sábado, 13 de maio de 2023

Anjos III

 



 O texto que enviei para esta terceira coletânea:


Foram anjos que desceram do filme?

 

Domingo à tarde. De chuva calma mas persistente. A convidar para um filme. No largo prazer do grande écran e 'no escurinho do cinema', como cantou Rita Lee.

O escolhido foi um filme francês: Mascarade. Na sala de cinema, só quatro lugares ocupados, dois deles por um casal.

Sem intervalo, a história, onde são representados anjos e demónios em figuras humanas, foi passando diante dos nossos olhos e demais sentidos. Muitas paixões, muitas frustrações e muitas máscaras que as personagens iam manejando. Umas iam caindo, outras eram mantidas e manipuladas ardilosamente. Como acontece em tantos casos, em tantos palcos e planos da nossa vida comum ou pública.

E cinema pede música. Entrelaçada com outros sons, foi emergindo uma canção do final dos anos sessenta: La Bambola. Era como se rompêssemos a linha do tempo e entrássemos, por breves instantes, nos bailes de garagem, enquanto jovens em abraçados slows, à volta de um pequeno gira-discos, do vulnerável vinil e de venerados ídolos.

Terminado o filme, a mesma música italiana fez-se ouvir, acompanhando a extensa ficha técnica. Estava na hora de deixar a sala.

Foi quando, descidos os degraus para a saída, o homem e a mulher se abraçaram e, felizes, começaram a dançar. Nem sei se ouviram os nossos aplausos. Talvez os anjos não necessitem tanto deles.

Sim, seriam anjos que haviam descido do filme? Moviam-se sem máscara. Com sorriso. Sem mentira. Com verdade. Sem ressentimento. Com amor. Sem preconceito. Com liberdade.   

Não, só podiam ser pessoas.

 

 

domingo, 7 de maio de 2023

Mãe

 

Quando passo junto à casa da minha mãe, revejo-lhe as mãos que, em vida, não paravam de zelar, verbo muito frequente no seu vocabulário quotidiano. Vinha muitas vezes acompanhado de ‘minha casinha, meu lar’ porque a sua casa era o seu amado e desejado universo. Sempre lhe vi o grande apego à casa - o seu refúgio, o seu descanso, o seu alimento, o seu trabalho de que não se queixava, porque entendia-o como mandamento de Deus.

Agora, que já não está entre nós, sinto a falta da sua voz, da sua presença,

de ver os seus gatos no pátio, aquecendo-se em manta quente ou ronronando ao sol;

de olhar a mesa da cozinha sempre posta, onde nunca faltava pão, chá e biscoitos;

de ver chegar os pequenos jornais católicos, donde ela retirava lições e exemplos de vida que contava e louvava. E agora tenho pena de não ter tido mais paciência para ouvir os casos relatados que eu considerava húmidos de tanta água benta;

de ver a sua preocupação quando pressentia fruta caída no chão e era preciso aproveitar. Estava boa e fazia fartura, dizia ela. Mãe, se a deixarmos muito tempo na árvore, acaba também por cair e estragar-se, dizia eu;

de apreciar os trabalhos de mãos que fazia;

de a ver a cuidar das plantas logo de manhã muito cedo;

de ler os seus versos devotos e de passar alguns no computador, etc.

Porem, paulatinamente, a visão foi-lhe diminuindo, as pernas deixaram de lhe obedecer e a mente foi confundindo presente e passado.

- Filha, o teu pai está a demorar tanto.

- Mãe, o pai está no céu.

- Hoje passei toda a noite em casa das minhas irmãs, mas não sei como fui para lá nem como vim.

- Mãe, foi um sonho, agora descanse.

- Mas, filha, não abras a janela.

- Mãe, é dia e assim parece sempre noite.

- Os meus olhos e a minha cabeça não aguentam tanta luz.

- Mãe, se foi Deus que nos deu a Luz, então por que quer fechá-la assim?

E passou a dormir horas sem fim, com as janelas fechadas, como se preparasse o repouso final que chegou quatro anos antes de fazer 100 anos.

Tanta coisa me vem à cabeça quando passo à casa da minha mãe. Pensamentos e questionamentos para fora e para dentro de mim, onde culpa se mistura com legítimo cumprimento da vida.

