quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Diário de Mariana



8 de novembro de 2012
Querido diário,

Hoje, quero escrever-te, embora não tenha nada de especial para te contar. Eu também acho que há poucas coisas especiais no nosso dia a dia, mas há algumas que são importantes, mesmo sem serem muito importantes. Estou a repetir, mas acho que percebes bem.

Hoje, de manhã, aconteceu uma cena na escola que até provocou atrasos a algumas aulas. Nesta semana, está a haver a campanha para a Associação de Estudantes e as listas convidaram pessoas da Casa dos Segredos. Eu, por acaso, não ligo muito, porque um dia vi o programa na televisão e eles estavam todos aos berros uns com os outros e preferi  ver um filme muito mais fixe.

No intervalo, logo a seguir à chegada do Fernando da Casa dos Segredos, foi uma barafunda. Toda a gente queria vê-lo de perto. Na aula a seguir, a Zé, a Vanessa e a Vânia nunca mais paravam de falar dele. Só diziam: ai, ele é tão bonito! A setora, então, disse assim: ó meninas, deixem lá de falar da criatura e vamos ao trabalho. Deve ser uma beleza, não haja dúvida! Uma delas, então, disse logo: “ó setora, se estivesse lá, queria ver se não ia logo para a fila da frente”. quem ouviu começou a rir-se e a professora também se riu. Depois, fizemos a composição.

Apesar de a escola estar altamente por causa das eleições para a associação de estudantes, o Gi anda meio esquisito. Esta semana, aprendi a palavra "abulia" e acho que deve ser isso que ele anda a sentir. Diz que anda sem vontade, que gosta de ir à escola só porque eu estou lá, que não lhe apetece estudar e que está sempre calado nas aulas porque está mortinho mas é para ir para casa. Eu tenho outros colegas assim. Será da crise de que a gente está sempre a ouvir falar? Se calhar, é.

Como vai haver o concurso de contos sobre a palavra Amor, eu disse-lhe que tínhamos de começar a escrever a história. Eu acho que ele ficou mais animado e, por acaso, até já tive uma ideia. E acho que o Gi também, porque, de repente, piscou-me o olho. E ainda ficou mais bonito. Qual Fernando, qual carapuça!

