terça-feira, 10 de julho de 2012
segunda-feira, 9 de julho de 2012
Poema de Aniversário
Maria Keil
Procurei no dicionário,
Com paciência e cuidado,
O real significado
Da palavra aniversário.
Aquele livro pesado,
Mestre dos visionários,
"Pai dos burros" batizado,
Pareceu-me sectário,
Ao responder meu chamado.
Deveras decepcionado,
Joguei o meu dicionário
Na estante, empoeirado,
Para pregar, solitário,
O meu significado
Da palavra aniversário.
Diz assim, o verbete lendário,
Ontem, por mim criado:
"Aniversário: Espécie de relicário,
Muitíssimo bem guardado
Nas folhas do meu diário,
Dos versos que eu escrevi,
Com todo amor, e não li,
Durante o ano passado."
Procurei no dicionário,
Com paciência e cuidado,
O real significado
Da palavra aniversário.
Aquele livro pesado,
Mestre dos visionários,
"Pai dos burros" batizado,
Pareceu-me sectário,
Ao responder meu chamado.
Deveras decepcionado,
Joguei o meu dicionário
Na estante, empoeirado,
Para pregar, solitário,
O meu significado
Da palavra aniversário.
Diz assim, o verbete lendário,
Ontem, por mim criado:
"Aniversário: Espécie de relicário,
Muitíssimo bem guardado
Nas folhas do meu diário,
Dos versos que eu escrevi,
Com todo amor, e não li,
Durante o ano passado."
Carlos Drummond de Andrade
"Viva la vida"
Até agora, e desde o seu nascimento, foi aberto umas catorze mil vezes. Umas, porque terá sido essa a escolha; outras, se calhar, por mero acaso.
É um meio extraordinário de podermos comunicar as pequenas/grandes coisas do quotidiano. De repente, e a qualquer hora, chegamos a diferentes sítios: Portugal (onde vivo e onde está uma parte de mim), Estados Unidos (onde tenho a outra parte), Reino Unido, Bélgica, Brasil, Rússia, Alemanha, Índia, França, Suíça, Espanha, Letónia, Ucrânia...
Seria melhor vermo-nos cara a cara? Seria difícil fazê-lo com regularidade no mundo de hoje. É bom pensar que chegamos aos outros e que os outros nos dizem muito, embora nada substitua a família e os amigos mais próximos. Sem eles, manter um blogue seria apenas um sinal de busca de remédio para muitas solidões; assim, é um modo de interagir, pondo em comum preocupações, alegrias e pequenas coisas do dia a dia que, apesar de comuns, interessam porque são humanas.
Procuro colocar nestas páginas o lado menos lunar ou sombrio dos dias, ainda que este exista em muitas palavras ou imagens.
Os momentos que passo neste blogue trazem-me alguma felicidade. E cada vez estou mais convencida de que, se tentarmos ser um pouco mais felizes, mais facilmente poderemos fazer felizes as pessoas que estão à nossa volta.
Um abraço e obrigada.
domingo, 8 de julho de 2012
Diário de Mariana
8 de julho 2012
Querido diário,
Estou furiosa. Toda a gente diz:
ó Mariana, és tão calminha! Sei lá se sou. Eu acho é que tenho um tipo de grilo falante que diz assim: tem
calma, Mariana, tem calma, Mariana…
Por exemplo, já tenho visto um
carro estacionado mesmo junto à porta de uma casa. As pessoas que lá moram quase
nem podem entrar nem sair ou então veem-se aflitinhas. Dá-me uns nervos que até
me apetecia estragar o carro. E lá está, oiço logo: tem calma, Mariana, tem
calma, Mariana. Eu não sou mais do que os outros, mas por que é que muita gente
só pensa nos seus interesses? Passo-me com isso, mas pronto lá está o tipo
grilo falante: tem calma, Mariana, tem calma Mariana. Brrrr!
Hoje estava a tomar o pequeno
almoço e ouvi uma espécie de jornalista ou escritor a falar de um livro de
aventuras. Achei altamente e pus-me a ouvir. Ele disse que quando escreve tem a
preocupação de ajudar a formar os jovens. Por acaso achei isso fixe. Depois
também falou que acha que os livros para jovens devem ser tipo divertidos. Eu
também concordo, mas o que ele disse a seguir é que até me tirou a vontade de
comer o pão com manteiga e compota que me estava a saber tão bem. Disse que um
dia mais tarde os jovens é que têm de pagar a dívida nacional.
