sexta-feira, 11 de outubro de 2024

É quase inverno, mas ainda falo de verão

 

Escrevi estes versos, no verão do ano passado, após um breve internamento de  urgência num hospital de Londres. 

Tinha lá ido visitar a família e festejar os meus anos.


 

Parabéns!

 

- Feliz aniversário, Maria!

- Ah! Então, como souberam?

- Vimos a data na ficha

E colegas nos disseram.

 

- Eu nunca nunca pensei

Vir hoje ao hospital;

Foi preciosa a vossa ajuda

Neste meu súbito mal.

 

- Sob estas nuvens de Londres,

Nós queremos trabalhar,

Pra todos serem felizes,

Com saúde e bem-estar.

 

- Vim do meu país de sol,

Pequeno mas com beleza,

Pra visitar minha neta

Que, juntamente com meu neto,

São minha grande riqueza.

 

- Noutros países nascemos,

Terras de eterno verão,

De cores várias e dimensão,

Mas grande pobreza lá temos.

 

 

- Também portugueses emigram

Para a vida melhorar;

Tantas vezes o esquecemos

Em vez de sempre o lembrar.

 

- Muito difícil é viver

Com a pele de cor diferente;

Ter coragem de partir

Enobrece a forte gente.

 

- Obrigada pelo bolo

Com velinha e doçura;

Para vós, mil parabéns

Pelo saber e ternura!

 

O texto juntou-se a outros mais da coletânia Mimos de...,
publicada pela Editora Lugar da Palavra.

sábado, 5 de outubro de 2024

A Portinha

 

Há nomes na nossa vida que passam a ter um sentido próprio para quem os usa. Adotamo-los sem os questionar. É o caso da Portinha.

A Portinha era um terreno que as minhas tias tinham fora, mas perto da casa de lavoura onde sempre moraram enquanto viveram. 

Logo que se entrava na Portinha, havia uma ramada e um enorme castanheiro. Por esta altura do ano, havia a vindima. A nós, os mais pequenos, cabia apanhar do chão os pequenos cachos (dizíamos gaipas) de uvas que iam ficando para trás e estavam ao nosso alcance ou caíam ao chão para serem aproveitados.

Queríamos era apanhar os cachos a sério, subindo ao escadote e usando tesoura de poda,  mas era o tempo em que o querer de criança era como a parra da uva: pouco interessava para o efeito.

Ora, a limitar este espaço havia um muro que terminava com uma entrada para a horta, onde havia diferente hortaliças - nesta altura também havia nabos com rama alta e muito verde -, flores para o cemitério, onde estavam os antepassados -, e um grande espaço de erva onde a roupa era posta a corar. Se havia sol e estava calor, era regada devagar com um regador, para que ficasse mais limpa e branquinha. E havia muitas vezes umas toalhinhas pequenas de felpo que eram regadas para que as manchas saíssem. Só mais tarde lhes conheci a função e desvendou-se o mistério.

Lembro-me muitas vezes da Portinha que deixei de ver desde que as minhas tias faleceram e deixei de ir à velha casa.

Feliz ou infelizmente, não sou muito saudosa, mas estou grata (palavra muito usada atualmente e oxalá não se gaste) por ter tido essas experiências até à minha adolescência. 

Nem sei se a Portinha ainda existe, porque foi construído um viaduto nas imediações, espaços desportivos e uma estrada onde se pode caminhar.

São boas as portinhas que a vida nos vai abrindo, nem que sejam como pequenos cachos de uvas que vamos agarrando para que não desapareçam no chão.


sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Andamos todos zangados?

 

Ontem à tarde, na Assembleia da República - conhecida pela Casa da Democracia - discutia-se o Orçamento de Estado e todos estavam zangados, chateados, mal humorados, afinados, furiosos, exaltados…

Nas intervenções dos governantes e deputados, era quem mais queria evidenciar o seu trabalho e maldizer, criticar, desprezar, anular as pretensões e palavras dos outros. 

Uma guerrilha teimosa e feia, uma crispação nada exemplar. Cada um atirava palavras duras, culpabilizadoras, jogando ao ataque e à defesa ao mesmo tempo. Enquanto isso, os sobrolhos carregados faziam prever que quando não  há entendimento, não há orçamento. Tudo irrevogável.

E tudo se encaminhava para um virar de costas nas negociações - um namoro conflituoso que terminava com ofensas na praça pública que assistia à prolongada e grande gritaria. Não, o casamento não era possível e no ar, e na AR, pressentia-se o fechar do pano de uma longa novela, enquanto se apregoava: ‘Está tudo terminado entre nós.’

Eis senão quando, passadas umas duas horas, o casamento entre o casal desavindo voltava a ser possível, o incêndio das palavras abrandava e o diálogo aproximava-se da porta para entrar.

Que bom - disseram uns, o país não aguenta com tantas eleições em tão pouco tempo.

É preciso esperar - diziam outros mais prudentes -  porque os noivos ainda não contaram a história toda e podem afastar-se outra vez.

Enquanto isto, e também por causa disto, o país vai-se mantendo tristonho, zangado e crispado. Ah, e de sobrolho carregado.

Se eu fosse nova, emigrava. Só vinha cá de vez em quando. Para não desaprender de ser feliz.


quinta-feira, 3 de outubro de 2024

O ministro zen?



Quando António Leitão Amaro, ministro da presidência, aparece, eu fico, quando posso, a observar as suas palavras e os gestos. 

Porquê?

Ele fala pausadamente, dividindo bem as sílabas das palavras, acompanhando o discurso que profere de gestos com as mãos, juntando o polegar ao indicador, mostrando que nada está a escapar à sua equipa de governo e que o caminho tem sido perfeito, como nunca foi. Está implícito, é claro, que os outros é que estragam tudo.

Ele aparece perante as câmaras para apaziguar, explicar, justificar, ‘amar a todos como a nós mesmos’, como numa aula imaginária e bondosa para crianças sentadinhas que se limitam a ouvir e a sorrir. Tudo muito zen, límpido e transparente. Ah, e ‘com sentido de estado’, que é expressão muito usada por quem está no poder e que assume múltiplos sentidos, consoante o momento.

