quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Presente



Abro a janela alta. Entra a luz da tarde. Não forte, porque é outono. Entram os ruídos: dos cães a ladrar, dos carros que passam depressa, das motas que parecem riscar o pavimento, das pessoas que contam o que lhes vai na alma enquanto caminham…
Nas janelas que avisto bate a luz do sol. Algumas estão fechadas. Já não vejo as mulheres que, domésticas, faziam da luz do dia um frenesim de lavagem de roupas, de limpezas gerais das casas, de confeção de comidas donde sobressaía o estrugido bem puxado…
Já não as vejo, porque passam mais tempo sentadas, embora ainda lavem, cozinhem, costurem… A diferença é que falam menos e também falam menos com elas.
Talvez espreitem a vida cá fora pelas janelas semi-fechadas para que não entre demasiado calor. A idade rejeita os excessos, o muito, o demasiado…
Conservo a janela aberta. Vejo os telhados. E nenhum é já de vidro.

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