Muitos abracinhos, querido diário

Mariana

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A canção da avó

Gómez Oropeza

No coração do México, os falcões sobrevoam as altas montanhas, mergulhando em direção às encostas suaves, semeadas de milho. Debaixo do sol tropical, as iguanas descansam sobre rochedos brilhantes, e os tucanos conversam com os guaxinins empoleirados em árvores verde-esmeralda. Por entre as colinas, os pumas correm, as raposas cinzentas procuram galinhas, e os lobos uivam entre si, à noite.
Numa aldeia situada no sopé das montanhas, vivia uma avó com a neta. Plantavam milho, tomates e girassóis na Primavera e juntas viam os rebentos verdes despontar da terra. No Verão, colhiam lírios brancos como leite, punham-nos em cestos às costas, e levavam-nos para vender no mercado. Pelo Outono, decoravam caules esguios de milho para a festa das colheitas, a fim de agradecer os cereais de um ano inteiro. No Dia dos Mortos, costumavam erigir um altar e acender velas, relembrando os entes queridos. E no Natal, pegavam em cola e papel e faziam pinhatas, que enchiam com frutas e doces.
A avó era alta e imponente. Tinha as faces macias e as maçãs do rosto bem marcadas. Os olhos eram profundos, castanhos e doces. Embora tristes, eram bondosos. Tinha o peito largo e as ancas redondas. Pernas e pés robustos ligavam-na à terra, como se fosse uma árvore antiga. Os braços eram fortes e as mãos graciosas, com dedos longos e finos. Era uma mulher tão delicada como os rebentos de um jacarandá.
A neta gostava de explorar e de sonhar. Costumava brincar sozinha, nos campos e nas florestas, mas tinha medo das sombras escuras, dos barulhos dos animais, e de tudo o que fosse novo e diferente. “O que haverá no buraco desta árvore velha?” pensava, enquanto se erguia nos bicos dos pés e esticava o pescoço para espreitar o tronco oco. Contudo, mal ouvia um gato-do-mato nos ramos altos, começava a tremer dos pés à cabeça, como um saco de folhas secas a ondular numa tarde ventosa.
Certo dia, a neta assustadiça encontrou um tatu. Não passava de um vulgar tatu que se cruzara no seu caminho, mas a rapariga tremeu como se fosse um urso feroz com garras afiadas e dentes rangentes. Depois desse encontro, cada pequena sombra no caminho para casa iria transformar-se num monstro aterrador.
Quando a avó ouviu o barulho da porta, correu para a neta e abraçou-a. Em seguida, sentou-a ao colo e afagou-a com doçura. Enquanto lhe afagava o cabelo e as costas, ia cantando:
Minha pequenina, como bate o teu coração e que medo te faz tremer tanto! O mundo é um lugar assustador para os que não confiam. A minha ternura dar-te-á confiança: a confiança que sinto, a confiança que a minha avó sentia, e que herdou da avó dela.
A neta sentiu-se invadida por um calor reconfortante e, enquanto o sol se punha, deixou de tremer e adormeceu.
No dia seguinte, um grupo de crianças surpreendeu-a enquanto brincava à beira da estrada. Rindo e gritando, correram para ela e perguntaram-lhe:
— Onde fica o rio?
Em vez de fugir, a menina apontou com o dedo para a esquerda. Embora tremesse por dentro, o dedo mantivera-se firme. Nessa noite, contou à avó o que acontecera. A avó sorriu:
— Isso já é um progresso.
Pegou na neta ao colo e afagou-a como se faz a um gatinho. Depois, começou a cantar:
— Minha pequenina, como bate o teu coração e que medo te faz tremer tanto! O mundo é um lugar assustador para os que não têm coragem, mas hoje mostraste bravura. A tua coragem alia-se à minha e à da minha avó, que a herdou da avó dela.
A neta sentiu uma força percorrer o seu corpinho e as tremuras pararam.
Alguns dias depois, um beija-flor caiu de um ninho no jardim e partiu uma asa. Em vez de fugir, a neta assustadiça dirigiu-se à avezinha e pegou nela. O corpo do pássaro tremia ainda mais do que o seu. A menina sentia o coraçãozinho minúsculo e trémulo e a barriguita quente e penugenta. Pegou no beija-flor com a mesma ternura com que a avó pegara nela e levou-o para casa.
A avó sabia tomar conta de animais feridos. Fizeram juntas um pequeno ninho numa caixa, com tecido e palha, e alimentaram o pássaro com um conta-gotas. A menina deu de beber ao bichinho, gota a gota. À medida que o fazia, ia sentindo um entusiasmo percorrer o seu corpo.
A avó sorriu e o sorriso iluminou-lhe o olhar.
— Isto é que é um progresso!
Enquanto o beija-flor dormia, pegou na neta e cantou:
Minha pequenina, como bate o teu coração e que medo te faz tremer tanto! O mundo é um lugar assustador para os que não ajudam os outros. Hoje ajudaste uma criatura pequena e assustada e descobriste o teu dom de curar.
Durante toda a noite, a avó manteve a sua querida neta ao colo e continuou a cantar:
Este é o dom que te transmito, que é também o dom da minha avó, que o herdou da avó dela.
Certa tarde, a neta observava uma loja do mercado quando o comerciante acusou injustamente uma criança de ter roubado. A menina viu a cara irada do homem enquanto este apontava um dedo ameaçador ao menino. Embora com o coração a bater, aproximou-se do comerciante e disse:
— Este rapaz não roubou nada. Eu vi. Por favor, não grite com ele.
O comerciante grunhiu uma resposta e a rapariga perguntou:
— Quanto dinheiro perdeu?
— Dez cêntimos — respondeu o homem.
A menina remexeu no bolso e deu-lhe todo o dinheiro que tinha.
— Isto é que é progresso! — exclamou a avó, quando a neta lhe contou o sucedido, quase sem fôlego pela corrida até casa.
A avó pegou nela ao colo e afagou-a durante muito tempo.
Ouve bem, minha querida. O mundo é um lugar assustador para os que não têm dignidade. Hoje mostraste a tua. A ela junto a minha e a da minha avó, que a herdou da avó dela.
A neta sentiu um orgulho estranho invadir-lhe o corpo. Sentiu-se maior e mais forte.
◊◊◊◊◊◊
Quantas vezes mais a avó acariciou a neta? Quantas vezes mais cantou para ela? Não sei. Mas sei que o fez muitas e muitas vezes, durante muitas semanas e muitos anos. Através da sua ternura, incutiu na neta assustadiça confiança e coragem, destreza e dignidade. E as suas canções eram tão profundas que penetravam o coração, o sangue, e todo o corpo da menina.
A neta cresceu esperançada, digna de confiança, generosa e bondosa. Já ninguém se lembrava de que fugira em tempos de guaxinins. Tornou-se uma mulher forte, de gargalhada fácil, tirando prazer de tudo o que a rodeava.
E muito mais tarde, embora já tivesse filhos, ainda punha a cabeça no colo da avó de vez em quando. Conhecia bem a linguagem das mãos dela e sorria, de olhos fechados, enquanto a avó percorria o caminho familiar da ternura que sempre lhe mostrara.
Com o decorrer dos anos, a avó tornou-se velha e frágil. Chegou então a vez da neta tomar conta dela. De manhã bem cedo, vinha acender o lume e aquecer água para o chá. Cozinhava, lavava e penteava o cabelo prateado da velhinha. Massajava com carinho os pés cansados, dedo a dedo. Pegava nas mãos que tanto amava e massajava-lhe os dedos hirtos. Por vezes, embora mais raramente, caminhavam juntas pela aldeia, atravessavam o vale e iam até às montanhas, rindo e cantando juntas. Sempre que o piso era incerto, a neta oferecia o braço à avó.
Uma noite, a neta sonhou com a avó a subir sozinha a montanha. Queria juntar-se a ela, mas a avó virou-se e levantou a mão:
— Tenho de ir sozinha — dissera, com um sorriso tranquilo nos olhos.
No dia seguinte, como de costume, a neta foi a casa da avó. Mas, quanto tentou acordá-la, viu que o corpo estava frio e a face serena. De joelhos, fulminada pela dor, a neta sentiu o coração a esvoaçar e o estômago a tremer, como quando era criança.
Estremeceu dos pés à cabeça, como ramo de um cedro apanhado no meio de uma tempestade tremenda. Como poderia viver sem a sua avó adorada? O coração abriu-se como um rio e as lágrimas inundaram o seu rosto. Os soluços sacudiram-na toda. De repente, ouviu a voz da avó:
— Minha pequenina, ouve-me.
A neta sentiu umas mãos fortes e quentes a acariciar-lhe as costas. Eram mãos invisíveis, mais poderosas do que as mãos físicas da avó. Essas mãos abraçaram-na e embalaram-na, incutindo-lhe bem-estar por todo o corpo. Os soluços cessaram, tão depressa como tinham começado. Sentiu uma enorme leveza no coração e força nos membros. Pôs-se de pé, e afagou a face e a testa da querida avó morta.
◊◊◊◊◊◊
A neta já foi muitas vezes avó. E muitas vezes também já pegou ao colo nos netos. Embalou-os com os seus braços fortes e capazes, riu e chorou com eles, e cantou para eles, enquanto os acariciava.
Meus pequeninos, ouçam bem. O espírito da avó rodeia-nos. Está no vento e nas árvores. Está nos vales e nas colinas. As mãos do espírito da avó brincam com os peixes nos riachos e acendem o lume da lareira. Está sempre presente quando estamos com amigos calorosos, quando provamos comida deliciosa, e sempre que partilhamos sorrisos ou lágrimas. Onde quer que estejamos, a avó está sempre perto. E sempre que precisarmos dela, podemos fechar os olhos e sentir-nos no seu colo.
Barbara Soros; Jackie Morris
Grandmother’s Song
Bristol, Barefoot Books, 1998
(Tradução e adaptação)

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Estamos de Acordo!

Hoje, estive com duas colegas a fazer uma sessão de formação sobre o Novo Acordo Ortográfico para profissionais de um Centro de Saúde de Gondomar. Foi uma experiência muito interessante. Para além da partilha de conhecimentos, foi bom ver o Centro de Saúde "por dentro". Os profissionais - funcionários administrativos - tinham-se inscrito para saberem usar corretamente as novas regras de ortografia. 