Mas gabo a paciência do jovem ministro e a visível lealdade ao seu líder e a uma causa que, nas suas palavras lentas e quase soletradas, parece não ter mácula. Mas tem, como tudo na vida, corra ela mais depressa ou devagar.

De facto, (tentar) representar bem também estará no rol de quem é político. E se essa capacidade ajudar a pacificar e desenvolver o país, tanto melhor. Ainda que, confesso, às vezes o excesso até dê vontade de rir ou, pelo contrário,  não tenha piada nenhuma, se o que se diz é bem diferente do que se faz.

Seja como for, mais vale ser zen do que incendiário como, infelizmente, também os há, dentro e fora do governo. Estes correm depressa para as câmaras de televisão para que, sempre a velocidade cruzeiro, nenhum descontentamento lhes escape e com ele só eles possam ganhar.

É caso para dizer:

Nem tanto ao mar nem tanto à terra, ou seja, nem tão devagar nem tão acelerado. E, sobretudo, que bom seria que os políticos fossem, de facto, mais francos, na prática e não só na teoria, porque são muito importantes na vida de um país.

Mas, às vezes, dá vontade de desligar do que dizem e fazem para ter(mos) momentos verdadeiramente mais zen, no recato (outra palavra atualmente muito usada) da nossa vida do dia a dia.


terça-feira, 1 de outubro de 2024

Com franqueza!

 

Há governantes que repetem sistematicamente chavões como ‘sejamos francos’. Ora, é fácil concluir que se precisam de repetir tanto que estão a usar a franqueza, é porque mentem mais do que deviam ou tomam para si apenas o lado da verdade que no momento mais interessa. Muitos políticos parecem estar demasiado habituados a estes filtros da verdade, consoante o momento e o interesse, manipulando e pretendendo puxar muitas pessoas para o seu lado, ou melhor, cativando votos que, em qualquer altura, podem ser necessários.

Bem fora da cena política, que os media mostram e tantas vezes exploram também consoante a sua linha editorial, conheço  alguém que, em meia dúzia de frases, usa sempre a expressão ‘sou sincera’. Pelo que se conhece, a realidade é por ela alterada com frequência e sempre a seu favor.  Observar esse comportamento chega a ter graça, mas quem está a ser visado não achará  piada nenhuma.

Antigamente faziam-se juras para garantir que a verdade estava bem viva e presente. Não sei se estão a cair em desuso, porque não as oiço tanto. Quando eu era miúda, até em pleno jogo da macaca, lá saíam juras e logo se ouvia em resposta: quem muito jura muito mente.

Também se diz que ‘a mentira tem perna curta’, mas, com perna curta ou perna longa, ela nasce e corre em demasiadas direções. E há mentiras que são ditas e postas a circular de tal modo que se confundem com verdades que influenciam e tornam tudo mais opaco, ainda que se proclame a transparência.

Não é por se apregoar a franqueza que ela existe, pelo contrário, leva até à descrença e à desconfiança, porque mais importante do que dizê-la é praticá-la, por pessoas anónimas como eu, ou por figuras públicas que marcam rumos do país.

Porém, muita da prática atual encaixa-se num pequeno provérbio: ‘Bem prega frei Tomás, olha para o que diz e não para o que faz’.


segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Porque hoje é 2a feira

 

Estou sentada no hall de entrada. Pela janela entra a luz do sol. Apetece-me dizer um lugar comum ainda que verdadeiro: hoje está sol, mas amanhã não se sabe. E o melhor será aproveitá-lo (embora nesta fase da minha vida tenha de redobrar os cuidados com o sol). Aliás, nunca se sabe o que pode acontecer no dia seguinte. Esse é um dos mistérios da vida. E talvez um dos seus encantos,  embora tantas vezes inquietantes. E desafiantes,  como agora se diz muito.

A minha cadela vai ladrando lá fora, reagindo a quem passa na rua. Se vir outros animais, a reação é maior. Não sei se é alegria ou é pena de a visão ser passageira. Quando ela me ouve na cozinha, aproxima-se da porta e fica longo tempo sentada junto à soleira da porta. E vêm-me à memória imagens da minha infância: eu ficava junto do quarto da minha mãe, enquanto ela dormia a sesta, à espera de restinhos de panos  para eu fazer roupa para as bonecas. A paciência era grande e o tempo mais comprido.

O que trará a semana que hoje começa? O orçamento de estado terá fumo branco? As guerras continuarão a matar e a causar pânico em tantos seres indefesos e sem culpa nenhuma das nuvens de fumo negro que sobrevoam os céus e sufocam as cidades? Que notícias felizes cada um de nós receberá? O que acontecerá que pode causar tristeza? Tanta incógnita e tanta descoberta pelo caminho dos dias!

Que pequenas coisas podem revelar que o ser humano é mais humano se houver mais verdade e mais beleza?

Sê bem-vinda, 2a f. Vem feliz e formosa para todos, ainda que insegura! 


sábado, 28 de setembro de 2024

Os rapazes continuam desavindos


Ontem, quando muita gente previa que o longo drama do orçamento de estado ia ter um final feliz, eis que, afinal, o palco continua aberto para novas cenas e atos.

E a culpa, que continua solteira, não tem mãos a medir. Ora é chamada por um dos principais protagonistas, ora é chamada por outro num jogo de acusações, fazendo esquecer os cumprimentos e sorrisos à chegada e à partida do encontro tão aguardado, leia-se desencontro, em S. Bento.

Cada um o mais teimoso, cada um a chamar radical e inflexível ao outro.

Entendam-se, caramba. O IRS jovem é injusto, muito caro e satisfaz apenas uma pequena minoria? 

Ponham-no de lado. Mas não ponham de lado os milhões de portugueses que não querem andar sempre em eleições. 

sexta-feira, 27 de setembro de 2024

Parar e olhar ou a planta quase esquecida

 

Como já devem ter percebido, com certeza, gosto de flores e de plantas, porque sempre vivi com elas por perto. Mesmo durante os anos que morei num apartamento, tinha vasos na pequena varanda.

Ora, isto vem a propósito da planta da foto.

