sábado, 14 de janeiro de 2012

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Pequeno sonho de uma noite de inverno



Uma noite destas, sonhei com linho.  Era um bocadinho de tecido pequeno, como uma simples amostra. Daquelas que se encontram numa caixa de costura, numa cestinha onde há linhas, novelos, tesouras, agulhas, botões, dedais…

No dia seguinte, na escola, uma amiga mostrou, encantada, um livro que lhe chegou às mãos sobre diferentes materiais. Uma página tinha-lhe chamado a atenção: a do linho!

Coincidência?

Como não há duas sem três, pensei: o que virá a seguir?

A – vou aprender a fiar;
B – Vou ser capaz de linho semear;
C – Vou em estopa bordar;
D – Vou continuar a sonhar…

A Castanha é castanha...


A Castanha é castanha
Por isso se chama assim
Não conhece qualquer manha
E não é nada ruim

Gosta muito de brincar
E de correr atrás da bolinha
O brinquedo põe-se a chiar
Nas patas da Castanhinha

Dorme sempre enroscadinha
E parece consolada
Dentro da caixa vermelhinha
Mesmo sem ter almofada

Quando vê a porta aberta
Corre logo para entrar
Mas logo a dona lhe diz:
Castanhinha,
Vai a bolinha buscar!

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

As pessoas sensíveis



As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas


O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra


"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
E não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão."


Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito


Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.



Sophia de Mello Breyner Andresen
(Livro sexto)
Ontem, numa turma, falámos de galinhas.
Lembrei-me, então, deste poema de Sophia. 
Apesar de ter umas dezenas de anos,
as palavras continuam atuais! 

Vi e gostei...

"Só nos é concedida 
Esta vida 
Que temos; 
E é nela que é preciso 
Procurar 
O velho paraíso 
Que perdemos... 

Mas corto as ondas sem desanimar. 
Em qualquer aventura, 
O que importa é partir, não é chegar."

Miguel Torga

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Oxalá

     A propósito de "Paixão e violência", tema do ateliê de escrita e de leitura em Serralves, hoje também se falou e escreveu sobre violência doméstica.

     Alguém se interrogava sobre estes fenómenos em pleno século XXI.

     Oxalá que a violência doméstica se torne um assunto raro e estranho. Por enquanto, ainda é tema bem conhecido em muitas famílias - independentemente do nível económico. 

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O GATO



Com um lindo salto
lesto e seguro
O gato passa
Do chão ao muro
Logo mudando
De opinião
Passa de novo
Do muro ao chão
E pega corre
Bem de mansinho
Atrás de um pobre
De um passarinho
Súbito, para
Como assombrado
Depois dispara
Pula de lado
E quando tudo
Se lhe fatiga
Toma o seu banho
Passando a língua
Pela barriga
Vinícius de Moraes

Correntes

O desafio, num ateliê de escrita em Serralves, foi escrever uma história de "belo horrível" ou "belo tenebroso". Pensei, pensei... lembrei-me de casas antigas, aparentemente abandonadas, e o resultado foi este. 
Será banal, por certo, em relação a outras estórias que penso ouvir na próxima 4ª f.
Conto, depois, contar alguma coisa que possa escutar.


Correntes
O céu estava coalhado de nuvens pardacentas. O ar gelava. A noite aproximava-se e não se via ninguém na rua ladeada de árvores despidas e negras. No silêncio parado, irrompeu o ruído de um carro, parando à porta do casarão quase sempre fechado. O silvado cobrira os muros altos, isolando a casa. Todos diziam que lá não morava ninguém e todos contavam histórias sobre os habitantes que há muito tinham morrido mas que, por muito amarem aquela casa, não tinham desaparecido. Porém, os únicos indícios de vida eram o carro que de repente entrava e saía pelo portão que abria  e batia de forma assustadora.
Engolido o carro, a rua voltava ao silêncio. Naquela noite, houve um outro sinal: saía fumo de uma chaminé da casa onde diziam viver fantasmas.
Aproveitando a minha invisibilidade de autora da história, entrei porque o frio era muito e também não gosto de ficar aquém dos muros. As sebes do enorme jardim estavam desgrenhadas e envelhecidas; os arbustos com troncos retorcidos e quebrados; algumas rosas vermelhas haviam murchado em botão, as heras trepavam cobrindo as paredes em ruínas….
Porém, no centro do jardim, erguia-se uma pequeníssima estufa envidraçada. As suas paredes de vidro deixavam ver aveludadas e viçosas rosas brancas. Era o único sinal de cuidado naquele espaço sem mimo de mão humana. Ao cimo das escadas de pedra, ouviam-se vozes quase murmuradas. De repente, uma porta chiou, saindo uma bela mulher de rosto entristecido. Desceu as escadas e dirigiu-se à estufa. Colheu um ramo de rosas e voltou a entrar em casa. O murmúrio de vozes ouviu-se de novo.
De repente, as nuvens ganharam movimento e houve um pouco de luar. Sem se ouvir a porta a fechar, a mulher desceu de novo, trazendo um ramo de rosas secas na mão. A noite fechou-se em trevas. A mulher saiu num ápice, tal como tinha entrado. Nenhuma luz se via. Apenas o fumo da chaminé continuava vivo.
De madrugada, a luz da lua iluminava as rosas brancas e as flores murchas. Ao lado, jaziam umas pesadas correntes.
Janeiro 2012

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Entre "doenças (1)" e "dor (1)", lá estava eu...