Eu sempre fui educada a não dever
nada a ninguém, mas como é que eu posso pagar se, na melhor das hipóteses, só
tenho trabalho e ganho quando tiver p'ra'í 30 anos? E com tudo a correr bem. Eu pus
trabalho antes de ganhar, porque outro dia vi um título numa revista que dizia
que há pessoas que trabalham e são pagas só com alimentação. Coitadas!
Olha eu e tantos outros sem culpa nenhuma a pagar dívidas
que não fizemos. É preciso ter lata!
Às vezes, apetecia-me passar-me à minha vontade, mas lá está ele,
o chato de grilo falante: tem calma, Mariana, tem calma, Mariana. Brrrr!
Muitos abracinhos, querido diário
Mariana
PS - Amanhã saem as notas dos exames. Eu este ano ainda não tenho esse stress, mas tenho alguns amigos meus que devem estar mortinhos por ver as notas. Ou não, sei lá. Por acaso era fixe que ficassem contentes. Já combinámos ir comer um cachorro.
Agora vai haver mais exames. A gente estuda estuda e não ganha nada e há políticos que nem sequer vão à Universidade e têm cursos e ganham muito. E a gente ainda por cima vai ter de pagar a dívida que muitos fizeram. Brrrr!
O gato que não "gostava" de Strauss
Gosto muito de ouvir rádio quando vou de carro. E se há entrevistas que me agradam, até me apetece ir mais devagar (sem interromper o trânsito, é claro!).
Hoje, na antena 2, alguém (nestes casos, as conversas ficam, com frequência, truncadas) falava de Strauss, contando uma história de um amigo que adorava música clássica. Ouvia-a quando chegava a casa, à noite depois de jantar, ao fim de semana... Quase sempre na companhia do gato. E o felino parecia gostar porque se enroscava, consolado, junto ao seu dono enquanto este, deliciado, ouvia a música.
Porém, quando ouvia música de Strauss, o gato fugia da sala e afastava-se o mais que podia. Estranho gato, estranho caso.
Um dia, o dono do gato falou a um amigo acerca da reação do gato quando ouvia música de Strauss. Também o amigo estranhou.
Um dia, ou melhor, uma noite, houve um concerto de música de Strauss. No final do espetáculo, o público aplaudia, de pé, com entusiasmo. Um grupo mantinha-se sentado, incluindo o dono do gato.
Ficava sempre irritado quando ouvia música de Strauss!!!
A cada um o seu jornal
Compro, há muitos anos, o jornal no mesmo sítio. Como os jornais estão colocados no passeio, as pessoas param os carros e os vendedores dos jornais - um casal - logo vêm trazer o jornal habitual.
Comigo nunca houve enganos e, que eu tenha reparado, acertam sempre com todos. E os clientes são muitos em todas as manhãs.
Gosto cada vez mais destas rotinas. Deve ser velhice, mas que são boas - para mim - são!
sábado, 7 de julho de 2012
O Rui Veloso também é (do) Porto
No palco, Rui Veloso, sempre à vontade, ia comunicando com o público:
O teu irmão num beio, cara(go)?
Que espetáculo! Que noite! Olha quem está ali!
Gosto mesmo de os ber aí, quera!
Parece que estão na minha sala! E esta é comprida, quera!
Olha aquele gajo do tempo do liceu! Ficou cum bergonha!
'Tou a ficar bailhote, já num bejo bem, queré!
...
E música. Muita música. Com memória(s). Com sentimento(s). Com pessoas de todas as idades. Uns de braços erguidos ao ritmo dos sons. Outros mais quietos, mas com a alma embalada pelas emoções.
Foi ontem à noite, na Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia. Um espetáculo de duas horas. Umas vezes com chuviscos (pareciam as orvalhadas de S. João, mas os Santos Populares já lá vão), outras com céu quase a descoberto.
Às vezes, passava uma gaivota e, entre as luzes, parecia uma pomba branca.
O público foi ao rubro quando Rui Veloso cantou o sublime Porto Sentido:
Quem vem e atravessa o rio
Junto à serra do Pilar
vê um velho casario
que se estende até ao mar
Junto à serra do Pilar
vê um velho casario
que se estende até ao mar
Quem te vê ao vir da ponte
és cascata, são-joanina
dirigida sobre um monte
no meio da neblina.
és cascata, são-joanina
dirigida sobre um monte
no meio da neblina.
Por ruelas e calçadas
da Ribeira até à Foz
por pedras sujas e gastas
e lampiões tristes e sós.
da Ribeira até à Foz
por pedras sujas e gastas
e lampiões tristes e sós.
(...)
As últimas três canções foram das que o público mais estava à espera.
