sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Fico sem jeito


Tem tanto jeito para escrever. Tem tanto jeito para pintar. Tem tanto jeito para desenhar. Tem tanto jeito para bricolage…
Quando se fala assim, habitualmente (acho eu, é claro) queremos dizer que o talento bateu à porta, ficou um bocadinho e partiu de seguida em busca de terreno mais fértil.
Não se diz que Eça de Queirós tinha jeito para escrever,  ou que Paula Rego tem jeito para pintar, ou que Mourinho tem jeito para ser treinador de futebol, ou que Cristiano Ronaldo tem jeito para jogar à bola. Dizemos que são geniais, que têm talento, que gostamos ou não do seu trabalho, que são o máximo… E se se falar de Mourinho até se diz (e ele também) que é special one.
Bem, se calhar tenho algum jeitinho (falsa modéstia também não tem jeito nenhum) para alguma coisa, mas aprecio muito quem tem talento. Até parece que fico sem jeito.

Que seca!


Ficar sem frigorífico é uma seca. Não posso comprar yogurts porque se estragam. Para não falar da sopa, do queijo, da manteiga, das sobras de comida… que não posso conservar.
A gente habitua-se às coisas e quando avariam é como não termos chave quando chegamos a casa cansados.
As avarias de eletrodomésticos também mostram o nosso poder de adaptação e o lugar que ocupamos no universo. A verdade é que  se sobrevive e não é por eu estar sem frigorífico que se acaba o sol de inverno.
Por falar em inverno, a falta de chuva  pode trazer uma grande seca. E será mais grave do que ter o frigorífico avariado.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Ainda que algum de vocês tenha vindo aqui por acaso, não faz mal nenhum, é isto o que faz as pessoas - ter a certeza do acaso.

Almada Negreiros

A ESTRELA DE ERIKA


NOTA DA AUTORA DO CONTO
Em 1995, cinquenta anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, encontrei a mulher de que fala esta história. O meu marido e eu estávamos sentados na beira de um passeio em Rothenburg, na Alemanha. Observávamos uns trabalhadores a limparem as ruínas do telhado da Câmara. Na noite anterior, um tornado tinha-se abatido sobre esta bonita aldeia medieval. Havia entulho um pouco por todo o lado. Um velho comerciante disse-nos que os estragos causados por este tornado se assemelhavam aos da última ofensiva dos Aliados durante a guerra. O comerciante entrou na sua loja, e uma senhora, sentada perto de nós, apresentou-se como sendo Erika.
Perguntou-nos se tínhamos vindo fazer turismo naquela região. Quando lhe disse que vínhamos de Jerusalém, onde passáramos duas semanas a fazer pesquisas, confessou-nos, com um suspiro, que desejava muito lá ir mas que não tinha dinheiro para a viagem. Ao ver uma estrela de David pendurada ao seu pescoço, eu disse-lhe que, no regresso de Israel, tínhamos passado pelo campo de concentração de Mauthausen, na Áustria. Erika confessou-nos que, um dia, tinha tentado visitar o campo de Dachau, mas que não conseguira franquear a porta. Depois, contou-nos a sua história…

Ruth Vander Zej/Roberto Innocenti
 Esta e muito mais histórias podem ser lidas através dos seguintes endereços:

 http://contadoresdestorias.wordpress.com/

Vale a pena consultar e ler muitas das histórias. Os "Contadores de histórias" são um projeto que merece todo o apoio e carinho. Leva histórias motivadoras a diferentes partes do mundo. Parabéns.