Precisava de uma planta para um recanto da minha casa. Disse à minha filha e logo procurámos plantas num site. Algum tempo depois, lembrei-me desta planta que vivia num anexo da minha casa, onde já tive, há muito muito tempo, coelhos e galinhas.

Que bonita, pensei eu. Vai ficar bem dentro de casa. E - o que não é menos importante - poupo tempo e dinheiro. 

Não sei é se a planta vai gostar da mudança e do sitio, como dizia a minha mãe.

Às vezes, nem reparamos com atenção no que temos de bom e de bonito bem perto de nós, digo eu. E não falo apenas de plantas.


quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Músicas que moram na (minha) cabeça!

 



quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Tudo boa rapaziada!

 

Tal como muitos portugueses que estão mais por casa, tenho acompanhado a guerra, ou melhor, guerrilha, por causa do orçamento de estado. Ele é uma chuva de comunicados, de encontros que para uns são secretos e para outros apenas discretos; de palavras trocadas e escondidas pela mão para ninguém perceber; de sorrisos cínicos seguidos de palavras que se dizem transparentes; subidas e descidas de escadas como numa sorridente  passerelle com o modelo mais atraente; afirmações que se fazem como se fossem definitivas e que duram apenas enquanto duram…

E não podia faltar o famoso ‘irrevogável’ que Paulo Portas inaugurou um dia, palavra que, a partir daí, passou a significar também ‘isto não é para levar a sério’!

E muita da rapaziada da cena política vai dizendo, com ar sério e patriarca, que tudo faz e que tudo fará para o bem das portuguesas e dos portugueses - como agora se diz para que a pose na fotografia fique numa moldura melhor.

Se assim é, porque existem tantos jogos, tantas mentiras, tantas meias verdades, tanto amor próprio e não pelo próximo, tanta sede pela fonte do poder?!

Entendam-se, rapazes, e não nos arrastem para eleições que ficam muito caras e nos cansam cada vez mais, de tão frequentes que têm sido.

Se a guerrilha continua, muita gente se interrogará:

Será que é/está boa esta rapaziada?


sábado, 21 de setembro de 2024

‘A paz sem vencedor e sem vencidos’


Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos 

A paz sem vencedor e sem vencidos 
Que o tempo que nos deste seja um novo 
Recomeço de esperança e de justiça. 
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos 

A paz sem vencedor e sem vencidos 

Erguei o nosso ser à transparência 
Para podermos ler melhor a vida 
Para entendermos vosso mandamento 
Para que venha a nós o vosso reino 
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos 

A paz sem vencedor e sem vencidos 

Fazei Senhor que a paz seja de todos 
Dai-nos a paz que nasce da verdade 
Dai-nos a paz que nasce da justiça 
Dai-nos a paz chamada liberdade 
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos 

A paz sem vencedor e sem vencidos 

.

in "Dual" de Sophia de Mello Breyner Andresen

 

Leonard Cohen faria hoje 90 anos

 


sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Chove


Vem, chuva, és um bem tão necessário 

Depois de dias e noites de calvário

Vem sossegar os nossos fogos

Que chamam e angustiam 

Os visíveis e os invisíveis

Dentro e fora de  nós

Para que possamos sentir

Que afinal não estamos sós.


És tão necessária, chuva,

E não estou a pensar só no meu quintal

O espaço em que se vive 

É bem maior e alargado

Embora seja justo que cada um 

Queira proteger o seu quintal

Mas não  culpando sempre os outros

Do que acontece de mal.


Vem, chuva, mas não percas a brandura

Para que a afogueada secura 

Não atropele mais o chão 

Precisamos de mais calma

Verdadeira e sincera 

Que não escape à nossa mão!

 

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Quem pergunta ofende?

 

- Muitos dos atuais incêndios rurais acontecem ou aconteceram em zonas onde vivem pessoas  (às vezes poucas) pobres e velhas. Se assim não fosse, teria havido meios mais céleres e eficazes para apagar esses fogos?

- Que resposta teria sido dada pelas autoridades aos autarcas que se queixaram de não terem ajuda, perante o avançar das chamas atingindo populações?

- O governo quer que as contas dos prejuízos com as áreas queimadas sejam rápidas.  Vão também substituir o provérbio ‘Depressa e bem há pouco quem?’


Bom dia a todos e que esta vaga de incêndios termine o mais depressa possível.


quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Em pleno inferno, também se elogia!


O famoso jornal londrino não foi indiferente ao inferno que muitas regiões do nosso país estão a viver, incluindo Gondomar. 

O fogo também rondou o meu quintal e terrenos vizinhos, sob grande ventania e escuridão, apesar de ocorrer em pleno dia, em cenário assustador. Voavam partículas a arder que aonde chegavam pegavam fogo. Valeu a ajuda preciosa de todos os moradores. Como em inúmeros lugares por esses terríveis incêndios  fora. 

Os fogos atormentam agora outras zonas a que chamamos ‘alto do concelho’, sendo muita gente obrigada a abandonar as suas casas.

Quem vive os incêndios quer sempre a presença dos bombeiros, mas estes avançam, o que se compreende, para males maiores como casas em risco. Possam os bombeiros em breve descansar de tanta exaustão, porque são mesmo soldados da paz, apesar da escassez de recursos.

E, neste momento, estou a ouvir (talvez) os canadairs tão necessários e bem-vindos. Ainda bem.

Mas, voltando à notícia do jornal The Guardian, a foto mostra Covelo, em Gondomar. Nesse lugar, mora uma senhora que trabalhou uns quarenta anos em minha casa. Ficámos amigas e todos nós reconhecemos as qualidades dela. Neste momento tão difícil para tantas populações, realço uma das suas práticas:  manter uma faixa sempre limpa do terreno junto à casa.

Muitas pessoas e autarquias deviam seguir-lhe o exemplo. Não evitaria este horror provocado por fenómenos naturais e, com certeza, por mão criminosa, mas reduziria tanto sofrimento.

Obrigada, Rosa, por, anonimamente, seguir o lema: ‘olha para o que eu faço’ e não o lema de muitos políticos: ‘olha para o que eu digo’.


segunda-feira, 16 de setembro de 2024

E não custa nada!