Hoje visitei o blog Terrear de Matias Alves, no qual já participei com alguns textos. Nas "etiquetas" laterais, dei de caras com o meu nome. Como começa por d, lá estava eu entre doença e dor... Se calhar não é por acaso que esta última palavra mora no meu nome.

Pois, revi, então, alguns textos que escrevi há algum tempo. Aqui vai um deles:



FELIZ ANO NOVO!


Casa quase toda na penumbra. Luz acesa na sala e na cozinha. Móveis antigos. Jarras com flores. Secas, algumas. Verdes, as folhas das camélias e do azevinho. O cão a correr e a abanar a cauda de contente.
O bicho já era velho mas nunca perdia a alegria. Só quando tinha estado doente. Nessa altura, lambia as mãos da dona, sem se levantar, por falta de força nas patas. E o olhar esvaziava-se, implorante e débil.
Reformada há vários anos, ela via a casa esvaziar-se das vozes familiares. Só a mobília e os objectos se mantinham nos lugares. E o cão enroscado sempre na carpete bem junto ao sofá. Com suspiros de sonolento alívio.
No dia-a-dia, a casa era quase só para ela e para o cão. Os lugares foram criando memória. Como os objectos de relembradas histórias. Dos sítios donde tinham vindo e das pessoas a eles ligadas.
A casa tinha um jardim por onde o cão corria. Porém, mantinha-se rente ao portão quando pressentia o regresso da dona.
Chegando a casa, os sons repetiam-se. O meter da chave. O empurrar da porta. O pousar da carteira. O tirar dos sapatos. O abrir da torneira. O correr da água. A água a cair no copo. Logo a seguir, o caminhar até ao telefone e o marcar asterisco mais duzentos. Para ver se a voz invariável anunciava:
- Tem uma mensagem nova.
Se assim fosse, sentiria mais alguma companhia.
Com o cão e as flores, a comunicação era fácil. Bastava olhá-los e tocar-lhes.
Ao cão fazia festas e às flores também, ajeitando a terra à sua volta.
Era um fim de tarde frio de início de Janeiro. Pegou num livro. Antes de o abrir, aproximou-se do telefone e marcou, como habitualmente, asterisco mais duzentos. A voz acetinada do outro lado fez-se ouvir, repetindo o que muitas vezes anunciava:
- Não tem mensagens novas.
Ela pousou o telefone sem desolação. E, contrariamente ao habitual, logo a seguir marcou um número.
- Feliz Ano Novo, disse em tom de celebração.
Do outro lado - sentia-se na voz - também alguém ficava um pouco mais feliz.

Dolores Garrido
Janeiro 2010
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Estórias Abensonhadas

O livro de contos Estórias abensonhadas, do escritor moçambicano Mia Couto, faz parte do Concurso Nacional de Leitura que irá, em breve, decorrer.
Pois, tal como muita gente, procurei o livro (já o tive, mas devo tê-lo dado ou emprestado) e estava esgotadíssimo. (na Fnac, na Bertrand...) 
Felizmente, encontrei, na Latina,  uma bonita edição ilustrada, embora a capa estivesse um pouco estragada.
Em país de poucos hábitos de leitura, não seria bom reeditar livros que são aconselhados a tantos leitores? Queremos ou não que os  jovens leiam mais (e os mais velhos também, é claro)?