"O anel de rubi":
Tu eras aquela que eu mais queria,
para me dar algum conforto e companhia,
e era só contigo que eu sonhava andar,
para todo o lado e até quem sabe talvez casar.
para me dar algum conforto e companhia,
e era só contigo que eu sonhava andar,
para todo o lado e até quem sabe talvez casar.
Ai o que eu passei só por te amar,
a saliva que eu gastei para te mudar.
Mas esse teu mundo era mais forte do que eu,
e nem com a força da musica ele se moveu.
a saliva que eu gastei para te mudar.
Mas esse teu mundo era mais forte do que eu,
e nem com a força da musica ele se moveu.
Mesmo sabendo que não gostavas,
empenhei o meu Anel de Rubi,
empenhei o meu Anel de Rubi,
Pra te levar ao concerto que havia no Rivoli
(...)
"Muito mais é o que une do que aquilo que nos separa":
Recebi o teu bilhete
para ir ter ao jardim
a tua caixa de segredos
queres abri-la para mim
e tu não vais fraquejar
ninguém vai saber de nada
juro não me vou gabar
a minha boca é sagrada
Estar mesmo atrás de ti
ver-te da minha carteira
sei de cor o teu cabelo
sei o shampoo a que cheira
já não como, já não durmo
e eu caia se te minto
haverá gente informada
se é amor isto que sinto
Quero o meu primeiro beijo
não quero ficar impune
e dizer-te cara a cara
muito mais é o que nos une
que aquilo que nos separa
para ir ter ao jardim
a tua caixa de segredos
queres abri-la para mim
e tu não vais fraquejar
ninguém vai saber de nada
juro não me vou gabar
a minha boca é sagrada
Estar mesmo atrás de ti
ver-te da minha carteira
sei de cor o teu cabelo
sei o shampoo a que cheira
já não como, já não durmo
e eu caia se te minto
haverá gente informada
se é amor isto que sinto
Quero o meu primeiro beijo
não quero ficar impune
e dizer-te cara a cara
muito mais é o que nos une
que aquilo que nos separa
(...)
Não há estrelas no Céu
Não há estrelas no céu a dourar o meu caminho,
Por mais amigos que tenha sinto-me sempre sozinho.
De que vale ter a chave de casa para entrar,
Ter uma nota no bolso pr'a cigarros e bilhar?
Por mais amigos que tenha sinto-me sempre sozinho.
De que vale ter a chave de casa para entrar,
Ter uma nota no bolso pr'a cigarros e bilhar?
[Refrão]
A primavera da vida é bonita de viver,
Tão depressa o sol brilha como a seguir está a chover.
Para mim hoje é Janeiro, está um frio de rachar,
Parece que o mundo inteiro se uniu pr'a me tramar!
(...)
A primavera da vida é bonita de viver,
Tão depressa o sol brilha como a seguir está a chover.
Para mim hoje é Janeiro, está um frio de rachar,
Parece que o mundo inteiro se uniu pr'a me tramar!
(...)
Nas nossas costas, estava uma das mais belas paisagens do mundo. Atrevo-me a dizê-lo, apesar de não gostar nada destas afirmações radicais.
É o Porto! É o porto!
quinta-feira, 5 de julho de 2012
Como será no futuro?
Os meios de comunicação social estão a divulgar mais um caso de um político que tirou um curso universitário à pressa. A confiar nas notícias, bastou um ano para Miguel Relvas obter uma licenciatura. Ou provavelmente menos tempo porque parece ter feito apenas quatro exames dos trinta e tal que era suposto fazer.
Segundo a orientação dos diferentes canais televisivos, há comentadores que condenam ou justificam esse procedimento. Ouvi argumentos como: não seria justo pedir a um político com uma experiência tão vasta que frequentasse as aulas como outro aluno qualquer.
Pois bem, este raciocínio aproxima-se do projeto das Novas Oportunidades, tão criticado nomeadamente pelo atual Governo.
Com estas práticas trapalhonas de políticos, que orientam uma grande parte das nossas vidas, muitos jovens ficarão mais desmotivados para o estudo sério e honesto. Para quê estudar tanto se muitos singram na vida sem essa necessidade? Como se tal não bastasse, ainda há mentiras pelo meio. E são pessoas que são defendidas na praça pública por aqueles que entraram na mesma teia.
Será que os jovens de hoje acreditarão um dia nos políticos? Ou deixar-se-ão arrastar por tão maus exemplos?
O futuro o dirá, mas a mudança de mentalidades é urgente. O salve-se quem puder não traz bem para ninguém. Ainda que alguns pensem isso. Eles pensam?
quarta-feira, 4 de julho de 2012
Dunas - GNR
Dunas são como divãs,
Biombos indiscretos de alcatrão sujo
Rasgados por cactos e hortelãs,
Deitados nas Dunas, alheios a tudo,
Olhos penetrantes,
Pensamentos lavados.
