Pollock
Estava
  um silêncio fora do habitual no pátio das galinhas e Cecily Fischer, a
 irmã do  padeiro, olhou à sua volta desconfiada. Nesse momento, as 
galinhas começaram a  cacarejar de medo. Cecily atravessou depressa o 
terreiro e escancarou a porta do  galinheiro.
—  Ludwig! Ora bem! Agora sei quem é que tem andado a roubar-me os  ovos!
—  Não, não, Menina Fischer — mentiu o rapazinho. — O Kaspar atirou o meu lenço  aqui para dentro e eu vim buscá-lo!
Ludwig
  van Beethoven vivia com o seu pai, mãe e os dois irmãos, Kaspar e 
Nikola, na  casa do padeiro, no nº 934 da Rheingasse, em Bona, na 
Alemanha. Em 1774, era um  rapazinho todo enxovalhado, de quatro anos de
 idade, com cabelo despenteado e  unhas sujas. Ludwig ia à escola com os
 seus irmãos mas detestava as aulas.  Estudava Francês, Italiano e 
Latim, mas tinha notas muito baixas. Na Matemática,  era tão fraco na 
multiplicação que, se tinha de calcular quantos eram três vezes  quatro,
 escrevia três quatros e adicionava-os!
O
  Kaspar e o Nikola eram muito bons alunos. Mas, quando se tratava de 
Música,  ninguém era tão brilhante aluno como Ludwig! Quando começou a 
tocar cravo era  tão pequeno que tinha de se pôr de pé num banco para 
chegar ao teclado. Também  aprendia a tocar violino. O seu pai, Johann, 
era cantor. Foi ele quem lhe deu as  primeiras lições, mas era muito 
severo: ao chegar a casa, já tarde na noite, ia  tirar Ludwig da cama 
para praticar. E quando este tentava tocar de memória, o  pai ficava 
muito zangado!
—
  Que asneirolas estúpidas estás para aí a arranhar? — gritava. — Toca 
pela pauta,  caso contrário nunca serás um músico a sério!
Por
  vezes, quando o pai estava com visitas, Ludwig aproximava-se à socapa 
do cravo e  tocava alguns acordes. Nessas ocasiões, Johann perdia as 
estribeiras:  
—  O que estás aqui a fazer? Vai-te embora se não queres levar um puxão de  orelhas!
Mas
  até mesmo o seu mal-humorado pai tinha de admitir que o filho estava a
 fazer  grandes progressos. Em pouco tempo, o rapazinho já andava a 
aprender a tocar  viola e órgão. E já era muito melhor músico do que 
ele! Quando fez sete anos, o  pai decidiu que era chegada a altura de 
Ludwig dar o seu primeiro concerto.  Ouvira contar como, alguns anos 
antes, Leopold Mozart tinha levado em digressão  Wolfgang, o seu filho 
genial, que tinha dado uma série de  concertos.
—  Ludwig também há de ganhar dinheiro! — disse ele.
O
  concerto realizou-se em 26 de Março de 1778. Todos os anúncios diziam 
que o  rapaz tinha apenas seis anos de idade. Johann mentiu quanto à 
idade do filho  para que as pessoas pensassem que Ludwig era tão esperto
 como Wolfgang  Mozart.
*
Johann
  estava a fazer um buraco num ovo! Ludwig fez uma careta de nojo 
enquanto  observava o pai a sorver o ovo cru e depois comer duas ameixas
  secas!
—  Vai cantar hoje à noite — pensou Ludwig.
O  seu pai comia sempre ovo cru e ameixas secas antes de  cantar.
—  Dá-me frescura à voz! — dizia ao seu jovem filho. 
Quando
  começou a crescer, Ludwig apercebeu-se de que quase toda a gente que 
ele  conhecia estava ao serviço do Arcebispo de Colónia. A vida no 
palácio do  Arcebispo era muito faustosa, porque o Arcebispo era uma 
pessoa importante. Foi  um dos poucos “Eleitores” que escolheram um novo
 imperador quando morreu o  velho. Adorava boa comida, a caça e a 
música. O Eleitor tinha a sua própria  orquestra. O avô de Ludwig tinha 
sido o seu kappelmeister — mestre de capela — o  chefe dos músicos da corte. O sonho de Johann era que Ludwig viesse também a ser  kappelmeister.
Quando
  Ludwig tinha dez anos, Christian Gittlob Neefe passou a ser o novo 
organista do  Eleitor. Este óptimo músico apercebeu-se de que Ludwig era
 um génio com  necessidade de um professor calmo e compreensivo que o 
animasse a compor. O  senhor Neefe não tardou a declarar que o rapaz era
 “um jovem génio de talento  muitíssimo promissor. Certamente 
tornar-se-á um outro Wolfgang Mozart se  continuar como começou!”. E 
assim o Senhor Neefe nomeou Ludwig seu organista  assistente.
