terça-feira, 28 de dezembro de 2021

4 de dezembro - um dia com histórias

 

Tal como eu já havia dito, foi apresentado, no passado dia 4 de dezembro, o livro As Fadas do Bosque das Cores e das Estórias, com ilustrações da Cristina Pinto, no Lugar do Desenho, em Gramido, Gondomar. Foi uma tarde boa, apesar das novas exigências anti-covid. As pessoas marcaram simpaticamente presença, o espaço tinha muitas das cores das estórias contadas e desenhadas no livro e estávamos felizes - autora e ilustradora - pelo trabalho produzido e pela boa recetividade de todos.

 

O livro e os marcadores

As fadinhas que 'voavam' para todos


A instalação com folhas de papel - ideia do bosque



Alguns dos trabalhos expostos


A árvore de diferentes cores

A mesa: Rep da Fund., Edit, Aut, Apres. Ilustrad.

As palavras que dirigi aos presentes:

 

Olá a todos. Bem-vindos.

Muito obrigada pela vossa presença, apesar de todos os afazeres e de todas as condicionantes e variantes da covid 19 neste tempo que atravessamos.

E a presença das crianças também é muito agradável, porque foi sobretudo a pensar nelas que escrevi a história deste bosque e destas sete fadas e também a Cristina Pinto nas suas ilustrações.

Na próxima semana, iremos a uma escola do 1º ciclo de Valbom dialogar com crianças sobre o livro e sobre tudo que vier a propósito, convite que nos agradou muito e esperamos que haja outros.

É muito bom escutar as crianças, as da nossa família, as dos nossos amigos, aquelas que não conhecemos e passamos a conhecer e ver como, na sua verdade, encaram o mundo. Se gostarem do livro e encontrarem alguma palavra ou algum desenho que as façam felizes e com vontade de contar, escrevendo ou desenhando, novas histórias, já valeu a pena este trabalho.

E em boa hora mostrei a história e alguns desenhos à Editora Novembro, que logo a quis publicar, acompanhando com atenção e profissionalismo todo o processo. Muito obrigada, Dra Avelina, D. Narcisa e Elsa, a designer, que soube enquadrar muito bem a história que escrevi e as ilustrações que a Cristina Pinto produziu. Foi igualmente a designer que compôs a capa que está muito bonita.

Muito obrigada também ao Lugar do Desenho/Fundação Júlio Resende que aceitou de imediato a proposta de fazermos aqui a apresentação do livro. E fiquei feliz pelo privilégio de podermos estar hoje neste  Lugar de que tanto gosto e onde há tanta arte,  tanta beleza e tanta simpatia, valores que são cada vez mais importantes para vivermos em harmonia, nas diferentes fases da vida. E todos sabemos bem que os tempos não vão fáceis para ninguém.

E, para apresentar o livro, logo me surgiu o nome da minha amiga Idalina Ferreira, a quem já tinha dado a ler a história há bastante tempo. Muito obrigada, Idalina, por teres aceitado logo o meu convite com tanto carinho e amizade.

Quando inicialmente a Idalina leu a história, teceu elogios e, como é muito exigente, fiquei mais descansada. Se gostava, valia a pena publicá-la. Sei que, para além do seu imenso saber e de ser uma pessoa com quem já aprendi e aprendo muito, é prática e não gosta de ser alvo de atenções.

Por isso, as minhas atenções vão agora para a minha família. Um obrigaaaada a todos pela boa interação que existe entre nós e por valorizarem este meu gosto pela escrita. Talvez por isso, aos 71 anos, sinto uma grande alegria com os textos que vou produzindo e partilhando. E um abracinho especial para as minhas filhas Ana e Lúcia.

Os meus amigos são também fundamentais na minha vida. Para além de partilharmos muitos momentos das nossas vidas, também lemos e trocamos impressões sobre textos que escrevemos, incluindo os  blogues. Obrigada a todos por tão boa partilha e comunicação, sob diferentes formas incluindo o Whatsapp, e permitam-me referir o papel atento e minucioso da Isaura Afonseca, que não pôde cá estar, pelas apreciações atentas e sugestões que sempre faz aos textos.