Mãe, enquanto puder passar pela sua casa, indo mais depressa ou mais devagar, abrirei sempre as janelas da memória porque nela encontro flores de que preciso.

Não é por acaso que me dizem que estou a ficar parecida consigo. 

 

 

segunda-feira, 1 de maio de 2023

Também ela pode ser uma arma?

 

Hoje, feriado nacional, dei-me ao luxo de me levantar mais tarde e, como tinha tempo e gosto de ouvir podcasts, ouvi dois logo ao começo da manhã.

Old Friends, com Júlio Machado Vaz e J. Sobrinho Simões - 'Late bloomers: a florescência das pessoas que se revelam mais tarde do que seria habitual'.

Muito interessante sobre o envelhecimento ativo. Com o passar da idade, pode-se ir desabrochando de diferentes formas, como mostram alguns exemplos.

PBX com Inês Maria de Menezes e Pedro Mexia - 'A cantiga ainda é uma arma: a doçura punk de Billy Bragg'

 

 

Eu não conhecia este cantautor, de 65 anos e nascido no Reino Unido. Nas suas canções, protesta contra vícios, por exemplo, do poder; defende direitos humanos, etc. 

Cada um à sua maneira, o mesmo fizeram e continuam a fazer muitos autores portugueses, como José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Ary dos Santos, Sérgio Godinho e tantos outros que ajudaram a acender luzes num país triste e isolado em que quase todos viveram às escuras durante quase meio século.

As pessoas que escrevem as canções, as que as cantam, as que tocam, as que nelas trabalham também fizeram e vão fazendo delas uma arma, não das armas que matam, mas das que ajudam a construir um mundo melhor. Tão necessário, num tempo em que tudo tem a ver com tudo, mas acontecem tantos desligamentos, mentiras, ganâncias  e consequentes solidões em todas as idades. O legítimo desabrochar de todos tem de ir acontecendo.

Tenhamos esperança. Será que também ela pode ser uma arma?

Bom 1º de Maio de 2023.

 

 

 

domingo, 30 de abril de 2023

Um dia feliz, disse ele!

 


Eu tinha chegado à cidade com mar ao fundo. Fui tomar um café. Por dentro do balcão, o homem magro e sempre lesto repetia o habitual 'obrigado'. Nunca parava para que os clientes não esperassem. Era a hora da meia de leite e da torrada ou croissant.  

Nas mesas, casais de meia idade com bom ar e bom peso iam saudando, sorridentes, outros casais conhecidos ou amigos com idênticos ar e peso que iam chegando. Quando saíssem, talvez dessem as mãos e sorrissem. E ainda melhor se fosse um para o outro.

Reparei que uma freira com roupa mais leve do que o habitual se sentava a uma mesa onde estava outra mulher com ar ascético, o que não impede o prazer de bons sabores logo a começar o dia. Num olhar e pensamento mais rápidos, diria que elas pareciam destoar. Ou eu também. E dei comigo a interrogar-me se este verbo ainda tem cabimento nos dias de hoje. 

Felizmente já não se destoa tanto como antigamente. Quando uma qualquer diferença era notada, como a cor de pele, a idade, a maneira de vestir, etc, logo se olhava e os mais indiscretos comentavam nem que fosse em surdina, que não deixava de ser ruidosa.

Fui pagar à caixa. O homem magro sempre em movimento agradeceu como fazia a todos os clientes. E, dando-me o troco, olhou rapidamente para mim, como também fazia com todos os clientes, e  'um dia feliz', disse ele.

 

Um domingo também feliz para todos, digo eu também, embora não nos possamos olhar. Se pudéssemos, seria bom que fosse com mais tempo e mais vagar.

 

 

terça-feira, 25 de abril de 2023

Onde estou no 25 de Abril 2023

 

Impossível não me lembrar do que vivi há 49 anos no dia 25 de Abril. Saí de casa para um dia de aulas normal e percorri as ruas habituais, no Porto. Estranho era o  silêncio de uma cidade que estava quase deserta. Perguntei a alguém o que se passava. 
Está a haver uma revolução em Lisboa, responderam-me com espanto semelhante ao meu.
O rádio, encostado ao ouvido, ia sendo escutado por outras pessoas que passavam, com ar atónito e  incrédulo.
A ditadura - palavra quase nunca pronunciada até então - tinha caído, ouvi também dizer.
E, ao fim da manhã, estávamos os dois de mão dada no meio de uma multidão que ia enchendo as ruas, como se saísse de um buraco negro em busca de uma luz que, afinal, existia, mas que a enorme maioria dos portugueses desconhecia.
 