 

Conheço casas com jardins ou quintais - ainda que pequenos - onde há uma mesa, uns bancos, mas onde ninguém descansa um pouco ou desfruta das plantas que estão à volta, do céu que nunca se esconde, mesmo com nuvens, não aproveitando nunca esses bens simples e bons.

Esses bancos, onde as pessoas se podiam sentar tranquilamente de vez em quando para manterem ou recuperarem energias, servem muitas vezes para pousar coisas utilitárias que podiam viver noutro lugar e deixar aquele espaço mais livre e mais convidativo. E mais bonito.

Muitas vezes, as pessoas têm as coisas, mas não lhes cumprem a função. Parece que é pecado parar e não fazer nada de vez em quando, se o corpo e a alma pedem um pouco de repouso, ou simplesmente apetece e a paragem a ninguém prejudica.

Parar quando se pode também é preciso, sem culpas nem receios de lembrar a preguiça. E a preguiça, cujo peso pecaminoso se foi esbatendo com o tempo, também pode ser necessária para o equilíbrio humano.

E se se tem um banco no jardim ou no quintal, por que não dar-lhe uso? São dois em um e quem o faz fica a ganhar. E também quem está à sua volta, incluindo as plantas se as houver. Parando um pouco, ouvindo sons da natureza,  cresce a atenção aos pormenores e àquilo que escapa quando a pressa e a azáfama não deixam ver as diferentes cores e muito menos as tonalidades.

Ter as coisas e não as usar também é desperdício e, cada vez mais, temos de as ulilizar o melhor possível. Sobretudo quando não custa nada.


sábado, 14 de setembro de 2024

Olivença, de quem és tu?

Imagem da net


Gostava de ir a Olivença

Terra que não conheço

Muito pertinho de Beja

Para uns é portuguesa

Para outros espanhola

E todos terão razão

Uns dizem ser espanhóis

Outros dizem que Portugal

Lhes está no coração!


E ontem o ministro da defesa

Em cerimónia militar

Vestiu fato de líder político

E mesmo sem ser o momento

Abriu o seu pensamento

E lembrou que Olivença 

Pertence a Portugal

Servindo o assunto do dia

Mesmo sem pôr avental!


E logo criou incómodo

Em pelouros do poder

Que resolveram calar

Porque não era lugar

Pra tal assunto trazer!


E o vento foi despenteando 

O farto cabelo branco

Do ministro que é cioso

Da terra de Olivença

Que entende ser pertença

Do nosso Portugal

Que é dono do ‘bocadinho’

Que está do lado de lá

Mas que por justo direito

Pertence ao lado de cá.


Ainda vai ouvir raspanete

Do seu chefe e primeiro ministro

Que gosta de brilharete

E de apregoado recato

E não do que gera polémica

E que se possa dizer

‘Este ministro é um prato’!


sexta-feira, 13 de setembro de 2024

E estas também são flores…


 … embora não as olhemos do mesmo modo que aquelas que plantamos, regamos,  colhemos ou compramos.
Até preferíamos que ervas e flores daninhas nem aparecessem.

Porém, as abelhas querem-lhes bem porque sem flores - incluindo as bravias e espontâneas - não têm alimentos e não sobrevivem. 

E a humanidade, sem abelhas, também não.


quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Ai flores, aí flores, do meu quintal!

 







E impossível não me lembrar desta cantiga de amigo, da autoria de D. Dinis.


segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Gosto do silêncio, mas não podia ser monja!



A região do Douro tem paisagens inigualáveis. Vendo-as, à cabeça - consolados que ficam os olhos - vêm-me palavras como beleza, perfeição… 

E há lugares onde mora o profundo silêncio. Nada se ouve, talvez para se ver tudo melhor.

E eu, que gosto do silêncio,  penso para mim ao fim de algum tempo: também me faz falta ver pessoas. Não, não podia ser monja!!!

Isto ocorre-me talvez por aquelas belíssimas paisagens terem a marca da mão humana, reveladora de um trabalho quase divino.


sábado, 7 de setembro de 2024

Tanta coisa aconteceu neste verão!

 

Gosto de chuva mansa, sobretudo quando o quintal e o jardim precisam de água. E não só, é claro, porque a seca vai rasgando o manto da terra.

Fiquei contente quando vi os pingos de chuva a escorrer na janela. Era pouca, mais ou menos como quando o meu neto pega no restinho de água dos copos e deita nas plantas porque também têm sede como nós.

A terra com esta chuva não ficará saciada, mas, pelo menos, refrescada.

Talvez seja o outono a aproximar-se ou pingos de cansaço do verão cada vez mais quente.

Tanta coisa aconteceu neste verão. Felizmente, ainda há calma e paciência para se olharem os pingos de chuva, ainda que escassos.


Bom fim de semana!

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Queria ter coragem de desligar!


Sempre gostei de ver debates sobre os mais variados temas, nos quais também cabe a política.

Mas às vezes fico irritada com o que vejo e oiço (não só com o discurso deste governo!) e, se não mudo de canal, ainda mais irritada fico, sobretudo comigo própria.

Irrita-me, por exemplo, ouvir perguntas a políticos e estes desviarem-se habilmente do que é perguntado, respondendo com coisas vagas, atribuindo culpas aos antecessores, apregoando projetos  para o futuro, ou fazendo crer que tudo é ‘cristalino e transparente’, não se importando, porém, de tornar as coisas ainda mais opacas.

Também me irritam frases feitas que mais não são do que modos de chutar para canto problemas impopulares que não dão votos.

Por exemplo, o caso da privatização da TAP dava para uma tese. São tantos os argumentos, os contra-argumentos, as defesas, as acusações, as verdades de uns que são mentiras para outros tantos…

Outra afirmação que irrita é ouvir políticos acusados e, alegadamente, com provas, afirmar, angelicamente, que têm a consciência tranquila!!!!

E penso para mim própria: era bem melhor continuar a leitura do livro, ao menos, aprendia alguma coisa!

E penso também: ao longo da vida, vamos aprendendo tanto e uma coisa simples como desligar a televisão às vezes ainda custa!


quinta-feira, 5 de setembro de 2024

‘Avó, qual é o mais pior?’