Desculpem-me se as minhas palavras lembram aqueles papelinhos amarrotados das pessoas que sobem ao palco quando recebem um prémio. Mas, de facto, aqui e agora sinto a alegria de ser premiada por tudo que já referi e pelo livro produzido que dediquei aos meus netos tão queridos, Sofia Clara e Joaquim Pedro.

Quanto à história, nasceu com um Era uma vez, contado há uns anitos numa noite em Londres à minha neta antes de ela dormir. Espero é que no Natal ela possa voar até cá.

Naquele momento, surgiram-me sete fadas de cores diferentes que viviam num bosque e que pensavam que só a sua cor existia.  Viriam, porém, a mudar de ideias com uma atitude que uma delas tomou e que viria a alterar a vida de todas.

História escrita para crianças exige ilustração. E teria de ser a Cristina Pinto a fazê-la. Já havia ilustrado as Histórias da Clarinha, livro publicado em 2019, na Editora Lugar da Palavra. E, dando tempo ao tempo, a Cristina, que, felizmente, aceitou o meu convite, foi fazendo os desenhos maravilhosos que voaram para o livro e que hoje aqui estão expostos. E realço a bela árvore feita também pela Cristina. Embora muito pequeninas, lá estão as fadinhas e uma casinha no centro, com a união de várias cores que cada um poderá interpretar e reinventar.

E espero que tenham gostado das fadinhas e dos marcadores que a Cristina  desenhou. E desta instalação que ela também criou. A Cristina é uma ilustradora muito criativa, muito trabalhadora, muito cuidadosa com o pormenor e com quem aprendo muito e gosto muito de trabalhar. E que me põe a trabalhar! Muito obrigada, Cristina, e também pela tua amizade e olha que já me cheira a novas histórias.

Muito, muito obrigada a todos. Boas leituras. Muita saúde. E que a vida de todos tenha bons e felizes momentos, como acontece no nosso livro As fadas do bosque das cores e das estórias que, com tanto prazer, hoje apresentamos.

Muito obrigada, mais uma vez e, desde já, um Feliz Natal.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Desculpem a demora. Confesso que já tinha saudades!

 

Há bastantes dias que não abro esta janela, embora goste muito de cá vir para respirar este ar amigo, bom e renovado.

Não, felizmente não estive doente, nem ninguém dos meus mais próximos. Só que estou a viver a alegria de ter a casa cheia (com os devidos cuidados e testes à mistura), ainda que esta alegria dê trabalho, porque sou filha, mãe, avó... Contando com toda a azáfama de Natal. Acho sempre em demasia, mas todos os anos acabo por repetir certos rituais.

Outra tarefa que também me ocupou bastante foi a apresentação do meu livro para crianças As fadas do bosque das cores e das histórias. Tenho fotos que quero partilhar, porque o encontro no Lugar do Desenho/Fundação Júlio Resende, em Gondomar, foi um momento que considerei muito bonito e feliz.

Mas, mesmo assim, amigos, desculpem a ausência. Todos os dias sentia falta de cá vir, mas as horas passavam velozes e depois vinha algum cansaço e também, talvez, um pouco de preguiça.

Agora, continuo com a casa cheia, mas sem o frenesim do consumo do Natal. Prefiro assim, sem dúvida.

Não vos desejei Bom Natal, mas desejo a todos agora Bom Tempo de Natal e Feliz Ano Novo, apesar de daqui para a frente não querer demorar tanto tempo a abrir a janela que também me ajuda a respirar.


Um conto de Natal

 

Partilho este conto que escrevi para a coletânea, cuja capa reproduzo em baixo, com desejos de um

 Feliz Tempo de Natal! 

Também com luzes de semáforos que vão piscando e chamando a atenção para o que à volta delas acontece.



Maria Dolores Garrido 

À Isaura

O velho do semáforo

Aquele semáforo fazia parte do meu trajeto quase diário. Passava lá, no mínimo, três ou quatro vezes por semana, entre as nove e as dez da manhã. A essa hora, o velho lá estava, no separador entre as duas vias, junto da fila de carros que parava ao sinal vermelho, quase a chegar ao Porto. Nesse lapso de tempo, o homem tentava aproximar-se do maior número possível de condutores, mas não conseguia abordar mais do que dois ou três, porque logo aparecia o sinal verde e todos arrancavam o mais depressa que podiam para evitar perdas de tempo, sempre escasso na ida para o trabalho.