Vimos que "injeção" se escreve apenas com um "c" porque o outro que existia não se lê e por isso desaparece; que "bactéria" mantém o "c" porque esta consoante é pronunciada; "veem", tal como "descreem" e "leem" já não necessita de acento; que o verbo "pôr" o mantém, mas "para", tal como "polo" deixa de o ter; que "heroico" não tem acento gráfico por ser palavra grave e com o ditongo "oi", mas que herói não perde o acento porque é aguda, apesar de o ditongo também lá estar; que anti-higiénico se escreve com hífen porque o segundo elemento da palavra começa por "h"; que "micro-ondas" se escreve com hífen porque "micro" termina com a mesma vogal que inicia "ondas"; que microestrutura se escreve tudo junto porque "micro" se escreve com uma vogal e o resto da palavra começa por vogal diferente; que "hei de" deixa de ter hífen; que os meses, tal como as estações, passam a escrever-se com letra minúscula...

E, no final, já fora da sala soalheira, onde decorreu  a participada sessão, também se falou de um rastreio ao cancro de pele, levado a cabo pelo Centro de Saúde com a colaboração direta de alunos da Escola Secundária de Gondomar. E a satisfação da Coordenadora da ACES era grande ao reconhecer a utilidade desse trabalho para a qualidade de vida da população. Seria dado feed-back aos alunos e professoras dinamizadoras, como reconhecimento de um serviço prestado, graciosamente, à Comunidade.

De facto, muitas vezes, só quando estamos "por dentro" é que tomamos conhecimento de ações importantes que se desenvolvem perto de nós, mas que, muitas vezes, nos passam ao lado.

Assim, entrámos no Centro de Saúde para falar do Novo Acordo Ortográfico, saindo a referir a importância de trabalhos desenvolvidos por muitas pessoas e sem os quais as populações seriam mais pobres a nível social, educativo, cultural...

O bem-estar de todos deverá ser cada vez mais uma preocupação comum. E nisso, julgo que todos estamos de Acordo.


domingo, 4 de novembro de 2012

Olha a mala...

Imagem da net

Quinta-feira, dia 1 de novembro, sete horas da manhã, a viajante chega ao aeroporto do Porto, rumo a Espanha. Fará escala em Madrid, e de lá seguirá para o sul do país.

Tem duas malas. A mais pequena para levar na mão. Ao fazer o check-in, dizem-lhe que a mala pequena também terá de seguir para o porão, tal como a outra. Assim acontece. Ambas serão recolhidas apenas no final da viagem e não em Madrid.

Chegada ao seu destino, pelo meio-dia, a viajante vê todas as bagagens serem recolhidas do tapete rolante, mas a mala mais pequena não aparece. Aguarda mais um tempo, na esperança de a ver lançada para o tapete. Nada. Vai ao balcão e tenta saber informações sobre o paradeiro da mala.

Não, não há malas retidas nem sobrantes. Terá de aguardar após a reclamação por escrito.

No final da tarde, a viajante liga para o número constante da reclamação. Não, não têm mala nenhuma. Terá de aguardar.

No dia seguinte, a viajante volta a ligar para saber da mala. Pois, a mala ficou no Porto.

A viajante liga para o Porto. Não, aqui no Porto não há mala nenhuma com essa descrição. Tem de estar no aeroporto de destino. Terá de aguardar. Não é da nossa responsabilidade. Quem tem de saber do paradeiro da mala é o aeroporto onde desembarcou.

Novo contacto para o aeroporto de destino. A mala está no Porto, porque aqui não temos bagagem retida.

Nova ligação para o Porto. Terá de aguardar que a mala apareça. Não temos informação sobre a mala e o código está incompleto. Faltam dois algarismos, por isso é difícil localizar a mala. Mas, um momento, por favor. Mais um momento. Estou a tentar contactar com os meus colegas de Madrid. A minha experiência diz-me que a mala perdeu a etiqueta e ficou posta de lado.

????!!!!

Mais um momento, por favor. Terá de ver que o aeroporto de Madrid é um mundo. O melhor é deixar o seu contacto e ligo-lhe quando tiver outras informações.

Sábado. 11.30 da manhã. A viajante, continuando sem notícias, contacta de novo o aeroporto de destino. Não, não temos a mala. Talvez ainda esteja no Porto. Tem de aguardar.

Novo contacto para o Porto. Não, isso não é verdade. A mala não ficou no Porto. Um momento, por favor, vejo que a mala já foi localizada. Está em Madrid. E quando irá ser entregue? Isso não sabemos. Terá de aguardar.  

Domingo de manhã, dia 4 de novembro, o telefone toca: a mala vai ser entregue. Deverá esperar. A viajante esperou três horas pela entrega da mala.

Dentro da mala, também havia um carregador de telemóvel. Ainda bem que a bateria ainda deu para tanto telefonema - que ajudou a tirar a mala do canto para onde teria sido atirada.

A viajante viajou na TAP e na Air Europa. O bilhete de embarque, incluindo a escala,  foi pago à TAP.


sábado, 3 de novembro de 2012

L’éléphant et le chien

                                                                                                                         Imagem da net

Détends-toi, ne bouge plus et écoute – écoute attentivement l’histoire d’un éléphant – l’éléphant royal  - qui appartenait au roi et avait l´honneur de mener les parades royales. - Son nom était Rajah et il vivait entouré d’un grand luxe. Mais cela ne le rendait pas heureux, parce que comme il était le seul éléphant royal, souvent il se sentait très seul, sans personne pour lui tenir compagnie. Jusqu’à ce qu’un jour il s’est fait un ami. Veux-tu savoir qui était-il ? Voyons si nous pouvons le découvrir !

Alors… chaque jour, à la tombée de la journée, Rajah prenait un long et rafraîchissant bain juste avant que son cornac ne lui serve le dîner. Après le repas, il marchait dans ses pièces et il admirait le coucher du soleil. Alors, quand les étoiles scintillantes prenaient leur place dans le ciel velouté, il allait se coucher.
Cependant, un jour, à la tombée de la nuit, venait-il de dîner, il s’est rendu compte qu’un petit chien blanc l’observait par la grille de la cour. Le chien était très maigre et avait l’air affamé.

