O piano
Ontem,
a menina, nos seus bonitos sete anos, deu o seu primeiro recital de piano. Os pais,
orgulhosos, filmaram e partilharam, felizes, o vídeo da pequena pianista, no
seu vestido de saia rodada florida e de grinalda rosada bem visível no cabelo. No
início da atuação, a professora de piano, sempre atenta aos pormenores, veio
dar um retoque na postura e logo se afastou, discreta, para não perturbar o
momento para o qual também tinha carinhosamente trabalhado.
Concentrada
e ágil, a menina cumpriu bem a bela missão e, no final, foi
aplaudida.
Em
casa, toca piano diariamente, com a ajuda insistente do pai, mas também diariamente diz
que não gosta de tocar piano.
Ficou,
porém, feliz com o seu primeiro recital. E disse, com a sua voz meiga e olhar
azul: - Gostei muito de atuar.
A conversão
Há
muito que não ouvia a palavra conversão. Hoje, na TSF, passaram excertos de uma
entrevista a Alice Vieira, dizendo-se que a escritora se tinha convertido à
religião católica, graças à sua grande amizade com José Tolentino Mendonça.
Esta
será uma boa notícia para os católicos nestes dias em que a igreja passa por
tantos problemas devido a comportamentos tão censuráveis: dos abusadores de
crianças e de quem encobriu os crimes durante tanto tempo, abusando também dos seus
poderes e não cumprindo o que é tantas vezes pregado de mãos erguidas e olhos postos no céu.
Felizmente
há padres e bispos que vivem a sua vida sacerdotal de forma exemplar não esquecendo que
todos os seres humanos, e não só, merecem respeito. Esses vão trabalhando
muitas vezes em silêncio para a alegria comum e nunca para o sofrimento de
inocentes.
A Maria do Céu
Nunca foi minha aluna, mas os professores da turma
falavam dela. Era estudante do secundário, muito aplicada, muito comunicativa, gostava de participar em
diferentes atividades da escola e queria ser advogada. Trabalharia muito para o conseguir,
porque os pais tinham de fazer grandes sacrifícios para poderem pagar os
estudos. Apoiavam-na em tudo para que conseguisse ser o que sonhava. E
louvavam os professores que também a ajudavam. A vida sorria como o céu na terra.
Maria era também muito bonita e saudável. Só que surgiu um
pequeno problema cardíaco, de pouca monta, mas que exigia uma intervenção
cirúrgica. Uma coisa rápida e simples, dizia o médico. Em breve, poderia retomar as aulas e a sua
vida de jovem promissora.
Porém, no hospital, durante a operação, que seria
pequena e corriqueira, as coisas correram mal. Muito mal. Como ninguém imaginou. Uns aparelhos não
foram devidamente ligados e utilizados. Com esta anomalia, a Maria ficou paralisada e dependente a cem por cento.
Para sempre. O hospital não reconheceu o erro, o
assunto vai-se arrastando em tribunal, as ajudas são só algumas, a mãe, a principal e
permanente cuidadora, faz tudo o que lhe é possível, com os fracos recursos de
que dispõe, mas Céu só o vê no nome da sua menina e na maior alegria que seria ouvir uma palavra dita por ela, o que não acontece desde que saiu do hospital há mais de cinco anos.
Quando
entrou para a sala de operações, a Maria levava todos os sonhos de uma jovem que queria viver feliz e ser advogada; quando de lá saiu, o céu dos sonhos tinha-lhe desabado, não deixando sequer antever uma nuvem de esperança.