Vezes sem conta o velho também se aproximou de mim, inclinando-se para a janela do meu carro, saudando com a mão e sempre mostrando um sorriso. O homem é simpático e terá, como qualquer ser humano, uma história de vida - pensava eu e interrogava-me por que razão nunca tinha aberto a janela para falar com ele, mesmo que fosse só para lhe dar os bons dias. E, lá com os meus botões, ia pensando que fechamos tantas vezes as janelas aos outros e gostamos tanto que para nós sejam abertas!

Nunca o vi de mau humor ou contra alguém que, como eu, nem abria a janela, embora lhe sorrisse. Às vezes até aproveitava a pequena pausa entre o vermelho e o verde do semáforo para me ver ao espelho ou espreitar o telemóvel. Ainda assim, tentava corresponder à simpatia do velho, acenando, mas não de forma explícita, confesso, porque o seu aspeto andrajoso e sujo retirava-me a vontade de comunicar sem o vidro da janela de permeio. As suas barbas abundavam crespas e incertas e o cabelo mal se via porque usava um gorro escuro e espesso. O outono já tudo arrefecia.

Numa manhã de novembro, fria mas luminosa, disse para mim que já era tempo de dirigir algumas palavras ao velho. Tantas vezes ali passava, tantas vezes era saudada, tantas vezes me dirigia palavras que tinha também de retribuir. Podia ser só para dizer bom dia ou até amanhã, mas tornava-se urgente fazê-lo, abrindo a janela. Na viagem seguinte, quando  cheguei ao semáforo, logo apareceu o sinal verde e tive de circular o mais rápido possível, para evitar buzinadelas nervosas e vozes destemperadas. Ficaria para o dia seguinte. Teria uma moeda à mão.

 Nessa manhã, fiquei logo à frente da fila, diante do implacável sinal  vermelho. O homem aproximou-se do meu carro, mas ainda não foi dessa que abri a janela. Tinha-me esquecido da máscara e não queria enfrentar aquele respirar direto, durante a saudação habitual, sempre com muitos acrescentos: bom dia para si e também para a família e muita saúde que é o melhor da vida e muita alegria que faz muito bem à alma, etc etc etc. Sorri e arranquei logo que pude. Seguiu-se uma semana de vento e chuva. Durante esses dias de tempestade, do velho nem sinal.

Os dias foram passando sem eu chegar à fala com o homem. Porém, sempre no mesmo lugar, o velho mantinha-se afável e transmitia uma ternura imensa que lhe escorria do rosto aberto em sorrisos e das mãos em acenos. Podia sentar-se à porta de uma igreja, de mão estendida em jeito de miserável sofredor, mas não, aguentava-se ali ao tempo, exceto quando chovia, mantendo-se de pé, distribuindo mais do que recebendo mimos, aceitando a má disposição de quem, àquela hora, ainda não tinha aberto a caixa dos sorrisos ou então a mantinha fechada à chave há muito perdida.

Eu não podia continuar a adiar uma pequena mas carinhosa troca de palavras com o velho. Como o Natal chegava, esse seria o momento. Sem hesitações, decidi dar-lhe um presente para compensar a pouca atenção. Comprei-lhe bombons macios e saborosos. Postos em caixinha bonita. Sem laço para ser mais fácil abrir e evitar também o desperdício. Como reagiria ele quando a recebesse? Sorrisos haveria com certeza, palavras carinhosas sem dúvida, brilho dos olhos não faltaria... E talvez surpresa. Não devia estar habituado a receber prendas, para além das moedas.

Nessa manhã, pus a caixinha dos bombons no banco da frente, junto à carteira. Quando chegasse ao semáforo, se fosse das primeiras pessoas da fila, poderia dar-lhe o presente um pouco mais devagar;  se o sinal vermelho já estivesse no final, teria a possibilidade de lhe entregar rapidamente os bombons com votos de bom Natal. Se sobrassem uns segundos, ainda lhe desejaria muita saúde e muita alegria, tal como ele dizia sempre a toda a gente, mesmo que não lhe abrissem a janela.

