sábado, 19 de janeiro de 2013

A casa pequena com outra grande às costas

Era uma casa pequena. Entrava-se e tudo se vivia no mesmo piso. Tinha sido construída ao mesmo tempo que uma família se criava. Um homem e uma mulher amavam-se e casaram. Como milhões de mortais, tiverem filhos. Veio o primeiro e depois o segundo. Todos pareciam gostar do seu abrigo. E a casa parecia feliz com o seu recheio. Ouvia música, ouvia os ruídos da televisão e ouvia sobretudo a família a falar, a rir… De vez em quando, alguns silêncios pesados, alguns ralhos, algumas discussões, algum choro – quase sempre de porta fechada aos soluços.
No geral, pelo menos vista de fora, parecia uma casa feliz, no sentido próprio e no sentido figurado. Também é verdade que a casa, nos seus diversos sentidos, era estimada: logo que aparecia uma mazela, havia logo quem reparasse e tentasse resolver a situação.
Assim foi durante mais de vinte anos. Mas, como quase nada dura sempre, a família cresceu, vieram novas necessidades e a casa passou a ser demasiado pequena. O que fazer, então? O melhor seria fazê-la crescer, tal como a família havia crescido. Mãos à obra, então.
Em breve, o tijolo começou a prolongar as paredes da casa pequenina inicial. Como se os braços da casa tivessem crescido para aguentar um peso maior.

Se eu soubesse desenhar, poria a casa tal qual a estou a ver: uma casa pequena, pintada de branco, a segurar uma bem maior que nela se apoia.
 Na verdade, o que me parece ver é essa casa pequenina com outra maior às costas. Quanto a mim, preferia-a mais pequena, mas não poderei saber o que é melhor. É que também sei que só sabe o que se passa debaixo de um telhado quem sob ele se abriga.

2 comentários:

  1. Ora aí está, a problemática que liga as casa e as famílias. Para quê casas grandes se conseguimos viver em espaços bem pequenos, ainda que a grandeza das nossas almas seja desmedida. Interrogo-me muitas vezes se valerá a pena aumentar as casas pequenas ou habitar em casas grandes, que mais tarde serão abandonadas às ervas daninhas.
    Muito bem!
    CS

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  2. Olá, Ci. Concordo com o que dizes - e que vem no seguimento da nossa conversa de há bocado.

    A casa onde vivemos revela-nos bem as fases da nossa vida. Como divisões que vamos recheando porque parecem eternas, mas que, uns tempos mais tarde, vão sendo menos visitadas.

    Um beijinho
    M.

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