domingo, 6 de maio de 2012

BARBARA (em dia de eleições francesas)

Seurat

Rappelle-toi Barbara
Il pleuvait sans cesse sur Brest ce jour-là
Et tu marchais souriante
Épanouie ravie ruisselante
Sous la pluie
Rappelle-toi Barbara
Il pleuvait sans cesse sur Brest
Et je t'ai croisée rue de Siam
Tu souriais
Et moi je souriais de même
Rappelle-toi Barbara
Toi que je ne connaissais pas
Toi qui ne me connaissais pas
Rappelle-toi
Rappelle-toi quand même ce jour-là
N'oublie pas
Un homme sous un porche s'abritait
Et il a crié ton nom
Barbara
Et tu as couru vers lui sous la pluie
Ruisselante ravie épanouie
Et tu t'es jetée dans ses bras
Rappelle-toi cela Barbara
Et ne m'en veux pas si je te tutoie
Je dis tu a tous ceux que j'aime
Même si je ne les ai vus qu'une seule fois
Je dis tu a tous ceux qui s'aiment
Même si je ne les connais pas
Rappelle-toi Barbara
N'oublie pas
Cette pluie sage et heureuse
Sur ton visage heureux
Sur cette ville heureuse
Cette pluie sur la mer
Sur l'arsenal
Sur le bateau d'Ouessant
Oh Barbara
Quelle connerie la guerre
Qu'es-tu devenue maintenant
Sous cette pluie de fer
De feu d'acier de sang
Et celui qui te serrait dans ses bras
Amoureusement
Est-il mort disparu ou bien encore vivant
Oh Barbara
Il pleut sans cesse sur Brest
Comme il pleuvait avant
Mais ce n'est plus pareil et tout est abîmé
C'est une pluie de deuil terrible et désolée
Ce n'est même plus l'orage
De fer d'acier de sang
Tout simplement des nuages
Qui crèvent comme des chiens
Des chiens qui disparaissent
Au fil de l'eau sur Brest
Et vont pourrir au loin
Au loin très loin de Brest
Dont il ne reste rien.

Jacques Prévert

sábado, 5 de maio de 2012

Nascer


Mãe!

Que verdade linda

O nascer encerra:

Eu nasci de ti.

Como a flor da terra!
  
                                     Matilde Rosa Araújo

Mãos de mãe

 
Rodin
Noite após noite, a minha mãe vinha aconchegar-me, mesmo quando eu já deixara há muito de ser criança. Tal como outrora, inclinava-se sobre mim, afastava o meu cabelo comprido e beijava-me a testa.
Não me lembro de quando o gesto das suas mãos a afastar o meu cabelo começou a irritar-me. Mas aborrecia-me deveras que ela passasse as mãos ásperas e gastas pelo trabalho sobre a minha pele macia. Uma noite gritei, zangada:
—Não faças mais isso! As tuas mãos são muito ásperas!
A minha mãe não disse nada, mas nunca mais aquele gesto de amor rematou os meus dias. Continuei acordada muito tempo depois de ter proferido aquelas palavras, que agora me perseguiam. Contudo, o orgulho abafou a consciência e não consegui dizer-lhe o quanto lamentava tê-las proferido.
Os anos foram passando, sem que a memória daquela noite se apagasse. O incidente, que ora parecia recente ora se afigurava longínquo, nunca me saiu da mente e eu comecei a ter saudades daquele gesto que reprimira.
Hoje a minha mãe já ultrapassou os setenta anos e as mãos que outrora achei tão ásperas ainda trabalham para mim e para os meus. É ela que tem sido a nossa médica, ao procurar no armário o remédio para aliviar uma dor de estômago ou de um joelho ferido dos mais novos. É ela que faz o melhor frango frito do mundo, que tira as nódoas das calças de ganga como eu nunca consegui, que ainda insiste em servir gelado a qualquer hora do dia ou da noite. Ao longo dos anos, as mãos da minha mãe trabalharam durante horas incontáveis, muito antes de haver máquinas de lavar e tecidos resistentes que não engelham.
Agora, os meus filhos já são crescidos e independentes e o meu pai já faleceu. Em ocasiões especiais, vou passar a noite com ela.
E foi assim que, numa véspera do Dia de Ação de Graças, quando eu começava a adormecer no quarto da minha infância, senti uma mão conhecida, que passava, hesitante, pelo meu rosto, para afastar o cabelo da minha testa. Quando um beijo, sempre igualmente gentil, pousou no meu sobrolho, recordei, pela milésima vez, a noite em que a minha voz jovem e ríspida soara indignada:
—Não faças mais isso. As tuas mãos são muito ásperas!
Então, segurando a mão da minha mãe, disse-lhe o quanto lamentava aquela noite. Pensei que, como eu, ela se lembrasse... Mas a minha mãe não sabia do que eu estava a falar, pois há muito que tinha esquecido e perdoado.
Naquela noite, adormeci profundamente grata pela presença da minha mãe e pelo carinho das suas mãos.
E a culpa que eu tinha carregado durante tantos anos desvaneceu-se.
Louisa Godissart McQuillen
Jack Canfield, Mark Victor Hansen
A Second Chicken Soup for the Woman’s Soul
HCIbooks, Deerfield Beach, 1998
(Tradução e adaptação)

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Poema da Auto-estrada

Imagem retirada da net

Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta.
Vai na brasa, de lambreta.