Quando cheguei ao semáforo, fiquei em segundo lugar na fila e peguei logo na caixinha que já tinha à mão. Oh! Não, não podia crer, quem eu queria que lá estivesse não estava. Não havia chuva a impedi-lo de vir que o céu estava bem azul e transparente. Estaria o velho doente? Alarguei o olhar nos poucos segundos que me restavam antes de avançar e deixar seguir os outros, confirmando que ele não estava mesmo lá.

No dia seguinte, saí de casa convicta de reencontrar o velho no semáforo para, finalmente, abrir a janela e entregar-lhe o presente. Mas não, mais uma vez, ele não estava no seu posto habitual. Nos últimos segundos de sinal vermelho, vi passar uma mulher jovem com olhar sorridente, um telemóvel pequenino numa das mãos  e um saco de pão na outra. Devia morar perto. Ainda tive tempo de lhe perguntar pelo velho do semáforo. Morreu há dias, respondeu. Estava em casa e a casa incendiou-se, concluiu com ar pesaroso mas sem falso drama.

Ela devia ter sentido prático, porque, ao ver o sinal vermelho, nada mais acrescentou, afastando-se no seu passo pequeno mas ligeiro.

Eu é que não retomei logo a marcha ao sinal verde, o que me valeu uma grande buzinadela de um dos condutores atrás de mim. Assustei-me de tal modo que deixei cair a caixinha e os bombons espalharam-se todos pelo chão.

In Lugares e palavras de Natal, Editora Lugar da Palavra, 2021, p. 42/44

 


quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Carta fechada para o Pai Natal

 

A menina disse à mãe que tinha escrito uma carta ao Pai Natal. A mãe perguntou-lhe se podia ler a carta. A menina, olhando a mãe com ternura, disse que não. A mãe perguntou-lhe porquê. Para mais, todos os anos lhe dizia quais eram os presentes desejados. A menina respondeu, então:

- Este ano, quero que os presentes do Pai Natal sejam surpresa para vocês.

 

domingo, 28 de novembro de 2021

A beleza das pequenas coisas

 

São marcadores feitos pela Cristina Pinto - para juntar ao livro As fadas do bosque das cores e das estórias que tão bem ilustrou. Assim também se marcam os nossos dias. Felizmente.

 


quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Praia no outono

 

Quando olho para o mar, em dias de outono, vem-me à lembrança este poema de David Mourão Ferreira e cantado por Simone de Oliveira, Celeste Rodrigues, Aldina Duarte e por outras vozes talvez. Foi o que me aconteceu hoje em Mindelo, Vila do Conde. No momento, apenas um casal na praia. Que não se limitou, tal como eu, a olhar o mar a partir do passeio.

 



 

'Praia de outono

Praia de outono desfigurada
Pela mordaça das marés vivas
Praia de outono transfigurada
Pela ameaça de alguém partir

Aquele amor sob o furor do mar
Já começou a declinar
Tenho medo!
Nem eu sei de quê
A noite vem tão cedo
Praia de outono ninguém nos vê

Em ti a bruma
Em mim ciúme
Vão-nos velando
A nós como as marés

Não se vislumbra
Esperança nenhuma
De alguém saber
Quem sou nem quem tu és'

David Mourão Ferreira  (Lisboa 1927/Lisboa 1996)

 

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

domingo, 21 de novembro de 2021

E se as fadinhas começassem a voar?

 

Atenção - isto tem um cheirinho a publicidade! Mas não é enganosa!!!

Bom domingo!|





sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Se fizerem obras, convém espreitar os canos!!!

 


Há uns vinte anos, fizemos obras na casa e construímos uma casa de banho que tem tido pouco uso. Há bastante tempo que a banheira estava entupida e lá fui tentando tudo e mais alguma coisa, mas a pobre continuava sem engolir. Como se aproxima o Natal e seremos mais em casa - se os confinamentos não nos vierem entupir a vida -, toca a pôr mãos à obra e ir ao fundo da questão, para ver o que se passava com a dita banheira. Veio o picheleiro (por cá, não dizemos canalizador), nada; veio um desentupidor munido de equipamentos mais poderosos, nada. 

Ora, a solução era furar, furar, furar até chegar ao cano para detetar o obstáculo. E, depois de muita ruideira e de muita poeira, achou-se um verdadeiro achado!

