sexta-feira, 17 de agosto de 2012
quinta-feira, 16 de agosto de 2012
Dá-me asas!
Júlio Rezende
Ontem fui para o jardim e desenhei um anjo.
— Obrigado — disse-me ele quando me preparava para lhe desenhar as asas. — Está muito bonito. Mas não me desenhes essas asas. Sabes, aquelas em que estás a pensar agora, com as grandes penas brancas.
— Porque não?
— Essas incomodam um pouco. Estão
sempre a atrapalhar, a prenderem-se nos ramos, nos fios da
electricidade, e, como sou um tanto distraído, bato com elas em todo o
lado. Ah! E sujam-se imenso! Gostava de ter uma coisa nova. Pensa em
algo de diferente. Dá-me asas...
Desenhei-lhe
então asas de ondas de mar, depois, asas de erva e asas de vidro
reluzente. Tentei também com uma fita de luz, com um raio de sol, com
ramos em flor, com um turbilhão de neve e até com uma centelha de
alegria. Experimentei asas de algodão, asas de vento e até mesmo asas de
imaginação!
Desenhei-lhe asas de letras e asas de papel branco.
Observei-o atentamente e dei-lhe umas asas com sardas.
— Obrigado — disse o anjo quando acabou de experimentar todas as minhas asas. — Gostei muito de tudo o que me deste. Mas agora é a tua vez!
Fechei os olhos. De repente, senti que tudo estava a ficar leve. Tive a impressão de perder o meu corpo e de ficar só com os meus contornos.
— Desta vez vamos dar só um passeio pequenino — disse o anjo. — Para que em tua casa ninguém fique preocupado com a demora.
E voámos por três vezes em volta da velha nogueira do meu jardim.
Heinz Janisch
Schenk mir Flügel
St. Pölten, NP Buchverlag, 2003
(Tradução e adaptação)
quarta-feira, 15 de agosto de 2012
terça-feira, 14 de agosto de 2012
Ao sabor das "Oportunidades"
O programa das
Novas Oportunidades, que muitas pessoas utilizaram para aumentar a sua
escolaridade, foi aplaudido pelo anterior governo e muito criticado
pelo atual.
Assim, antes de terminar o ano letivo anterior, foi anunciado o fim das Novas Oportunidades numa grande parte das escolas.
A
meu ver, as Novas Oportunidades tinham a vantagem de permitir aceder a
um diploma, uma vez que muitas pessoas não tinham podido obtê-lo em
idade "normal", partindo das diferentes experiências profissionais.
Na
escola onde trabalho, participei, com duas colegas de uma Oficina de
Língua no apoio a muitos destes formandos. Em bastantes casos, era notório
o esforço, assim como era o gosto por aprender ao longo da vida,
nomeadamente língua portuguesa. Reparei, contudo, em casos em que a
preocupação maior era obter o diploma.
Uma das
desvantagens era não haver tempo para a assimilação de conteúdos novos,
não sendo muito visível, em bastantes casos, a diferença entre o antes e
o depois da obtenção do diploma.
Pois bem, o governo atual parece ter recuado na decisão e o programa das Novas Oportunidades vai continuar por mais uns tempos.
Possa,
pelo menos, ajudar aqueles que gostariam de ter estudado quando eram
mais novos e não puderam fazê-lo porque tiveram de começar a trabalhar
ou por dificuldades económicas.
E que sejam
para eles, de facto, novas oportunidades, porque andarmos ao sabor das
oportunidades de alguns políticos já estamos demasiado habituados.
"O desporto não é só futebol!"
Hoje de manhã, ouvi um dos medalhados portugueses (medalha de prata em canoagem) a expressar a sua alegria por ver o seu trabalho recompensado e reconhecido.
Foi a única medalha que Portugal conquistou, para além de alguns diplomas. Há quem considere que a prestação de Portugal nos Jogos Olímpicos foi sofrível, por comparação com outras países de igual dimensão que obtiveram algumas medalhas.
