sábado, 7 de março de 2020

Desculpa, Cândida!


De vez em quando, enviava-me uma mensagem, dizendo que tinha feito coisas novas. Fazia-o durante o ano, sobretudo pela Páscoa e pelo Natal, e continuava a fazer voluntariado na instituição onde nos tínhamos conhecido.
Eu ia a casa dela e em cima da mesa estavam compotas, biscoitos, muitos trabalhos feitos a partir de restos de tecido, de rolhas usadas, de botões antigos e de muitos objetos que pareciam já não ter qualquer utilidade nem serventia, mas aos quais ela dava uma vida nova.
Sobre a mesa, havia sempre um pequeno tabuleiro com duas chávenas que enchia de café quente, que bebíamos e acompanhávamos com biscoitos que ela também fazia. E ficávamos a falar muito tempo: dos trabalhos dela e das nossas vidas.
Ela vivia com muitas dificuldades económicas, porque, depois de ter tido cancro da mama, nunca mais tinha podido trabalhar fora, como fizera durante muitos anos, o que implicou redução do salário ao fim do mês.
Porém, em casa, trabalhava muito para ajudar a filha e para pagar as contas. A horta, que cultivava consoante as forças, também ajudava na necessária poupança porque todos os meses a dívida da casa tinha de ser paga.
No final do verão, mandou-me uma mensagem dizendo-me que estava com cancro no pâncreas. Fiquei muito triste, mas respondi-lhe também por mensagem, na esperança que vencesse esta doença como ia vencendo a anterior, assim como os muitos problemas familiares. Sempre com um sorriso de animada e corajosa esperança.
Mandei-lhe uma mensagem antes do Natal, mas não me respondeu. Fiquei apreensiva.
Soube hoje que faleceu no final de dezembro. Tive muita pena e remorso por não ter ligado, em vez de ter enviado mensagem. Talvez ela tivesse ainda podido falar.
 Não lhe prolongava a vida, por certo, mas era capaz de a mimar. E a Cândida precisava disso de certeza.



Sem comentários:

Enviar um comentário