Delicadeza natural



Abrindo-se a manhã


terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Eu não estou contra os pais


Muitas vezes, os pais chegam à escola e não sabem qual é a turma do filho ou da filha. Muitos vêm por bem: dialogam naturalmente e mostram-se interessados pelos filhos. Alguns chegam de pé atrás e querem tirar satisfações por causa de coisas que ouviram dos filhos e de que não gostaram: o professor deu-lhe ordem de saída sem motivo; o professor não gosta dele; o professor responde mais prontamente aos outros alunos…
Outros pais nem sequer vão à escola: ou porque os filhos ficam com as cartas enviadas pelo diretor de turma, ou dão o contacto errado…
No segundo caso, os pais, quando confrontados com ocorrências dentro ou fora da sala de aula, acabam por pedir desculpa, dizendo que não sabiam o que se passava. De facto, existem alunos que manipulam habilmente os pais. Sobretudo quando estes caem que nem patinhos. Ou porque é mais fácil, ou porque querem evitar mais um problema, ou porque estão cansados…
Quando os pais nunca vão à escola, ainda que chamados, então o caso é bem mais complicado.
Eu não estou contra os pais, mas os pais que pouco vão à escola, por muito pouco ficam contra ela. E quando assim é, o aluno sente o terreno mais aberto para fazer das dele. E o mundo parece andar às avessas.

O país está irritado…


…e eu, como cidadã portuguesa, também, é claro, com as declarações do Senhor Presidente da República, quanto ao valor da sua(s) reforma(s). Julgo que, em qualquer país civilizado, o que foi dito teria consequências.
Os milhões de portugueses que vivem com muitas dificuldades foram esquecidos.
Mas tão grave como esse esquecimento é a ideia que é passada de que os portugueses não pensam, não têm sentido crítico, isto é, são todos parvos.
Para mim, isto é ainda mais grave. E são muitos os setores da vida nacional a fazê-lo. Ainda não aprendemos, ou melhor, essas pessoas que se julgam acima de muitos dos deveres de cidadania ainda não aprenderam que os outros cultivam a sua inteligência. E raramente com as mordomias a que eles se habituaram.
Cavaco Silva diz que o dinheiro que recebe ao fim do mês não lhe chegará para as despesas!!! Podia ter-se livrado de tanta chacota nacional se fizesse as suas amadas e domésticas continhas (continhas???) longe das câmaras e dos microfones e alargasse os seus horizontes à vida nacional.
Por falar em despesas, muitas figuras públicas ficam-nos muito caras! E, muitas vezes, o que se ganha não dá para os gastos do mês! Isto quanto aos cidadãos comuns, é claro.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Fica sempre alguma cor do Natal


Abri um mail e a mensagem soube bem. Como algumas manhãs de domingo!

Fernando Pessoa 
(Lisboa, 13 de junho de 1888 - Lisboa, 30 de novembro de 1935)
 Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,
mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá a falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios,incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e
se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar
um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um 'não'.
(,,,)

 
Fernando Pessoa

Porque hoje é domingo


Preparei um pequeno almoço mais completo, mais colorido e com um pouco mais de vagar do que durante a semana.
A rua está sossegada, o sol anuncia-se com luz e com silêncio e aqui estou eu, simples cidadã, a saborear o pequeno almoço, enquanto oiço também as notícias da manhã.
Leio em títulos de jornais a palavra sacrifício. Só que sacrifício para alguns políticos de topo seria um grande prémio para milhões de cidadãos. Será que as palavras traem ou “eles” não olham a realidade, pelo menos num qualquer dia da semana?
“Guimarães somos todos” vejo noutro título. Quero arranjar tempo para lá ir. De preferência sem grandes multidões. Os eventos e a cidade prometem.
Felizmente, ainda existem pessoas e coisas em que é possível acreditar. Ou será porque hoje é domingo?

sábado, 21 de janeiro de 2012

Que título dar a este poema de Manuel Bandeira?

Beijo pouco, falo menos ainda
Mas invento palavras
Que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana
Inventei, por exemplo, o verdo teadorar
Intransitivo: Teadoro, Teodora



Nota 1 - Há poetas que enchem as palavras de montanhas de afetos! 
Nota 2 - O título que me chegou é Neologismo

Os gostos discutem-se?


