sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

Fabulosa Natureza

Um orangotango espreitando atrás de uma árvore num rio em Bornéu, Indonésia Jayaprakash Joghee Bojan/ National Geographic Nature/ Photographer of the year 2017

Um cont(inh)o de Natal!

Chuva no Litoral (1977) Paterson Ewen


Sem estrondo

Conheciam o ritual desde muito pequenos. Os quatro irmãos punham o sapatinho na beira da chaminé, na cozinha, depois da ceia de Natal e iam dormir, não sem olhar algumas vezes para trás, confirmando que os sapatinhos estavam a jeito para receber os presentes.
Logo de manhãzinha, vinham a correr ver o que o menino Jesus lhes tinha oferecido.  Às vezes, diziam que as prendas tinham sido trazidas pelo Pai Natal, mas a mãe não concordava  porque o achava demasiado pagão para entrar em sua casa naquela noite sagrada.
Em anos mais prósperos, os meninos encontravam um brinquedo ou um livro; em Natais de menos fartura, umas pequenas guloseimas, porque era preciso poupar e arrecadar como a formiguinha e nada de entusiasmos e esbanjamentos, como era próprio da cigarra.
O tempo ia passando, os meninos crescendo e os presentes apareciam nos sapatos conforme necessidades muito práticas. Ou era um casaco, ou um pijama, ou um gorro para o frio... Os meninos ficavam até a pensar como é que o Pai Natal adivinhava as carências de cada um. Nesses momentos, a mãe intervinha dizendo que tinham a prova de que era o menino Jesus, filho de Deus, que trazia as prendas no Natal, porque  tudo via, tudo sabia e tinha capacidades infinitas.
Os meninos continuavam a achar estranha a vinda noturna de um ser divino ou terrestre para depor  presentes nos sapatos, entrando pela chaminé, sem ninguém os ver nem ouvir. Quanto mais os meninos cresciam, mais lhes custava a compreender este mistério.
Chegou então o Natal em que as meninas (eram duas raparigas e dois rapazes) tinham pedido um guarda-chuva ao menino Jesus ou ao Pai Natal, porque as dúvidas também cresciam ou se, o que era mais certo, a prenda vinha de muito mais perto, sem haver necessidade de descida dos Céus à Terra ou da longa e gélida viagem de trenó. Achavam até estranho que o velhinho de barbas brancas nunca tivesse apanhado uma pneumonia ou partido uma perna nas subidas ou descidas.
Rosa, a mais perspicaz, dizia a Maria, mais nova e mais crente nas delícias da imaginação, que era impossível um ou outro trazer tantas prendas, embora soubesse que muitos meninos nada recebiam. A irmã, porém, continuava a afirmar que tinha visto uma vez o menino Jesus na chaminé a pôr as prendinhas nos sapatos usados de borracha e que os cabelinhos eram encaracolados e clarinhos. Rosa respondia que só podia ter sido um sonho. O André e o Manuel, os irmãos, ligavam mais à realidade e o importante era receberem os brinquedos que tinham pedido, sobretudo bolas e camiões.
Chegou a noite da consoada. Os pratos de festa foram tirados do armário, lavados e postos a escorrer com a travessa cavalinho onde seriam servidas as batatas, o bacalhau e as hortaliças. Para as rabanadas, a aletria e o leite-creme também tinham sido retirados os pratos grandes, com um fiinho dourado à volta, do armário. Mesmo vazios, pareciam já cheirar a açúcar e a canela.
Que presente receberiam naquela noite? Rosa e Maria sabiam que cada uma precisava de um guarda-chuva. Seria essa a prenda que iam encontrar no sapatinho?
Veio a hora da ceia. A família sentou-se à mesa. O cão Dunas ficou enroscado e a dormitar na cozinha, perto do fogão, para receber algum do seu calor, porque lá fora o vento gelava.
Enquanto a mãe colocava o prato das rabanadas no centro da mesa, ouviu-se um pequeno estrondo. Talvez fosse a ventania que tivesse atirado alguma planta ao chão. Continuaram, porém,  a saborear os prazeres ainda quentinhos da mesa. Mais tarde, quando o vento amainasse, via-se se havia estragos.
E foi quando o Dunas apareceu na sala, puxando, ora um ora outro, dois pequenos guarda-chuvas em tons diferentes de cor-de-rosa. A mãe ficou com um quente rubor nas faces e só dizia:
- Maldito cão que foi atrás da porta da cozinha!
E Rosa, a mais espevitada, disse abraçando o cão:
- Daqui em diante, vou chamar-te Dunas, o Pai Natal.
Nesse momento, Maria olhou a mãe, com meiguice, querendo assegurar que nunca lhe dariam o nome de Menino Jesus.




terça-feira, 12 de dezembro de 2017

"All I Want For Christmas Is You"

                                                                                   O original desta música é de Mariah Carey 
e foi partilhada no blogue Bem-vindo ao Paraíso
https://isauraafonseca.wordpress.com
Obrigada. Partilho-a eu agora, porque tem a
alegria e o quentinho que todos
desejaríamos para o Natal.
Para todos. 

