sexta-feira, 30 de junho de 2023

Desperdiçamos até o sol

 

Fiz análises clínicas e a vitamina D está muito abaixo do que devia estar. E podia estar. Porque, felizmente, no nosso país temos sol em abundância. Porque, felizmente, tenho espaço exterior onde posso circular. Porque, felizmente, onde vivo é quase aldeia (se é que se pode dizer assim) e tenho passeios onde posso caminhar, apesar de nem sempre estarem nas melhores condições. 

Em casa, já levei um 'sermão': tens de caminhar mais e apanhar mais sol.

E, desta vez, fiquei com vontade de me disciplinar um pouco mais, caminhar e apanhar sol, embora moderadamente porque, na pele que me cobre, sou mulher do sul, apesar de, por nascimento, ser mulher do norte.

Tenho de sair mais da famigerada zona de conforto que é a minha casa.

Para começar, como hoje não tenho o neto, vou lá fora varrer folhas caídas pelo vento. E apanhar ameixas. E tirar algumas ervas às plantas, etc.

E fazer festas à Castanha. Também a meiguice dela tenho de aprender a não desperdiçar.

Um dia bem vitaminado para todos.

 

terça-feira, 27 de junho de 2023

Coração e avenca

 

As duas plantas viviam lado a lado. Há algum tempo. Pela fresca, bebiam a água que lhe davam do regador já antigo, que parecia já saber como regar: no pé da planta e devagar.

Quis a natureza - ou Deus, não sei - que as duas plantas tivessem formas diferentes e buscassem espaços também diversos.

A planta dos corações reproduzia-se na vertical buscando a terra; a avenca elevava-se no ar, e para os lados, como ancas de mulher.

E assim viviam, cumprindo, à sua maneira, a função de verdejar a prateleira onde moravam.

Um dia - por acaso, hoje - foram encontrados a abraçarem-se. O coração - vamos chamar-lhe assim porque não lhe conheço o nome - que reproduzia novos corações na vertical, tinha estendido um dos seus braços à avenca vizinha. Pareciam felizes no momento.

E quem regava as plantas desejou parar o vento para que ele não as separasse. 

 

domingo, 25 de junho de 2023

Por dentro da vidraça

 

O calor era muito dentro de casa. Tornava-se insuportável.

O estreito corredor entre a porta de casa e o passeio da rua tinha sombra, mas o ar quente parecia agarrado às duas paredes.  Optou por sair. Abriu o portão e conseguiu passar, mesmo sem a ajuda da mulher. Cá fora, e respirando ar mais fresco, pôs o encosto da cadeira para trás e os pés mais altos.

Sentia o alívio de respirar melhor e não transpirar tanto como dentro de casa. Ficou ali um bom bocado, de cabeça levantada como se apenas o céu lhe interessasse.

Um menino estava com a avó por dentro da vidraça da casa em frente. Quando foram para dentro, o menino disse adeus ao nhô nhô, que, para ele, queria dizer senhor.  Não respondeu ao aceno porque o olhar dele não estava nessa direção. Ou talvez dormitasse, aproveitando o consolo da brisa mais fresca.

O menino voltou a dizer adeus por dentro da vidraça.

A avó voltou a pensar naquele homem grande e bonito, prisioneiro de uma cadeira de rodas. Que pena ter tido o acidente. E também saber que lhe chamam o aleijadinho.

 

sexta-feira, 23 de junho de 2023

Ó meu rico S. João...

 

Ó meu rico S. João

Peço-te neste calor

Que refresques o ambiente

Nele pondo mais amor

E vem feliz se puderes

Sem mentira mas verdade

Queremos é bons exemplos

Sem blá blá nem falsidade

Dá ânimo a quem não tem

P’rà vida a todos sorrir

Sem ver tantos a chorar

Ou a terem de partir

Hoje não irei ao Porto 

Pra te ver a festejar

Mas comprei um manjerico

Para a casa perfumar!

domingo, 11 de junho de 2023

A oficina e o café

 

Nas manhãs de vários sábados, chegávamos à mesma hora ao café que fica bem perto de algumas de nós.

No início, era só uma, depois duas e, em breve, já éramos quatro ou cinco amigas, à mesa porque a mestra se nos juntou também. Era um gostoso aquecimento para umas horas a cortar, combinar, coser tecidos, vendo aparecer um objeto bonito e nosso.

