quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Depois do corte



Querido diário

27 de outubro

Querido diário,

Hoje mostrei o meu diário à Bea (eu digo Bea, porque ela chama-se Beatriz. Se eu escrevesse como pronuncio, dizia Bia, mas assim acho mais fixe e não mudo as letras).

Leu com atenção, porque ela lê sempre do princípio ao fim, em silêncio, se tem de dar a opinião. Depois de ler, disse assim: é fixe, Mariana, mas acho que falas muito da tua mãe, pouco do teu pai e dizes muitas vezes fogo.

Fogo, com isto é que eu não contava. Como ela é minha amiga, eu disse-lhe: Bea, já sabes que a minha mãe tem muita influência sobre mim. Sabes que quando eu nasci, ela já era um bocadito coisa (eu digo coisa quando me custa dizer alguma palavra e não gosto de dizer que a minha mãe já era um bocado velha). Sabes bem que muita gente julga que sou neta da minha mãe. Sempre fomos muito ligadas, mas às vezes sonho que vou para outro país, gosto da ideia ne não me importava de viver sozinha.

A Bea, quando é assim, não interrompe para me deixar falar. Eu por acaso também faço a mesma coisa com ela quando ela precisa. Mas depois disse-me: não sei por que não falas mais do teu pai.

Eu fiquei um bocado calada e expliquei: sabes, porque tenho saudades dele. Gostava que o meu pai ainda estivesse connosco. Eu não falo muito, mas muitas vezes faço coisas mais descansada por saber que ele estaria de acordo comigo. Vivi pouco tempo com o meu pai, mas ele fazia as coisas com tanta força e intensidade que acho que fiquei a saber bem o que ele pensava e pra mim isso também é uma orientação. Se calhar, é por isso que dizem que tenho maturidade, mas eu acho que faço é como ele me ensinou. Menos estudar, é claro, porque, sei lá, o tempo nunca dá, fogo.

Depois disto tudo, diz a Bea: ó Mariana, não te quero chatear, mas escreves tantas vezes fogo. E eu então respondi: Ó Bea, também não se deve exigir que seja tudo às mil maravilhas. Também temos o direito de errar, de dizer algumas coisas que nos vêm à cabeça. Não sou perfeita, nem especialista em linguagem. Fogo.

E depois não me lembro muito bem do que dissemos a seguir. E se não me lembro é porque não foi nada de especial. Mas gostei que ela me tivesse dito isso, porque vi que é mesmo minha amiga e assim posso melhorar e eu gosto disso.

Muitos abracinhos

Mariana

Pensamentos

As escolas demasiado grandes podem tornar-se espaços ao Deus-dará, o que a ninguém traz proveito positivo.

Muitos funcionários não podem ser substituídos com tanta frequência e em pleno ano letivo por outros que, embora com boas intenções, desconhecem o funcionamento da escola.

Os materiais utilizados nas obras das escolas têm de ser mais adequados ao uso por centenas e centenas de pessoas. As verbas gastas, em muitos casos, são astronómicas em confronto com as fragilidades detetadas.

A opinião de alguns encarregados de educação parece contar muitos mais do que o parecer de muitos professores. Vivemos sob a capa hedonista do "tá-se bem" ou da negrura do medo.

Muitos jovens não conhecem a palavra "deveres" e muitos adultos também já a esqueceram.

Às vezes, temos dificuldade em nos pormos no papel do outro, porque pensamos que somos os únicos heróis.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Luz(es) de outono

Diário de Mariana

26 de outubro

Querido diário,

Vão começar os testes. Parece que as aulas também começaram ontem e já há avaliações. Como o tempo passa, fogo. Agora vai ser testes, trabalhos de casa, estudar e quando é que a gente descansa e sente que está a viver? E o meu diário, não tenho direito a escrevê-lo?