O que fazia com que a água da banheira não escorresse era - eu nem queria crer - um ponteiro de ferro que havia ficado no cano!!! Agora, cheio de ferrugem, jaz, para que conste, em cima da tijoleira rebentada.

É caso para dizer também: e esta, hein?

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Desculpem, não é assunto para começar uma semana.

 

Não gosto muito de me queixar, mas deixem-me dizer que ando cansada.

Cansada de políticos com palavras e sorrisos dúbios, cá dentro e lá fora.

Cansada do barulho que o meu vizinho faz constantemente com as obras na casa que são intermináveis.

Cansada de ver pessoas a sofrer em fronteiras que podem ser as últimas das suas vidas.

Cansada de só saber usar algumas valências básicas do computador e tantas vezes precisar de saber mais.

Cansada de ouvir o pobre do Manel a vociferar pela rua fora com pacote de vinho na mão e feridas na cara desvairada e alcoólica.

Cansada de ver sempre as mesmas pessoas a ganhar prémios, como se a mesa só fosse posta para alguns.

Cansada de ter uma  banheira entupida quase sem remédio por seguir conselhos que não devia seguir como pôr soda cáustica no raro.

Cansada de não ver a minha filha nem a minha neta por causa da covid e de ver o sr. Boris sempre despenteado e ar de quem atrapalha tudo, mas que nunca se atrapalha.

Cansada de ouvir outro vizinho a consertar o motor da mota sempre ao fim de semana, enevoando tudo de ruído.

Cansada de não ter tempo livre, de não terminar a leitura do livro que comecei, de deixar sempre coisas em cima da mesa, etc. etc. 

Cansada de não ser mais organizada, mais sensata, mais paciente, mais sábia, mais tolerante, mais criativa, mais magra, mais segura, de ter dores nos joelhos, de não andar mais a pé, de não ter a palavra certa no momento certo, de não agir com eficácia, de... de...

Cansada de achar que o que faço e o que digo ficam muito aquém do que gostava de fazer e de dizer.

Ando cansada, pronto, ando cansada. Desculpem. Isto não é assunto que se traga em início de semana.

'Erros meus, má fortuna...'

Mas a todos desejo uma Boa Semana.


sábado, 13 de novembro de 2021

Passeando por Londres - com os olhos e o coração!


 


Criticar ou não os outros, eis uma questão.

 

Muitas pessoas fazem críticas - umas mais camufladas, outras mais explícitas - quando falam de outrem. É aquela malícia ou maldizer que se abre muitas vezes para julgar de imediato as ações dos outros, ainda que sem má intenção.

Perante o que se sabe ou ouviu, vem um comentário, um juízo de valor, uma crítica, uma dúvida... E às vezes sem palavras, para além das interjeições, mas com olhares, trejeitos de boca... 

Isto vem a propósito de uma comparação entre duas famílias. Se uma julgava com alguma frequência o que outros diziam ou faziam, a outra limitava-se a conhecer modos diferentes de viver a vida - ainda que não concordasse com eles - sem nada perguntar, sem nada retorquir, sem nada julgar.

E, desta troca de impressões, emergiu uma conclusão: quem o faz é má pessoa.

Só não percebi a que família a afirmação se dirigia.

 

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Entre cartões e recibos, também pode haver poesia!

 

Abri o porta moedas e, entre cartões e recibos, encontrei este pedacito de jornal. Já não sei donde o retirei, mas sei que gosto muito da poesia de Adélia Prado - muito ligada ao quotidiano (ainda que só dizer isto seja redutor) e a reflexões que ele nos traz. Quando puder, vou estudar um bocadinho para poder dizer coisas mais sustentadas sobre esta grande poeta, nascida em 1935, em Minas Gerais, Brasil. 


 

Depois, foi só procurar um poema na net que me pareceu vir a propósito (tenho um livro de Adélia Prado e hei de relê-lo).

 Momento

Enquanto eu fiquei alegre,
permaneceram um bule azul com um descascado no bico,
uma garrafa de pimenta pelo meio,
um latido e um céu limpidíssimo
com recém-feitas estrelas.
Resistiram nos seu lugares, em seus ofícios,
constituindo o mundo pra mim, anteparo
para o que foi um acometimento:
súbito é bom ter um corpo pra rir
e sacudir a cabeça. A vida é mais tempo
alegre do que triste. Melhor é ser.