Eram divertidas e criativas essas manhãs de sábado na oficina de costura. Escolhíamos os tecidos e, sempre com a ajuda da mestra - mais nova do que nós -, fizemos chapéus, sacos de várias formas, capas para caderno ou álbum, etc, etc, etc.

Com a sua peça acabada, cada uma de nós sentia a alegria de a ter produzido. Ou quase, melhor dizendo, porque a mestra lá acertava o corte e a cosedura, se o desacerto era grande.

Ontem foi a despedida dessas manhãs de sábado tão costurado como animado.

A mestra, que era uma boa mestra e também muito gentil, ofereceu-nos, nesta última sessão, pedaços de tecidos para continuarmos a fazer os nossos trabalhos em casa. Vistosos mimos a saírem de uma caixa de retalhos dobrados, desdobrando já novas ideias.

No próximo sábado, talvez a senhora do café repare na nossa ausência porque, desde o primeiro dia, ocupávamos sempre a mesma mesa. Ou talvez não, porque os cafés e pingos e meias de leite e galões e torradas e pães com queijo são peças que vai servindo todas as manhãs com pouco descanso. Sempre com um sorriso suave e natural. Também de mestra.

 

terça-feira, 6 de junho de 2023

MIMOS DE JUNHO - Antologia Poética 2023

 Reenvio o regulamento que também recebi. 

Que o mês de junho traga estes ou outros mimos.

 

"MIMOS DE JUNHO Antologia Poética 2023 A Mimos e Livros continua a celebrar a Poesia e quer comemorá-la consigo!  Vamos publicar nova Antologia Poética: MIMOS DE JUNHO.  Participe! Regulamento 1. O prazo de inscrição para participação na antologia MIMOS DE JUNHO e envio de textos decorre até 27 de junho de 2023. 2. Os textos devem ser enviados em suporte informático (tipo word) e remetidos para geral@mimoselivros.pt 3. Serão admitidos textos do género lírico (poemas e prosa poética). 4. Cada autor poderá participar apenas com um texto, que pode ocupar, no formato de poesia tradicional, até 30 linhas de verso (incluindo espaços de transição de estrofe e eventuais versos demasiadamente longos) ou, na prosa poética, um máximo de 1400 caracteres (espaços incluídos). 5. A ordem de publicação obedecerá a um critério a definir, posteriormente, pela organização. 6. Os autores podem utilizar pseudónimo, embora sejam obrigados a identificar-se e o seu nome ser incluído na breve biografia a constar do livro. 7. Os autores devem enviar uma curta nota biográfica, que será publicada, com um máximo de 500 caracteres, incluindo espaços. No caso de exceder o limite fixado, a organização reserva-se o direito de proceder às alterações que achar convenientes. 8. O tema dos textos é livre.  9. No caso de a organização entender que o número de participantes não é suficiente para a edição do livro, os textos serão publicados on.line no site da editora Lugar da Palavra, em www.lugardapalavra.pt e enviado um exemplar em formato pdf a todos os participantes. A organização é soberana na seleção dos textos a incluir na obra. 10. A organização e seleção dos textos para publicação pertencem à Mimos e Livros Edições, uma chancela da Lugar da Palavra Editora. Da decisão de seleção ou não do júri não haverá recurso. 11. Todos os textos serão alvo de revisão, com vista a apresentar um trabalho da maior qualidade possível, comprometendo-se, obviamente, a organização a nunca desvirtuar o original do autor. 12. Os participantes disponibilizam os seus textos exclusivamente para a presente publicação, sendo- lhes, obviamente reconhecido o seu direito de autor (pelo qual assumem essa responsabilidade), mas não serão pagos quaisquer direitos patrimoniais. Ou seja: o participante envia textos da sua autoria (se já publicados, com a respetiva autorização competente) e cede-os exclusivamente para o fim em questão, não resultando da sua publicação a obrigação da editora de pagamentos de direitos patrimoniais ao autor.13. Os participantes selecionados beneficiarão de vantagens na aquisição de Mimos de Fevereiro e obrigam-se a adquirir pelo menos um exemplar da obra. 14. A participação implica a aceitação de todos os termos do presente regulamento. 15. Será formado um Conselho Editorial, composto por três elementos, que terá por função pronunciar-se em relação à qualidade de alguns textos com vista à sua inclusão (ou não) na antologia. 16. Os casos omissos serão resolvidos pela organização." 

Voltei à cozinha

 

Passar dias e muitas horas com um neto de dois anos, não fazemos bem o que queremos nem temos algumas coisas no sítio onde queremos, embora a sua presença nos traga muitas e alegres recompensas.

