sábado, 3 de junho de 2023

Se eu pudesse recuar no tempo, não sei se queria voltar à infância

 

Felizmente há bastantes pessoas que falam da sua infância como um tempo feliz. Nesses casos de felicidade recordada, para além dos pais, quase sempre há um avô ou uma avó a amaciar os caminhos com amorosa candura.
Os meus avós maternos não os conheci. Morreram ainda novos, já com muitos cansaços e muitos filhos.
Os meus avós paternos, que tiveram também uma família numerosa, esses, felizmente, conheci-os. O meu avô era um homem grande e forte, muito ternurento, que alimentava as suas alegrias e histórias quotidianas vendo o futebol da terra e ouvindo bandas de música nas festas populares. Não falava muito da sua infância, mas tinha começado a trabalhar ainda menino.
A minha avó, porém, estava mais fechada ao amor e a meigas interações. O momento feliz do seu dia era quando ouvia o Tide, o folhetim da rádio. Esses momentos eram a hora do sonho e da vida a tornar-se leve. Ou o refúgio numa vida que gostava de viver mas que lhe fugia ou não tinha força de agarrar.
Enquanto eu ia crescendo, ia-me apercebendo de muitas pessoas à minha volta com muita inteligência, mas nas quais se pressentiam mágoas de não acederem à felicidade que conseguiriam atingir mais facilmente se tivessem, por exemplo, estudado ou sido apoiadas por figura boa e amaciadora dos seus caminhos.  
Como uma corrida de maratona que se deseja, mas para a qual não se tem apoio para treinar nem se arranja treinador.
Foram muitas pessoas de diferentes idades que fui conhecendo, dentro e fora da família, muitas delas a trabalhar desde crianças pequenas, e que se ressentiam, ao longo da vida, da falta de valorização e do roubo de direitos tão comum nessa época de enorme desamparo social.
Muitas dessas pessoas talvez gostassem de voltar à infância, mas por uma única e  complexa razão: com o que já sabem, poder viver um tempo mais feliz do que aquele que conheceram.
 
 

3 comentários:

  1. Eu poderia voltar, e se calhar fazia algumas coisas diferentes! :))
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    A Vontade de lá voltar...
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    Beijo, e um excelente fim de semana,

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  2. Imagino que, a haver céu e lugar de transcendência, ele será qualquer coisa de infantil e sem problemas. E não uma fase da vida, mas um sempre. E que os homens serão inocentes e espontâneos como crianças.
    Não sei se isto responde à questão da Maria Dolores sobre voltar ao que não se pode; porque não se volta a coisa nenhuma.
    Um abraço

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  3. Eu de certeza não quereria. Não quereria voltar à miséria, que foi a minha infância.
    Abraço, saúde e bom domingo

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