I don’t want a lot for Christmas
There is just one thing I need
I don’t care about the presents
Underneath the Christmas tree
I just want you for my own
More than you could ever know
Make my wish come true oh
All I want for Christmas is you
I don’t want a lot for Christmas
There is just one thing I need, and I
Don’t care about the presents
Underneath the Christmas tree
I don’t need to hang my stocking
There upon the fireplace
Santa Claus won’t make me happy
With a toy on Christmas day
I just want you for my own
More than you could ever know
Make my wish come true
All I want for Christmas is you
I won’t ask for much this Christmas
I won’t even wish for snow, and I
I just wanna keep on waiting
Underneath the mistletoe
I won’t make a list and send it
To the North Pole for Saint Nick
I won’t even stay awake
To hear those magic reindeer click
‘Cause I just want you here tonight
Holding on to me so tight
What more can I do
Oh, Baby all I want for Christmas is you
All the lights are shining
So brightly everywhere
And the sound of children’s
Laughter fills the air
And everyone is singing
I hear those sleigh bells ringing
Santa won’t you bring me
The one I really need
Won’t you please bring my baby to me quickly
I don’t want a lot for Christmas
This is all I’m asking for
I just wanna see my baby
Standing right outside my door
I just want you for my own
More than you could ever know
Make my wish come true
Baby all I want for Christmas is you
All I want for Christmas is you, baby!

domingo, 10 de dezembro de 2017

Uma imagem natalícia?

West Hampstead, arredores de Londres, hoje.

A cor do presente e a noite de Natal

     António era funcionário público e os vizinhos chamavam-lhe o solitário da rua. Tinha uma vida pacata que, para alguns, seria monótona. Porém, sentia-se bafejado por momentos simples e felizes, como regressar ao fim da tarde e colher legumes para o jantar. Às vezes, ficava no quintal ou no jardim até à noite, arrancando ervas daninhas, podando ramos secos, lançando sementes à terra, colhendo verduras ou frutos...
Também fazia caminhadas com a cadela Duna, lia, ouvia música clássica, escrevia umas pequenas histórias que ia guardando...
Duna, uma labradora de gema, acompanhava-o, fiel e serena, há alguns anos. Em noites de inverno, dormia a seus pés, restabelecendo a ordem do mundo.
 Filho único, António vira os pais desaparecerem quando tinha vinte e quatro anos. Ainda festejaram a conclusão do curso e a sua entrada no mundo do trabalho. Os tios mais próximos, quando António ficou só, ofereceram-se para o receber. Agradeceu, mas não aceitou o convite. Preferia ficar na casa onde sempre vivera. Os tios concordaram porque, mais tarde ou mais cedo, casaria e haveria espaço para as crianças.
O tempo foi passando e tornando grisalho o cabelo de António. Nunca casou e a rotina diária era novelo que ia aumentando sem embaraços.
A rua onde habitava tinha a planura suficiente para os vizinhos se conhecerem. Apesar da discrição, ou por causa dela, António era muito observado. Sabia-se que não se ausentava longamente, a avaliar pelas janelas abertas logo de manhãzinha e luz acesa ao serão.
Porém,  depois do verão, as janelas mantiveram-se fechadas e as luzes não se acendiam. As vizinhas, curiosas, sabiam da sua presença na Repartição e das vindas a casa, mas de fugida.
- Onde passará ele as noites? 

(...)


Para os tios e primos, sempre amorosamente próximos, alegrias vermelhas. Pensou, a seguir, nos colegas da Repartição. Para a Fernanda, que tudo via cor-de-rosa,  uma planta da mesma cor; para a Linda, que apreciava a limpa arrumação dos papéis, a flor branca; para a Sílvia, de bâton laranja em dias de sol, flores do mesmo tom; para o Bruno, acastanhadas para poder oferecer a uma das muitas namoradas para quem tinha sempre claras mentiras.  Para as vizinhas, a quem achava muita graça por tentarem, sorrateiramente, entrar na sua privacidade, alegrias-do-lar amarelas. Sorria quando as três diziam "nós", numa espécie de curiosíssima trindade.