 

Nestas férias, a minha neta - a Clarinha que vive em Londres - esteve cá bastante mais tempo do que é costume, por razões que estão no post anterior.

Eu cheguei a dizer que ‘há males que vêm por bem’, porque assim a Clarinha consolou-se de brincar com os primos e ficou a falar melhor em português. Ah, e aprendeu a andar melhor de bicicleta. Oh, happy days!

E foi captando muito do que ouvia. 

Um dia, perguntou- me: Ó avó, qual é o mais pior,  é dizer Poça!, ou dizer Fogo!?

Embora não goste muito de estar sempre a corrigi-la (até porque acho piada a certas expressões e não quero que se sinta constrangida), aproveitei para fazer a pergunta mais corretamente e ela repetiu ‘qual é o pior’…

Pois bem, pensei uns segundos e respondi:

- Eu acho que é Fogo!, querida.

De repente, ouviu os primos e foi a correr brincar com eles. 

E assim não me perguntou porquê!!!



quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Também gosto muito, disse eu!


 
Uma amiga partilhou esta canção comigo. 
Também gosto muito, disse-lhe eu.
Obrigada.


terça-feira, 3 de setembro de 2024

‘Ainda tenho tanta coisa que gostava de fazer!’


Com o início destas férias de verão veio um crescente cansaço e com ele os costumeiros comentários e conselhos:

- É do calor. Tens de descansar mais. Também não paras!

O melhor era mesmo fazer as análises já prescritas há bastante tempo. 

Por email, chegaram os resultados. No meio de letras e números pequeninos, apareciam os valores de uma anemia. Das grandes. 

Em poucos dias, sucederam-se exames. O primeiro -  colonscopia - deu logo o alerta.

Como é possível? Não doía nada! Tudo parecia normal.

Em casa, entravam palavras até então pouco usuais: ferro, consulta, hospital, internamento…

- E agora? E as vossas férias já marcadas?

E eu que não gosto nada de estragar a festa!

- Mãe, há prioridades. O que é preciso é resolver isto quanto antes.

E, num sábado de agosto, veio a cirurgia.

- Como se sente? Correu tudo bem!

Que bom, então.

E ontem a consulta sobre o que já se sabia  sobre o intruso no intestino, que, felizmente, deixou limpas as proximidades da área, onde se tinha instalado e donde foi retirado.

Que alívio!

Mas logo veio a comunicação (já esperada) de quimioterapia e, com ela, as necessárias explicações sobre esse tratamento preventivo.

- Concorda?

- Claro que sim, senhora doutora, se tem de ser…

É que gostava ainda de fazer tantas coisas!


Nota 1 - Façam(os) os exames que os médicos ou  o SNS aconselham. Embora nem sempre apeteça, pode ser que não tenhamos tantos percalços, e sejamos mais felizes, bem como aqueles que nós amamos e que nos amam também.


Nota 2 - Muita saúde para todos e festejemos  a beleza da luz de cada dia. 


domingo, 1 de setembro de 2024

Por falar em Escola…


 Apesar de terem passado muitos anos, tenho  bem presente o meu tempo de conselho diretivo numa escola secundária. As minhas filhas eram muito pequenas e eram quase sempre as últimas a sair da escola (privada que frequentaram até ao quarto ano, passando, depois, para o ensino público até final dos cursos), porque o trabalho na escola parecia multiplicar- se.

Apesar de muito trabalho, tanto na escola como em casa, foram quatro anos que me trouxeram muita felicidade, apesar de muitos constrangimentos. Nesse tempo, as equipas  que geriam as escolas eram eleitas por todos os docentes, ao contrário de agora em que a eleição é feita por um conselho de representantes da comunidade escolar e educativa.

 Nesse tempo, para gerir a escola, não era necessário ter cursos específicos de gestão escolar. Valia-nos o gosto pela boa gestão e harmonia daquela comunidade para a qual havia muito trabalho comum. Ah, e um grande amor ‘pela camisola’. No entanto, sou a favor de cursos de maior especialização.

Os serviços não estavam informatizados como agora. Com tentativas e erros, trabalhávamos no sentido da melhoria dos diferentes setores. Por exemplo, ver os equipamentos da cantina mais modernos foi uma alegria, porque, assim, alunos, professores e funcionários passariam a ter melhores condições de trabalho e de utilização.

Uma área que muito fascinava era ver sucessos dos alunos, fossem eles na avaliação, na participação em atividades, etc., áreas em que muitos professores se empenhavam de alma e coração e em que funcionários também colaboravam.

Foi um tempo de grande entusiasmo e aprendizagem, embora momentos menos bons também existissem, como é natural, e que tentávamos superar.

Em todos os tempos, a gestão escolar - quando desenvolvida de porta aberta - não é fácil e a exigência sempre foi crescente.

Conheço muitos casos de grande dedicação e competência, tanto do passado como no presente. Possa assim continuar porque a vida da escola é um mundo.

 E todos esperam e desejam um Mundo em progresso e sempre melhor.


quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Eu não, obrigada!

 

Não sei se está a ser aceite ou não a proposta do governo de os professores reformados poderem continuar a dar aulas. Pode até ser uma medida que ajude a resolver o grande problema da falta de professores, mas parece-me que revela desconhecimento da vida das escolas, por parte dos decisores, 

Quase todos os professores em final de carreira e, sentindo grande cansaço, anseiam por vir para casa e fazer outras coisas para as quais não tinham tido tempo enquanto lecionavam. 

Ora, querer continuar na escola ou a ela voltar implica que os professores em fim de carreira gostem muito da escola, que o seu trabalho seja reconhecido pela direção e pela comunidade; o salário seja estimulante e saibam claramente o que vão fazer.

Para juntar a este leque, existirão, por certo, alunos, que, logo no primeiro contacto, dirão: mais um velhote.

Também os colegas mais jovens olharão (desculpem se tal não acontece) a generalidade dos já reformados como seres muito dependentes da escola, mas que pouco sabem de coisas fundamentais nos nossos dias como são as novas tecnologias.

