sexta-feira, 4 de maio de 2018

" A minha filha perguntou-me" - Ana Luísa Amaral

Helena Almeida

A minha filha perguntou-me 

o que era para a vida inteira 

e eu disse-lhe que era para sempre.

Naturalmente, menti, 

mas também os conceitos de infinito 

são diferentes: é que ela perguntou depois 

o que era para sempre 

e eu não podia falar-lhe em universos 

paralelos, em conjunções e disjunções 

de espaço e tempo, 

nem sequer em morte.

A vida inteira é até morrer,

mas eu sabia ser inevitável a questão 

seguinte: o que é morrer?

Por isso respondi que para sempre 

era assim largo, abri muito os braços,

distraí-a com o jogo que ficara a meio.

(No fim do jogo todo, 

disse-me que amanhã 

queria estar comigo para a vida inteira)

Ana Luísa Amaral

quinta-feira, 3 de maio de 2018

"Palavras para a Minha Mãe" - José Luís Peixoto

 
Graça Morais

mãe, tenho pena. esperei sempre que entendesses

as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.

pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.

às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.

lê isto: mãe, amo-te.

eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei-de fingir que
não escrevi estas palavras, e tu hás de fingir que não
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.

José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Adélia Prado - "Ensinamento"


Graça Morais

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
“Coitado, até essa hora no serviço pesado”.
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

Adélia Prado

"Mãe" - Matilde Rosa Araújo

Luzia Lage

Mãe!
Que verdade linda
O nascer encerra:
Eu nasci de ti,
Como a flor da terra

Matilde Rosa Araújo

"Poema Canção Amiga" - Carlos Drummond de Andrade

Helena Almeida

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me veem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

Carlos Drummond de Andrade

Amanhecer em S. Paulo - Brasil


terça-feira, 1 de maio de 2018

Cantiga do Maio - Carlos Paredes

segunda-feira, 30 de abril de 2018

domingo, 29 de abril de 2018

Madredeus - a andorinha da primavera . não muito distante . alma (letra)

"Jeito de Escrever" - Irene Lisboa


Não sei que diga
E a quem o dizer?
Não sei que pense.
Nada jamais soube.

Nem de mim, nem dos outros.
Nem do tempo, do céu e da terra, das coisas...
Seja do que for ou do que fosse.
Não sei que diga, não sei que pense.

Oiço os ralos queixosos, arrastados.
Ralos serão?
Horas da noite.
Noite começada ou adiantada, noite.
Como é bonito escrever!

Com este longo aparo, bonitas as letras e o gesto - o jeito.
Ao acaso, sem âncora, vago no tempo.
No tempo vago...
Ele vago e eu sem amparo.
Piam pássaros, trespassam o luto do espaço, este sereno luto das horas. Mortas!

E por mais não ter que relatar me cerro.
Expressão antiga, epistolar: me cerro.
Tão grato é o velho, inopinado e novo.
Me cerro!

Assim: uma das mãos no papel, dedos fincados,
solta a outra, de pena expectante.
Uma que agarra, a outra que espera...

Ó ilusão!
E tudo acabou, acaba.
Para quê a busca das coisas novas, à toa e à roda?

Silêncio.
Nem pássaros já, noite morta.
Me cerro.
Ó minha derradeira composição! Do não, do nem, do nada, da ausência e
solidão.

Da indiferença.
Quero eu que o seja! da indiferença ilimitada.
Noite vasta e contínua, caminha, caminha.
Alonga-te.
A ribeira acordou.

Irene Lisboa, in 'Antologia Poética'

Os cravos...


Enviado pelo Clube das Histórias

Enquanto é abril

Benedita kendall

Em abril, águas mil.

Em abril, cada pulga dá mil.

Em abril, vai onde deves ir, mas volta ao teu cuvil.

Inverno de março e seca de abril deixam o lavrador a pedir.

Não há mês mais irritado do que abril zangado.

No princípio ou no fim, costuma abril ser ruim.

Quando vem março ventoso, abril sai chuvoso.

Quem em abril não varre a eira e em maio não rega a leira anda todo o ano em canseira.

Uma água de maio e três de abril valem por mil.

sábado, 28 de abril de 2018

London and Spring!


sexta-feira, 27 de abril de 2018

É primavera!


quinta-feira, 26 de abril de 2018

Gato que brincas na rua  
Como se fosse na cama, 
Invejo a sorte que é tua  
Porque nem sorte se chama. 

Bom servo das leis fatais  
Que regem pedras e gentes,  
Que tens instintos gerais  
E sentes só o que sentes.  

És feliz porque és assim,  
Todo o nada que és é teu.  
Eu vejo-me e estou sem mim, 
Conheço-me e não sou eu.

Fernando Pessoa

quarta-feira, 25 de abril de 2018

"O canto da liberdade"

caracteres grandes
Enviado pelo Clube das histórias

Peço desculpa pela leitura do poema não ser tão fácil como eu gostaria.

Pelas mãos de um poeta

As Mãos

Manuel Alegre

Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema - e são de terra.
Com mãos se faz a guerra - e são a paz.
 
Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas, mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor, cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.

Com as Mãos e com a Voz