domingo, 28 de julho de 2013

Abrandamento


Já marcou as férias, professora?
No Natal e na Páscoa, o termo é outro: interrupção das atividades letivas (apesar de muitas pessoas acharem que os professoras têm muitas férias durante o ano).
Mas deixemos isso, porque o tempo é de abrandamento.
É tempo, portanto,
De ter de andar mais a pé.
De ter de ler os livros que comprei e que não li.
De ter de acabar de ler os artigos que ficaram amontoados.
De ter de ler mais sobre os autores dos programas.
De ter de falar mais vezes com os meus familiares idosos e doentes.
De ter de telefonar à vizinha que teve um acidente e que deve ter pensado que a ignorei.
De ter de ter tempo para olhar a Natureza.
De ter de escrever mais, sem a culpabilidade de estar a “roubar” tempo a outras tarefas.
….
Falo eu de abrandamento e só me ocorreu a pressão do ter de. Assim, em vez de abrandamento poderá é haver descarrilamento, o que não quero de forma alguma!

Não, eu quero mesmo que haja abrandamento. Pôr em prática uma expressão antiga e deliciosa: andar do meu vagar.
Depois de um ano letivo com o stress acrescido de ter anos de exame a nível nacional; de ter turmas com alunos que são verdadeiros heróis e outros tantos que, pelas mais variadas razões, não aprenderam a vontade de o ser; de trabalhar numa escola “refundada”, mas sem internet em muitas salas; dos toques inexoráveis (ia dizendo irrevogáveis, o que até seria bom – com o novo sentido da palavra) das campainhas; de ver o ano terminar com greves que achei justas; de corrigir quase uma centena de provas de exame, querendo fazer bem o trabalho mas sem certas certezas; olhar a pauta com os resultados dos meus alunos e sentir (quase) o que se sente quando se recebe um resultado médico;…

Sim, vou substituir o “ter de” pelo verbo “ poder” ou “tentar”, mas sempre do meu vagar.
     Porque tenho de saber que o o tempo pode ser de abrandamento!


2 comentários:

  1. A propósito, aí vai o meu singelo contributo para um pequeno álbum de recordações daquele que permanecerá sempre N`atividade, apesar do "Abrandamento":

    Um Reino Maravilhoso…

    Embora muitas pessoas digam que não, sempre houve e haverá reinos maravilhosos neste mundo. O que é preciso, para os ver, é que os olhos não percam a virgindade original, diante da realidade, e o coração, depois, não hesite. Ora, o que pretendo mostrar, (…), não só existe como é dos mais belos que se possam imaginar. Começa logo porque fica no cimo de Portugal, como os ninhos ficam no cimo das árvores para que a distância os torne mais impossíveis e apetecidos. E quem namora ninhos cá de baixo, se realmente é rapaz e não tem medo das alturas, depois de trepar e atingir a crista do sonho, contempla a própria bem-aventurança.
    Vê-se primeiro um mar de pedras. Vagas e vagas sideradas, hirtas e hostis, contidas na sua força desmedida pela mão inexorável de um Deus criador e dominador. Tudo parado e mudo. Apenas se move e se faz ouvir o coração no peito inquieto, a anunciar o começo de uma grande hora [que persiste em tardar]. De repente, rasga a espessura do silêncio, uma voz de franqueza desembainhada: (1)
    (…)
    – Pois…! É que… eu ontem estava muito cansado… e o relógio partiu a corda, durante a noite, e não despertou… e a Delfina também adormeceu e não me chamou…! Depois, o carro ficou sem combustível a meio do caminho… e, quando dei conta, tinha esquecido a carteira no posto da gasolina…! E,… ao regressar, até a minha estimada "Brasília" me pregou uma partida…! Se não… tinha conseguido chegar a horas...! (2)
    Um retalho do "Portugal" de Miguel Torga (1), GEOcalcorreado por Dalmindo N’atividade e condimentado com algumas das suas múltiplas peripécias (2).
    Esperamos poder continuar a contar, por muito mais tempo, com a tua colaboração e alegria e com a ampliação do manancial de peripécias com que nos brindaste em todos estes anos.
    A nossa gratidão e um abraço sentido,
    A.V.
    E. S. Gondomar, Julho/2013.

    Nota: Esta foi a minha colaboração singela para um álbum de recordações que lhe oferecemos. Decidi partilhar contigo, porque me pareceu que vinha a propósito. Continuação de boas férias. Bjs A.V.

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  2. Quando comecei a ler e vi "N'atividade", fiquei curiosa.
    O Dalmindo Natividade é, de facto, um Professor que, julgo, enquanto puder, nunca deixará de sorrir e por quem a ESG tem um grande carinho e admniração, mesmo quando o vê "aos papéis".
    Em tempo de pouco reconhecimento sem nada em troca, o Dalmindo merece homenagem, se calhar, simples como a que acabas de fazer, porque ele nunca procurou as luzes, embora tenha ajudado, por exemplo, com os seus passeios e visitas de estudo, a iluminar melhor o que nos rodeia.
    Recordo duas situações: Uma vez, a filha, perante o atraso sistemático do pai, disse: o meu pai é pontual; chega sempre com uma hora de atraso!
    Uma outra situação foi numa albufeira, julgo que em Trás-Os-Montes. No final de uma visita de estudo, já com o motorista a dizer que estava na hora do regresso, os miúdos insistiam: deixem-nos tomar banho! O Dalmindo olhava os colegas, que lhe mostravam o relógio, e os alunos desejosos de água. A opção foi, claro, um mergulho!

    Felizmente ele vai continuar, apesar da aposentação, com o GeoClube, criado por ele há muitos anos.

    Obrigada, um abraço e até um dia destes. Vamos andar um bocadinho a pé?
    M.

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