A classe docente está bastante envelhecida e os que amam a Escola e a Educação gostariam de ver mais jovens a ingressar na profissão docente, mas será que fazer mais sacrifícios e ter mais constrangimentos depois de tantos anos de trabalho vale a pena?

Não conheço ninguém que vá continuar na escola após a reforma, mas, se houver professores que o façam, parabéns pela força e coragem.

No entanto, conheço docentes que continuam na escola, não para dar aulas, mas em funções ligadas, nomeadamente, à arte, à ciência, às bibliotecas…. Nesse caso, poderá ser estimulante, mas, mesmo assim, só se for compensador e uma mais-valia pessoal.

Vou repetir uma ideia já por demais dita e redita:

Deixem-nos descansar, deixem-nos viver sem cumprir tantas obrigações. Sem o tic-tac do relógio, que torna a vida ainda mais breve. 

A menos que a vida seja, assim, mais feliz, mas, nas circunstâncias atuais, não me parece.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Ouvir falar muito também cansa!


O post anterior era um diálogo entre duas pessoas - uma não sabia ouvir os outros e preferia falar, faltando-lhe empatia para ver que estava a ser incómoda pela situação frágil de quem estava do outro lado, recém-operada, e que precisava de descanso e não  de ouvir longas peripécias.

Todos conhecemos pessoas assim: esquecem-se - mesmo sem querer e sem ser por mal - das necessitadas da pessoa com quem estão a interagir e não descolam de si. Muitos de nós somos assim, em diferentes doses. Também me acontece, infelizmente,  e  fico triste quando caio em mim.

O amigo JR até pensou que era piada e fez-me voltar ao texto. Podia ser graça, mas existem situações idênticas. Alguém está doente, mas o interlocutor acha que esteve ou está ainda pior, contando todos os pormenores como se fossem únicos.

Faz lembrar o ‘Não se esqueça do que vai dizer’, intercalando um longo relato de algo que se passou e que, facilmente, faz cair o que ia ser dito pela outra pessoa.

Ouvimo-nos muito mais a nós do que às outras pessoas. Muitas vezes falamos mais do que ouvimos. Nalguns casos, até nem é grave; noutros, é uma seca que só com muito controle não seca a paciência!!! Ou provoca ainda mais cansaço a quem precisa de o vencer.


sábado, 24 de agosto de 2024

Está melhorzinha?


Ex-doente  - Então, está melhorzinha?

Doente - Obrigada. Para já, está a correr bem, mas continuo cansada, sobretudo quando falo.

Ex - Foi como eu quando fui operada há uns anos. A recuperação foi tão complicada! Nem imagina. Ainda agora o sinto só de pensar nisso, Até me custava falar. Eu bem queria, mas tinha muita dificuldade!. Sabe o que eu fazia? Às vezes, recorria aos gestos. Imagine como eu estava.

D. - A mim, o cansaço ainda não me largou.

Ex. - Eu sei. Oh, se sei, porque já passei por elas. E de que maneira! E, agora, as coisas estão mais facilitadas; no meu tempo, sofria-se mais. O que me valeu foi o meu médico. Ele é um grande especialista. O consultório dele é em Gaia e com vista para o rio. Um luxo de consultório e um luxo de médico. Só me zanguei um bocadinho com ele uma vez. Eu estava tão mal, tão mal que o chamei a casa, já depois da operação, e ele disse-me que não podia vir. Nem imagina como fiquei.

D. -, Em breve, vou ficar sem bateria.

Ex. - Eu também não demoro. É só mais um bocadinho. Voltando ao médico, eu disse-lhe que quem segue esta profissão tem de estar disponível para quem chama porque está  a sofrer. Sabe que não me respondeu! É porque enfiou a carapuça, não acha? Diz-se que quem cala consente, não é verdade?

D. - Desculpe, a minha bateria vai mesmo terminar e, para além disso, estou mesmo cansada. Ade…

Ex - Para os seus botões: 

Tirei uma  boa parte da tarde para falar com ela, até me encostei às almofadas para conversar durante mais tempo e para não me cansar, e, afinal, nem sequer se dignou levantar-se para pôr o telefone a carregar. As pessoas são cada vez menos generosas e mais egoístas. Só pensam em si! Que mundo este!


terça-feira, 20 de agosto de 2024

Eu amo-o, senhora enfermeira!


Do que Alcina menos gostava no hospital era das noites Custava-lhe a luz forte e comprida da parede em frente, que ficava acesa até muito tarde. Também a vozearia das enfermeiras e das auxiliares a perturbava.  Porém, não fazia críticas, porque, desde pequena, a isso não fora habituada e a reação implicava sempre ralhetes e o pior era fazerem-lhe crer que ela não tinha direito a opinião.

Nesses momentos, fechava os olhos, parecia dormir, mas estava bem acordada. Deixava fluir o pensamento, com muitos avanços e recuos. Era então que muitos dias do passado lhe afloravam ao pensamento. E lá se desenhavam momentos sem nenhuma cor de qualquer carinho. Vinham também monólogos antigos que não deixavam tempo nem permissão para qualquer resposta ou defesa.

E a falta que lhe faziam mimos, beijos e abraços. Se ao menos tivesse  tido uma tia ou uma avó que a acarinhassem, mas nem isso!

Só o médico que a acompanhava no hospital parecia compreendê-la. Mais vale tarde do que nunca - pensava ela. Ele tratava-a pelo nome, ouvia-a e olhava-a com atenção e ela sentia que era bom ter nascido.

Numa noite, em que as insónias a faziam virar e revirar na cama vezes sem conta, já com dores no corpo e no pensamento, a mão premiu, repentinamente, a campainha de chamada.

A enfermeira de serviço entrou, acendeu a luz e perguntou:

- Quem tocou?

- Fui eu - disse D. Alcina,  com voz fraca e quebrada. 

- O que se passa? De que precisa? 

- Peço  desculpa, senhora enfermeira, mas eu amo-o.

- Não entendi - respondeu a enfermeira, conchegando-lhe a roupa da cama, enquanto perguntava apressada e perplexa:

- Você gosta de quem?