*
—  É altura de ir para o andar de cima, Mamã! 
Os
  meninos estavam todos excitados. Era o aniversário da mãe e todos os 
anos o  celebravam com um concerto. Enquanto a Mãe estava a descansar, 
punham uma  cadeira especial debaixo de um dossel e decoravam-na com 
folhas e flores. Por  volta das dez horas estava toda a gente pronta e 
os músicos começavam a afinar  os seus instrumentos.
—  Já aí vem! Todos calados!
A
  Mãe desceu as escadas. Estava linda. Johann conduziu-a à sua cadeira 
especial.  Os músicos começaram a tocar e o som da música maravilhosa 
espalhava-se pela  vizinhança. Após o concerto, comeram e beberam. 
Depois, todos tiraram os sapatos  e dançaram em meias, para não 
incomodar os vizinhos que estavam a dormir.  
*
Ludwig
  estava sentado à janela do seu quarto, que dava para o terreiro. À sua
 frente  encontravam-se os manuscritos das suas primeiras composições 
musicais  importantes. Eram três sonatas para cravo. Tinha-as trabalhado
 durante várias  semanas, reescrevendo longas passagens até finalmente 
se dar por satisfeito.  Escreveu a dedicatória: A Sua Eminência o  
Arcebispo Eleitor de Colónia, meu gracioso Soberano, composto por Ludwig
 van  Beethoven, aos onze anos de idade.
*
—  Tragam-me a lista de todos os músicos da minha orquestra!
Em
  1784, havia um novo Eleitor em Bona. O Arquiduque Maximiliano era 
irmão do  Imperador. Era um homem muito gordo que gostava de boa comida e
 de boa  música.
—
  O que é isto? Johann van Beethoven tem uma voz já muito gasta! Dizes 
que o seu  filho Ludwig é ainda jovem, mas muito capaz. Toca órgão, é? 
Estou desejoso de o  ouvir a tocar! 
Ludwig
  já não andava todo enxovalhado! Agora que era músico da corte, tinha 
de parecer  muito arranjado e limpo. Usava uma casaca elegante, calções 
pelos joelhos, meias  de seda, sapatos com laçarotes e um colete bordado
 com bolsos, que apertava com  cordão de oiro genuíno. Tinha o cabelo 
aos caracóis dos lados e rabo-de-cavalo  atrás. Até tinha uma espada num
 cinto de prata, que usava em ocasiões  especiais.
Aos
  16 anos, o Senhor Neefe decidiu que ele iria estudar com Mozart em 
Viena. Após  uma longa viagem, Ludwig Beethoven chegou a Viena em 7 de 
Abril de 1787. Alguns  dias mais tarde encontrou-se com Mozart, que o 
convidou a tocar. Ludwig  sentou-se ao cravo e tocou maravilhosamente. 
Mas Mozart não parecia muito  impressionado.
—  Bom, preparou bem essa peça — disse, num tom bastante  frio.
—  Posso fazer muito melhor do que isto! — gritou Ludwig.— Dê-me uma melodia e  mostrar-lhe-ei o que posso fazer com ela!
Os
  dedos de Ludwig voavam sobre o teclado. Estava a tocar para o grande 
Wolfgang  Mozart. Transbordava de inspiração. A melodia simples que 
Mozart lhe sugerira  tornou-se uma obra-prima quando Beethoven a 
transformou numa composição  maravilhosa. Mozart estava enlevado. Por 
fim, foi ter com uns amigos que estavam  na sala ao lado.
—  Aquele é Ludwig van Beethoven — disse. — Um dia, todo o mundo falará  dele.
Ludwig
  van Beethoven tornou-se um dos compositores mais importantes de todo o
 mundo.  Compôs mais de 600 peças, incluindo 9 sinfonias, cinco 
concertos para piano, um  concerto para violino, uma ópera, 32 sonatas 
para piano e muitos quartetos de  cordas, trios e obras de música coral.
 Mas Beethoven compôs muitas destas  obras-primas depois de ficar surdo.
 Entre as suas composições encontram-se a  “Sonata ao Luar”, a Sinfonia 
“Pastoral” (nº6) e o “Hino da Alegria”, da sua  Sinfonia nº 9. 
Ludwig van Beethoven morreu em 1827.
Ann Rachlin; Susan Hellard
Beethoven
Porto,  Campo das Letras, 1997
(Adaptação)
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