Entretanto, um vaso vermelho-fogo estava separado na estufa e era ainda mais carinhosamente tratado. Oferecê-lo-ia se o desejado convite chegasse.
 
(...)
Excertos do meu conto, publicado na coletânea
 Lugares e Palavras de Natal, 2017, da Editora Lugar da Palavra

Lugares e Palavras de Natal - ontem no Porto

Ontem ao fim da tarde, muitos autores das histórias da coletânea Lugares e Palavras de Natal estiveram reunidos no Café Progresso, no Porto, bom sítio, de novo escolhido pela Editora Lugar da Palavra, para a apresentação do livro que já vai na sexta edição.
Cá fora, estava frio, mas lá dentro, sobretudo à volta da grande mesa que ocupávamos, sentia-se o calor de quem escreve por amor às palavras e à vida.
Foi dito que a autora mais nova tinha dez anos. A mais velha, não sei, mas talvez mais de setenta, mas isso pouco importa.
O importante é haver momentos inspiradores, bons lugares e boas palavras, neste caso, de Natal.
Uma das janelas do Café Progresso. Também elas natalícias.
A coletânea reúne histórias e poemas de Natal de dezenas de autores.

sábado, 9 de dezembro de 2017

Outro texto sem importância

Tive de levar o carro ao mecânico. Outra vez. É o que faz ter carro bastante velho. Para amenizar o incómodo e o dinheiro gasto, digo que está doente e hospitalizado com frequência.
Vem-me trazer a casa porque está a chover. Falamos do Natal. E que vai ser o pai Natal na festinha dos miúdos. E dos supermercados cheios. E das horas que lá se passam. Eu digo que prefiro fazer compras à hora do almoço. E da dependência do carro. Ele confirma. E não fosse a área dele. E das compras de Natal. E não fosse a área de quase toda a gente.
Digo-lhe que preciso do carro hoje. Diz que vai ver o que pode fazer. Com ar de dia seguinte a um feriado e véspera de domingo.
Está a chover. O que é bom. Muito bom. Pensando bem, fico sem carro e não dá lá muito jeito, mas a chuva é precisa. Venha ela.
Despedimo-nos. Obrigada. Não se esqueça de que preciso do carro hoje. Pois, já me disse, diz ele, ensaiando um sorriso de Pai Natal.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Incêndios na Califórnia

Mensagem enviada para dez milhões de habitantes.
Long Beach, hoje, com fogo no horizonte.

Duas árvores de Natal: e sei de qual gosto mais!!!!


Um texto sem importância

Feriado. Podia preguiçar mais um bocadinho. Foi o que fiz. Soube bem. O tempo está frio. Cinzento. Chuvoso. Gostava era de ouvir a chuva a cair. É bom estar em casa e ouvir o  barulho da chuva. Cada vez mais, mas tem-se ouvido cada vez menos.
Quero fazer a árvore de Natal. Há uns anos que a fazia com ramos secos de árvore. Faz-me impressão ver árvores cortadas ou arrancadas para esse efeito. Embora algumas sejam arrancadas com critério e por necessidade da organização da floresta. Vi há pouco uma notícia vinda dos Açores que achei de relevo: venda de árvores etiquetadas pelos serviços florestais para garantir que não eram cortadas indiscriminadamente.
Optei este ano por comprar uma árvore artificial. Vem a Clarinha e julgo que a magia será maior do que os ramos secos, ainda que com enfeites bonitos.
Este ano, em Londres, ao ver as luzinhas acesas na árvore de Natal, vi o sorriso e os olhinhos dela a iluminarem-se.
O tempo continua cinzento mas a chuva mal se ouve. 
Daqui a pouco, o peixe do forno vai exalar um cheirinho quente. Espero eu. E a abóbora assada com batata doce. Novos hábitos e sabores que vamos adquirindo.
Oxalá possa ouvir a chuva cair nem que seja à noite.
E que as luzinhas que vou pôr na árvore de Natal acendam também o sorriso da Clarinha. E não só.
E que as coisas, aparentemente sem importância, continuem a ter importância.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