« M. l’Eléphant, excusez-moi — a dit le petit chien d’une voix douce — excusez-moi de vous déranger, mais est-ce que vous permettez que je mange vos restes? J’ai tellement faim.
— Bien sûr », répondit gentiment Rajah. Alors, le petit chien se glissa sous la porte et se précipita vers la gamelle de l’éléphant pour manger les restes ; il les avala en un clin d’œil, puis remercia l’éléphant et s’enfonça dans la nuit en gambadant. La même chose se produisit le lendemain, puis le surlendemain, jusqu’à ce qu’un soir, voyant arriver le chien, Rajah lui dise : « Mon ami, voudrais-tu venir partager chaque soir mon dîner ? Je vis seul, et ta compagnie me ferait grand plaisir. »

Ne se tenant plus de joie, le petit chien accepta avec enthousiasme cette aimable proposition. Un gigantesque éléphant assis auprès d’un petit chien blanc avec lequel il dînait – quel étrange spectacle ils offraient !
Cependant, le cornac estimait que le petit chien blanc n’était pas un compagnon convenable pour un éléphant royal, et tous les soirs, il faisait de son mieux pour le chasser. Mais, à la grande satisfaction de l’éléphant, son petit compagnon persistait à revenir. Et comme le cornac était paresseux, il ne tarda pas à renoncer à l’éloigner et lui permit de rester. 

Rajah et Flocon de Neige (ainsi que l’éléphant l’avait baptisé) ne tardèrent pas à devenir inséparables. Quand l’éléphant allait prendre son bain le soir, le chien l’accompagnait et ils jouaient ensemble dans l’eau. Après quoi ils dînaient en parlant inlassablement, comme font les amis. Ils riaient aussi beaucoup, bien sûr. Puis quand venait l’heure de se coucher, Flocon de Neige se pelotonnait à côté de Rajah. C’était une grande amitié.
Mais un jour, un fermier qui s’en revenait des champs vit les deux animaux jouer ensemble ; il aborda le cornac et lui dit : « Ce petit chien a l’air très intelligent ; j’aimerais beaucoup l’acheter. Combien en voulez-vous ? » Voyant là l’occasion rêvée de se débarrasser enfin du petit chien tout en arrondissant sa fin de mois, le cornac fit affaire avec le fermier, qui emmena aussitôt Flocon de Neige.

Le départ de son ami plongea Rajah dans une grande solitude et une grande tristesse. Il perdit peu à peu l’appétit ; il n’avait pas envie de manger seul. En fait, il n’avait pas envie de grand-chose. Il se contentait de rester là, à regarder par la clôture la direction dans laquelle le petit chien était parti. Quand arrivaient le soir et l’heure du bain, Rajah refusait d’aller dans l’eau, et il ne remarquait même pas le coucher de soleil et les étoiles qui brillaient dans le ciel nocturne dégagé.
Après une semaine de cet étrange comportement, le cornac commença à s’inquiéter vraiment pour lui. Il en parla donc au roi, qui envoya son propre médecin examiner Rajah. Le médecin ausculta soigneusement l’éléphant. « Eh bien, je ne lui trouve absolument rien, dit-il finalement. Cet éléphant n’a pas l’air malade, il semble juste très triste.
— Oui, en effet, répondit le cornac.
— Humm... En général, poursuivit le médecin avec sagesse, quand les personnes et les animaux sont tristes, il y a toujours une bonne raison. Est-il arrivé quelque chose ces derniers temps ? Y a-t-il eu des changements dans sa vie ?
— Pas vraiment... Quoique... il avait l’habitude de jouer chaque soir avec un petit chien tout maigre qui a été acheté récemment par un fermier du coin.
— Quand cela est-il arrivé ? s’enquit le médecin.
— Oh ! cela doit faire presque une semaine, maintenant, répondit le cornac d’un air penaud.
— Et quand a-t-il cessé de manger et de prendre son bain ? demanda le médecin.
— Humm... À cette époque, je présume, répondit le cornac, visiblement gêné de ne pas avoir fait la relation.
— Eh bien, nous y sommes ! Il doit être triste parce que son ami lui manque !
— Oh ! mon Dieu, si seulement je n’avais pas été tellement pressé de vendre le petit chien ! Je trouvais qu’ils formaient un couple si bizarre, tous les deux ! Je vais essayer de le retrouver, mais pour être honnête, j’ignore où habite le fermier », dit le cornac tout penaud.

Quand le médecin rapporta cette nouvelle au palais, le roi fit savoir dans tout son royaume qu’une récompense serait offerte à qui ramènerait le chien. Apprenant cela, le fermier se mit immédiatement en route avec Flocon de Neige pour aller réclamer sa récompense. 

Dès qu’ils franchirent les portes du palais, Flocon de Neige aperçut son ami Rajah et, aboyant de joie, il courut vers lui aussi vite que ses petites pattes le lui permettaient. Revoir son petit compagnon rendit l’éléphant fou de joie. Il le souleva à l’aide de sa longue trompe, le déposa au sommet de sa tête et se mit en route pour aller prendre son bain. Ce soir-là, les deux amis partagèrent de nouveau leur dîner et Rajah recommença à être heureux. Le lendemain, le cornac fit fabriquer une gamelle spécialement pour Flocon de Neige afin de lui signifier qu’il était invité à rester pour toujours. Au cours de la procession suivante, les gens s’émerveillèrent à la vue du petit chien blanc assis sur la tête de l’éléphant qui menait le cortège royal.
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Nous avons tous besoin d’amis avec qui partager des moments et des souvenirs précieux, et capables de nous aider dans les moments difficiles. Le sage sait qu’il est possible de trouver un ami même parmi les êtres les plus différents de soi.
Dharmachari Nagaraja
Histoires d’ailleurs : Petits contes de sagesse bouddhiste
Paris, Le Courrier du Livre, 2008


quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Há Momentos

Klint

Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Diário de Mariana

 4ª f., 31 de outubro
Querido diário,

Ontem, a prima Za disse que eu já não escrevia há muito tempo. Foi fixe ela ter-se lembrado de mim. Eu pareço tipo bem disposta mas sou um bocado tímida e acho mesmo fixe quando  gostam de mim. Eu escrevo, mas muitas vezes é só na minha cabeça. Vou para a escola, vejo uma coisa qualquer sem importância mas gira, oiço palavras que me chamam a atenção e apetecia-me logo escrever, mas… fica só escrito na minha cabeça.