Ao longo do dia, foi-se sabendo que um grupo de pessoas de grande coragem tinha dado vida à Liberdade, palavra que até então só era dita por alguns mais ousados ou mais informados e que, por isso, dela eram privados, porque o poder instalado preferia a cândida e calada ignorância. Não era por acaso que 60% das mulheres eram analfabetas.
Nesse dia, dia único, compreendi muita coisa que durante anos me escapou. Tal como à maior parte das pessoas.
 
Hoje, escolhi ficar em casa e aproveitar o sossego para arrumações que ficam por fazer no dia a dia.
Oiço, porém, alguns discursos de comemoração dessa data fundamental na nossa História e alguns comentários ao que está a acontecer na Assembleia da República. 
Não vi nem ouvi os discursos quando Lula estava presente. Vi depois imagens dos cartazes que um grupo parlamentar exibiu em protesto pela sua presença.
Ufanos e excitados, esses deputados pareciam rapazolas num concurso de televisão onde queriam surpreender.  Desse por onde desse, logo que desse pontos.
 
E em muitos discursos - a maior parte serenos, felizmente, embora veementes e críticos - lá apareceram as citações de poetas do costume: Sophia, Natália Correia, etc. E como de Ceos da TAP se tem falado muito e também hoje se falou, o Céu foi lembrado sendo S. Paulo citado, assim como o Papa Francisco.

Pela tarde, fiquei contente ao ver tanta gente nas ruas de várias cidades. Uns indignados, outros a exigir o que lhes é devido, outros a festejar. Todos usando bens que fazem progredir a Humanidade, como a Liberdade e o respeito.

Uma das perguntas do dia, nos media, era se a Democracia está em risco. E as respostas que ouvi diziam que sim, que a Democracia pode estar em risco, por erros cometidos e pelos extremismos emergentes que, inexplicavelmente, querem que o país regresse à escuridão fechada do passado.
 
Ao jantar, falamos do que foi acontecendo ao longo do dia e de como será bonito irmos em família à Festa na comemoração dos 50 anos do 25 de Abril. 
 
Oxalá a esperança não esteja em risco.

sexta-feira, 21 de abril de 2023

Perguntas guardadas. E não só.

 

Fomos a uma escola do primeiro ciclo, nas Antas. Levávamos uma atividade que incluía o desenho, o recorte e a leitura. Porém, no grupo dos meninos do segundo ano nasceram, espontaneamente, muitas perguntas, sobretudo sobre as ilustrações do livro.


Queriam saber quem fez a capa, como tínhamos escolhido as letras, como é que se faz um livro, se demora muito tempo a fazer os desenhos e muitas, muitas mais. Ver aqueles meninos com os bracitos no ar a perguntar, a querer saber, a ser curiosos parecia o melhor de tudo.

E como as questões incidiam mais sobre as ilustrações e a parte gráfica, puxei a brasa à minha sardinha e se, tal como tinha sido referido pela ilustradora, para desenhar como se quer é preciso desenhar muito, também para escrever uma história é preciso ler e escrever muito. Com paciência e com amor.

E logo mais perguntas: escreves a lápis primeiro? Tens computador? Já escreveste outras histórias? E mais bracitos no ar. E mais e mais perguntas. E outras tantas respostas.

E a atividade era como a procissão: ainda ia no adro. E uma turma tinha o tempo contado porque ao início da tarde havia uma visita de estudo.

Foi quando uma das professores interveio e em voz bem alta e doce disse:

- Para já, vamos guardar as outras perguntas no coração.  

Os meninos ouviram com livre atenção e fizeram silêncio. E, naturalmente, também guardei o momento no coração.


quinta-feira, 20 de abril de 2023

As escadas rolantes e os namorados

 

Já tenho ouvido e tenho reparado que nos tapetes rolantes de centros comerciais há beijinhos, sorrisos, mãos dadas e outros afetos. Não deixa de ser bonito e bom para quem aproveita esse tempo que parece mais livre e mais lento.