A mesma ideia

Estes saquinhos com bombons, frutos secos, um pequeno objeto natalício como um presépio, etc poderão ser um pequeno e carinhoso presente de Natal.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Não é só por ser quase Natal



quinta-feira, 30 de novembro de 2017

A visita



O dia estava mesmo frio. Uma boa altura para ir ao Camden Arts Center, perto do centro de Londres. Um pequeno museu. Sossegado. Pessoas simpáticas na receção. Átrio com exposição de livros e postais bonitos. Não turísticos. Um café luminoso com vista para o jardim. Sandwiches e saladas. E sopa do dia. A galeria é no andar de cima. 
Visitantes da galeria apenas um:  a visitante. Não fazia mal. Não precisava de se pôr em bicos de pés para ver as obras. Estava tudo ao alcance do seu olhar.
Havia duas exposições: uma ocupava uma sala e era de Christian Nyampeta (Words after World), um jovem artista nascido em 1981; e outra de Nathalie Du Pasquier (Other rooms), menos jovem, nascida em 1957, que ocupa duas salas e dá capa ao catálogo.
A visitante percorreu as três salas com vagar e alguma atenção. Fixou-se mais na exposição maior: pelas cores exuberantes, pelo desenho, pelo geometria. Pelos volumes.
Leu referências sobre os autores dos trabalhos. Desceu  até ao átrio. Havia escadas. Usava menos o elevador. Num écran, os autores falavam dos seus trabalhos e do local onde estavam expostos.
A visitante parou a ver e a ouvir.
Nathalie Du Pasquier, com um sorriso de alegre encantamento, falava do seu trabalho. 
Havia legendas. Muito bem. Assim a visitante compreendia melhor. A designer e pintora foi dizendo que era feliz todos os dias ao realizar o seu trabalho. E estas palavras tão simples e ditas com verdade da expressão cativaram a visitante. Tanto como a obra exposta.
A visitante comprou alguns postais não turísticos e saiu.
A visitante tinha ganhado o dia.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Quando um livro acaba e a vontade de o reler começa!

Acabei de ler o Manual para Mulheres de Limpeza de Lucia Berlin. Li toda a coletânea de contos sempre com a mesma vontade. São mais de quinhentas páginas que nos fazem segurar o livro durante todo o tempo possível porque tudo é contado com muita vivacidade e de uma maneira verosímil - a autora diz que não é preciso que a história seja verdadeira, tem é de ser verosímil, venha ela donde vier.
O final das histórias é sempre inesperado e sugestivo, o que dá logo vontade de ler o conto seguinte.
Problemas como a droga, a doença, o alcoolismo, o fracasso familiar, a miséria são apresentados de uma forma realista mas não deprimente. Estão lá e as pessoas que os corporizam riem, choram, falam, pedem ajuda, calam-se, gritam...
Mas o amor, os encontros felizes, a reconciliação, os afetos estão presentes e pressentem-se os abraços e as conversas e os silêncios...
A infância e a juventude são igualmente recorrentes, como são as relações sobretudo mães-filhos.
O fascínio pela natureza também lá está, tanto pela observação do momento (as montanhas, as flores, as árvores, as aves, o céu estrelado) como imagens da memória.
Também gostei do facto de haver várias histórias em que a leitura e a escrita são referidas, como o conto que aborda um curso de escrita criativa numa prisão.
Ao longo das narrativas, tantas vezes tecidas com bom humor, existem personagens de quem é dito que "gostam das pessoas".
Com este livro, acho que Lucia Berlin também gosta(va) mesmo das pessoas.

Que bom haver boas sugestões!


Presto sempre atenção às sugestões literárias e musicais de Nicolau Santos, no seu Expresso Curto. Ontem, Seal foi um dos cantores sugeridos, embora não por estas músicas.
E, habitualmente,  acho boas as suas partilhas.
É bom ver e ouvir um homem que tanto sabe de Economia falar destas coisas de cultura, reconhecendo-lhes muita importância para a vida de cada um.
Referiu também o livro 4321 de Paul Auster.
O título é sugestivo porque, a meu ver, muita coisa haverá para descobrir.
Quando puder, vou tentar lê-lo.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Passeio por Istambul

Vista do palácio Topkapi
Haya Sofia

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Comeres e beberes em Istambul

A semana passada esteve chuvosa e fria. Tomar chá frequentemente ajuda a aquecer - tanto lá como cá.


Obrigada, A., pelas fotos. Bom regresso. É pena não encontrares chuva.