Uma dessas coisas é o meu computador que gosto de usar na mesa da cozinha, mas que, com uma criança cheia de energia, não será o lugar mais conveniente. Por isso, ocupa habitualmente espaço mais quieto e menos frequentado.

Como esta semana tenho mais dias por minha conta, uma das coisas que voltou ao lugar, onde gosto de o encontrar, foi o meu computador. 

Assim, enquanto estou a cozinhar - hoje são favas do meu quintal - vou escrevendo. 

Deve cheirar bem na cozinha, mas não sei bem porque não recuperei o olfato que a pandemia ainda não me devolveu.

Porém, o computador na cozinha devolveu-me algum prazer. Embora também seja bom  voltar a levá-lo para onde estava, quando chegar o meu pequenino.

 

domingo, 4 de junho de 2023

Um domingo bom que passa devagar. Será?

 

O céu está enevoado e o domingo, calmo, por minha conta. Sem programa nem solicitações em final de semana, o que me sabe muito bem.

Tinha pensado ir cedo pela manhã à 'minha' cidade com o mar ao fundo, mas mudei de ideias. Ficaria em casa a organizar algumas coisas, o que me ajuda a arrumar também a mente e, finalmente, podia tirar as ervas daninhas de umas taças com catos. E regar as plantas que agora florescem dando aos canteiros um ar bem-vindo de beleza e de festa.

E vi que outras plantas precisam também de arranjo, que lhes amacie a terra para que a água não fique só à superfície ressequida. Será a próxima etapa. Talvez numa manhã ou fim de tarde em que não tenha pressa nem de olhar para o relógio muitas vezes.

Fiz o almoço e comi devagar. Talvez demasiado pão, mas não resisti à regueifa fresca que fui comprar à padaria. Ai saborosa tentação de domingo.

Durante o almoço, vi um programa de culinária, porque já me causa fastio o famigerado computador roubado ou desviado, o SIS que foi chamado e não se sabe ao certo por quem, etc

Agora, com a tarde a avançar, quero ler algumas páginas de um livro em que Fernando Pessoa é personagem. Poderei ler devagar porque a casa, silenciosa, chama e apetece.

Depois das cinco horas, joga o meu clube. Até à noite, poderei continuar a gerir calmamente o meu domingo, só que, durante o jogo, o tempo não passará tão tranquilo e devagar como até aqui. Não sei.´Prognósticos só no fim do jogo'!!!

Um belo e feliz domingo para todos! 

 


sábado, 3 de junho de 2023

Se eu pudesse recuar no tempo, não sei se queria voltar à infância

 

Felizmente há bastantes pessoas que falam da sua infância como um tempo feliz. Nesses casos de felicidade recordada, para além dos pais, quase sempre há um avô ou uma avó a amaciar os caminhos com amorosa candura.
Os meus avós maternos não os conheci. Morreram ainda novos, já com muitos cansaços e muitos filhos.
Os meus avós paternos, que tiveram também uma família numerosa, esses, felizmente, conheci-os. O meu avô era um homem grande e forte, muito ternurento, que alimentava as suas alegrias e histórias quotidianas vendo o futebol da terra e ouvindo bandas de música nas festas populares. Não falava muito da sua infância, mas tinha começado a trabalhar ainda menino.
A minha avó, porém, estava mais fechada ao amor e a meigas interações. O momento feliz do seu dia era quando ouvia o Tide, o folhetim da rádio. Esses momentos eram a hora do sonho e da vida a tornar-se leve. Ou o refúgio numa vida que gostava de viver mas que lhe fugia ou não tinha força de agarrar.
Enquanto eu ia crescendo, ia-me apercebendo de muitas pessoas à minha volta com muita inteligência, mas nas quais se pressentiam mágoas de não acederem à felicidade que conseguiriam atingir mais facilmente se tivessem, por exemplo, estudado ou sido apoiadas por figura boa e amaciadora dos seus caminhos.  
Como uma corrida de maratona que se deseja, mas para a qual não se tem apoio para treinar nem se arranja treinador.
Foram muitas pessoas de diferentes idades que fui conhecendo, dentro e fora da família, muitas delas a trabalhar desde crianças pequenas, e que se ressentiam, ao longo da vida, da falta de valorização e do roubo de direitos tão comum nessa época de enorme desamparo social.
Muitas dessas pessoas talvez gostassem de voltar à infância, mas por uma única e  complexa razão: com o que já sabem, poder viver um tempo mais feliz do que aquele que conheceram.