Não era muito saudosista, mas às
vezes falava de coisas que tinha vivido, nas histórias que contava.
Os netos pediam: avó, conta uma
história. E ela contava. E nunca contava da mesma maneira. A
neta mais pequenina, muito observadora, dizia logo: avó, enganaste-te, a
história não é assim. Tinha, então, de se lembrar das palavras já ditas e de que não se podia desviar.
Um dia, a neta de dez anos disse:
avó, conta a história do capuchinho vermelho mas à tua maneira. Ela, talvez por
já ser mais crescida, gostava de pormenores diferentes ou de histórias
verdadeiras. E a avó disse então: em vez do capuchinho vermelho, vou contar-te
a história do vestido vermelho. É verdadeira.
- Mas começa por Era uma vez como eu gosto?
- Sim, pode começar. Era uma vez uma menina que gostava muito
de roupa colorida. Desde pequena que assim era. Era uma festa quando a mãe lhe comprava
uma peça de roupa nova e vistosa.
Cresceu, tornou-se mulher e
manteve o gosto por vestidos, saias, blusas… com muita cor.
Foi sempre boa aluna, tirou um
curso e começou a dar aulas numa escola. Ficou tão contente por poder começar a
trabalhar que, no primeiro dia, levou o vestido de que gostava mais: um vestido
vermelho. Quando chegou à escola, foi chamada ao diretor que lhe disse, muito
sério, que era proibido entrar numa sala de aulas de vestido vermelho.
- Ó avó, essa história é
inventada. Inventas cada coisa!
- Mas olha que é verdadeira!
- Só se for para ti, avó. Queres
enganar-me? Esqueces-te que já tenho 10 anos? Para inventar prefiro a playstation!
A avó imaginou-se ainda com
corpo de menina e a cabeça cheia de sonhos a vestir o vestido vermelho. Que
conservava há mais de 38 anos. Apesar de já não lhe servir, contava uma das histórias mais verdadeiras da sua vida.
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