Recebi um comentário de A.V. ao post "Ei-los que (também) partem".
Pela atualidade, transcrevo-o aqui .
De facto, os escritores estão, muitas vezes,
à frente do seu tempo.
Muitos governantes, porém, vão apenas atrás do seu tempo,
não havendo, por isso, as mudanças necessárias.
Encontrei,
hoje, este comentário a uma notícia sobre o actual clima económico em Portugal,
bem a propósito da sempre actual situação do país e da "sangria"
demográfica que lhe tem andado associada. É incrível a actualidade do nosso Eça
de Queiroz.
«Querido Leitor: nunca penses em servir o teu país com a tua inteligência, e para isso em estudar, em trabalhar, em pensar! Não creias na inteligência, crê na intriga! Não estudes, corrompe! Não sejas digno, sê hábil! E sobretudo nunca faças um concurso: ou quando o fizeres em lugar de pôr no papel que está diante de ti o resultado de um ano de trabalho, de estudo, escreve simplesmente: sou influente no círculo tal e não mo façam repetir duas vezes!»
«É estranho – que haja quem estranhe a emigração. Nós estamos num estado comparável à Grécia: mesma pobreza, mesma indignidade política, mesma trapalhada económica, mesmo abaixamento dos caracteres, mesma decadência de espírito. Nos livros estrangeiros, nas revistas, quando se quer falar de um país caótico e que pela sua decadência progressiva poderá vir a ser riscado do mapa da Europa – citam-se a par da Grécia e Portugal.
…Ora na Grécia, o facto permanente é a emigração. E nós emigramos, pelo mesmo motivo que o grego emigra – a necessidade de procurar longe o pão que a pátria não dá.
… Que querem os senhores que se faça num país destes? Sair, fugir, abandoná-lo. O país é belo sim, de deliciosa paisagem. Mas a politica, a administração, tornaram aqui a vida intolerável. Seria doce gozá-lo, não tendo a honra de lhe pertencer. Só se pode ser português, sendo-se inglês!
… Mas enfim é tomar o caminho – é implicitamente confessar que a vida é extremamente difícil em Portugal – e que a acção natural que todo o cidadão português deve ao seu país – é abandoná-lo».
«Querido Leitor: nunca penses em servir o teu país com a tua inteligência, e para isso em estudar, em trabalhar, em pensar! Não creias na inteligência, crê na intriga! Não estudes, corrompe! Não sejas digno, sê hábil! E sobretudo nunca faças um concurso: ou quando o fizeres em lugar de pôr no papel que está diante de ti o resultado de um ano de trabalho, de estudo, escreve simplesmente: sou influente no círculo tal e não mo façam repetir duas vezes!»
«É estranho – que haja quem estranhe a emigração. Nós estamos num estado comparável à Grécia: mesma pobreza, mesma indignidade política, mesma trapalhada económica, mesmo abaixamento dos caracteres, mesma decadência de espírito. Nos livros estrangeiros, nas revistas, quando se quer falar de um país caótico e que pela sua decadência progressiva poderá vir a ser riscado do mapa da Europa – citam-se a par da Grécia e Portugal.
…Ora na Grécia, o facto permanente é a emigração. E nós emigramos, pelo mesmo motivo que o grego emigra – a necessidade de procurar longe o pão que a pátria não dá.
… Que querem os senhores que se faça num país destes? Sair, fugir, abandoná-lo. O país é belo sim, de deliciosa paisagem. Mas a politica, a administração, tornaram aqui a vida intolerável. Seria doce gozá-lo, não tendo a honra de lhe pertencer. Só se pode ser português, sendo-se inglês!
… Mas enfim é tomar o caminho – é implicitamente confessar que a vida é extremamente difícil em Portugal – e que a acção natural que todo o cidadão português deve ao seu país – é abandoná-lo».
Eça de Queiroz – As Farpas - Novembro de 1871
Sem comentários:
Enviar um comentário