A nossa filha Ruby deu-nos uma grande lição, ao tornar-se alguém que ajudou a mudar o nosso país.
Tornou-se parte da nossa história, tal como acontece com os generais e os presidentes. À semelhança deles,
também Ruby foi uma líder, porque conduziu negros e brancos
a um maior entendimento.
(Testemunho da mãe de Ruby)
Ruby Bridges nasceu numa pequena cabana perto de Tylertown, no Mississipi.
― Éramos pobres, muito pobres ― recorda ela. ―
O meu pai trabalhava nas colheitas. Havia alturas em que tínhamos
muito pouco para comer. Quando os donos das terras começaram a usar
máquinas para facilitar as colheitas, o meu pai ficou sem emprego e
tivemos de mudar de terra. Penso que tinha quatro anos quando partimos.
Em
1957, a família mudou-se para Nova Orleães. O pai arranjou emprego
como porteiro e a mãe cuidava das crianças durante o dia. Depois de os
aconchegar na cama à noite, ia esfregar o soalho de um banco. Iam à
igreja todos os domingos.
Naquele
tempo, as crianças brancas e as negras frequentavam escolas separadas
em Nova Orleães. As crianças negras não tinham direito ao mesmo tipo de
educação das brancas. O que era injusto e ia contra a Constituição. Em
1960, um juiz decidiu que quatro meninas negras frequentariam duas
escolas primárias para brancos. Três das meninas foram para a Escola
McDonogh 19. Ruby Bridges, então com seis anos, foi para a Escola
William Frantz.
Os
pais de Ruby estavam felizes por a filha poder participar num evento
tão importante da história americana. No primeiro dia de escola de
Ruby, uma multidão de brancos enfurecidos juntou-se à porta do
edifício. Alguns traziam tabuletas nas quais diziam que não queriam
crianças negras numa escola branca. Insultaram a menina e quiseram
mesmo bater-lhe. Nem a cidade nem a polícia estatal ajudaram Ruby. Foi
então que o Presidente dos Estados Unidos ordenou que guardas federais
armados acompanhassem Ruby até à escola.
E
assim, todos os dias, durante meses, Ruby teve aulas neste ambiente.
Ia sempre para a escola escoltada por guardas federais, munida de uma
lancheira e caminhando devagar. Quando se aproximava da escola, via
logo a multidão que fazia piquete à porta do edifício. Homens, mulheres
e crianças gritavam contra ela e queriam empurrá-la. Apenas a presença
dos guardas e a ameaça da prisão os impedia de lhe fazerem mal.
Ruby apressava-se a entrar na escola, sem dizer palavra.
Os
brancos da vizinhança recusaram-se a enviar os filhos para a escola.
Quando Ruby entrava no edifício, só lá estavam ela e a professora, Mrs.
Henry. Não havia crianças com quem aprender, brincar ou almoçar. Mas
todos os dias Ruby entrava na sala com um grande sorriso, e
preparava-se para aprender.
― Era muito bem-educada e trabalhadora ― lembra a professora. ―
Gostava de estar na escola. Não parecia nervosa, irritadiça ou
assustada. Parecia-se com qualquer criança normal e relaxada que eu
ensinara.
Ruby começou assim a aprender a ler e a escrever numa sala da aula vazia e numa escola vazia.
― Às vezes perguntava-me como ela conseguia ― continua Mrs. Henry. ― Como passava por aquela multidão todos os dias e conseguia entrar na escola de uma forma tão descontraída.
A
professora fazia-lhe perguntas para averiguar o verdadeiro estado de
espírito da criança e Ruby sempre lhe assegurava que se sentia bem.
Mrs. Henry decidiu esperar para ver se haveria alguma alteração no
comportamento da sua aluna. Se esta, eventualmente, revelava desgaste
ou queria desistir da escola.
Certa
manhã, algo de diferente se passou. A professora estava à janela a ver
Ruby dirigir-se à escola, quando, de repente, a menina estacou e se
dirigiu à multidão vociferante. Mrs. Henry perguntou-se o que estaria a
sua aluna a dizer. A multidão parecia querer matá-la. Os guardas
estavam assustados e queriam que Ruby entrasse na escola o mais
depressa possível. Mas esta só o fez depois de dizer tudo o que tinha a
dizer.
Quando
entrou na sala de aula, a professora contou-lhe que a observara da
janela e perguntou-lhe o que dissera àquelas pessoas. Ruby ficou
agastada.
― Eu não falei com elas.
― Mas, Ruby, eu vi os teus lábios a mexer.
― Eu não estava a falar com elas, estava a pedir por elas.
Quando as aulas terminaram naquele dia, Ruby saiu por entre a multidão, como de costume.
Depois
de ter andado alguns quarteirões e de se ter distanciado da turba, a
menina parou para repetir o pedido que fazia todos os dias...
Nesse
mesmo ano, dois rapazes brancos começaram a frequentar a escola de
Ruby. Os pais estavam cansados de os ver metidos em sarilhos, em vez de
estarem na escola a aprender. A multidão enfureceu-se com a presença
deles mas, em breve, outros se lhes juntaram.
Um dos pais disse:
―
Temos estado a deixar que algumas pessoas roubem o direito dos nossos
filhos à educação, ao quererem fazer justiça pelas suas próprias mãos.
Temos de lutar ao lado da lei e defender o direito dos nossos filhos à
educação.
E muitas crianças começaram a frequentar a escola.
Quando
Ruby estava no segundo ano, a multidão desistiu de se manifestar e de
desafiar a ordem do juiz para acabar com a segregação racial nas
escolas. Depois de frequentar a escola primária, Ruby frequentou também
a secundária.
Hoje é casada com um empreiteiro e tem quatro rapazes. Empresária de sucesso, criou a Ruby Bridges Educational Foundation, para fomentar o envolvimento dos pais na educação dos filhos.
Robert Coles; George Ford
The Story of Ruby Bridges
New York, Scholastic, Inc., 2004
(Tradução e adaptação)
es@contadoresdehistorias.co
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