Paixões e o jantar em
Paris
Cheguei ao aeroporto de Francisco Sá Carneiro e,
inesperadamente, vi a Vânia, pequenina, torrencial, gordinha, de
cabelo claro, toda a vibrar num sorriso muito sonoro e muito aberto.
Aproximou-se de mim, deu-me um abraço, disse-me que andava apaixonada por
Fernando Pessoa, mas que às vezes até chorava com pena dele. Sobretudo quando
ouve as leituras do Pedro na aula, como
se fosse o próprio poeta que estivesse a
escrever e a sentir.
- Fogo, setora! Viver sem paixões como o
Ricardo Reis é que eu não aceito. Se ele soubesse como é bom!
E que continuava a trabalhar no café ao
fim de semana. E que andava bastante cansada. E que hoje estava de folga. E que
ia ter com a família que já se tinha afastado. E que vinha despedir-se do pai.
E que tinha gostado muito de me ver. E que me ia mandar um texto que tinha
escrito e que achava muito fixe. E adeus, professora, apareça na escola. E vou
dizer à turma que a vi. E beijinhos, ...
E lá foi ela a correr, com o telemóvel
na mão como se fosse a extensão de um dos braços.
Gostei de a rever e logo a situei na
sala de aula, com os olhinhos a vibrar e a sorrir quando os assuntos a
entusiasmavam.
À chegada a Paris, o
David sorriu logo que me viu, levantando os bracinhos a pedir-me colo. Como
está grande! Achei o António Pedro um pouco mais abatido, embora com o seu
habitual sorriso juvenil.
Disse-me que o pior já
tinha passado e que lhe falasse da viagem, da família, do que tenho escrito.
Logo depois de ter
tirado da mala a polpa de dióspiro e o bolo-rei, a Jessie disse que estava na
hora de começarem a preparar o jantar porque tinha convidado três colegas de
trabalho, duas das quais a fazer investigação na Universidade onde Jessie
trabalha.
Por isso, ao jantar e à
volta da mesa, éramos nós os dois portugueses, a nossa escocesa, uma rapariga
espanhola, outra italiana e outra turca.
Era, portanto, uma mesa
cosmopolita. E, embora eu reagisse com
naturalidade, talvez tenha reparado mais na estudante de Istambul porque usava
"hijab". Ela trouxe uns docinhos
maravilhosos para a sobremesa e café turco para acompanhar, que ela própria
confecionou num tachinho, à falta do recipiente próprio.
À refeição, comemos salmão
com vegetais e tudo estava delicioso.
O David já dormia
enquanto jantávamos.
Eu acho que falei pouco
porque ia pensando como eles, incluindo as raparigas que tinham pouco mais de
vinte anos, sabiam tantas coisas e tinham tantas competências para interagir em
contextos tão diferentes.
Realmente, só com a
riqueza da diversidade, o mundo poderá evoluir mais.
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