quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Diário de Mariana

14 de setembro

Querido diário,

Soube hoje que as escadas e os corredores dos contentores (o nome chique é monoblocos) onde vamos ter muitas aulas são aos furinhos. Será que faltou o dinheiro e pouparam no pavimento? Ou então, esses materiais foram pensados por homens de barba rija. Vai ser lindo: as raparigas a subir de minissaia para o segundo piso e os rapazes em baixo a fazer de conta que perderam uma moeda. Por mim não há problema porque ando sempre de calças. Até já puseram umas placas no corredor por causa dos olhares indiscretos.

Uma funcionária muito fixe que eu conheço diz que tudo se vai arranjar. Eu gostava era de saber como se arranjam tantos milhões para pagar tantas obras Em casa, é só: não pode ser, não vês que a vida está má? Isso tem de ficar para quando as coisas melhorarem. A gente não sabe o que vai ser o dia de amanhã…

Mas eu sei que amanhã, vai ser a aula de presentação. Vou dormir mal de noite, mas só te digo a ti porque não me levam muito a sério. Se dissesse, ouvia logo: Vais, vais!

Beijinhos, meu grande amigo

Mariana

PS - E se as professoras que não conhecem as escadas e os corredores dos monoblocos vêm de tacões fininhos amanhã? Meu Deus!

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Diário de Mariana

13 de setembro

Querido diário,

Escrevi-te há algumas horas, mas como ainda tenho um bocadinho de tempo livre fui andar de bicicleta. Quando cheguei a casa, tive vontade de te escrever outra vez. Antes de sair, ouvi não sei quantas vezes: Mariana, anda devagar. Mariana, não fales com pessoas que não conheces, mesmo que pareçam fixes, como tu dizes. Mariana, atenção às pedras e aos carros. Mariana, anda só onde houver gente. Mariana, não demores…

A gente quando chega à escola, tem de se lembrar de regras que nunca mais acabam. Eu acho que as mães também deviam saber algumas. Por exemplo, que não se pode repetir tantas vezes as mesmas coisas. Fogo.

Quando ando de bicicleta, lembro-me de muitas coisas. A minha mãe diz que isso lhe acontece quando anda a pé. Diz que se lembra de coisas giras mas que depois se esquece. Eu juntei dinheiro e comprei-lhe uma agenda moleskine para ela tomar notas. Agora anda sempre com ela na carteira. Qualquer dia, vou espreitar.

Se calhar por ter falado da minha mochila, enquanto andava de bicicleta, lembrei-me que nunca tive nenhum professor que usasse mochila ou rabo de cavalo. Mas eu já vi e achei fixe. Os meus profs usam sempre pasta e cabelo rentinho. Algumas pastas são horrorosas. Tenho até um setor que usa uma pasta preta , muito cheia e já velha. Quando a abre, até demora a encontrar os papéis. É fixe porque assim podemos falar um pouco mais.

Será que é este ano que vou ter um prof de mochila e de rabo de cavalo? Falta pouco pra eu ficar a saber.

Até amanhã, querido diário.

Mariana

Por que se diz, pejorativamente, "fazer flores"?




Instantâneos/ Os meninos de sua mãe




Para o L. e para o J.

O menino disse uma palavra e a mãe rejubilou.

O menino temperou a salada e a luz da cozinha clareou.

O menino adormeceu e a mãe enlevou-se no seu respirar.

O menino viu o mar e correu correu para apanhar as suas ondas.

O menino sorriu quando viu que ia passear e a mãe estava junto dele.

O menino abriu o frigorífico e as mãos saborearam o queijo que espreitava.

O menino fez um gesto e a mãe escutou-o.

O menino é um anjo que vai voando perto de sua mãe.

O menino aproxima-se como se fizesse festas a uma árvore macia.

O menino está feliz e é mais sonoro o riso da mãe.

O menino chega à escola e sossega com palavras sossegadas.

O menino abraça a mãe refugiando-se na sua voz.

O menino despeja a água e refresca-se nela.

O menino procura a doçura da geleia.

O menino brinca como se o tempo não existisse.

O menino olha as imagens que passam e a mãe fixa-as no olhar.

O menino ouve a história que a mãe escreveu e quer agarrar o papel.

O menino cresce e continua a ser menino.