D. Alcina, olhando-a, pensou: ‘você’ não entenderia e disse, fechando os olhos:

- Desculpe, senhora enfermeira, estava a sonhar!! 


domingo, 18 de agosto de 2024

Senhor doutor, mande-me embora!

 

O médico, simpático como sempre, chegou à enfermaria para falar com a doente da cama 10, perto da porta. Pergunta daqui, resposta dali, chegou a boa notícia: Como estava tudo a correr como esperado, a doente ia ter alta nesse dia.

A cama já estava feita de lavado, mas outra pessoa a ocuparia.

Após a boa notícia, aumentaram os sorrisos de alegria, mas, da cama próxima da janela, veio um pedido, de resiliência calma mas não calada:

- Senhor doutor, mande-me embora!

O médico, olhando-lhe o rosto magríssimo e meigo,  disse:

- Já imaginou que podia não estar aqui?

A senhora, de corpo quase sumido, esboçou um sorriso e foi olhando para o programa que estava a dar na televisão. Também ia olhando pela janela. Como se procurasse prazeres imaginários de agosto que desgostos lhe tinha trazido. Felizmente ainda estava ali para os desafiar.


sexta-feira, 16 de agosto de 2024

A enfermeira

 

Quando a enfermeira chegou à enfermaria, logo pareceu empática. Sem falar alto, sem chamar minha querida, meu amor… sem infantilizações, sugeriu um  passeiinho pelo corredor, não sem antes ensinar exercícios de respiração - inspiração seguida de expiração.

Ajudou-a a levantar do cadeirão, deu-lhe o braço e daí a muito pouco, estavam a caminhar pelo corredor e a conversar. Na conversa, entrou o mar que se via das janelas do outro lado do corredor,  sem muita nitidez, por causa do nevoeiro.

Voltou dois dias depois e repetiu alguns dos exercícios da sua especialidade: enfermeira de reabilitação.

De novo no cadeirão, para descansar um pouco, a doente ia pensando que o SNS tem serviços muito úteis, muitos deles criados há anos, mas pouco conhecidos. E deles pouco se fala. Porém, em todos os tempos se apregoa muita coisa que, de utilidade, só fica o eco, 


quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Estou (quase) de volta, e o tempo é de compra de beijinhos e abracinhos!


Os últimos dias foram diferentes para mim. Nem sei se hei de dizer ‘felizmente ‘ ou ‘infelizmente’. Em breve, vou explicando através de peripécias quotidianas destes dias.

Antes de recomeçar, deixem-me só falar um bocadinho de imagens que vejo de rentrées políticas, comícios, campanhas, etc.


Aqui vão algumas impressões, que são fruta da época:


Deixai vir a mim as criancinhas, os abraços e os beijinhos

Não há campanha, comício ou rentrée política em que não haja crianças pegadas ao colo, entre muitos sorrisos e muitos desejos de prolongado poder, pelos políticos que assim angariam simpatias e votos. Grão a grão… 

A família, vendo o gesto, mesmo que não pense no assunto de imediato, na hora do voto,   procura o quadradinho certo para pôr a cruzinha no partido que mimou a sua criança.

E os abraços correspondidos são também garantia de votos a entrar na urna. O mesmo se passa com os beijinhos.

Estou a imaginar esses políticos, no final do dia, a chegar a casa ou ao quarto do hotel a despir-se da roupa supostamente cheia de micróbios e impregnada de maus cheiros. É natural que o dr Montenegro demore mais um bocadinho nessa tarefa, porque as calças são quase sempre muito apertadinhas! A fase seguinte é o banho, nesses dias mais prolongado do que o habitual.

E, olhando os palanques, vejo mulheres extasiadas, homens folgazões, velhos sem perceber a razão de estarem ali, jovens a bocejar, políticos a repetir ‘sinceramente’, ‘humildade’, ‘vergonha’, etc e etc.

E já que estamos no querido mês de agosto, vêm-me à memória canções que se cantam porque, com elas, muitos males se espantam e, assim, não se pensa em tanta promessa incumprida em muito comício desta vida!


Aqui vai uma, mas há outras mais pimba e igualmente engraçadas e que, implícita ou explicitamente, cumprem a função.


‘Ora dá cá outro, toma lá um beijinho….’



quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Até breve!

 

Queridos amigos,

Durante uns dias, não virei aqui partilhar algumas coisas do dia a dia, como tanto gosto.

Obrigada pelas visitas e pelas mensagens. 

Feliz verão!

Um abraço e até breve! 


quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Onde está o meu Sal?

 

O carro entrou no pátio, ela saiu a sorrir e, voltando-se para o jardim onde estavam meninos e uma educadora, perguntou: onde está o meu Sal?

E logo me lembrei da história do homem que tinha três filhas e da tristeza enfurecida que sentiu quando a prova de amor de uma delas foi que o amava como a comida ama o sal (ainda não tinha chegado o tempo da necessária redução de sal na alimentação).

Com estes pensamentos, eu ia ouvindo: Onde está o meu Sal? Com aquele sorriso feliz de quem vai buscar o neto à escola para o mimar alegremente.

Para temperar a sua vida, ou até salvá-la, quem sabe, não tivesse o menino de seu nome Salvador.


segunda-feira, 5 de agosto de 2024

O desejo

 

Há bastantes anos que tal acontecia. Quando vinha o mês de agosto e com ele as férias, a família fazia as malas e ela pensava que preferia passar a maior parte daqueles dias em casa, a jardinar, a ler a uma sombra de qualquer árvore, a organizar os espaços interiores e exteriores da casa, a ir ao cinema, a um museu, a um espetáculo, a um parque… sempre longe das multidões ruidosas do verão. Mas sabia que a vontade da família não era essa e, por isso, os hábitos mantinham-se.

Em vez de um mês de agosto como sempre desejara, era o afã do aluguer de casa perto da praia, o calor, o ruído, as filas, as demoras, o trânsito nervoso…

Os anos sucediam-se e assim sucedia em cada agosto. O desejo de passar mais tempo em casa no mês de férias ou perto de casa é que não.

E o agosto de 2024 chegou, quente, como quase sempre. E tudo havia sido pensado e preparado também como quase sempre. Porém, houve um imprevisto.