No entanto, será bom realçar que há modalidades desportivas, nas quais se incluem o remo e a canoagem, que exigem um enorme esforço diário e, pelo que que julgo saber, os atletas não recebem nada ou recebem muito pouco.
São incomparáveis os salários de uma grande parte dos futebolistas e as condições em que trabalham. Alguns ganham salários obscenos nos dias que correm.
Contudo, as atenções voltam-se sobretudo para o futebol. As transmissões televisivas duram horas e horas, enquanto outras modalidades são quase esquecidas ao longo do ano.
Era altura de os meios de comunicação privilegiarem outras áreas. Podia ser que estimulassem outras práticas desportivas e ajudassem a reduzir tanta corrupção do futebol.
As audiências baixariam por uns tempos, mas o país jogava para ganhar.
segunda-feira, 13 de agosto de 2012
70%? Irra!
A confiar nas notícias de hoje, 70% dos estudantes universitários portugueses pensam emigrar, após conclusão dos seus cursos. A causa principal é a falta de trabalho.
Há uns anos, eu assistia ao cortejo universitário anual e ia pensando como era possível haver trabalho para tantas pessoas. Eu encontrava-me nos Clérigos, no Porto, e o desfile dos estudantes demorou horas. Eram milhares os jovens das diferentes faculdades, tanto públicas como privadas, que engrossavam as ruas do Porto até chegarem à Praça do Município.
Perante aquela multidão de estudantes ou recém-licenciados, muita gente se deve ter interrogado, tal como eu, se aqueles jovens teriam saídas profissionais num futuro próximo.
O desemprego e as dificuldades em arranjar o primeiro emprego não são problemas apenas de Portugal, mas o facto de os índices de escolaridade terem sido muito baixos até ao 25 de abril de 74 trouxe consequências que vão demorar a desaparecer.
A escolaridade obrigatória e acessível a todos foi um dos grandes bens da democracia.
Ouso até dizer que a falta do primeiro emprego para os jovens é ainda uma consequência de tantas décadas em que a educação foi menosprezada.
"Daqui o céu é muito alto"
A menina estava feliz. Tinha os pais por perto, amigos, dois cães que gostavam de correr e de brincar na praia ao fim da tarde...
Depois de um passeio divertido, com o mar mesmo ali mesmo ao pé, a menina, de quatro anos, já cansada, olhou para o céu e disse: daqui o céu é muito alto.
"Também quero ver o mar!"
A menina saiu do carro a correr. No parque de estacionamento, havia ainda pouca gente.
Às nove horas da manhã, numa praia do Norte, ainda é cedo, ouvem-se melhor as gaivotas e as vozes de quem vai chegando.
Às nove horas da manhã, numa praia do Norte, ainda é cedo, ouvem-se melhor as gaivotas e as vozes de quem vai chegando.
À frente, seguiam, também a correr, umas crianças maiores em direção às escadas que levavam à praia.
Ouviam-se os passos e o mar ficava mais limpo e azul com a voz da menina a voar: também quero ver o mar...
As mulheres do pátio
Deniz Korkmaz
— Esta corda ser minha! — grita a Jugoslava. — Eu há mais tempo na casa!
— Tu a mentir! — grita a Turca. — Senhorio disse corda para todos!
As
duas mulheres chegaram ao pátio com os cestos cheios de roupa para
estender. Agora discutem sobre quem fica com as cordas de plástico
esticadas ao longo do pátio. A Jugoslava não sabe turco, a Turca não
sabe falar jugoslavo. Por isso é em alemão que têm de falar uma com a
outra, a língua do país onde vivem.
— Tu má! Eu três filhos! Muito sujo!
— Tu rainha aqui? Tu nada rainha! Corda aqui para todos!
— O teu homem prega gancho ali, no outro canto! Tu compra a corda para ti, percebido?
— Não, não! Não tenho dinheiro para nova corda! E tu não dar ordens aqui!
