Era eu adolescente quando nos mudámos para a casa onde a minha mãe continua a viver. É aldeia, mas onde nós morávamos era mais aldeia ainda, apesar de ser a mesma aldeia. Havia muitos campos à volta e os lavradores deslocavam-se com os seus carros de bois que passavam ronceiros.
Ora, alguns desses campos tinham nascentes que eram aproveitadas para tanques onde as mulheres iam lavar a roupa e, tantas vezes, limpar a alma do pó duro das suas vidas, enquanto ensaboavam, esfregavam, espremiam, torciam a roupa.
Como não havia máquinas de lavar, também a minha mãe lá ia. E muitas vezes eu ou a minha irmã. O meu irmão não, porque era mais novo e esses sítios eram como o chorar, isto é, não eram para homens.
Como a nova casa ficava um pouco mais distante, foi feito um tanque para lavarmos a roupa. A minha mãe queria-o grande, porque estava habituada a larguezas de água. Com o tempo, foi vendo que havia muito desperdício do líquido que viria a fazer muita falta - dizia ela, mesmo sem se ouvir ainda falar do assunto. Por isso, algum tempo depois, mandou fazer uma parede, reduzindo o tanque em mais de metade. Quando agora o uso para lavar algumas peças de roupa mais sujas ou mais delicadas, recordo essa mudança e os alertas da minha mãe, tão atuais e necessários agora.
E sempre a vi a aproveitar água da chuva para regar as plantas ou para lavagem de alguns espaços. Também as águas de lavar legumes não iam pelo cano abaixo. Louvo-lhe esses cuidados que mais pareciam nascer dela, porque nunca foi de passar muito tempo a ouvir rádio ou a ver televisão.
Não sei como estará esse lavadouro da minha infância, agora que já ninguém lá vai. Deus queira que a nascente não tenha secado. Parece que não tem nada a ver, mas não me posso esquecer de fechar a torneira enquanto lavo os dentes. A gente às vezes esquece-se de que o oceano é feito de muitas gotas.
Confesso que raramente fecho a torneira enquanto lavo os dentes ou tomo banho não desligando o chuveiro. Erro meu, reconheço..
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Um domingo feliz
Cuide-se
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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Também ainda não me habituei a guardar a água enquanto aquece para tomar banho, mas conheço pessoas que já o fazem. Qualquer dia vou tentar.
EliminarRestinho feliz de domingo que espero tenha sido também feliz.
É que todo o gesto é válido!
ResponderEliminarMeus pais sempre aproveitaram as águas e minha mãe lavava a roupa no riacho da aldeia!!! Bj
É importante o que diz, Gracinha. É que nos esquecemos tantas vezes de que um gesto pode fazer a diferença - para o bem e para o mal.
ResponderEliminarUm beijinho
No meu Alentejo a água sempre faltou. Meu pai abriu três poços dois dos quais teve que arrasar de novo e duas minas que, inda hoje, são o sustento do único poço que resta e onde no verão corre um fio de água. As nossas árvores sofrem verões de sede quando a mina deixa de correr e o poço é apenas um fundo lamacento que espreitamos um dia atrás do outro e as árvores de orelha murcha. E a quem nos venha falar de poupança na água, damos de certeza lições, que já eu beirava os trinta quando a água canalizada nos chegou. É preciosa centelha de vida e, para mim ela é o verdadeiro néctar dos deuses.
ResponderEliminarMas existem teorias de que a água nunca se perde, infiltra e volta. Não sei se serão verdadeiras. Duvido um bocadinho que o ciclo mantenha inalterável a quantidade.
Boa tarde, Maria.
Portanto, cuidadinho a lavar os dentes (e o resto, não?).
Cá em casa faço o aproveitamento da água até chegar a quente, num balde. Dá para a sanita quendo é preciso.
ResponderEliminarA água dos legumes quando me lembro coloco nas plantas.
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A teimosia que me define ...
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Desejando um excelente fim de semana. Beijos
Bom exemplo, então, Cidália. A água de lavar os legumes também vai para as plantas. A outra tenho mesmo de a aproveitar.
EliminarUm beijinho, Cidália, e boa noite.
Bea, bons motivos para eu passar a aproveitar a água que corre enquanto aquece para tomar banho. Procuro gastar apenas o suficiente e seria incapaz de encher a banheira. Pelos exemplos que dá, o problema da falta de água é bem mais grave no Alentejo do que aqui no Douro Litoral. Cá ou lá, cada gesto conta mesmo. Quando falo de fechar a torneira durante a lavagem dos dentes, é que pode parecer pouco e óbvio, mas muita gente não o faz. Grão a grão...
ResponderEliminarFelizmente, tenho um poço no meu quintal que me dá água para regas e limpezas exteriores. Foi mandado fazer pelos meus pais e, para mim, é um bem precioso.
Também não acredito no tal ciclo que às vezes é referido.
Uma noite descansada, Bea.
Boa tarde
ResponderEliminarEste texto é claramente um retrato da minha infância e juventude. Hoje já poucas casas têm água do poço, mas a casa onde habito ainda tem, embora tenha também água canalizada da companhia para qualquer necessidade por isso infelizmente não me preocupo muito com os gastos, embora saiba que o meu procedimento não é na realidade o melhor.
JR
Bom dia, Joaquim.
ResponderEliminarSim, julgo que se fazem poucos poços agora; recorre-se mais aos furos de água.
Quem os pode fazer, é claro, e onde é possível fazê-los.
O problema da água dá mesmo que pensar. Enquanto esse bem essencial não se esgota mesmo.
Um dia bom para si.