segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Diário de Mariana

26 de setembro

Querido diário,

Às vezes deves pensar que tenho ciúmes das minhas irmãs. Não, nada disso, mas irrita-me que as pessoas olhem para mim e só reparem no meu cabelo forte, se estou mais gordinha ou mais magrinha… Parece que só existo por fora. Ou então dizem: é tão engraçada e tão diferente das irmãs! Fogo, não acho nada bem Como só me veem por fora, pensarão até que não sou capaz de ser persistente e escrever um diário. Se calhar, até pensam que copio, ou melhor, plagio que é a palavra que a minha professora ensinou ano passado. Nessa altura, quando contei à minha mãe, ela fez-me muitas recomendações. Como se eu já não soubesse.

Um dia, escrevi um texto sobre um filme de que gostei muito. Era o trabalho de casa. Eu acho que a minha prof, quando o leu pela primeira vez, pensou que não era meu e que eu estava a mentir e fiquei um bocado triste. Por outro lado, fiquei contente. É porque estava bem. Se calhar, foi por acaso, mas ficou mesmo fixe. Era sobre um filme francês e acho que o título era: O segredo do Couscous. Gostava até de o rever.

A minha mãe já me contou que há alunos que entregam trabalhos retirados da net e fazem de conta que são deles. Por isso, nem citam as fontes. Se a minha mãe fosse à escola e soubesse uma coisa dessas, acho que me castigava logo. A primeira coisa, acho eu, era proibir-me de escrever o diário neste blogue. Eu não o faria porque não sou capaz de roubar nada a ninguém Mas uma vez copiei num teste. Levei umas regras de gramática escritas a lápis e a letra miudinha num dicionário. Durante o teste, estava com tanto medo que a prof descobrisse que até me esqueci de coisas que eu sabia bem e t6irei fraca nota. Jurei que nunca mais.

Também já ouvi que há adultos que copiam trabalhos nas universidades. Até já falámos disso à mesa. E não sei se era por estarmos a jantar, mas a minha mãe disse que há coisas que não pode digerir. Eu nesse momento estava a comer um bocado de maçã, não mastiguei bem e tive de dizer: ai, mãe, e eu não posso engolir!

Beijinhos, meu fiel amigo (Fogo, até parece que para mim és um bacalhau).

Mariana

domingo, 25 de setembro de 2011

Estados crepusculares

Amadeu Souza Cardoso

Fim de tarde. Uma casa antiga. Com estalidos nos longos tempos de silêncio. Um grupo de mulheres sentadas: uma borda, outra lê, outra cose uma saia, outra apenas diz que está cansada e que a comida está quase pronta.

Uma jovem chega com o namorado. Cumprimentam-se. Sorriem. Os dois começam a falar numa língua que não é o português. Aproximam-se da janela de guilhotina. Olham os campos. Falam de Itália, onde viram um grupo de mulheres a rezar numa capela pequena com cheiro a flores murchas.
Os jovens dão as mãos e anteveem a viagem que retomarão dentro de horas.

As quatro mulheres, sem levantar os olhos, começam a rezar baixinho.

Tema sugerido em ateliê de Serralves, com Mário Cláudio.


Diário de Mariana

25 de setembro

Querido diário,

Hoje, a minha mãe disse-me logo que cheguei à cozinha: Mariana, depois de almoço, vamos a um Centro Comercial Quero comprar um candeeiro para a nossa casa e durante a semana é um corre-corre. E eu: ó mãe, a um Centro Comercial ao domingo à tarde? Ver criancinhas maltratadas? E a minha mãe, deixando de cortar o pão: Mariana, o que estás a dizer? E eu: sim, mãe, com aquela gente toda, se começam a berrar tanto é porque não lhes fazem bem. E a minha mãe, em tom apaziguador: Mariana, nem toda a gente tem quintal, por mais pequenino que seja. E eu: ó mãe, então se precisam de espaço, por que não levam as criancinhas para o parque da Cidade ou para a beira do mar? Não se paga nada. E a minha mãe, no mesmo tom: Mariana, muitas pessoas têm uma semana triste e precisam de ver coisas bonitas, de animação…

E eu cá pra mim: deve ser uma animação andar a ver montras e aos encontrões e a dizer aos filhos que levam uma bofetada se não se calarem..

