'Pai, dizem-me que ainda te chamo, às vezes, durante
o sono - a ausência não te apaga como a bruma
sossega, ao entardecer, o gume das esquinas. Há nos
meus sonhos um território suspenso de toda a dor,
um país de verão aonde não chegam as guinadas
da morte e todas as conchas da praia trazem pérola. Aí
nos encontramos, para dizermos um ao outro aquilo
que pensámos ter, afinal, a vida toda para dizer; aí te
chamo, quando a luz me cega na lâmina do mar, com
lábios que se movem como serpentes, mas sem nenhum
ruído que envenene as palavras: pai, pai. Contam-me
depois que é deste lado da noite que me ouvem gritar
e que por isso me libertam bruscamente do cativeiro
escuro desse sonho. Não sabem
que o pesadelo é a vida onde já não posso dizer o teu
nome - porque a memória é uma fogueira dentro
das mãos e tu onde estás também não me respondes'.
Maria do Rosário Pedreira, in 'Nenhum Nome Depois'
sexta-feira, 19 de março de 2021
'Pai, Dizem-me que Ainda Te Chamo'
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Boa tarde Maria, obrigado pelo texto maravilhoso.
ResponderEliminarSim, Maria do Rosário Pedreira é muito boa poeta.
ResponderEliminarAinda bem que gostou, Luíz.
Um poema tão bonito da Maria do Rosário. Mesmo lindo. É uma boa poeta e muito versátil, os seus poemas para canções têm o tom brejeiro que não lhe imaginamos. Obrigada.
ResponderEliminarBoa noite, Maria.
Gosto muito da poesia de M.R.P. Julgo que é a autora de várias letras de fados, por exemplo, cantados por Aldina Duarte.
ResponderEliminarUm bom dia e um bom início de primavera, Bea.
Hummm....não aprecio fado. Abro poucas e honrosas excepções que Aldina Duarte não partilha. Mas acredito que seja diferente em fado e em canção ligeira, acho-a multifacetada.
ResponderEliminarUm dia, ouvi-a numa entrevista e referia que gostava muito de livros e de os ler. Gostei de ouvir. Disse também que de manhã gostava de 'pastar' pela casa. Não gostei muito do verbo, mas compreendi a ideia, porque também gosto de andar, quando posso, pela casa ou pelo quintal sem ter programa nem horas marcadas.
ResponderEliminarContinuação de tarde de sol.
Um belíssimo poema. Gosto muito da Maria do Rosário Pedreira. Ela é uma das poetas na galeria do meu blog desde 2012
ResponderEliminarhttp://amulhereapoesia.blogspot.com/search?q=Maria+do+Ros%C3%A1rio+Pedreira
Abraço e saúde
Também gosto muito de MRP. Refere coisas do quotidiano e torna-as poéticas, usando muitas vezes palavras comuns.
ResponderEliminarContinuação de boas e felizes ideias, Elvira.
Um beijinho