Por acaso também me lembro de uma cena que ficou por contar há algum tempo. A tia Cilinha até disse que se calhar era por causa do Gi, mas por acaso não era. Eu, nesse dia, disse que estava mesmo mesmo contente, que era mesmo fixe o que eu estava a viver. Eu não cheguei a explicar, mas foi por causa da minha irmã do meio. Ela vem trabalhar para mais perto e assim posso falar com ela mais vezes, posso ir visitá-la (a minha mãe já me disse que só íamos se não acabassem as viagens low cost) e assim se ela precisar ou nós, já estamos todos mais perto e não é preciso atravessar o Atlântico para a gente se encontrar. Assim é muito melhor.

Também não escrevo muito porque quando chego a casa, tenho sempre bué de coisas para fazer. Mesmo que não me apeteça muito, depois de almoço, começo logo a fazer os tpcês. Isto se a minha mãe não me disser: Mariana, arranja-te porque quero que vás comigo a casa da avó e a casa das tias (tenho umas tias muito fixes, já bastante velhinhas, com a casa sempre muito arrumadinha e com a mesa sempre posta para a refeição seguinte). Por acaso até gosto de ir lá. Há sempre flores abertas nos canteiros e o cheiro da casa é especial. Sei lá, cheira ao tempo em que eu era pequena e ia para lá muitas vezes brincar. Só que elas tinham um pato e eu tinha medo porque ele era muito grande e desajeitado e corria atrás de mim. Devia ser para brincar mas eu pensava que era para me atacar e apetecia-me fugir cheia de medo dele. Ele se calhar divertia-se a assustar-me. E eu caía que nem um patinho.

Hoje no intervalo grande, o Gi abraçou-me e pareceu-me muito triste. Acabou por me dizer que como amanhã é o dia de se ir ao cemitério, lembrou-se mais do avô que morreu há alguns meses. Eu disse-lhe que também tenho muitas saudades do meu pai.  Ficámos os dois abraçados, sem falar e pensativos. Estávamos no corredor e passou a minha dê tê. Olhou para nós e começou a rir-se ao ver-nos assim abraçadinhos. Por que é que os setores não pensam que também temos problemas?!

Muitos abracinhos, querido diário.

Mariana

Almoçar só: eis a questão

Na escola, há dias em que o tempo de almoço para os professores é de 45 m. Assim sendo, come-se uma sandwich no bar, almoça-se na cantina ou "vai-se lá fora", mas sempre a correr.

Pois bem, como o tempo é pouco e comer coisas saudáveis e económicas também é importante, alguns professores trazem comida de casa. Transportada nas célebres, coloridas e polivalentes tupperwares. Depois, se necessário, há micro-ondas para aquecer a sopa e aconchegar o estômago. Para não falar do maior prazer que dá comer comida quentinha. O prazer pode ser pequenino, mas se o juntarmos a outros também se aquecem os dias.

Um grupo de professores (acho que éramos só professoras, porque as professoras voltam-se mais para estas coisas) falava sobre isto e uma delas referiu que, apesar de gostar muito da companhia de colegas, também lhe sabia bem comer sozinha e em silêncio. Era um momento de paragem e de tempo só para ela.

Lembrei-me também de uma professora universitária que dizia que, mesmo em dias de congressos ou colóquios, se afastava um pouco à hora do almoço para poder estar sozinha. Só assim ficava mais concentrada e disponível para os restantes trabalhos do dia.

E também me recordei de outra pessoa que dizia ter boas ideias quando parava um pouco a meio doa dia e podia desfrutar do silêncio. Até a mente se tornava mais ativa e criativa.

Para não falar de uma amiga que, em tempos de juventude e de campos de férias, comia sempre em silêncio, porque só assim podia saborear os alimentos. Causava espanto a quem estivesse próximo, punham-lhe questões, mas só respondia no final da refeição.

Eu, como vejo muitas coisas (o que às vezes é mau) por um lado/por outro lado..., também aqui assim acontece.

Bom almoço.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Diálogo imprevisto - hoje no supermercado

- Sabes o que é que o homem me perguntou?
- O que foi? Sei lá!
- Se havia marmelada matinal.
- E tu?
- Disse-lhe que não, mas só me apetecia rir.
- Porquê? Porque não sabes o que é marmelada matinal?!
- Nada disso, foi pela cara dele.
- E disseste-lhe o que havia dessa marca?
- Eu, não, porque olhava para ele e nem conseguia falar.
- Eu bem sei do que te lembravas!
- Olha, vê lá se te cai algum dente e ainda vai junto com as tripas do peixe.
- Não te enganes tu a pensar na marmelada matinal.
- Sempre gostei mais da noturna. Coitado do homem, quando me lembro...

domingo, 28 de outubro de 2012

Crepúsculo de outono

Aurélia de Sousa


O crepúsculo cai, manso como uma benção.
Dir-se-á que o rio chora a prisão de seu leito...
As grandes mãos da sombra evangélicas pensam
As feridas que a vida abriu em cada peito.


O outono amarelece e despoja os lariços.
Um corvo passa e grasna, e deixa esparso no ar
O terror augural de encantos e feitiços.
As flores morrem. Toda a relva entra a murchar.


Os pinheiros porém viçam, e serão breve
Todo o verde que a vista espairecendo vejas,
Mais negros sobre a alvura unânime da neve,
Altos e espirituais como flechas de igrejas.


Um sino plange. A sua voz ritma o murmúrio
Do rio, e isso parece a voz da solidão.
E essa voz enche o vale...o horizonte purpúreo...
Consoladora como um divino perdão.


O sol fundiu a neve. A folhagem vermelha
Reponta. Apenas há, nos barrancos retortos,
Flocos, que a luz do poente extática semelha
A um rebanho infeliz de cordeirinhos mortos.


A sombra casa os sons numa grave harmonia.
E tamanha esperança e uma tão grande paz
Avultam do clarão que cinge a serrania,
Como se houvesse aurora e o mar cantando atrás.

Manoel Bandeira

Outono em Chicago


sábado, 27 de outubro de 2012

Almoço de curso em tempo de crise

Imagem da net

Éramos vinte e tal, hoje, no restaurante do Monte Aventino, nas Antas, num almoço de curso. Tínhamos entrado na Faculdade de Letras do Porto, no ano em que se deu o 25 de abril, para frequentar o Curso de Românicas.

Apesar de o encontro ser anual, para muitos era o reencontro após um longo período de tempo sem se verem.