Flores amarelas sob céu cinzento


quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Lição

Um dia, houve a apresentação de um livro num infantário. Havia meninos e pais a assistir. As autoras  sentaram-se em cadeiras baixinhas, tal como todos os presentes. Como a assistência não era numerosa, travou-se um diálogo, neste caso, mesmo de proximidade.
Havia uma menina muito faladora que revelava bem se estava a gostar, ou não, das conversas ou das estórias que também foram lidas.
A um dado momento, a menina, que devia ter uns três anos, disse para as autoras, encostando-se à mãe:
- Eu gosto de ouvir estórias, mas têm de ser pequeninas e que eu perceba, senão fico com muito sooooono!
Todos sorriram e tentariam aprender a lição.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

O guardador de livros

Era um homem que vivia só e não gostava de emprestar livros, ou melhor, nunca os emprestava. E desde muito novo que os comprava. Mesmo quando o dinheiro era pouco e o desejo de ler era muito. Eram criteriosamente escolhidos, lidos e organizados nas estantes. Que existiam na sala, no quarto e se estendiam pelas paredes do corredor.
Quando queria, encontrava-os facilmente, ou para falar deles em encontros literários ou em pequenos grupos que o convidavam para falar de um livro ou do papel da leitura ou simplesmente para os reler. Dificilmente deixava que o interlocutor manuseasse os livros que eram seus. Se alguns dados fossem necessários, era ele que os procurava e ditava-os ao interessado. Se alguém lhe pedisse para fotografar a capa, ou algum elemento do interior do livro, só autorizava se não fosse com flash.
E assim foi ao longo de muitos e muitos anos. 
Às vezes convidava uns amigos para a sua casa. Mais amigos dos livros, por assim dizer.
Nunca os deixava sós junto das suas preciosidades, para se certificar que ninguém lhes mexia ou as tirava do lugar.
Ainda não disse, mas o guardador de livros há muito que tinha redução no bilhete de transportes públicos. Um dia, aconteceu o que cada um tem mais certo.
O apartamento foi vendido, os livros colocados em caixotes e alguns foram para reciclar. Como eram muito pesadas, houve caixas que cederam no transporte. Alguns livros caíram na rua encharcada e ninguém os quis.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Um parque para todos - até quando?

Hampstead Heath, em Londres, num soalheiro - ainda que frio - domingo de manhã.

domingo, 19 de novembro de 2017

Um livro interessante


Disse muitas vezes aos meus alunos que não utilizassem o adjetivo "interessante" e, apesar disso, usei-o no título. Foi o que me ocorreu para este livro de contos - histórias curtas que relatam vivências da autora, como é dito em textos preliminares.
Gosto do estilo: frases curtas, objetividade na narração dos factos, às vezes aparentemente pequeninos como são os dos comuns mortais; outros de grande complexidade, tal como são também muitos dos comuns mortais.
A autora, nascida no Alasca, em 1936, morreu na Califórnia, em 2004, tendo deixado dezenas de contos escritos. Este livro é uma coletãnea dos considerados melhores.
Comecei a ler e, se pudesse, não parava durante horas seguidas.
As histórias abordam temas ligados às profissões que a autora teve para sobreviver, relações familiares tempestuosas, casamentos falhados, mas também uma adesão sem reservas à vida, mesmo na profundidade dos mares.
O título da obra é de um dos contos.
Vale a pena ler. Tem vivacidade, fala do mundo, nem sempre cor-de-rosa, mas as cores da natureza humana nem sempre o são. E isso é interessante. Muito.

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Abbey Road e a imagem que ficou


Algumas pessoas atravessam a passadeira com o mesmo movimento de braços que os Beatles, o que faz do local - já bonito em si - um lugar de observação e divertimento. E talvez algumas das músicas ainda andem no ar ou na memória.

Curioso!

Já estive várias vezes em Abbey Road e, curioso, nunca atravessei a mítica passadeira para peões, eternizada por um álbum dos Beatles. E, curioso também, passam lá diferentes gerações e não apenas as que mais os ouviam e dançavam. A avaliar pelas fotografias que são tiradas por pessoas de todos os continentes, parecem vir de propósito àquele local como se vai a outro sítio onde se sente mais vivamente a presença de quem lá esteve ou viveu.
Vêm, não sei se por nostalgia, se por amor à música que engloba o mundo e a vida, se por desejo de transpor uma passadeira de fama nem que seja por segundos. E que por sinal já está um pouco gasta.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Caído no chão

Ontem, um homem velho caiu junto à porta de um grande supermercado. Ia só.
Era muito alto, forte e usava óculos. Feriu-se na testa, donde escorria algum sangue, mas sorriu por não ter partido os óculos.
Foi difícil levantá-lo porque era muito pesado. Um casal aproximou-se logo e mais duas pessoas que passaram depois da queda ajudaram a levantá-lo. Quando se viu de pé, o homem agradeceu e disse ter escorregado nas folhas húmidas do chão.
Afinal, já não ia ao supermercado.
Ainda era um homem bonito. 
Não sei se a sua intenção era ter companhia enquanto bebia o café em copo grande que era oferecido a todos os clientes com cartão.
Voltou para o metro e um homem indiano disse que o levava até à estação.