Adélia Prado

 

quarta-feira, 10 de novembro de 2021

terça-feira, 9 de novembro de 2021

De mãos dadas

 

Confesso que gosto de ver casais de mãos dadas, no seu outono da vida. E se se pressentir empatia, ainda acho mais bonito. E sorrisos sinceros também. E palavras carinhosas olhadas e escutadas e respondidas, então o momento é ainda mais belo.

É um tema que me ocorre com frequência. Talvez por isso, hoje, quando fui à  'minha cidade com mar ao fundo', deparei com dois ou três casais de mão dada. 

Estava um calorzinho ameno, o mar cintilava e esses casais, cada um no seu tempo e no seu espaço, passavam passeando tranquilos numa rua perpendicular ao mar.

Imaginei cada um desses casais à noite a dormitar no sofá - imagem não tão romântica assim. Mas talvez ainda procurassem as mãos um do outro antes de a noite ser noite.


sábado, 6 de novembro de 2021

A abóbora em poesia - ninguém diria!

 

 Num comentário - obrigada, Bea - foi referida a abóbora porqueira.  Talvez pelos sons semelhantes, logo me lembrei da 'abóbora carneira' que aparece no poema de Cesário Verde, 'Num bairro moderno'. Como é bastante longo, mas vale a pena lê-lo todo, partilho só um excerto.

No poema, surge uma vendedora de fruta numa rua da grande cidade. Sobressai a atenção aos pormenores e sensações do real, não faltando o olhar social e humano face à dureza de alguns trabalhos. E outras coisas, é claro, porque a cada leitor a sua leitura.

 

Vi há pouco o comentário do Vítor Oliveira com a partilha de um post da sua Carruagem 23. Obrigada, Vítor. Vejam, se puderem. Vale a pena. Está em: 

https://carruagem23.blogspot.com/2011/02/cesario-verde-tanta-poesia-para-tao.html

Nota: Janita, assim poderá ver e ouvir o poema na íntegra.

Um domingo com boas sensações para todos.

 

'Num bairro moderno'

'(...) 

O Sol dourava o céu. E a regateira,
Como vendera a sua fresca alface
E dera o ramo de hortelã que cheira,
Voltando-se, gritou-me, prazenteira:
"Não passa mais ninguém!... Se me ajudasse?!..."

Eu acerquei-me dela, sem desprezo;
E, pelas duas asas a quebrar,
Nós levantamos todo aquele peso
Que ao chão de pedra resistia preso,
Com um enorme esforço muscular.

"Muito obrigada! Deus lhe dê saúde!"
E recebi, naquela despedida,
As forças, a alegria, a plenitude,
Que brotam dum excesso de virtude
Ou duma digestão desconhecida.

E enquanto sigo para o lado oposto,
E ao longe rodam umas carruagens,
A pobre, afasta-se, ao calor de agosto,
Descolorida nas maçãs do rosto,
E sem quadris na saia de ramagens.

Um pequerrucho rega a trepadeira
Duma janela azul; e, com o ralo
Do regador, parece que joeira
Ou que borrifa estrelas; e a poeira
Que eleva nuvens alvas a incensá-lo.

Chegam do gigo emanações sadias,
Ouço um canário - que infantil chilrada!
Lidam ménages entre as gelosias,
E o sol estende, pelas frontarias,
Seus raios de laranja destilada.

E pitoresca e audaz, na sua chita,
O peito erguido, os pulsos nas ilhargas,
Duma desgraça alegre que me incita,
Ela apregoa, magra, enfezadita,
As suas couves repolhudas, largas.

E, como as grossas pernas dum gigante,
Sem tronco, mas atléticas, inteiras,
Carregam sobre a pobre caminhante,
Sobre a verdura rústica, abundante,
Duas frugais abóboras carneiras.'

Cesário Verde, in O Livro de Cesário Verde

 

Cesário Verde  nasceu em Lisboa em 25 de fevereiro de 1855. Morreu na mesma cidade em 19 de julho de 1886, apenas com 31 anos.

Foi um dos primeiros poetas portugueses do realismo. A sua obra - curta mas muito importante - está compilada em O livro de Cesário Verde.