Sentia-se fraca. Foi ao médico. Exames e mais exames. Teria de ser operada e a vida familiar teve de ser reorganizada.

Os dias dela eram passados em casa ou em consultas no hospital. Um dia, deu-se conta a dizer para si própria: como seria bom estar na praia!

domingo, 4 de agosto de 2024

Coisas de domingo

 

Tenho ouvido várias pessoas  repetirem que querem é ser boas pessoas. Eu também gostava.

Agora não me tem acontecido - espero que não seja por ser má pessoa - mas já me disseram várias vezes que sou boa pessoa. E, francamente, já houve momentos em que essa afirmação me desagradou por me parecer sinónimo de inocente e sem outras capacidades.

Ora, se se puder ser boa pessoa - embora reconhecendo falhas do passado e do presente - e ter algumas outras boas competências, então, é oiro sobre azul.

Julgo que o mesmo se passará com pessoas conscientes e com um ego dito normal e não gigante que nem deixa ver os seres humanos que existem no mundo. É o que acontece com muitos políticos, sobretudo os claramente ditadores e os que sentem essa atração, deixando- o escapar por palavras e por atos.

Não sei porque me lembrei disto nesta tarde de domingo quente de verão. Talvez porque as notícias não param de falar sobre a Guerra do Médio Oriente e da Ucrânia, da mais que provável fraude nas eleições da Venezuela, etc, etc, etc. E muitos desses homens - julgo que não há mulheres a comandar esses conflitos - são muito más pessoas. E sem qualquer vontade de o reconhecer e de se tornarem melhores. E, por causa deles, o mundo também piora e de que maneira.

E, poderá até ser uma injustiça, mas o meu domingo - como o de mais gente, felizmente - está a ser calmo e comum.

Recebo uma mensagem de uma amiga em visita a um museu. Pus loiça e roupa a lavar (parece que estou a ouvir a minha mãe: o domingo é dia sagrado !). Quero ler um pouco. E talvez ver o final da volta a Portugal e imagens de Jogos Olímpicos. E há provas, como de natação e ginástica que apetece ver e rever. E se Paris aparece, encantam-se os olhos e o coração. 

Um domingo bom e calmo para todos. 

Que me desculpem aqueles que não o têm porque não podem ou para que outros o possam ter. 


sexta-feira, 2 de agosto de 2024

Fui ao Jardim Botânico…


Fui ao Jardim Botânico, no Campo Alegre, no Porto. Estava um ventinho persistente que sacudia os Ramos das árvores e fazia chover folhas que, pelo chão, percorriam sombras ou zonas iluminadas pelo sol.

Depois de uma tigela de sopa bem gostosa no bar, em frente a um dos jardins floridos, percorremos os diferentes espaços verdes, muitos deles separados por sebes de camélias que, quando floridas, iluminarão o caminho por tanta luz de beleza. 

E, neste passeio, apercebi-me de troncos de árvores, uns mais finos, outros mais grossos, que ficam nos jardins, talvez onde viveram, ganhando novas utilidades.

Desconhecia, mas talvez a mais importante seja que os troncos, mesmo cortados, continuam a alimentar insetos, musgos, microorganismos, etc, muito úteis à natureza.

E esses pedaços de árvores também são úteis na divisão de canteiros ou jardins, embelezando-os.

Quando vi estes troncos, logo pensei em seguir o exemplo no meu jardim e quintal, quando tiver algum semelhante.

Depois do pequeno passeio pelo exterior, (gratuito) seguiu-se a visita ao museu (paga). Eu preferi ficar cá fora. Cada vez defendo mais a ideia de que não se pode ver ou aprender tudo num dia e, para além disso, tinha vontade de escrever este post.

Ah, não vi o Rapaz de Bronze. Sei, porém, que também mora no livro de Sophia que facilmente imaginamos a brincar pelos jardins enquanto criança.

Porém, nesse tempo, não se ouvia o ruído da autoestrada nem os troncos das árvores estavam envelhecidos. Felizmente o cuidado e imaginação não caíram como as folhas que vi tombar, apesar do calor e do verão.

J



quarta-feira, 31 de julho de 2024

A dona Vitória

 

Saiu da Moldova há uns anos e veio trabalhar a dias para Londres. Procurava uma vida melhor porque no seu país não havia emprego. Com ela, veio o marido e um filho que, entretanto, seguiu a sua vida e foi morar para longe dos pais.

A vida foi correndo na casa minúscula cuja renda era mais comportável com o pouco dinheiro que o casal ganhava, mas nela entrara o vício do álcool, trazido pelo marido. Dona Vitória entristecia e a casa ainda lhe parecia mais pequena e sufocante, mas era o seu abrigo.

Quando o via chegar alcoolizado, mais os dentes lhe doíam e mais lhe custava comer. E o tratamento era demasiado caro em Londres. A única solução era tratar os dentes na Moldova. O marido iria também, e poderia até reduzir o vício da bebida. Teria vergonha da família, com certeza, e poderia mudar de hábitos.

Dona Vitória avisou as patroas de que iria ao seu país, onde teria de ficar umas semanas. Umas compreenderam e outras, não. 

As dores de dentes eram insuportáveis e, se a vida era dura, mais dura se tornaria se não resolvesse o problema. E lá foram. No final de umas poucas semanas, dona Vitória sentia o alívio dos dentes tratados e o marido, sentindo-se vigiado pela família, já não bebia tanto. Dona Vitória tinha esperança de que assim continuasse.

Voltaram a Londres, um pouco mais felizes do que quando haviam partido. Chegariam a casa e teriam novo ânimo para trabalhar.

Porém, à chegada a casa, depararam com o que nunca lhes tinha passado pela cabeça: o senhorio tinha-os despejado e retirado do interior todos os seus haveres. O que parecia um recomeço mais ameno era agora uma realidade nem sequer imaginada. 

Uns amigos receberam-nos,  disse ela, quando contou a uma das patroas que logo se ofereceu para fazer queixa do senhorio. Dona Vitória agradeceu muito, mas preferia não o fazer, porque perderia muito tempo e falava muito mal inglês. Disse-o com um sorriso triste de quem raramente conhece qualquer vitória.