Estão
de pé em frente dos cestos gritando uma com a outra. As pessoas das
casas vizinhas já há muito que sabem por que motivo as duas mulheres se
zangam. Mesmo assim, ainda há quem corra à janela a ver como é que a
discussão desta vez vai acabar. Às vezes há quem ainda grite: “Silêncio
aí em baixo!” ou “Pendurem a roupa em vossas casas!” De vez em quando,
uma janela fecha-se com força, alguém ri do alemão cómico das mulheres
do pátio.
—
Vocês deixam que isto aconteça? Uma confusão destas num domingo? —
pergunta o Sr. Stachel, de visita, com a mulher, em casa de Lotti e
Karl Waldmeister.
O Sr. Waldmeister fecha o guarda-sol e encosta-o a um canto da varanda.
— Bom, vamos antes tomar o café dentro de casa, peço desculpa.
A Sr.ª Waldmeister encolhe os ombros.
— Logo vi que isto ia acontecer.
— Muito desagradável! — diz a Sr.ª Stachel.
— Não há forma de se acabar com isto — diz o Sr. Waldmeister.
Mas ele sabe muito bem como pode mudar a situação. Já pensa nisso há muito tempo.
No
quarto de banho estão duas máquinas de secar roupa. Só uma é utilizada
mas a segunda também podia passar a servir. O Sr. Waldmeister pensa
ainda na terceira grande máquina, a ganhar pó no sótão, que lhes fora
oferecida pela vizinha, quando se mudara para um lar de idosos. “Sabes
que mais, Lotti?” podia dizer à sua mulher. “É muito simples: colocamos
a máquina de secar no pátio e acabamos com a discussão de uma vez por
todas!”
Não
o diz porque talvez Lotti não ache a ideia boa. Se calhar responderia:
“Oferecer alguma coisa a quem está sempre a incomodar-nos?”
A Sr.ª Waldmeister corta o bolo e abafa um suspiro. Ela teria uma solução. Já anda com esta ideia há bastante tempo.
“Sabes
que mais, Karl?” podia dizer ao marido. “Por que é que não colocamos a
terceira máquina de secar roupa lá em baixo, no pátio?” Não o diz,
porque Karl não levaria a ideia a sério.
Se calhar responderia: “Nem
pensar! Elas que tratem de comprar uma máquina de secar roupa o mais
rápido possível!”
O Sr. Waldmeister fecha a porta da varanda e liga a ventoinha.
As mulheres continuam a discutir no pátio.
— No vosso lugar, chamava a polícia — diz o Sr. Stachel.
— Bem, se isto continuar assim — diz o Sr. Waldmeister — um dia não vamos ter outra solução.
A Sr.ª Waldmeister tira do frigorífico a taça a transbordar de natas e pousa-a em cima da mesa.
— Sirvam-se à vontade. Há que chegue.
A voz treme-lhe um pouco, mas ninguém nota.
Temos tudo que chegue. Bolo que chegue. Natas que cheguem. E uma máquina de secar a mais.
Os Waldmeister têm tudo o que precisam.
Só coragem é que têm muito pouca.
Vera Ferra-Mikura
Frieden fängt zu Hause an
Jutta Modler (org.)
Munique, DTV, 1989
(Tradução e adaptação)
domingo, 5 de agosto de 2012
sábado, 4 de agosto de 2012
sexta-feira, 3 de agosto de 2012
As meninas curiosas
As duas meninas foram com a mãe e o pai ao Jardim Zoológico. Queriam ver as zebras, os elefantes, os macacos, os leões...
Iam devagar enquanto observavam as reações dos diferentes animais. Faziam perguntas, comentários...
Chegaram, então, ao lugar dos lobos. Ouvia-se o ruído feroz que faziam ao movimentarem-se nas jaulas.
As meninas olhavam, olhavam... Uma dava a mão ao pai, outra ia de mão dada com a mãe.
Os pais iam falando, mas as meninas quase nem davam conta, sempre a olhar como quem está à procura de alguém ou de alguma coisa.
Foi quando uma das meninas, olhando os lobos, perguntou:
- Onde está o Capuchinho Vermelho?!!
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