segunda-feira, 5 de julho de 2021

Foi como se

 

Foi como se entrasse de novo naquela casa. De paredes velhas mas retocadas com paciência durante longuíssimos anos. De telhado com ninhos vigiados, para que não deteriorassem as telhas nem entupissem os canos.

Foi como se parasse no telheiro da casa e revisse os molhos de redondas cebolas penduradas e prateleiras cheias de batatas e alfaias antigas no chão térreo. Ah! E como se olhasse a coluna de granito, como um esteio, com vasos viçosos à sua volta, a segurar os barrotes grossos mas fragilizados do palheiro.

Foi como se encontrasse as habitantes da casa a regar as plantas pela fresca das manhãs, a descansar nas tardes de estio, em recolhimento dos dias invernosos.

Foi como se visse perto a cadela da casa que, a correr, amedrontava. Ou pressentisse o agitado pato brincalhão a querer roubar-me o pão, quando eu era criança. Ou os fofos coelhos. Ou as ninhadas amarelinhas de pintos seguindo a segura mãe galinha...

Foi como se sentisse de novo o cheiro dos vegetais acabados de colher e logo saboreasse alguns, mesmo crus.

Foi como se cada coisa daquela casa me trouxesse as mesmas emoções e sensações boas e diferentes.

Foi como se aquele sonho fosse uma visita feliz àquela casa. Ainda que breve.

 

16 comentários:

  1. Por vezes o visitar/recordar cria emoções inexplicáveis.
    .
    Saudações amigas
    .
    Pensamentos e Devaneios Poéticos
    .

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Se cria. É como se agarrássemos um bocadinho o tempo e coisas boas que ele nos trouxe, embora ele fuja a correr.
      Um dia feliz, Ricardo.

      Eliminar
  2. Boa tarde
    O sonho foi bom e vai prevalecer como se fosse verdade.

    JR

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Bom dia.
      Sim, a verdade de cada um(a).
      Um dia muito bom, Joaquim.

      Eliminar
  3. Será que se refere à velha casa em a Ver o Rio? Até me custa acreditar Maria Dolores...
    Um pouco de ficção, realidade ou uma mistura das duas como quase tudo o que se cria? Parece um voltar à velha casa que guarda muitas recordações.
    Boa noite.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Que bom, Joaquim, ter referido a casa de A Ver o Rio. Não, esta é outra. Nesta, ficaram mais pedaços da minha infância.
      Um dia bem feliz.

      Eliminar
  4. Estas recordações fazem tão bem à alma!:)

    -
    Solto mil pensamentos coloridos ...
    -
    Beijos, e uma excelente semana

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Se fazem, Cidália. Acho que 'recordar não é viver', mas é bom.
      Um beijinho

      Eliminar
  5. Boa noite. Esse texto nos faz lembrar dos lugares que passamos e nos trazem boas recordações.

    ResponderEliminar
  6. Bom dia, Luiz. E, felizmente, quase todos nós temos lugares da memória que são bons, ainda que não perfeitos, porque (quase) nada o é.
    Um abraço

    ResponderEliminar
  7. É bom quando se despertam sensações e emoções!!! 👏👏👏

    ResponderEliminar
  8. Acho que todos passamos por isso em relação a espaços importantes na nossa infância.
    Obrigada e um beijinho

    ResponderEliminar
  9. Já não sonho tão bonito. Mas não tenho grande memória de casas, lembro melhor espaços livres e gente; ou situações ocorridas; tal como nos filmes não oiço a música, nas situações não sei as casas onde ocorrem. Esse seu sonho é um encanto e está tão bem descrito que até julguei fosse nova história.
    Quando garota pequena, nasciam-me feridas pelo corpo. Lembro-me delas e conservo algumas marcas. Certa vez estava junto à rede da capoeira (passava muito tempo a olhar as galinhas e os perús) e tinha um dedo desgraçado por uma ferida violácea, inchada e purulenta. Veio uma galinha sorrateira e bicou-ma. Foi uma berraria. A casa de minha avó floria por todo o lado. Mas no interior nunca vi um vaso ou sequer uma haste de flor. Cada pessoa é um mundo.

    ResponderEliminar
  10. Sim, há lugares que nos ficam, mas pessoas também, felizmente. E até alguns animais, como a cadela e o pato que me assustava imenso, porque ia atrás de mim, sobretudo se tinha pão na mão. E também galinhas e coelhos. A tal galinha sorrateira é que foi mesmo de ficar na memória. Imagino a dor.
    Desde miúda que estou habituada a ver flores e plantas nas casas, mas cada pessoa tem, de facto, as suas preferêncas e prioridades e tem direito a tê-las.
    Ah, obrigada, Bea, pelas palavras simpáticas.
    Uma noite bem descansada

    ResponderEliminar
  11. Há locais que criam vivências na nossa memória que nunca mais se esquecem.
    Abraço e saúde

    ResponderEliminar
  12. Bem verdade, querida Elvira.
    Um abraço e muita saúde também

    ResponderEliminar