Leva calções de pirata,
Vermelho de alizarina,
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno,
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que se enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.

Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa, de lambreta.

António Gedeão, in 'Máquina de Fogo'

quinta-feira, 3 de maio de 2012

"A gaivota"

Ontem, na Biblioteca Municipal de Gondomar, numa Comunidade de Leitores, abordou-se a peça "A gaivota", de Anton Tchékhov.

O moderador, João Teixeira Lopes, sociólogo e professor universitário, orientou, de forma serena, atenta e profunda, o diálogo à volta desta obra da qual realçou a modernidade e intemporalidade.

Leu-se, ouviu-se, falou-se, argumentou-se, convocaram-se emoções despertadas pelo belíssimo texto; referiram-se sentimentos que emergiram da leitura: desencanto, desamor, angústia, impossibilidade de ser feliz; estabeleceram-se relações com experiência pessoal...

Interligaram-se outras formas de arte, nomeadamente a música e a poesia. Vieram, assim, à baila os  versos de Carlos Drummond de Andrade:

"João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém"...

Mas só quem amasse e conhecesse a vida humana poderia escrever esta peça. E, no entanto, no título, paira uma gaivota.



"Eles são vida"

Falava com um amigo sobre alguns momentos da educação (de muitos) dos nossos dias. Alguns difíceis porque muitos adolescentes não se inibem de falar com um professor como falam com um colega da idade deles. E os pais, muitas vezes, concordam e até reforçam esses comportamentos. Julgo não andar longe da verdade dizendo que alguns pais parecem 
- perder o controlo dos filhos;
- ter medo dos filhos;
- desconhecer comportamentos relevantes dos filhos;
- querer compensar os filhos, defendendo que só os outros é que estão  errados;
-...

Ora, assim sendo, esses jovens reivindicam alto os seus direitos e viram as costas aos deveres.
A minha experiência pessoal diz-me que muitos jovens revelam que lhes incutiram regras de boa convivência em sociedade, levando a crer que serão bons futuros cidadãos. Porém, muitos existem que as preferem ignorar - não sei se por genes, se por falta de quem lhas ensinasse -  e vão riscando traços labirínticos onde podem perder-se.

Falando, então, com um amigo sobre estes assuntos, ele disse: pois é, "mas eles são vida". 

E senti "saudades do futuro".

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Eram sete menos três

Combinaram um jantar. Não é que não se encontrassem com frequência. À mesa falaram de tudo e mais alguma coisa: das últimas peripécias, de amigos que há muito não viam...
E a conversa foi parar às ausências. Diretamente ligadas aos sete jovens já eram três as pessoas que tinham emigrado. 
E falaram também de outros amigos ou amigos de amigos que tinham igualmente procurado trabalho no estrangeiro.
Cá, em Portugal, o trabalho era precário, ou incerto ou tinha mesmo acabado.
No próximo jantar, poderão ser mais do que sete. Ou talvez menos.


terça-feira, 1 de maio de 2012

Com todas as mãos se trabalha o mundo


Cézanne
Manet
Millet
Vermeer
Vermeer

As mãos
Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema – e são de terra.
Com mãos se faz a guerra – e são a paz.

Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no Tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.

Manuel Alegre

segunda-feira, 30 de abril de 2012

As maias

Quando eu era pequena, íamos aos matos das proximidades apanhar maias para pôr nas fechaduras das portas na noite de 29 de abril para 30 de maio. Julgo que a tradição ainda se mantém, porque as maias que se veem estão sobretudo em lugares altos onde não é fácil chegar. As que estavam ao alcance da mão foram sendo colhidas.
Também muitos lavradores ou pessoas que tinham hortas colocavam maias entre as batatas, as favas, as ervilhas... Pretendia-se que tanto as casas como os campos fossem preservados do mal. Dizia-se que as maias defendiam os campos do arejo, que causava a destruição. Nas casas, o diabo não entraria se na fechadura houvesse raminhos de maia.
Ficam festivos os matos pintados assim de amarelo. É uma forma de olharmos um pouco mais para a natureza e de acreditarmos, com bondade e inocência, em forças que nos transcendem.
Procurei, na net, a origem desta tradição, que eu julgava pagã. O que me apareceu tem até raízes cristãs.
Para além de como tudo começou, vou tentar arranjar maias para pôr nas fechaduras das portas. Como muitas mais haverá, a noite ficará mais alegre e colorida. Não vá o diabo entristecê-la.



domingo, 29 de abril de 2012

Belo azul

Juan Miró

sábado, 28 de abril de 2012

Cores ao sol


Descanso

Stefani Melton Fisher

Jean François Colson

Millet
Gauguin

Daniel Ridgway

sexta-feira, 27 de abril de 2012

É bom estar aqui!