Só que às vezes o par carinhoso impede a passagem de quem está atrás e nem repara. 

Se tenho tempo, deixo que os mimos continuem, não me aproximo muito e vou olhando à minha volta. Se estou com pressa, com licença, com licença, sem deixar de pensar que estou a interromper um bom momento. 

 

quarta-feira, 12 de abril de 2023

Meia culpa

 

Não, não é engano na palavra. Queria mesmo dizer meia, porque tento libertar-me pelo menos  de metade da culpa que, em muitas pessoas da minha geração, foi sendo incutida quase desde que nascemos.

Conheço casos de várias self made women, mulheres que se esforçaram e que foram aprendendo por si próprias a vencer obstáculos. Não todos porque se a culpabilidade começa muito cedo, mais custa a libertar.

E se o assunto é chato para algumas pessoas, mea culpa. É, porém, sinal de que a culpabilidade não vai sendo tão semeada. Felizmente.


terça-feira, 11 de abril de 2023

Às vezes tinha vergonha de dizer que era de Gondomar

 

Oiço por vezes pessoas a falar da sua terra com segura convicção e sentimento amoroso de pertença. Apesar de cada vez mais o mundo se alargar legitimamente para todos, louvo-lhes a atitude.

Existem, porém, lugares cujos habitantes falam da sua terra natal com um tímido e inseguro sorriso, como julgo acontecer muitas vezes na minha, traduzindo alguma indiferença ou desconfiança já muito antigas. 

A forma como as autarquias são geridas tem bastante importância para a construção da história de cada um e da satisfação pela terra onde se vive. Com muita ou pouca instrução, as pessoas querem ver ações que contribuam para a sua qualidade de vida, tendo resultados práticos desse necessário e natural investimento.

Há uns anos, quando Valentim Loureiro era presidente da autarquia, eu, como tanta gente, sentia algum constrangimento e até vergonha quando dizia que era de Gondomar, porque logo vinha à baila o nome do polémico autarca, sentindo um rótulo pelas confusões e trapalhadas de um grupo que nos governava e que se governava a si e aos seus  - embora houvesse casos exemplares de dedicação à causa pública em diferentes pelouros.

Quantas anedotas e histórias iam sendo contadas nos meios de comunicação social a propósito de ofertas de eletrodomésticos e de outras manobras populistas para aliciarem ao voto nesse candidato que tantas vezes apregoava pôr Gondomar no mapa.  Conseguiu-o também pelas agitadas e ruidosas barafundas das quais o país se ria, ridicularizando.

Felizmente esse tempo já é passado e, apesar da esfera em que circulo ser bastante restrita e de consumir sobretudo alguns bens culturais, vejo que há mais normalidade e que obras importantes vão surgindo e facilitando a ligação das pessoas à natureza e a espaços verdes e de lazer, o que é fundamental para o bem-estar nos dias de hoje. 

Talvez um orgulho calmo e consciente de sermos desta terra tenha de continuar a ser cultivado. O atraso de Gondomar, em muitos setores e durante muitos anos, contribuiu para isso. Daí a razão de muitas pessoas, ao verem surgir uma Biblioteca Municipal, um Pavilhão Multiusos, etc, também votarem massivamente, durante os vários mandatos, em Valentim Loureiro, mesmo discordando das manigâncias que eram públicas. Felizmente da última vez que se candidatou, os votos que caíram nas urnas foram muito poucos com o seu nome.

Parafraseando a canção de Cláudia Pascoal: sou Maria, sou mulher e sou de Gondomar.

Oxalá possa continuar a dizê-lo com crescente confiança e segurança, embora esta última palavra não sirva muito bem para me caracterizar.

 

 

quinta-feira, 6 de abril de 2023

BOA PÁSCOA!

 

Uma Páscoa e primavera felizes para todos e para todas.

Obrigada pelas vossas visitas e mensagens. Não imaginam a alegria que me dão.

Aproveitemos, se possível, estes dias floridos e de sol. 

Num mundo complexo, as coisas simples e boas não deixam, felizmente, de existir para desfrutarmos delas.

E sermos mais felizes, sentindo o corpo e a alma mais descansados.