Olha, estás na mesma! Já te reformaste? E os teus filhos estão bem? Já tens netos? Olha quem aí vem, lembras-te de como se chama? Recordo-me da cara mas já não me lembro do nome. Que pena o 2ª f já não estar entre nós. Coitado, como só ia às aulas à 2ª f nunca mais se livrou do nome. Do que me lembro melhor é de, no primeiro ano, o anfiteatro estar cheio. E o Vasco, com aquele ar de personagem do Eça. E o Mateus, sempre tão reservado, só falava nas aulas de Teoria da Literatura. Eles deixaram de vir ao encontro. Gostava de os ver. De certeza que estão mais gordos. O Vasco deve estar com a barbicha branca e o Mateus ainda estará interessado em dissecar a "fímbria da folha?"
Olha, não estás a conhecer? Está com o cabelo grisalho mas a cara não modificou. Ainda bem! Fartei-me de rir com as anedotas da Paula. E a Francisca, que trabalheira ela teve a organizar isto! E as fotografias que ela trouxe para todos. Estão tão giras. Que diferente que eu estou! Queria era ter o cabelo como tinha há cinco anos. Realmente o tempo não perdoa...

Lá fora, um sol manso de outono a aquecer as folhas avermelhadas que iam caindo, devagar. Algumas esvoaçavam pela brisa.
 E, depois do almoço, todos se ajeitaram para a fotografia de grupo. Afastem-se um pouco mais. Isso mesmo, aninhados como os jogadores de futebol. Assim vê-se melhor toda a gente. Ora vamos lá. Só mais uma. 

E falou-se muito, E reviveu-se. E houve muita troca de sorrisos. E muitas palavras descontraídas. No fim, todos se despediram até um dia destes. Que tinha sido muito bom. Que não faltariam na próxima.

O almoço foi mais concorrido do que nos anos anteriores. Será pelo facto de a amizade ser ainda mais urgente em tempos de crise?

Francês

Quando comecei a trabalhar, há muitos muitos anos, gostaria de dar aulas de Português e de Francês, porque o meu estágio tinha sido feito nas duas disciplinas. Durante muito tempo, tal não foi possível. Como havia muitos alunos inscritos em Francês, os professores mais novos, últimos a escolher os horários, ficariam com as turmas que restavam. Também por isso fiquei bastantes anos só a dar Francês. Gostava muito, porque sempre gostei da língua francesa.
E, felizmente, pude conhecer  Paris e outras cidades e regiões francesas, às vezes com a família e amigos, outras em visita de estudo. E foi bom ver os alunos fascinados com a torre Eiffel, o Arco do Triunfo, a Avenida dos Campos Elísios e dizerem que tinham sabido falar em Francês...

Com o tempo e as modificações introduzidas nas escolas, as turmas de Francês foram-se reduzindo drasticamente. E também eu, com o passar inexorável do tempo, passei a poder escolher a disciplina a lecionar - Português. No entanto, o Francês, apesar de para mim já um pouco distante, não perdeu, também para mim, as belas sonoridades.

Ontem, a falar com uma amiga, tive conhecimento dos contos em Francês enviados pelo Clube de Contadores de histórias. De seguida, partilhei um dos que ela me enviou: "Li Na et l'empereur". Apesar de ser um pouco longo, apetece lê-lo devagar e em voz alta. Talvez por desejar um pouquinho da perfeição que Li Na procurava. E que, felizmente, acabou por encontrar.



sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Li Na et l’Empereur

Imagem da net

Il y a très longtemps, dans la lointaine Chine, une vieille femme vivait sur un petit bateau amarré sur le fleuve Jaune. Elle s’appelait Li Na, et elle était calligraphe.
Li Na avait travaillé toute sa vie pour atteindre la perfection dans son art. Beaucoup de gens savent écrire. Mais seul un artiste parvient, par quelques traits sur le papier, à exprimer la vérité d’une chose.
En ce temps-là, vivait aussi dans la capitale de la Chine un empereur. Il habitait un palais immense, dont l’entrée était interdite aux gens ordinaires. Il était très riche, très puissant et très, très cruel. Même sa femme et ses enfants le craignaient.
Tout le monde, au contraire, aimait la vieille calligraphe. De toutes parts on venait admirer ses créations. « Écris-nous le signe de l’amour ! » lui demandait-on. Ou bien : « Nous voudrions offrir à notre mère un idéogramme qui lui rende sa gaieté ! » Alors Li Na trempait son pinceau dans l’encre noire et, avec des gestes élégants, traçait sur le papier l’idéogramme de l’amour, ou celui de la joie, ou celui du bonheur. Et tous s’en retournaient heureux et comblés.
Bonheur, joie, amour, amitié, pardon, tout cela Li Na l’avait ressenti de tout son être et pouvait l’exprimer dans un idéogramme. Mais parfois, il fallait à la vieille calligraphe des jours, ou des semaines, pour atteindre le sens profond d’un signe. Pour traduire la vérité d’une fleur, Li Na avait dû devenir elle-même une fleur. Éprouver ce que ressent une fleur lorsque la rosée se dépose sur les feuilles, lorsque s’ouvre lentement la corolle. Et lorsque, enfin, la fleur fane et perd ses pétales. Li Na maîtrisait son art à la perfection.
Li Na avait une élève, San Li, qui vivait avec elle sur le bateau. San Li savait déjà quel papier convenait le mieux pour tracer un idéogramme. Elle savait aussi préparer l’encre et avait reçu ses premières leçons de calligraphie.
Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)
Un matin, une grande agitation vint troubler les abords du fleuve Jaune.
L’empereur approchait de l’endroit où était amarré le bateau de la calligraphe. Cent guerriers précédaient le palanquin incrusté d’or, cent guerriers le suivaient, et cent guerriers encore le protégeaient de chaque côté.
L’empereur fit arrêter les porteurs devant le bateau de Li Na. Un serviteur appela la vieille femme :
― L’empereur t’ordonne de tracer pour lui un idéogramme. Il doit exprimer la grandeur de son empire, sa richesse infinie et sa puissance inébranlable !
Li Na poussa la porte branlante de son bateau et s’avança. Cachée derrière le montant de la porte, San Li tenta d’apercevoir l’empereur. Mais les rideaux tissés d’argent du palanquin le protégeaient des regards. Sa voix était puissante et sonore.
― Combien de temps te faudra-t-il ? demanda-t-il d’un ton impérieux qui fit trembler de peur San Li.
― Il me faudra le temps de comprendre la nature de votre puissance ! répondit la vieille calligraphe d’une voix ferme.
San Li admira le sang-froid de son professeur.
― Qu’un serviteur vienne dans une semaine chercher la calligraphie.
L’empereur frappa trois fois du pommeau de sa canne la paroi du palanquin, et, aussitôt, porteurs et guerriers se mirent en mouvement.
Les habitants, emplis de crainte, s’étaient cachés dans leurs maisons ou leurs bateaux. L’empereur sortait fort peu souvent de son palais, et rares étaient ceux qui l’avaient vu de leurs propres yeux. Comme le palanquin resplendissait ! Comme les guerriers semblaient invincibles ! Ils portaient les armes, sûrs de leur puissance, et le sol tremblait encore de leurs pas.
Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)
Depuis la visite de l’empereur, la vieille calligraphe était plongée dans un profond silence. Elle n’avait adressé la parole à personne, pas même à San Li. Assise sur le pont du bateau, elle réfléchissait. Comment pouvait-elle mesurer la grandeur de l’empire, elle qui jamais n’avait pénétré dans le palais impérial ? Comment pouvait-elle imaginer l’immensité des richesses de l’empereur, elle qui ne possédait rien ? Comment pouvait-elle comprendre sa puissance, elle qui jamais n’avait donné d’ordre ?
Lorsque le soleil se coucha sur le fleuve Jaune, Li Na était toujours assise au même endroit. Perdue dans ses pensées, elle fixait le fleuve.
Elle ne réagit pas lorsque San Li apporta un bol de riz et du thé parfumé. La tête penchée en avant, la vieille calligraphe s’était assoupie, et la lune faisait briller des reflets d’argent dans ses cheveux.
Une semaine s’écoula, et un serviteur du palais vint réclamer la calligraphie.
Désolée, la vieille dame secoua la tête :
― Je regrette, mais je ne peux répondre à la commande de l’empereur. Je n’ai jamais pénétré dans le palais impérial, je ne sais rien des cérémonies de la cour. Empire et puissance sont pour moi des mots étrangers. Peux-tu me rapporter un objet du palais ? Quelque chose que l’empereur touche chaque jour.
Le serviteur le promit. Une semaine plus tard, il apporta un riche tapis et un gobelet en or. Comme Li Na n’était pas visible, il les remit à son élève. Tremblante, San Li prit les précieux objets.
― Porte-les à ton professeur ! l’exhorta le serviteur de l’empereur. Mais prends garde de les souiller ou, pis, de les abîmer. L’empereur vous jetterait aussitôt en prison, toutes les deux !
Incapable d’articuler un mot, San Li hocha la tête.
― Je reviens dans une semaine ! Que la calligraphie soit alors achevée !
De nouveau, une semaine s’écoula, et le serviteur revint trouver la calligraphe.
― Je ne parviens pas à traduire sur le papier la puissance de l’empereur, dit la vieille dame d’une voix tremblante. Apporte-moi une épée ou une autre arme avec laquelle l’empereur fait sentir son pouvoir à ses ennemis.
― Je vais voir ce que je peux faire ! répondit le serviteur, et il s’éloigna sur son haut cheval.
Quelques jours plus tard, il réapparut avec une lourde épée.
Li Na était assise, immobile et silencieuse. San Li découpait des feuilles de papier. Mais point de calligraphie, pas même une esquisse.
― Combien de temps te faut-il encore ? demanda le serviteur.
Comme la vieille dame ne répondait pas, il se tourna vers son élève :
― Quand la calligraphie sera-t-elle terminée ? L’empereur s’impatiente.
San Li haussa les épaules.
― Je ne sais pas, dit-elle timidement.
Le serviteur laissa s’écouler trois mois avant de reparaître sur la rive du fleuve Jaune. Cette fois, la vieille calligraphe allait enfin livrer son travail, pensait-il. Mais il se trompait.
― Li Na demande qu’on ne la dérange en aucun cas, lui annonça San Li. Reviens dans un mois, et tu pourras emporter la calligraphie de l’empereur.
L’homme fut saisi de peur. Quand l’empereur apprendrait que la calligraphie n’était pas terminée, il l’en rendrait responsable, à coup sûr.
― Pourquoi cela dure-t-il si longtemps ? demanda-t-il à la fillette.
― Li Na doit d’abord comprendre la puissance de l’empereur avant de prendre le pinceau.
San Li baissa les yeux.
― La commande de l’empereur exige quelque chose de bien différent de tout ce que Li Na a peint jusqu’à présent, poursuivit-elle à voix basse.
Le serviteur hocha la tête pour montrer qu’il comprenait. Mais l’empereur, lui, comprendrait-il ? L’empereur ne comprit pas. Lorsqu’il vit le serviteur revenir les mains vides, il le fit jeter aussitôt en prison. On osait s’opposer à ses ordres ! Eh bien, il irait lui-même trouver la vieille calligraphe au bord du fleuve. Il irait lui-même chercher ce qui lui appartenait.
Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)
Vêtu avec magnificence, l’empereur se mit en route avec tout son équipage. En voyant les soldats s’approcher de la rive, les habitants s’enfuirent dans leurs embarcations. San Li aussi se cacha, terrorisée, dans la cuisine, lorsque le palanquin de l’empereur s’arrêta devant le bateau de la calligraphe. Accompagné de quatre gardes, l’empereur pénétra en personne dans l’habitation de Li Na.
― Où est la calligraphie que je t’ai ordonné de peindre ?
Li Na s’approcha. À la main, elle tenait un grand pinceau, d’où gouttait l’encre. Devant elle, était étendu un rouleau de papier. Sans un mot, sans un regard à l’empereur, elle se pencha et, en quelques gestes précis, traça sur le papier le signe de la puissance.
Saisi d’effroi, l’empereur fit un pas en arrière.
Ses gardes tirèrent leurs épées pour le protéger. Le signe de la puissance était violent et cruel, menaçant et hostile, dur et glacial. On aurait dit que toute la pièce était sous son emprise. Les gardes reculèrent en tremblant. L’empereur lui-même pâlit. Mais il s’efforça de ne pas montrer qu’il était impressionné.
― Pourquoi m’as-tu fait attendre des mois pour achever maintenant, en quelques secondes, la calligraphie ? demanda l’empereur, courroucé.
― Il m’a fallu ce temps avant de comprendre votre puissance, répondit la vieille calligraphe d’une voix douce, mais ferme.
Elle rangea le pinceau et regarda l’empereur droit dans les yeux. Puis elle prit son sceau et l’imprima sur le papier de riz, juste à côté de son œuvre. Des minutes s’écoulèrent dans un grand silence. L’encre sécha. Li Na fit signe à deux gardes de soulever le rouleau. Sans attendre l’autorisation de l’empereur, ils firent ce que la vieille femme leur avait demandé.
L’empereur comprit alors qu’elle avait percé la nature de sa puissance. Il s’empressa de rouler le papier de riz, et se fit transporter en son palais.
Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)
Là, il se retira aussitôt dans ses appartements privés et ordonna que personne ne le dérange, pas même les ministres, pas même son épouse ni ses enfants. Il déroula devant lui, sur le sol, la calligraphie de la vieille Li Na et se mit à la contempler. Il sentit un grand froid s’insinuer dans son corps. Sa gorge était comme étranglée. C’était cela, le froid glacé de la peur. La poignée d’acier de la crainte. Le goût amer de la cruauté. Le pouvoir de la cupidité et de la violence.
Un silence de mort régnait sur le palais. Après une très longue attente, le premier garde de l’empereur s’approcha, hésitant, de la porte de l’appartement privé.
― Sa Majesté ne se sent pas bien ? demanda-t-il timidement.
Comme aucune réponse ne parvenait, le garde ouvrit prudemment la porte.
L’empereur fixait le sol, à l’endroit où était déroulée la calligraphie de Li Na. Et l’empereur de Chine pleurait ! Pas de sanglots, pas de gémissements, nul son ne franchissait ses lèvres. Les larmes roulaient silencieusement sur son visage.
― Est-ce cela le pouvoir de l’empereur ? Angoisse et peur ? Suis-je vraiment si cruel ? chuchotait-il.
Il aperçut le garde.
D’un mouvement lent, infiniment lent, l’homme hocha la tête.
― Oui, Votre Majesté est cruelle.
Il avait parlé d’une voix ferme, en regardant l’empereur. L’empereur détourna les yeux de la calligraphie et fixa, médusé, son serviteur. Il dressa le poing, menaçant, en direction du garde. Tremblant de colère, il ouvrit la bouche. Mais il baissa le bras. Sans mot dire, il regarda le sol et se mit à pleurer.
Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)Preto de ouros (cartas)
Sur le bateau amarré sur le fleuve Jaune, la vieille calligraphe rangeait son matériel. Papier et pinceau, pierre à encre et sceau, tout retrouva sa place habituelle. Pour finir, Li Na étendit au sol le précieux tapis de l’empereur, posa le gobelet sur une étagère et déposa dans un coin l’épée incrustée de pierres précieuses. Elle souriait.
Le matin, le serviteur du palais était venu encore une fois.
― L’empereur te donne ces objets pour prix de ton travail, avait-il expliqué.
― Tu es allé en prison ? avait demandé San Li, curieuse.
L’homme avait hoché la tête.
― Sa Majesté a libéré tous ceux qu’elle avait injustement emprisonnés. Depuis que la calligraphie de Li Na est accrochée dans son palais, l’empereur est devenu un autre homme.
Lorsque le serviteur fut parti, Li Na appela son élève.
― Petite San Li, dit-elle d’une voix douce, veux-tu apprendre le signe de la vérité ?
La fillette la regarda avec de grands yeux.
― Oh oui, j’aimerais bien l’apprendre ! répondit-elle avec enthousiasme.
Bien excitée, elle regarda la main de Li Na qui, calmement, prenait le grand pinceau.
Andrea Liebers
Li Na et l’Empereur
Toulouse, Milan, 2002

