Quarta-feira, 6 de junho 2012
Querido diário,
Já perdi a
conta aos dias desde a última vez que escrevi para te contar algumas peripécias. Aprendi
esta palavra este ano. Demora a dizer mas é fixe.
Às vezes, vou
para a escola e parece que escrevo uma página de diário na minha cabeça, mas depois
começam as aulas e quando chego a casa são os têpêcês do costume. Devia haver
uma manif contra os têpêcês. Eu ia logo à frente com um grande cartaz:
Não aos
Trabalhos Inutilmente Forçados!
E depois o mau
ambiente que é na sala de aula:
-Quem não fez
os trabalhos de casa?
Quase toda
gente com os braços no ar. Ao ver aquela braçaria toda, a setora muda de cara e
de tom de voz:
-Quem fez,
então?
Eu por acaso
faço. Mas também é verdade que às vezes faço sem saber muito bem o que estou a
fazer.
Mas se não
fizesse, tinha ainda mais trabalho a ouvir a minha mãe, quando fosse falar com
a dê tê.
As aulas estão
quase a acabar mas não me sinto feliz por isso. Hoje uma prof disse várias
vezes:
- Meninos,
atenção, têm de estudar mais. Têm de aproveitar melhor as vossas capacidades. O
Fábio abriu a boca até cá atrás, sem pôr a mão à frente, e a prof passou-se.
Não gosto nada
destes tempos mortos e o pior é que eu nunca sei muito bem quem tem razão.
Começo a pensar e digo para os meus botões: por um lado é assim, mas por outro
é assado.
Às vezes, tenho
dificuldade em definir-me. Um dia destes, apetecia-me falar sobre isto mas não tinha ninguém para ouvir. As minhas colegas estavam a estudar e não
quis chateá-las. O Gi anda esquisito e quando começo a falar destas coisas,
ele fica a olhar para mim e só lhe falta bocejar. Falar com as minhas
irmãs não era boa ideia, porque têm mais que fazer e davam-me logo a entender
que são coisas de adolescente com borbulhas. Falar disto à minha mãe também não
convém nada, porque fica logo a pensar que eu tenho o mesmo problema de uma amiga
de uma amiga dela. A hipótese de falar à minha avó também a pus logo de lado. Ia
logo começar a dizer: nem sabes, querida, como a vida era dura no meu tempo…
E sabes,
querido diário, foi um dia em que senti solidão. Eu que achava que nem sabia o que isso era.
Mas não fui
capaz de dizer nada ao Gi. Ele anda mesmo esquisito. Fala menos do que falava e outro
dia começou a chorar. Foi quando me disse que o pai também ficou desempregado.
À tarde, em todos os intervalos, ia ao bar comer
croissants com fiambre e beber ice-tea. Eu olhei para ele e ele disse-me que eu estava a criticá-lo e que a vida dele era uma merda.
Há quem diga
que se escreve com mais vontade quando se está triste, portanto daqui a nada
vou escrever outra vez.
Mas ao Gi não
vou mandar nenhuma mensagem. Para mais tenho pouco saldo no telemóvel.
Ou seria melhor enviar? Não me estou a sentir nada altamente.
Muitos
abracinhos, querido diário.
Mariana
Agora digo eu: Olá Mariana!
ResponderEliminarJá tinha pensado em ti e nem percebia muito bem a causa da tua ausência. Tens razão o tempo e os afazeres engolem-nos e nem temos tempo para nós próprios quanto mais para os outros. Mas para o Gi tens de ter. Escreve-lhe à moda antiga, uma carta bem bonita. Assim não corres o risco de ficar sem saldo. Fala-lhe da tua solidão e de ainda não te teres encontrado lá muito bem contigo própria. Pode ser que ele te responda e até tenha tempo disponível para um rendez-vous. Quem sabe? Mas não te preocupes muito com razões filosóficas para se chegar à definição de ti própria. Ainda és muito nova e na adolescência, para além das borbulhas que não desaparecem, existem sempre muitas dúvidas como, por exemplo, olha-se o espelho e logo se pensa «como sou feia!». E, afinal, até somos giras. Vá lá escreve ao Gi. Agora, o que é que vais fazer com tanto tempo? Vá lá escreve e não te esqueças de ir dando corda ao teu diário...
Bjs
CS