sexta-feira, 28 de outubro de 2011

FRÁGIL

Apetecia-me repetir, como Jorge Palma: estou frágil, sinto-me frágil… embora não queira ficar mais frágil. E muito menos dar ar de frágil. Nem tornar o outro mais frágil. Estou frágil, porque deparo, por exemplo, com alguns alunos que preferiam não fazer nada. Estou frágil porque muitas vezes a palavra oportuno é uma versão light do oportunismo. Porque os defeitos próprios são invisíveis enquanto os dos outros são como gigantes.

Frágil, porque há a necessidade de estudar, de preparar matérias, de programar atividades, de corrigir trabalhos e, muitas vezes, isso é esquecido. Esquece-o a sociedade quando se espanta pelo facto de o professor estar ocupado fora das aulas. Como se tivesse o dom de chegar à sala de aula, abrir uma torneira donde jorra trabalho feito. Ou, então, um computador que armazena e atualiza dados automaticamente.

Estou frágil, porque nos rostos dos alunos também coabitam muitas fragilidades: familiares, educativas, sociais, económicas… Sinto-me frágil, quando alguns alunos desperdiçam fortes capacidades enquanto outros, que nada esbanjam não têm sucesso.

Frágil, quando os saberes parecem ter voado ou fora do lugar. E voltamos atrás. E lemos textos. E vemos filmes. E fazemos visitas de estudo. E falamos. E escrevemos. E ligamos saberes do passado a realidades atuais para que exista fio condutor. E são eles que utilizam habilmente, nas aulas, a ferramenta informática, sem engano e com precisão. Sabem o significado de cada fio, de cada tecla, de cada botão…

Sinto-me frágil, porque é grande o cansaço à nossa volta. E irritabilidade. E vulnerabilidade. E mistério perante o enigma que é o futuro.

Frágil, porque tudo é frágil, embora isso seja cada vez mais natural.

Precisamos de estímulo, de espaço, de tempo, de confiança, de solidariedade… Para vencer toda esta fragilidade. Esta forte fragilidade.

Frágil - Jorge Palma

Põe-me o braço no ombro
Eu preciso de alguém
Dou-me com toda a gente
E não me dou a ninguém
Frágil
Sinto-me frágil

Faz-me um sinal qualquer
Se me vires falar de mais
Eu às vezes embarco
Em conversas banais
Frágil
Eu sinto-me frágil

Frágil
Esta noite estou tão frágil
Frágil
Já nem consigo ser ágil

Está a saber-me mal
Este whisky de malte
Adorava estar in
Mas estou-me a sentir out
Frágil
Eu sinto-me frágil

Acompanha-me a casa
Já não aguento mais
Deposita na cama
Os meus restos mortais
Frágil
Eu sinto-me frágil

Memórias felizes



Estive com uma colega e amiga a recordar atividades escolares realizadas há uns quinze anos. Muitos alunos, quando encontram esses professores, casualmente ou através do facebook, recordam-nas com alegria. Os momentos felizes são alimentados por boas memórias. E ainda melhores são quando partilhadas e motivam boas palavras e sorrisos.

Recordámos que muitas atividades eram realizadas por amor: à causa, “à camisola”, à educação, à disciplina que ensinávamos, aos autores de que gostávamos…

Atualmente, também muitas coisas bonitas se realizam nas escolas, apesar de muitos professores terem tarefas muito desgastantes, como é o caso das aulas de substituição. São difíceis porque nem o professor conhece os alunos nem estes estão habituados ao docente. E o mais frequente é os alunos revelarem indisponibilidade face aos trabalhos propostos. Só com muita “arte” o docente consegue cativar os alunos e pô-los a trabalhar calmamente. Neste contexto, vai-se tornando muito difícil a realização de outras atividades realizadas voluntariamente.

De facto, a situação atual não é propícia à realização de atividades extra-aula. Para além disso, muitos professores são confrontados com o não reconhecimento pelo seu trabalho.

Porém, retomo a nota risonha com que iniciei estas notas, porque acho importantes as memórias que ficam e ajudam a superar momentos menos bons.

É 6ª f., está sol, e, quando tantas coisas são retiradas, as boas memórias são inalteráveis. Felizmente!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Depois do corte



Querido diário

27 de outubro

Querido diário,

Hoje mostrei o meu diário à Bea (eu digo Bea, porque ela chama-se Beatriz. Se eu escrevesse como pronuncio, dizia Bia, mas assim acho mais fixe e não mudo as letras).

Leu com atenção, porque ela lê sempre do princípio ao fim, em silêncio, se tem de dar a opinião. Depois de ler, disse assim: é fixe, Mariana, mas acho que falas muito da tua mãe, pouco do teu pai e dizes muitas vezes fogo.

Fogo, com isto é que eu não contava. Como ela é minha amiga, eu disse-lhe: Bea, já sabes que a minha mãe tem muita influência sobre mim. Sabes que quando eu nasci, ela já era um bocadito coisa (eu digo coisa quando me custa dizer alguma palavra e não gosto de dizer que a minha mãe já era um bocado velha). Sabes bem que muita gente julga que sou neta da minha mãe. Sempre fomos muito ligadas, mas às vezes sonho que vou para outro país, gosto da ideia ne não me importava de viver sozinha.

A Bea, quando é assim, não interrompe para me deixar falar. Eu por acaso também faço a mesma coisa com ela quando ela precisa. Mas depois disse-me: não sei por que não falas mais do teu pai.

Eu fiquei um bocado calada e expliquei: sabes, porque tenho saudades dele. Gostava que o meu pai ainda estivesse connosco. Eu não falo muito, mas muitas vezes faço coisas mais descansada por saber que ele estaria de acordo comigo. Vivi pouco tempo com o meu pai, mas ele fazia as coisas com tanta força e intensidade que acho que fiquei a saber bem o que ele pensava e pra mim isso também é uma orientação. Se calhar, é por isso que dizem que tenho maturidade, mas eu acho que faço é como ele me ensinou. Menos estudar, é claro, porque, sei lá, o tempo nunca dá, fogo.

Depois disto tudo, diz a Bea: ó Mariana, não te quero chatear, mas escreves tantas vezes fogo. E eu então respondi: Ó Bea, também não se deve exigir que seja tudo às mil maravilhas. Também temos o direito de errar, de dizer algumas coisas que nos vêm à cabeça. Não sou perfeita, nem especialista em linguagem. Fogo.

E depois não me lembro muito bem do que dissemos a seguir. E se não me lembro é porque não foi nada de especial. Mas gostei que ela me tivesse dito isso, porque vi que é mesmo minha amiga e assim posso melhorar e eu gosto disso.

Muitos abracinhos

Mariana

Pensamentos

As escolas demasiado grandes podem tornar-se espaços ao Deus-dará, o que a ninguém traz proveito positivo.

Muitos funcionários não podem ser substituídos com tanta frequência e em pleno ano letivo por outros que, embora com boas intenções, desconhecem o funcionamento da escola.

Os materiais utilizados nas obras das escolas têm de ser mais adequados ao uso por centenas e centenas de pessoas. As verbas gastas, em muitos casos, são astronómicas em confronto com as fragilidades detetadas.

A opinião de alguns encarregados de educação parece contar muitos mais do que o parecer de muitos professores. Vivemos sob a capa hedonista do "tá-se bem" ou da negrura do medo.

Muitos jovens não conhecem a palavra "deveres" e muitos adultos também já a esqueceram.

Às vezes, temos dificuldade em nos pormos no papel do outro, porque pensamos que somos os únicos heróis.