UM GRANDE ABRAÇO!


quarta-feira, 5 de abril de 2023

Uma coisa sem importância. Ou terá?

 

Nunca fui muito gastadora, mas acho que já fui mais gastadora do que sou hoje. Ia mais a lojas e não resistia a algumas compras não muito necessárias mas que me atraíam no momento.

Agora, dou comigo a olhar para o que tenho no guarda-fatos e a pensar que, afinal, tenho que chegue e que sobre para usar e variar. 

Os lojistas é que não devem gostar muito desta conclusão a que muita gente vai chegando, pensando na sua bolsa e na proteção do ambiente.

Porém, como noutros setores, o tempo é de procurar, criativamente, novas alternativas. E, por enquanto, acho que pelo menos as grandes lojas continuam a faturar e a faturar. As mais pequenas é que talvez não, e tantas vezes com coisas bonitas, diferentes  e de boa qualidade. 

Que me desculpem, mas, mesmo nessas não tenho entrado. Numas, fico confusa com a fartura de coisas tantas vezes remexidas e desarrumadas; noutras, porque já prevejo a reação: não sei se temos o tamanho!!! 

 

segunda-feira, 3 de abril de 2023

As duas mães

 

Há muito tempo que não se viam. A mulher mais velha gostou muito de rever a rapariga, mas já com filhos adolescentes. Recordava-se tão bem dela quando era pequena, de mimado sorriso tímido.

E a mulher mais velha logo se lembrou da mãe dela.  Quando os filhos eram pequenos, encontravam-se na escola com frequência. E falavam muito das suas crianças. Dos sucessos, dos sonhos, das fragilidades, etc.

Com o tempo, cada um dos filhos foi seguindo os seus cursos e as suas vidas. As duas mães deixaram de se ver, sem deixarem de se lembrar com carinho uma da outra. Com vidas e profissões muito diferentes, ambas acabaram por ficar sós, também em circunstâncias diversas.

Agora, ali estava uma delas a falar com uma das crianças que há muito não via e que se tinha tornado mulher adulta.

- E a tua mãe como está?

Não estava bem, não. Vivia muito só e, o pior, não tinha amigas com quem falar nem tinha qualquer atividade que lhe desse alegrias.

E a pergunta surgiu por parte da jovem:

- E no seu caso, tem amigas, com certeza?

Sim, algumas boas amigas e uns poucos bons amigos. Felizmente. E ela ia fazendo perguntas. Andava mesmo muito preocupada com a mãe. Os irmãos iam-se desligando porque tinham a sua vida muito ocupada e não desperdiçavam o direito de a viver.

Ela, que era a mais nova, estava sempre presente e tentava ajudar a mãe. Falava com ela, dava-lhe sugestões, motivava-a a sair, a participar de atividades onde conhecesse outras pessoas e se sentisse bem. Sim, iria fazê-lo, prometia-lhe a mãe, mas, chegada a hora, desistia e tudo ficava na mesma - a mesma solidão, as mesmas obsessões. Como estariam os filhos? E os meninos? Porque não atendiam o telefone? Porque não respondiam às mensagens? Porque não vinham visitá-la mais vezes?

Deste lado, a outra mãe ia pensando que talvez fosse bem mais feliz e que assim também os filhos o seriam. Pese embora ter muitos momentos com preocupações idênticas. Tinha bons amigos e algumas atividades que lhe davam prazer, o que lhe amaciava a vida e ajudava a olhar mais alegre e carinhosamente para o mundo e a relativizar muitas situações presentes e passadas.

Sabia que a vida vai dando e retirando muita coisa, mas acreditava que também a vida vai oferecendo outras.

Acabou por mandar um beijinho para para a outra mãe. Pudesse, pelo menos, dar-lhe algum alento. Por pouco que fosse.



domingo, 2 de abril de 2023

Felizmente há manhãs bonitas!


Vi hoje que, no seu blogue,  http://carruagem23.blogspot.com/, Vítor Oliveira tem o post "Uma dramatização de Uma história de João Ratão", acompanhado de vídeo.

Obrigada, Vítor, que os dias continuem a florir no Agrupamento de Escolas Dr Manuel Laranjeira, em Espinho.

Um abraço