Bem, tenho de estudar matemática e português, porque esta semana vou ter testes.. Já fiz uma grelha com a distribuição do tempo. Em baixo, pus a letras garrafais: Desligar o telemóvel. Mas custa tanto! E se as minhas colegas me telefonam a perguntar alguma coisa sobre a matéria? (eu estou sempre a inventar coisas para não desligar o telemóvel, porque elas queriam era ligar para a Bea, mas essa é que quando estuda desliga tudo). E se o Gi também me liga? Pra mais ele anda tão queridinho.

Ai que custa tanto começar a estudar a sério. E depois dá-me fome, sede, vontade de fazer outras coisas. Depois, quando chega à noite, estou sem paciência e cheia de nervos. Amanhã, querido diário, vou começar mesmo como deve ser.

Prometo. Não juro porque sempre ouvi dizer que quem muito jura muito mente.

Um abracinho muito apertadinho.

Mariana

Ruínas

100 palavras

Quando passo por uma casa em ruínas, fico sem palavras. E imagino a casa inteira, bonita, com gente a habitá-la e a embelezá-la como um ser que se ama. As casas em ruínas deixam de ser agasalho e recolhimento, ainda que possam continuar abrigo. Numa primeira fase, cobrem-se de pó e depois o que parecia firme torna-se frágil, esboroado e volátil. Se há jardim, só as flores mais resistentes não desaparecem como quem as semeou, regou ou apenas por elas passou.

As pessoas não deviam deixar cair as casas em ruínas. Mesmo que o céu se afigure mais fácil.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Diário de Mariana

25 de outubro

Querido diário,

Aproveitei um intervalo e vim ao Centro de Recursos escrever-te. Tive saudades. Acho que os meus colegas não compreenderam muito bem que eu tenha saído sozinha do polivalente, mas também penso que temos de fazer certas coisas pela nossa cabeça e pelos nossos pés e mãos. E temos de pensar nas nossas vontades. Até pode ser bom para algumas pessoas, porque assim também se sentem mais livres.

Pronto, já matei saudades e ainda vou ter com os meus amigos. Realmente é verdade: se a gente quiser, até arranja tempo para muita coisa. O que não se arranja é para tudo. Mas como quem tudo quer tudo perde, mais vale querer (e fazer) pouca coisa de cada vez.

Abracinhos
Mariana

PS - Da janela, vejo árvores e pedaços de céu azul. As pontinhas das árvores parecem tocar as nuvens. E estão bem assentes na terra.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Diário de Mariana

24 de outubro

Querido diário,

Hoje estive a falar muito tempo com o Gi. Não gosto nada de andar com vontade de dizer alguma coisa e népia. Desde que o tinha visto a fumar e a jogar as cartas como furioso, não tínhamos tido assunto. Hoje, ele perguntou-me: Mariana, estás chateada comigo?

Foi mesmo fixe ele ter perguntado. Comecei então a dizer o que eu pensava. Ele ouviu ouviu e depois disse assim: Por acaso, acho que não tens muita razão. É muito raro fumar e quando isso acontece tem de ser à porta da escola porque cá dentro não se pode. Em jogar as cartas não vejo mal e pra mais já ouvi que até desenvolve o raciocínio. E eu: ó Gi, o que acho horroroso é baterem com as mãos na mesa com tanta força. Como disse uma setora, parecem batoteiros.

E sabes que o Gi me prometeu que não fumava mais nem batia com as mãos na mesa com força quando estivesse a jogar?! Eu nem queria acreditar. Foi mesmo querido. Se eu tivesse coragem e jeito, escrevia-lhe uma carta de amor, tipo aquela que eu um dia ouvi ler numa aula e que tinha sido escrita por uma rapariga ao namorado.

Mesmo que não escreva, ele vai ver nos meus olhos que eu fiquei mesmo contente. Amanhã até vou prender o cabelo com a fita vermelha e dar uma laço. Eu acho que ele gosta. I’m so happy!

Muitos muitos beijinhos. All the best.

Mariana