quinta-feira, 26 de julho de 2018

Outra página de A Velha Casa e Outros Dias



Paixões e o jantar em Paris

Cheguei ao aeroporto de Francisco Sá Carneiro e, inesperadamente, vi  a  Vânia, pequenina, torrencial, gordinha, de cabelo claro, toda a vibrar num sorriso muito sonoro e muito aberto. Aproximou-se de mim, deu-me um abraço, disse-me que andava apaixonada por Fernando Pessoa, mas que às vezes até chorava com pena dele. Sobretudo quando ouve as leituras do  Pedro na aula, como se fosse o próprio poeta que  estivesse a escrever e a sentir.
- Fogo, setora! Viver sem paixões como o Ricardo Reis é que eu não aceito. Se ele soubesse como é bom!
E que continuava a trabalhar no café ao fim de semana. E que andava bastante cansada. E que hoje estava de folga. E que ia ter com a família que já se tinha afastado. E que vinha despedir-se do pai. E que tinha gostado muito de me ver. E que me ia mandar um texto que tinha escrito e que achava muito fixe. E adeus, professora, apareça na escola. E vou dizer à turma que a vi. E beijinhos, ...
E lá foi ela a correr, com o telemóvel na mão como se fosse a extensão de um dos braços.
Gostei de a rever e logo a situei na sala de aula, com os olhinhos a vibrar e a sorrir quando os assuntos a entusiasmavam.

À chegada a Paris, o David sorriu logo que me viu, levantando os bracinhos a pedir-me colo. Como está grande! Achei o António Pedro um pouco mais abatido, embora com o seu habitual sorriso juvenil.
Disse-me que o pior já tinha passado e que lhe falasse da viagem, da família, do que tenho escrito.
Logo depois de ter tirado da mala a polpa de dióspiro e o bolo-rei, a Jessie disse que estava na hora de começarem a preparar o jantar porque tinha convidado três colegas de trabalho, duas das quais a fazer investigação na Universidade onde Jessie trabalha.
Por isso, ao jantar e à volta da mesa, éramos nós os dois portugueses, a nossa escocesa, uma rapariga espanhola, outra italiana e outra turca.
Era, portanto, uma mesa cosmopolita. E, embora  eu reagisse com naturalidade, talvez tenha reparado mais na estudante de Istambul porque usava "hijab". Ela trouxe  uns docinhos maravilhosos para a sobremesa e café turco para acompanhar, que ela própria confecionou num tachinho, à falta do recipiente próprio.
À refeição, comemos salmão com vegetais e tudo estava delicioso.
O David já dormia enquanto jantávamos.
Eu acho que falei pouco porque ia pensando como eles, incluindo as raparigas que tinham pouco mais de vinte anos, sabiam tantas coisas e tinham tantas competências para interagir em contextos tão diferentes.
Realmente, só com a riqueza da diversidade, o mundo poderá evoluir mais.

terça-feira, 24 de julho de 2018

Flores de verão


Na ilha de Armona, olhando Olhão



segunda-feira, 23 de julho de 2018

Em Olhão, olhando o mercado


quarta-feira, 18 de julho de 2018

Uma casa de Londres em A Velha Casa e Outros Dias


A casa de Alice

Tinha-me ficado na lembrança a sugestão do Félix, naquele já distante fim de semana em Londres, inspirada no nome do Pub Alice House e de que ele falava numa carta.
O tempo foi passando e agora, de repente, surgiram-me estes versos, talvez atabalhoados e estapafúrdios:

A casa de Alice

Na casa de Alice
Mesmo sem qualquer tontice
A filha era Alice
Tal como a mãe
E como a avó
Que o mesmo nome tinha
 E a coincidência fazia dó

Um belo dia
Uma gata lhes deram
E sem qualquer fantasia
Era  também Alice
O nome da gatinha
Bem bonita e meiguinha

Para facilitar
Puseram-se a adaptar
A filha passava a ser Li
A mãe ficou Lili
E a avó Dona Licinha
Só a gata ficou Alice
O que não era tolice
Porque o nome era bonito
Para pessoa ou bichito