Cores de lugares

Outono em Chicago

Legenda recebida: Parece Manhattan!


quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O livro de ponto

Hoje, ia pelo corredor da escola e dei comigo a pensar no livro de ponto que levava na mão. Em formato A4, de capa grossa e folhas suficientes para nele serem escritos os sumários de todas as aulas, ao longo do ano letivo, é bem pesadinho o livro de ponto.

Lembro-me de há muito tempo ter sido cinzento, depois azul e agora cor de laranja. Não sei se a simbologia das cores foi tida em conta nessas escolhas. Quando nos esquecemos ou não podemos ir buscá-lo, pedimo-lo à funcionária: pode trazer-me o livro, por favor?

"O livro" é, assim, o objeto que todos os dias passa nas nossas mãos. Ou então, nas nossas cabeças: ai que não escrevi o sumário; não tinha o livro! Já tocou? Não tenho tempo para ir buscar o livro! Tenho de pôr em ordem o livro!

É desejado, acarinhado este calado e surdo motor do cumprimento. O que se dá nas aulas fica lá tudo registado. Daria, por certo, para diferentes ensaios: sobre o tipo de letra, as frases curtas ou longas, a indicação do pormenor e do geral...

Também para os alunos é "o livro": ó setora, deixe-me ver o livro para ver se tive falta na aula anterior!

Quando toca para dentro, os professores aproximam-se da prateleira, onde os livros estão ao alto, bem arrumadinhos,  e cada um leva o da sua aula e da sua turma.

Há muitos anos, quando andava grávida, lembro-me de que, nos corredores ou nas escadas, punha muitas vezes o livro à frente da barriga, tipo escudo, para me proteger de algum encontrão que os miúdos dessem, sem querer, nos avanços e recuos da brincadeira e correria.

Também já serviu, na sala de aula, para ajudar a levantar o projetor e assim ver-se melhor o écran.
E também já me aconteceu meter o livro de ponto na pasta, inadvertidamente, e trazê-lo para casa e, no dia seguinte, ir logo pô-lo no lugar para não dar nas vistas. Mas depois, quando contada a peripécia, tantas histórias parecidas já ouvi: por distração, por cansaço...

O livro de ponto, em papel, é, então, "o livro" que vai marcando os ritmos de muito do quotidiano escolar. 

Vê-lo a ser transportado pelo professor pode ser sinal de que já tocou para dentro ou para fora. Vê-los todos juntos significa que não há aulas...

O livro de ponto - tantas impressões lá ficam registadas. Para além das digitais, é claro.


quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Lugares do Mundo


 Chicago 

Mississipi
 
 New Orleans