Biombos indiscretos de alcatrão sujo
Rasgados por cactos e hortelãs,
Deitados nas Dunas, alheios a tudo,
Olhos penetrantes,
Pensamentos lavados.
Bebemos dos lábios, refrescos gelados (refrão)
Selamos segredos,
Saltamos rochedos,
Em câmara lenta como na TV,
Palavras a mais na idade dos "PORQUÊ"
Dunas, como que são divãs
Quem nos visse deitados de cabelos molhados bastante enrolados
Sacos camas salgados,
Nas Dunas, roendo maçãs
A ver garrafas de óleo boiando vazias nas ondas da manhã
Quem nos visse deitados de cabelos molhados bastante enrolados
Sacos camas salgados,
Nas Dunas, roendo maçãs
A ver garrafas de óleo boiando vazias nas ondas da manhã
Bebemos dos lábios, refrescos gelados,
nas dunas!
nas dunas!
Em câmara lenta como na TV,
Nas dunas..
Nas dunas..
Naasss duunas...
Naasss duunas..
Refrescos gelados...
Como na Tv.
Nas duunas...
Rui Reininho, 1985
O rico e o remendão
Era
uma vez dois vizinhos que viviam numa terra vulgar. Mas não viviam os
dois da mesma maneira! Um era o mais rico senhor daquela terra e muitas
noites levava sem poder dormir, preocupado com as suas riquezas, com a
sua casa cheia de preciosidades…
O
mais pobre era mesmo muito mais pobre: não tinha quase nada e vivia
numa casa velhinha, à porta da qual tinha montado uma espécie de
oficina de remendão. Ele remendava tudo: carteiras velhas, sapatos,
albardas, maletas, enfim, trabalho assim era coisa que nunca faltava! E
todo o dia cantava! Tivesse muito ou pouco trabalho, nunca deixava de
cantar!
Na
casa ao lado, o rico senhor não compreendia como é que com a sua vida
de sacrifício e canseira, e tanta miséria que bem se via, o seu vizinho
passava o dia em cantorias!!! Aquilo fazia-lhe imensa espécie...
Um dia mandou chamá-lo à sua presença e disse-lhe:
− Ó mestre, vossemecê quanto é que ganha num ano inteiro?
O remendão coçou a cabeça, o que era sinal de que não fazia a mínima ideia, e disse:
−
É impossível calcular isso... pois há tantos domingos e tantos
feriados que as contas ficam muito complicadas...
Mas o homem rico insistiu:
− Ó mestre, mas diga assim mais ou menos...
Respondeu o remendão:
− Mais ou menos, mais ou menos, ganho o que me dá para o comer do dia! Só sei que não morro de fome, lá isso não!
Então o homem rico disse-lhe:
− Pois tome nota: eu quero que vossemecê viva sem cuidados e com fartura, pois bem o merece, já por tanto ter trabalhado!
E dizendo isto, entregou-lhe uma bolsa bem recheada de moedas de ouro.
O
remendão foi às nuvens!!! Nem sabia como havia de agradecer! Julgou-se
o homem mais rico da terra e correu para o seu telheiro a enterrar a
bolsa de moedas. A partir daí, nunca mais cantou, pois o menor ruído o
punha em sobressalto, com medo dos ladrões... Deixou de ter o sono
ferrado e descansado que sempre tivera, e então cantar?! Isso foi coisa
que nunca mais fez, com medo de dar nas vistas a sua alegria!!!
Um
dia reparou que até o andar do seu gato o fazia tremer... Então foi
ter com o vizinho rico e levou-lhe a bolsa de moedas de ouro,
dizendo-lhe:
−
Muito lhe agradeço, meu senhor, a sua bondade, mas aqui tem o seu
dinheiro. Guarde-o, que eu por mim guardarei as minhas cantorias e o
meu rico soninho descansado!!!
E assim, o remendão
Preferiu o que mais queria.
Mais que a riqueza enterrada,
Vale a sua cantoria!
Maria Alberta Menéres
100 Histórias de todos os tempos
Porto, Ed. Asa, 2003
segunda-feira, 2 de julho de 2012
"Árvores como nós"
Existe uma
planta chamada agave. Alguns exemplares vivem no Jardim Botânico, no Porto.
A planta-mãe
cresce durante dez anos.
Enquanto se eleva em direção ao céu, vai espalhando sementes que germinam e crescem à sua volta.
Enquanto se eleva em direção ao céu, vai espalhando sementes que germinam e crescem à sua volta.