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Bons sabores de outono!

 

Deram-me esta abóbora. Bem bonita, por sinal. Obrigada, Rosa.

Resolvi fazer doce com uma boa parte. Alguns frasquinhos poderão ser presentes de Natal. Espero que fique com bom sabor. Para que os rótulos bonitos que irei pôr por fora fiquem a condizer com o conteúdo!

Deixo aqui algumas fotos que fui tirando enquanto preparava esta doçura que, neste momento, ainda está quentinha.

Espero que gostem. 

A mãe de toda esta compota

A abóbora com o açúcar e paus de canela

A abóbora já cozida

Amêndoa moída para juntar à panela 




A abóbora com a amêndoa

Da panela para os frascos

Arrefecendo e criando vacuum (para não criar bolor)

 

Pus o resto da abóbora em saquinhos e congelei. Para sopa, por exemplo.

Bons sabores de outono! 

 

 

quarta-feira, 3 de novembro de 2021

A cada um(a) os seus botões

 

Com os seus botões - figura sentada 1

Tanta gente aqui no hospital à espera de vez. Não conheço ninguém, mas deve haver muitos professores, a maior parte reformados. É bom haver convenções. Que bom eu ir à consulta e saber que o problema não é grave. Já tomei um café e soube-me bem. Passo a maior parte do meu tempo em casa. Só saio para a minha pequena caminhada. Tenho medo de cair. Hoje estou feliz porque saí e, se cair, tenho quem me ajude. Há muito tempo não vestia este fato. Os sapatos apertam-me um bocado, mas trazem-me boas recordações e a caixa pode arejar. Sempre gostei de me arranjar. Em casa, como estou só, uso demasiado o roupão, mas, pensando bem, não é a melhor indumentária para vestir o meu dia.

Agora reparo, aquela fulana está sempre a olhar para mim. Será pelas minhas rugas? Será que estou despenteada? Mas ontem fui à cabeleireira e quando saí não havia vento. Para além disso, a laca que a cabeleireira me põe é à prova de furacão. Já lhe disse que faz mal ao ambiente, mas ela é teimosa. Diz que me fica muito bem. Traz-me o espelho para me mirar de vários ângulos. Nem quando eu era secretária de direção, usava o cabelo assim. Também não precisava porque era jovem e bonita. E sempre gostei da minha liberdade. Até no cabelo. Agora deixo-me levar pelos mimos.

Os olhos dela fixos em mim parece que me estão a tirar uma radiografia. Fogo, como diz agora toda a gente. Se demorar a chegar ao meu número, levanto-me e vou perguntar-lhe se me conhece. Não tem cara de quem esteja a tramar seja o que for, mas é tramado o modo atento como olha. Se me levantar para falar com ela, é da maneira que alivio os meus pés e falo com alguém, sem ser só com a funcionária do guichet e com o médico.

 

Com os seus botões - figura sentada 2

Ui, ainda faltam trinta números para chegar à minha vez. O que vale é que neste hospital não faltam funcionários nem pontos de atendimento e os números rolam a bom ritmo no ecrã. Devem estar aqui muitos professores, porque a instituição tem convenção com a ADSE. Atrás de mim, uma jovem diz que já passa das onze e meia, que vai dar aulas à uma hora em Aveiro e ainda não fez o exame médico.

Todo o tempo do mundo terá aquela senhora tão bem posta, como dizia a minha mãe. Está sentada do lado oposto. Há tanto tempo que não via alguém vestido assim. Um fato chanel, como antigamente nas revistas chiques de moda. A blusa com um grande laço e até os sapatos são a condizer.

Qual teria sido a sua profissão? Se a teve, foi professora quase de certeza. Daquelas rígidas que nunca deixavam o programa por cumprir, sem tempo para outros diálogos. Para quem a liberdade era palavra desnecessária e pejorativa.  Devo estar a fixá-la bastante, creio. Mas a figura dela ficou no guarda-fatos de muitas das memórias de quem também viveu esse tempo, como eu. Quando chegar a minha vez, se passar por ela, vou sorrir-lhe. Falar-lhe talvez não, porque de certeza que não quer ser incomodada e em casa não lhe faltará com quem falar.