Mas se de repente alguém
Chamava por Alice
Não se sabia quem era
Ter outro nome  quem dera
Era o que todas diziam
E por acaso não mentiam
Tal era a agitação
Vindo nova decisão
A mais nova seria Licinha
A mãe  apenas Alice
E a avó Dona Alice
Para impedir a dúvida
E muito menos chatice

Mas então a gata
Que epíteto teria ela
Poderia ser Micaela
Mas não quiseram o nome mudar
Gata Lili passou-se a chamar
E sem miar ou rosnar
A gata ouviu e pôs-se a dormir
Cansada de tanta mudança
Para melhor compreensão
Sobretudo da vizinhança
Que mantinha a confusão

E chamadas por sílabas
Diminutivo ou palavra toda
Vivem felizes este outono
Sem qualquer fanfarrice
E ninguém sente abandono
Nem o nome nem seu  dono
Por isso bela é a casa de Alice


Quando os terminei, enviei-os ao Tó e ao Félix. Eu sabia que o meu filho não iria responder logo, porque anda sempre muito atarefado. E traz trabalho para casa. E há o David para cuidar.
Já o Félix enviou logo a resposta, dizendo que tinha achado piada, que era difícil ilustrar, mas que, mesmo assim, iria tentar com a ajuda da Maria Isabel.
Está tão ligado à neta que, julgo, continuará longo tempo em Moçambique. De facto, é um descanso para a Elsa saber que a filha está sempre acompanhada, tendo quem a leve e vá buscar à escola na hora certa e em segurança.
Hoje, ao fim da tarde, os meus pais e eu pusemo-nos à janela para ver a superlua.
Registei a imagem num pequeno haikai:
Lua/ Luz redonda/ Eclipsando o céu


Nota - A casa de Alice existe em West Hampstead, perto do centro de Londres.
 Acho o nome tão curioso que decidi incluí-la em A Velha Casa e Outros Dias.
Na esplanada, mesmo em dias cinzentos e frios, há sempre pessoas 
a conversar, com uma bebida sobre a mesa.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Em Chichicastenengo - Guatemala

Araras
O enorme mercado 
O colorido cemitério
Um tuk tuk

Tenho uma amiga americana que, periodicamente,
vai à Guatemala, com um grupo também de amigos, 
em missão de solidariedade. 
Partilham o seu saber e oferecem o seu trabalho
 para que várias famílias 
passem a viver melhor.



Obrigada, M. J. 

sábado, 14 de julho de 2018

ZAZ - "Je Veux" Legendado PT-BR

Elis Lovrjé - Cantora Croata no Brasil e Vidal França

Jacques Brel - Le Plat Pays.

Trump em Londres - O direito à indignação

Imagens da net

sexta-feira, 13 de julho de 2018

terça-feira, 10 de julho de 2018

Felizmente há luzes ao fundo do túnel!

Foto de LAUREN DECICCA

"Na Praia de Chesil"


É um filme que tem alguns ingredientes de que gosto: belas paisagens, uma história bem contada e com muita humanidade dentro, sentimentos fortes, artes como a música ou pintura, guarda roupa bonito, etc.
A história passa-se em 1962 e estende-se até outras datas assinaladas: 1975 e 2007.

O mar banha a praia de Chesil (na costa sul da Inglaterra), de imensas e pequenas pedras que são calcorreadas, em diferentes circunstâncias, um par de vezes pelo jovem casal (Florence e Edward) que acaba de se casar. 
A noite de núpcias é passada num hotel e o diálogo entre ambos revela medos, preconceitos, boas e más memórias, dramas familiares, desconhecimento da vida a dois, etc. O presente vai sendo complementado com imagens do passado que também justificam atitudes drásticas de desajuste sexual.

Ainda estava longe a libertação que muitos movimentos sociais e artísticos foram introduzindo.
Para a maioria dos jovens de hoje seriam inenarráveis os entraves mostrados à consumação do casamento e geradores de improváveis soluções.

A caracterização é fabulosa, sobretudo no final do filme, estando vincadas as marcas do tempo, apesar de a memória conservar um amor que parece ter durado sem qualquer disfarce artificial.


segunda-feira, 9 de julho de 2018

Também são belas as cores diferentes das rosas!


ANIVERSÁRIO

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim mesmo,
O que fui de coração e parentesco,
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino.
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa.
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
15-10-1929
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944