Depois de um
ciclo de dez anos, a planta-mãe morre para que o alimento não falte aos seus
rebentos.
Dos filhotes
crescerão outras árvores e destas, a seu tempo, novas crias.
domingo, 1 de julho de 2012
Carta a Ruben A.
Que tenhas morrido é ainda uma notícia
Desencontrada e longínqua e não a entendo bem
Quando – pela primeira vez – bateste à porta da casa e te sentaste à mesa
Trazias contigo como sempre alvoroço e início
Tudo se passou em plenos e projectos
E ninguém poderia pensar em despedida
Mas sempre trouxeste contigo o desconexo
De um viver que nos funda e nos renega
- Poderei procurar o reencontro verso a verso
E buscar – como oferta – a infância antiga
A casa enorme vermelha e desmedida
Com seus átrios de pasmo e ressonância
O mundo dos adultos nos cercava
E dos jardins subia a transbordância
De rododendros dálias e camélias
De frutos roseirais musgos e tílias
As tílias eram como catedrais
Percorridas por brisas vagabundas
As rosas eram vermelhas e profundas
E o mar quebrava ao longe entre os pinhais
Morangos e muguet e cerejeiras
Enormes ramos batendo nas janelas
Havia o vaguear tardes inteiras
E a mão roçando pelas folhas de heras
Havia o ar brilhante e perfumado
Saturado de apelos e de esperas
Desgarrada era a voz das primaveras
Buscarei como oferta a infância antiga
Que mesmo tão distante e tão perdida
Guarda em si a semente que renasce
"O Amor é de outro Reino"
Ruben A. (Jardim Botânico, no Porto)
"O amor é de outro reino. (...) Da amizade, do amor, do encontro de duas pessoas que se sentem bem uma ao lado da outra, fazendo amor, falando de amor, trocando amor, conversando de amor, falando de nada, falando de pequenas histórias código de ministros com aventuras de aventuras sem ministros conversa alta e baixa de livros e de quadros de compras e de ninharias conversas trocadas em miúdos ouvindo música sem escutar música que ajuda o amor o amor precisa de ajudas de ir às cavalitas de andas de muita coisa simples amor é um segredo que deve ser alimentado nas horas vagas alimentado nas horas de trabalho nas horas mais isoladas amor é uma ocupação de vinte e quatro horas com dois turnos pela mesma pessoa com desconfianças e descobertas com cegueiras e lumineiras amor de tocar no mais íntimo na beleza de um encanto escondido recôndito que todos no mundo fizeram pais de padres mães de bispos avós de cardeais amor agarrado intrometido de falus com prazer de alegria amor que não se sabe o que vai dar que nunca se sabe o que vai dar amor tão amor".
Ruben A., in 'Silêncio para 4'
sábado, 30 de junho de 2012
A prova
Sábado à
tarde. Numa das ruas perpendiculares à Ribeira do Porto, há uma exposição de pintura. Entramos.
Para além dos
quadros que podem ser admirados, há também prova de um vinho do Douro. As
garrafas e os copos estão dispostos sobre um balcão. Aceitamos a oferta.
Do lado de
dentro, está o pintor – um homem que parece reservado e preferir o silêncio
doméstico.
Do lado de
fora, a mulher dirige-se às pessoas que entram, mostrando à vontade, convicção
e simpatia. Com entusiasmo, tenta vender o vinho e mostrar os quadros
produzidos pelo marido.
Enquanto
provamos o vinho, falamos com o pintor – um professor de Educação Visual já reformado.
Fala como que a
pedir licença, envolvendo as palavras em sorrisos.
Diz que a exposição dos quadros foi uma prenda da
mulher quando fez 65 anos.
Quando saímos, felicitamos os dois pela prova... de amor.
Os Jardins de Sophia (de Mello Breyner Andresen)
Em bela e luminosa manhã de sábado, um grupo de amigos (e amigos da escrita e da leitura) visitou o Jardim Botânico,
no Campo Alegre, no Porto.
A quinta pertenceu ao avô de Sophia. Sobretudo em criança, a poeta brincava nestes espaços que, mais tarde, viriam a entrar em muitas das suas histórias: O rapaz de bronze, Noite de Natal e muitos mais.
Para além das inúmeras variedades de plantas, dos espaços (quase) míticos, da beleza florida, existe uma cafetaria com mesas voltadas para um dos jardins (construído à imagem de uma das carpetes que existia na casa).
Está aberto das 10 h às 18h.
Um belíssimo espaço para ler.
Ou percorrer alguns dos caminhos de Sophia.
E por que não apenas olhar?
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