Diário de Mariana

Querido diário,
9 de janeiro 2012
Hoje, pareceu-me que a minha DêTê estava um bocadito triste. No final da aula, fiquei para trás e fui ter com ela. O Gi fez-me sinal, a Bia entreabriu a porta, mas fiz de conta e fiquei como queria. Não me interessa que os outros pensem  que fiquei a dar graxa. Às vezes, acho que penso de mais no que os outros acham e não no que eu quero mesmo. Que se lixe.
A professora estava a arrumar o livro de ponto e perguntei-lhe: ó setora, está triste? É por nossa causa? E ela disse logo: não, Mariana, não tem nada a ver convosco.
Se calhar, ela pensava que eu ia logo embora, mas eu fui ficando. Ela então disse assim: sabes, Mariana, gostava de fazer as coisas bem feitas e às vezes acho que não faço. Se calhar, por vários motivos que eu dificilmente venço.
E eu disse assim: ó professora, claro que ninguém é perfeito, mas acho que tudo corre bem na turma. Tem sido altamente.
E a DêTê acrescentou: sabes, Mariana, às vezes, o que os outros dizem ou veem não é igual ao que sentimos. Gostava de fazer melhor muitas coisas.
Eu fiquei a olhar para ela sem saber o que dizer, porque nunca tinha ouvido nenhum prof a dizer que gostava de fazer melhor o seu trabalho. Eu sempre ouvi os setores dizerem que os alunos é que fazem mal: que o trabalho está incompleto, que as frases estão muito longas e têm erros, que temos de estudar mais, que as notas têm de melhorar, que temos de prestar mais atenção, que sabemos pouco, que os exercícios que fazemos não chegam…
Uma prof a dizer que tem de melhorar é que nunca ouvi, ou então tenho andado muita distraída.
Como eu estava a olhar para a Dê Tê e não dizia nada, ela disse-me assim: vamos sair, Mariana, os teus amigos devem estar à tua espera.
Eu tive então uma ideia: ó setora, não estou a perceber muito bem por que está triste, mas, desculpe, estou a lembrar-me de um conselho que um dia me deu quando eu precisava, que foi escrever. Eu acho que também lhe fazia bem. Você vai ver que escrever alivia.
E a Dê Tê disse muito depressa com cara de admirada: Disseste “você”, Mariana? Tu não costumas falar dessa maneira!
E eu: pois foi, setora, desculpe, não acredito, e pra mais disse bocê
E começámos as duas a rir.
No intervalo seguinte, passei por ela no corredor e ela piscou-me o olho. Parecia que estava mais bem disposta. 
Hoje fico por aqui, querido diário. Muitos abracinhos.
P.S. Esta semana não tenho testes. Que fixe! Ai é verdade, tenho um miniteste! É bem melhor (eu é que já não digo Fogo, senão dizia: Fogo!)
Mariana

domingo, 8 de janeiro de 2012

Ao domingo, há mais janelas abertas ao mar?


DESEJOS


Desejo a vocês...
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho.
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu.
Carlos Drummond de Andrade

sábado, 7 de janeiro de 2012

Mar!


Mar!
Tinhas um nome que ninguém temia:
Era um campo macio de lavrar
Ou qualquer sugestão que apetecia...
Mar!
Tinhas um choro de quem sofre tanto
Que não pode calar-se, nem gritar,
Nem aumentar nem sufocar o pranto...
Mar!
Fomos então a ti cheios de amor!
E o fingido lameiro, a soluçar,
Afogava o arado e o lavrador!
Mar!
Enganosa sereia rouca e triste!
Foste tu quem nos veio namorar,
E foste tu depois que nos traíste!
Mar!
E quando terá fim o sofrimento!
E quando deixará de nos tentar
O teu encantamento!
Miguel Torga, Poemas Ibéricos

Mar...


 Monet
Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só pra mim.

Sophia

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Não sou dada a fantasmas, mas...


Não sou dada a fantasmas ou a fenómenos sobrenaturais que não compreendo, mas acho piada quando oiço dizer que determinada casa está assombrada. Fazem-me lembrar casas grandes que conheci na minha infância. E também pessoas que nelas viveram.
A essas casas ligo sempre a ideia de muros altos, silvado, paredes em ruínas…
Pois bem, num ateliê de escrita que frequento, foi pedida uma história de “belo horrível” ou “belo tenebroso”.
Agora, que tinha um bocadinho livre, queria escrevê-la, mas, confesso, acho que não tenho jeito  para esse tipo de histórias. Mesmo assim, vou tentar. Se conseguir, partilho-a. De certeza que não vai assustar ninguém.

Dias de Reis



Lembro-me de alguns Dias e Noites de Reis da minha infância. Na nossa casa, havia sempre um presépio com musgo que íamos buscar ao mato, a sítios onde as árvores não deixavam entrar o sol.
Perto do Dia de Reis, íamos aproximando as figurinhas de barro que seguravam o ouro, incenso e mirra. Eram figuras mágicas porque ouvíamos contar que vinham de terras distantes, guiados por uma estrela.
Na noite de cinco para seis de janeiro, quase sempre muito fria, comíamos de novo bacalhau cozido com batatas, grelos e penca. A travessa tinha desenhos verdes e, ainda agora, me parece vê-la no meio da mesa a fumegar.
E só passados alguns dias guardávamos as figurinhas do presépio para o ano seguinte. Apenas o musgo seria diferente.

Ainda há pouco chegou o Natal...


... e já vieram Os Reis!


terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Rio Douro: carregado de sentido