Ela não lhe chama ritual. Apenas o dia de domingo.
Ao fim da tarde de sábado, prepara a roupa que quer usar no dia seguinte. Não é que a variedade seja muita, mas como não engorda nem emagrece, a roupa dura-lhe muitos anos. Vai à caixinha das joias e escolhe os adereços a condizer: brincos, anéis, um alfinete, pulseiras e um fio de ouro com uma medalha. Fora o fio, é tudo pechisbeque, mas acha tudo lindo e colorido, assim como a caixinha que comprou numa excursão a Aveiro. Pega nela com muito jeito para não partir, nem cair nada, porque já lhe custa vergar-se.
Depois é só esperar pelo domingo. Antes das nove horas da manhã, já está feliz e esmerada na paragem da camioneta que a leva ao Porto, onde se encontra com as amigas, no mesmo Centro Comercial.
São sempre as mesmas e os vizinhos de mesa também. Um deles namora-a com o olhar e sorri-lhe. Um dia, arranjou coragem para lhe dizer que ela era bonita e que gostava muito do cabelo dela aos caracóis.
Quando ouve elogios, ela sorri com sorriso namorador, porque não os ouviu durante longos anos.
Nem quer pensar no tempo em que o Centro Comercial esteve fechado por causa da pandemia. Um dia, nervosa, quase deixou cair a caixinha das suas joias a limpar o pó. O que vale é que se lembrou do elogio namorador, quando viu os caracóis grisalhos, mas ainda juvenis do seu cabelo. Até são bonitos, pensou, namorando a sua imagem refletida.
Há muito que voltaram as manhãs de domingo passadas no Centro Comercial. Hoje, antes das nove da manhã, já estava ela à espera da camioneta. Acenei-lhe e parecia feliz. Talvez à espera do sorriso namorador no Centro Comercial.