segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Ela, o velório, o mar e tanta outra coisa

Ela veio ao velório de uma amiga comum, mesmo com custo. Tinha de vir. Por amizade antiga, duradoira e profunda. 
- Estás melhor do que da última vez que te vi. Que bom.
- Engordei um bocadinho. Detestava doces e agora só me apetece comer doces.
- E sempre o teu sorriso maravilhoso.
- Não adianta andar chateada nem andar a queixar-me a toda a hora. Quero é chatear as metástases.
- Só tu.
- Estava com tanta vontade de vir que  me esqueci dos medicamentos e devem ter a mania que são importantes porque já me estão a fazer falta.
- Levamos-te a casa quando quiseres.
- Agora estou dependente das boleias, e logo eu que era um ás do volante.
E logo uma gargalhada.
Fomos a conversar sobre as nossas vidas.
Chegámos.
- Podes parar aqui. Vou este bocadinho a pé senão tens de dar uma grande volta.
- É bonito aqui e podes ver o mar.
- Sim, tenho tudo o que é necessário: a farmácia, o mini-mercado e, sim, o mar.
- E felizmente tão perto.
- Vou vê-lo sempre que posso.
Depois de troca de palavras carinhosas, saiu do carro e percorreu o passeio devagar apoiada a uma bengala, apesar da sua ainda meia idade.
Ainda há tantas coisas boas na vida. Não me posso queixar.
Isto pensaria ela por certo. E se lesse este pequeno texto, daria outra gargalhada ao ver que o seu nome até rimava com ela.

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