6ª f. Fim de tarde. Na cesta, junto à janela da cozinha, há batatas apanhadas hoje. E também cebolas. E ervilhas também frescas no frigorífico. E o computador em cima da mesa. 
Gosto de ter o computador em cima da mesa da cozinha. Se calhar porque gosto de estar na cozinha. A máquina do café à mão, as maçãs e as laranjas ao meu alcance, a televisão à minha frente, quase sempre sem som, a janela donde vejo as cores do céu, a Castanha à porta porque me pressente...
Abro o blogue e fico contente porque há pessoas que passam por aqui e ficam um bocadinho. Não conhecerei muitos rostos e o meu, nalguns casos, também será desconhecido. E, no entanto, comunicamos através de palavras escritas e de imagens.
Apesar de todas as crises, deixem-me dizer que é bom ser 6ª f. à noite (noite? ainda está sol!) e que é bom estar aqui.

Na televisão, passam imagens de uma situação de pânico numa rua de Londres, de um choque de comboios em Itália, de lucros fabulosos na EDP, do desconhecimento público quanto às formas de pagamento da dívida da Madeira, da morte de um deputado culto e afável que queria que o mundo ficasse melhor e morreu cedo, de divergência entre partidos políticos...

Ao meu lado, tenho um livro de Anton Tchékhov. E o telefone. E uma cesta pequena com novelos. O tacho ferve no fogão. 

Malgré tout, é bom poder estar aqui!

quinta-feira, 26 de abril de 2012

O problema


Gustave Caillebotte

Era uma vez um lavrador. Embora trabalhasse noite e dia, nunca conseguia deixar de ser pobre. De cada vez que começava a sentir que estava a tirar o melhor partido de uma situação, tudo acabava sempre por falhar. Se num ano havia seca, no outro havia cheia. Se num ano os rebanhos adoeciam, no ano seguinte os lobos dizimavam-nos. Se num ano o preço do cereal descia, no ano seguinte o rei subia os impostos.
Certo dia, o lavrador estava sentado num tronco, cabisbaixo e desesperado. De repente, apareceu uma estranha e grotesca criatura a dançar, a cantar e a rir à volta do lavrador. Os pelos que lhe cobriam o corpo estavam emaranhados, os olhos selvagens faiscavam e tinha os dentes pretos. O cheiro que exalava quase fez o lavrador chorar.
— Quem és tu?
— Eu, bom homem, sou o teu problema. Só passei por aqui para ter a certeza de que eras o mais infeliz possível!
— Monstro! Então é por tua causa que nunca coisa alguma me corre bem?
— Pois é! Eu sou o teu azar, a tua desgraça. Sem mim, serias um homem com sorte.
Rápido como o vento, o pobre homem agarrou o seu problema pelo pescoço e amarrou-o com cordas fortes. Em seguida, abriu uma cova bem funda e atirou a sua desgraça lá para dentro. Tapou-a com pedras e regressou a casa.
No dia seguinte, a sorte começou a mudar. As ovelhas deram à luz gémeos, as vacas começaram a dar duas vezes mais leite, as culturas cresciam mais depressa e mais alto do que nunca, e as árvores estavam carregadas de frutos. Todos os comerciantes queriam comprar os seus produtos e toda a gente vinha adquirir os seus legumes, frutos e animais. Em poucas semanas, o homem, que fora tão pobre, estava rico.
O lavrador tinha um vizinho que habitualmente era bem-sucedido. Este homem rico sempre olhara com desdém para o lavrador e ridicularizara o seu trabalho. Agora via que o lavrador estava quase tão rico como ele e, ainda por cima, em tão pouco tempo. Um dia, não conseguiu aguentar mais a curiosidade e foi visitá-lo.
— Parabéns, vizinho, pela sua recente boa sorte. Devo dizer que estou admirado com a rapidez com que conseguiu fazer prosperar esta quinta. Qual é o segredo?
— É simples. Encontrei a raiz do meu infortúnio. O meu problema veio vangloriar-‑se da minha má-sorte e eu apanhei-o. Enfiei-o num buraco fundo, que cobri com pedras, um buraco que fica na minha pastagem. Essa é, sem dúvida, a razão pela qual finalmente tive sorte, depois destes anos todos de trabalho e fracasso.
O lavrador rico não gostou que o vizinho tivesse finalmente triunfado na vida. Naquela mesma noite, rastejou até ao buraco onde o problema do vizinho estava enterrado. Durante toda a noite levantou as pesadas pedras e cavou a terra até encontrar o problema. Desamarrou-o e pô-lo em liberdade.
— Muitíssimo obrigado — gritou o problema. — O senhor é um verdadeiro amigo.
— Agora — disse o homem rico — podes voltar a atormentar o teu antigo dono outra vez.
— Não, não, não! — gritou o problema. — Aquele homem tratou-me muito mal e atirou-me para dentro deste buraco. Mas o senhor foi tão amável em libertar-me! Vai ser um amo muito melhor. Vou ficar consigo para sempre.
Assim foi e devia ser.
Dan Keding
Stories of Hope and Spirit
Little Rock, August House Publishers, 2004
(Tradução e adaptação)

