quinta-feira, 25 de abril de 2013
quarta-feira, 24 de abril de 2013
Saí à rua, claro!
Hoje, na despedida de uma aula, disse mais ou menos isto: meninos, um bom feriado e festejem a liberdade que o 25 de Abril nos trouxe. Nem imaginam o bem que é viver em liberdade.
Um aluno perguntou então: a professora saiu à rua no primeiro
25 de abril? Respondi que sim, claro.
Saíram todos da sala de aula e, enquanto punha os livros na pasta, ia
recordando esse dia de abril de 1974.
Logo pela
manhã, fui para as aulas na Faculdade de Letras do Porto. O curso de Românicas
funcionava onde é atualmente o ICBAS. Viam-se muito poucas pessoas na rua e
algumas ouviam o rádio portátil com muita atenção, tentando compreender todas as
palavras. O Porto estava estranhamente varrido de movimento.
Uma revolta
estava a acontecer em Lisboa e a queda do Governo estava para breve, ia-se dizendo de boca em boca.
Depois
de quase cinco décadas de fascismo, os mais velhos não sabiam se haviam de rir
ou de chorar. Não estavam habituados à liberdade e tudo era religiosa incerteza. Os mais novos participavam da surpresa assustada.
Voltei para
casa porque não haveria aulas. O sobressalto era enorme e aumentava a cada minuto.
À tarde, tu e
eu atravessámos a ponte Luís I e fomos festejar numa rua de Gaia onde alguém
falava da alegria que era a conquista da liberdade. Não me lembro do orador, mas era, com certeza, uma das poucas pessoas politizadas da época.
Ao fim da
tarde, já havia muita gente nas ruas. Tinham-se aberto muitas portas à Liberdade, desabando muros negros de medo.
Felizmente há Dias assim!
terça-feira, 23 de abril de 2013
A VERDADE HISTÓRICA
(Apontamento - meu:
Um belo poema
para ler devagar e ao sol!
Pode ser na cozinha)
A minha filha partiu uma tigela
na cozinha.
E eu que me apetecia escrever
sobre o evento,
tive que pôr de lado inspiração e lápis,
pegar numa vassoura e varrer
a cozinha.
A cozinha varrida de tigela
ficou diferente da cozinha
de tigela intacta:
local propício a escavação e estudo,
curto mapa arqueológico
num futuro remoto.
Uma tigela de louça branca
com flores,
restos de cereais tratados
em embalagem estanque
espalhados pelo chão.
Não eram grãos de trigo de Pompeia,
mas eram respeitosos cereais
de qualquer forma.
E a tigela, mesmo não sendo da dinastia Ming,
mas das Caldas,
daqui a cinco ou dez mil anos
devia ter estatuto admirativo.
Mas a hecatombe
deu-se.
E escorregada de pequeninas mãos,
ficou esquecida de famas e proveitos,
varrida de vassouras e memorias.
Por mísero e cruel balde de lixo
azul
em plástico moderno
(indestrutível)
ANA LUÍSA AMARAL,
"Minha Senhora de Quê", Quetzal Editores, Lisboa, 1999
na cozinha.
E eu que me apetecia escrever
sobre o evento,
tive que pôr de lado inspiração e lápis,
pegar numa vassoura e varrer
a cozinha.
A cozinha varrida de tigela
ficou diferente da cozinha
de tigela intacta:
local propício a escavação e estudo,
curto mapa arqueológico
num futuro remoto.
Uma tigela de louça branca
com flores,
restos de cereais tratados
em embalagem estanque
espalhados pelo chão.
Não eram grãos de trigo de Pompeia,
mas eram respeitosos cereais
de qualquer forma.
E a tigela, mesmo não sendo da dinastia Ming,
mas das Caldas,
daqui a cinco ou dez mil anos
devia ter estatuto admirativo.
Mas a hecatombe
deu-se.
E escorregada de pequeninas mãos,
ficou esquecida de famas e proveitos,
varrida de vassouras e memorias.
Por mísero e cruel balde de lixo
azul
em plástico moderno
(indestrutível)
ANA LUÍSA AMARAL,
"Minha Senhora de Quê", Quetzal Editores, Lisboa, 1999
domingo, 21 de abril de 2013
O grito da mãe e a gaivota comilona
Para a Inês
Era uma manhã
de sábado. Inês foi com a mãe e o pai ao jardim do Palácio de Cristal. A mãe de
Inês ia encontrar-se com uma amiga que também viria com a mãe.
No Palácio de
Cristal, havia umas barraquinhas com petiscos muito bons, caldo verde, docinhos
variados e deliciosos. Tudo tinha sido feito pelas pessoas que estavam a vender
com muita simpatia.
Pois bem, as
pessoas compravam o que queriam comer e pousavam os pratinhos em cima de uma
mesa muito comprida com uma toalha aos quadradinhos. O dia estava tão bonito
que as pessoas iam chegando sempre e já não havia mesas livres.