Pronto, tem de ser. Vou com a minha mãe comprar o candeeiro. Só espero é que ela não veja um vestido barato, cor-de-rosa, e diga logo: Mariana, que lindo vestido. Ficava-te bem com o teu cabelo preto. E eu: ó mãe, já bastou o vestido de fada que vesti uma vez no Carnaval.

Bem, estou a fazer filme, mas ir a um Centro Comercial a um domingo à tarde também vai ser. Por que é que a gente não faz só aquilo de que gosta?

E o que é mais engraçado é que a minha mãe diz muitas vezes: Mariana, a vida é curta e temos de aproveitá-la bem. Vê-se mesmo. Deve ser por isso que vamos ver um candeeiro a um Centro Comercial ao domingo à tarde. Até parece que em casa estamos às escuras.

Hm, que cheirinho a torradas. Ainda bem que tenho umas horitas antes de me meter na cena do Centro Comercial. O que vale é que a minha mãe me deixa ouvir a minha música preferida enquanto vamos no carro.

Muitos beijinhos

Mariana

Pormenor de quadro. De outono?

Florentina Gonçalves

Os outros

100 palavras

Muitos professores defrontam-se com o problema de numerosos alunos não assumirem responsabilidades no dia a dia, de esquecerem os deveres, insistindo nos direitos.

Porém, é este o comportamento de muitos políticos de diferentes partidos. O “buraco” na Madeira parece ser disso exemplo. Dizer, dar o dito por não dito, insultar, fazer-se de vítima… enquanto alguns políticos lá justificam, como podem, estes comportamentos, protegendo-se de ataques indesejáveis.

As novas gerações, para além de escolas alargadas e intervencionadas, precisam de exemplos de políticos modernos que não fragilizem as contas públicas nem a democracia. Essa seria obra excelente para o futuro.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Formas e cores


Diário de Mariana

23 de setembro

Querido diário,

Já te escrevi hoje, mas cheguei a casa e apeteceu-me comunicar outra vez.

Às vezes acho que não sou muito influenciável, mas outras sim. Eu gosto muito da minha diretora de turma e se calhar por isso dou comigo a pensar que gostava de ser professora.

Hoje fizemos mais uma prova de avaliação dignóstica. A escola deve gastar resmas de resmas de papel. Só para a minha turma é um teste de três ou quatro folhas em cada disciplina. E somos quase trinta alunos., é só pegar na máquina de calcular e fazer as contas. Tanta folha. A minha Dê Tê já nos disse que vai receber o relatório de todos os professores e que, embora não seja a avaliação mais importante, quer que tudo corra bem. Como gosto muito dela, era fixe que ela ficasse contente.

Enquanto estávamos a fazer a prova, um dos meus colegas arredondou os braços em cima da mesa, como se fossem uma almofada e deitou a cabeça. Parecia mesmo que queria dormir. A prof aproximou-se dele e disse-lhe para levantar a cabeça e rever a ficha. Eles falavam baixinho, mas quando é assim, parece que fico ainda mais atenta e curiosa. E a prof disse-lhe: tenta rever o ponto quatro. E ele: ó setora, eu já fiz e não vou fazer outra vez. E ela: por que não? Tens tempo e fica melhor. O que escreveste está muito incompleto. E o rapaz: não, setora, não quero escrever outra vez, porque dá muito trabalho. E disse trabaaaalho, demorando a dizer a palavra, como se fosse uma coisa muito difíiiiiiiicil.

Eu não sei muito bem, mas acho que a setora não conseguiu que ele completasse a resposta. E, coitada, bem se esforçou. No final da aula, eu até disse à Bea: nem sei se ainda quero ser prof. Dá muito trabaaaaalho. Ela começou a rir-se e disse assim: eu é que não quero. Custa-me aturar os meus irmãos quando não querem comer a sopa, que faria se tivesse insolentes à minha frente. Quando os alunos não estão atentos nem estudam, ela diz logo que são insolentes. Este até nem é muito, mas é um preguiçoso de primeira. Até faz nervos. E algumas profs falam com ele com paninhos de lã. Haviam era de lhe chegar a roupa ao pelo (não pus acento, porque a setora de português disse que agora é assim. Nem em “para” se põe acento quando é verbo. Eu acho esquisito, mas não é por isso que vou deixar de dormir. De noite, é claro. Posso não ser muito boa aluna, mas não vou dormir para as aulas. Mas comigo, os profs não me fazem fosquinhas, como diz o meu avô).

Muitos abracinhos, querido diário, porque já estou a ficar com sono.

Mariana

Mariana

Azáleas