es@contadoresdehistorias.com

Nota pessoal: Gostei desta história, embora a preferisse sem a última frase.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Festejando o dia em que "A Poesia saiu à rua"

Maria Helena Vieira da Silva

25 DE ABRIL

Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo


                         Sophia de Mello Breyner Andresen
 
 

Pátria

Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro

Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Do longo relatório irrecusável

E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas

- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro

Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo.
Sophia de Mello Breyner Andresen



segunda-feira, 23 de abril de 2012

"Amigos improváveis"


Um tetraplégico devido a um acidente de parapente. Homem muito rico. Apreciador de arte. À procura de quem o ajude 24 horas por dia. Para além das funcionárias que zelam pelo equilíbrio doméstico.
Muitos candidatos ao lugar. Todos com boas ações no curriculum tão completo como cinzento.
Um jovem, com uma força física incrível, com uma força anímica formidável, com uma alegria extraordinária é aceite. De todos os candidatos é o que  toma atitudes politicamente mais incorretas, mas o único que ajuda a sorrir e trata normalmente uma pessoa incapacitada. Que é um bom acompanhante em desejadas altas velocidades. Que proporciona um encontro amoroso redentor. Que mantém um diálogo com quem perdeu a autonomia mas não a vontade de agarrar a vida. Que é capaz de alicerçar uma boa amizade...

Gostei  imenso do filme. Provoca boas gargalhadas e um desejo enorme de melhorar como ser humano. 

O filme começa e, de repente, já passaram duas horas. Bem passadas com estes “amigos improváveis”.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Frutos em tigela


quarta-feira, 18 de abril de 2012

A VERDADE HISTÓRICA

 
                                           Imagem da net

A minha filha partiu uma tigela
na cozinha.
E eu que me apetecia escrever
sobre o evento,
tive que pôr de lado inspiração e lápis,
pegar numa vassoura e varrer
a cozinha.

A cozinha varrida de tigela

ficou diferente da cozinha
de tigela intacta:
local propício a escavação e estudo,
curto mapa arqueológico
num futuro remoto.

Uma tigela de louça branca

com flores,
restos de cereais tratados
em embalagem estanque
espalhados pelo chão.

Não eram grãos de trigo de Pompeia,

mas eram respeitosos cereais
de qualquer forma.
E a tigela, mesmo não sendo da dinastia Ming,
mas das Caldas,
daqui a cinco ou dez mil anos
devia ter estatuto admirativo.

Mas a hecatombe

deu-se.
E escorregada de pequeninas mãos,
ficou esquecida de famas e proveitos,
varrida de vassouras e memórias.

Por mísero e cruel balde de lixo

azul
em plástico moderno
(indestrutível)



ANA LUÍSA AMARAL, "Minha Senhora de Quê", Quetzal Editores, Lisboa, 1999

Os frutos de Josefa de Óbidos (séc. XVII)




Uma amiga lembrou: Antero de Quental faria 170 anos!

 Sam Weber
No Circo
(A João de Deus)

Muito longe d'aqui, nem eu sei quando,
Nem onde era esse mundo, em que eu vivia...
Mas tão longe... que até dizer podia
Que enquanto lá andei, andei sonhando...

Porque era tudo ali aéreo e brando,
E lúcida a existência amanhecia...
E eu... leve como a luz... até que um dia
Um vento me tomou, e vim rolando...

Caí e achei-me, de repente, involto
Em luta bestial, na arena fera,
Onde um bruto furor bramia solto.
 


Senti um monstro em mim nascer n'essa hora,
E achei-me de improviso feito fera...
— É assim que rujo entre leões agora!

Antero de Quental, in "Sonetos"


Gostei do soneto e do quadro
 que a IA escolheu para o ilustrar!
Obrigada!