Foi então que
os pais da Inês e as amigas foram pondo os pratinhos em cima de um banco do
grande jardim do Palácio. Enquanto uns escolhiam e pagavam os alimentos, os outros iam
guardando o almoço que estava nos pratinhos.
Como cheirava
muito bem, junto das pessoas havia gaivotas e uns patinhos também passaram, mas
iam muito apressados para irem tomar banho nos lagos. Aconchegadinho a um ramo
de uma árvore, estava um pavão com uma cauda muito comprida e bem esticadinha. Um
bocadinho mais longe, havia outro pavão muito vaidoso. Abria as penas em leque para
todos verem como era jeitoso e colorido.
As gaivotas
eram muito bonitas mas um bocadinho indiscretas, porque aproximavam-se das
pessoas e eram preciso dizer xô xô várias vezes para que se afastassem. Parecia mesmo
que o bico se aproximava dos alimentos para os levar num abrir e fechar de olhos.
E uma gaivota mais
teimosa não se deixava convencer pelo xô xô e ia ficando sempre, andando de um
lado para o outro, conforme lhe cheirasse melhor. Essa gaivota, que era muito
comilona, e que podia ter o nome de gaivota-do bico-comprido, tinha deixado uma
gaivotinha do outro lado do rio porque ainda mal sabia voar e a mãe tinha medo que
ela se afogasse.
A gaivota
começou a olhar a comida que estava sobre o banco, mas não lhe podia chegar porque
ouvia sempre xô xô e uma mão a fazer o movimento de quem a mandava afastar.
De repente, o pai
de Inês viu que havia um bocadinho da mesa livre e assim todos se podiam
sentar, tendo onde pôr o prato sem segurar tudo na mão. Foram, então,
buscar tudo ao banco do jardim onde tinham posto os pratinhos.
Todos
transportaram os alimentos para a mesa. Quando a mãe da Inês vinha com os pratinhos
nas duas mãos, a gaivota levantou as asas, aproximou-se do prato e zás que se
faz tarde, deu uma bicada num rissol, prendeu-o bem e levantou alto voo a alta velocidade.
A mãe
de Inês deu um grito, porque a gaivota não se tinha aproximado dela sozinha.
Duas amigas tinham feito companhia à gaivota comilona, sobrevoando também o pratinho
dos rissóis para que fosse mais fácil a missão.
Quando se
sentaram à mesa, já sem o rissol, todos falaram da aventura. Bem no alto, no
céu azul, passou uma gaivota e outra mais pequenina a voar mais devagarinho.
A gaivota mais pequenina tinha atravessado o rio
com a mãe para ver Inês a fazer passos de balet na beirinha de um lago, perto de muitas
florzinhas brancas.
A gaivota
comilona olhou para baixo e disse à filha gaivotinha:
Vamos continuar a voar
porque o céu é muito bonito
Não quero voltar a assustar
A mãe de Inês que deu um grito!
A vendedora de bonecas
No jardim do Palácio de
Cristal, havia muitos artesãos que expunham os seus trabalhos.
Chamou-me a atenção um cesto
com bonecas de pano. Aproximei-me. Olhei as bonecas com atenção. Não gosto
muito de mexer nos produtos expostos. Penso que se toda a gente o fizer, tudo
fica mais desordenado.
Cativou-me uma boneca de cabelo
grisalho, avental e olhos serenos. Perguntei o preço: 15 euros. Pois, claro,
tem aqui muito trabalho. Sim, sou eu que faço tudo. A jovem expressão da artesã
era também serena, mas bem longe da idade grisalha.
Parabéns pelo seu trabalho.
Adivinho-lhe o pensamento: melhor seria que comprasses uma boneca. Não comprei.
Continuei a olhar, por uns instantes, a boneca de cabelo grisalho. A jovem
pegou delicadamente na boneca e disse, alisando-lhe o cabelo: a minha
grisalhinha!
A boneca ficou, mas também o
momento.
sábado, 20 de abril de 2013
O Porto tem sempre encanto!
"à" leia-se "há", é claro! Ah!
Moelas com "u" também ficam demasiado abertas.
É melhor mais fechadinhas
e escrever a palavra com "o" também ajuda.
Moelas com "u" também ficam demasiado abertas.
É melhor mais fechadinhas
e escrever a palavra com "o" também ajuda.
junto às barraquinhas de petiscos
e de artesanato
Uma fadista (também havia um fadista)
tinha pronúncia acentuada do Norte
e voz aquecida por muitas noites cantadas em tabernas do Porto.
A festa era também homenagem a esses locais
de convívio, sobretudo masculino em tempos
de antigamente.
Muitos deles são agora espaços gourmet
(um dos palestrantes pronunciava, com afetação, "górmê")
abertos, naturalmente, a homens e mulheres.
Rua Miguel Bombarda
- abertura de exposições
nas Galerias
e espetáculos de rua:
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