quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Obrigação


Uma encarregada de educação foi à escola da filha para falar com o diretor de turma. Um pai havia chegado mais cedo, estava a ser atendido e a reunião demorou algum tempo.

Enquanto aguardava a sua vez, a encarregada de educação ia observando o que se passava perto de si. Viu, então, que os alunos se abeiravam da funcionária em busca de informações. Nenhum dizia boa tarde à chegada nem obrigado após esclarecimento.

No diálogo com o diretor de turma da filha, a encarregada de educação falou do assunto. E disse: não compreendo estas atitudes; isto é uma escola. Ele lembrou-lhe que estas coisas são aprendidas em casa. Ela olhou-o durante alguns segundos e rebateu: a gente em casa não liga a isso, mas pensava que na escola eram obrigados!

Não me Peçam Razões...


Não me peçam razões, que não as tenho,
Ou darei quantas queiram: bem sabemos
Que razões são palavras, todas nascem
Da mansa hipocrisia que aprendemos.

Não me peçam razões por que se entenda
A força de maré que me enche o peito,
Este estar mal no mundo e nesta lei:
Não fiz a lei e o mundo não aceito.

Não me peçam razões, ou que as desculpe,
Deste modo de amar e destruir:
Quando a noite é de mais é que amanhece
A cor de primavera que há-de vir.

José Saramago, in Os Poemas Possíveis

Hoje, 16 de novembro, José Saramago faria anos.

A estória


A menina fazia sete anos. A tia escreveu-lhe uma estória. Pequenina e terna. Chamou-lhe A boneca feliz. Feliz podia ser a boneca ou podia ser a menina. Pô-la em folha A4, frente e verso, em forma de livrinho. Ilustrou-a com desenhos e colagens. Ficou apelativa.

Mesmo assim, a tia não sabia se a sobrinha ia gostar. No momento de dar o presente, estava atenta à reação da pequena aniversariante. Queria dizer-lhe que reparasse na estória. Devia lê-la só depois da festa para compreender melhor.

Estava a gostar de ver a sobrinha com gosto e curiosidade. Ao lado, outra menina, dando a mão à autora da estória, disse risonha: olha, eu também vou fazer anos. É dia 30!

Também a tia ficou feliz.

Emoções

S/cem palavras

Atelier de escrita criativa. O dinamizador pede que os participantes mencionem situações que ficaram na memória.

Surgem as mais diversas: doenças graves de parentes próximos; desencontros amorosos, conflitos familiares...

Repetido foi o tema da escola: um rapazinho gordo que se vê ridicularizado pela turma ao ser chamado como tal; uma menina, humilhada, ao ver o seu primeiro desenho apresentado como exemplo do que não deve ser feito, por causa da cor do céu; outra menina, desajeitada, que leva a pasta para o recreio, no primeiro dia de aulas, porque desconhecia o funcionamento da escola…

Emoções antigas: contam no presente.

PS - Encontro uma ex-aluna no bar de Serralves. Fico contente com a reação e com as palavras. É bom quando a escola continua a contar.

Despedida

S/cem palavras

A família nunca a tinha visto chorar. Não que não tivesse sentimentos, mas tinha sempre coisas a tratar, a fazer…

Uma neta ia estudar para fora do país. Não era por muito tempo, mas as ausências não se medem só pela conta dos dias.

A família, numerosa, reuniu-se para uma pequena festa de despedida. Porém, aquela neta, antes de partir, quis rever a avó. Para se despedir dela de uma maneira mais próxima e com mais tempo. O amor entre netos e avó era recíproco. Comovida e saudosa, chorou como nunca.

Como se adivinhasse que era o último adeus.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Mude-se o título: DIZ A AVÓ

Para a D. F, que também gostava de Poesia
DIZ O AVÔ

Tens cabelos brancos
Mas porquê, avô?
Caiu muita neve
Na estrada onde vou.

Tens rugas na face.
Mas porquê, avô?
Bateu muito sol
Na estrada onde vou.

Tens os olhos baços.
Mas porquê, avô?
Pousou nevoeiro
Na estrada onde vou.

Tens calos nas mãos.
Mas porquê, avô?
Parti muita pedra
Na estrada onde vou.

Tens coração grande.
Mas porquê, avô?
Nele mora a gente
Que por mim passou.

Luísa Ducla Soares, A cavalo no tempo.

domingo, 13 de novembro de 2011

Domingo fechado de chuva