     Sei que parece estranho, mas não gosto de dias prolongados de sol. Sobretudo no inverno. Gosto de chuva e de nuvens no céu.
Há uns anos, ouvi um pintor – cujo nome não recordo – dizer que tinha emigrado para um país do norte da Europa por causa do clima. Preferia viver com menos sol.
     Eu nunca chegaria a esse ponto, mas acho que não me importaria nada de viver longo tempo sob um céu cinzento.
     Um dia, ouvi Agustina Bessa Luís dizer que gostava da chuva.
Eu, cidadã comum e de talentos comuns, também afirmo: gosto de nuvens e de chuva.

Muito bem!


Hoje, um formador, no âmbito da escrita sobretudo para o ensino básico, afirmava que os jovens gostam de escrever se tiverem o professor do lado deles, se sentirem que são acompanhados e valorizados na sala de aula.

Foi referido que tão importante como ensinar a fazer é saber elogiar quando o aluno escreve bem uma frase, aplica corretamente a pontuação…

… é dizer com convicção, olhos nos olhos, que o aluno será capaz de fazer melhor, nos casos em que não acertou…

… é mostrar, objetivamente, como deve ser corrigido o erro…
E insistiu na eficácia das palavras de reforço, oralmente ou por escrito.

Apetece dizer e repetir: Muito bem!

Versos Escritos N'água



Os poucos versos que aí vão,
Em lugar de outros é que os ponho.
Tu que me lês, deixo ao teu sonho
Imaginar como serão.

Neles porás tua tristeza
Ou bem teu júbilo, e, talvez,
Lhes acharás, tu que me lês,
Alguma sombra de beleza...

Quem os ouviu não os amou.
Meus pobres versos comovidos!
Por isso fiquem esquecidos
Onde o mau vento os atirou
 

.
Manuel Bandeira (Recife 1886/Rio de Janeiro 1968)

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Romance


Picasso
Para muitos alunos, romance é sinónimo de história de amor. Basta falar de romance e aguça-se-lhes a curiosidade sobre quem ama quem.
Depois, é-lhes explicado que pode haver romances sem histórias de amor. Que o que nos interessa é romance entendido como narrativa em prosa na qual as personagens podem existir em grande número e com grande densidade psicológica. Para além dos tempos e dos espaços que podem ser abundantes. Assim sendo, o romance tem uma extensão considerável.
Algumas vezes, perde-se o fascínio, outras não, porque muitos romances contêm belas histórias de amor. E quem não as aprecia?

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

A Palavra Mágica

Amadeo de Souza-Cardoso

Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.

Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
não desanimo,
procuro sempre.

Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra.


Carlos Drummond de Andrade

Natureza morta

Ovo de avestruz com pinhas

Tinham em comum o medo


Medusa - Caravaggio


 Medeia - Paul Cézanne

Todos os dias, aprendemos coisas novas, o que é motivador.
Ontem, em Serralves, fiquei a saber um pouco sobre dois mitos - de duas figuras de mulher tão inspiradoras para os artistas (música, pintura, literatura...) como terríveis.

Medeia foi personagem criada por Eurípedes (autor de tragédias gregas), alguns séculos antes de Cristo. 
Era feiticeira, sabia manipular venenos, matou os filhos após traição do marido...


Medusa foi decapitada por Pereceu e da sua cabeça desenrolavam-se serpentes.

Os nomes Medeia e Medusa  tinham em comum a palavra medo.


Veio a propósito a citação feita por Mário Cláudio:
"Enquanto a história se deforma a longo prazo, o mito forma-se".
Cocteau


Nota: Mário Cláudio também escreveu uma peça de teatro com o título Medeia (representada por Anna Paula).
 É um misto de Medeia grega, de atriz que pode ficar sem palco, de mulher que envelhece, de mãe que reflete sobre os filhos, de pessoa que repensa o seu lugar no mundo...
Razões que confirmam que o mito se forma, percorrendo todos os tempos.

Disse aos meus alunos...

...que procurassem, na internet, um poema de Nuno Higino. 
Um grupo trouxe este e gostei muito (do poema e que o tivessem procurado).

O silêncio sempre deixa saudade
A saudade é uma porta por onde se vê o mar
O mar é o baloiço que vai e vem nos olhos
do poeta
O poeta sempre mora na alma que há no vento
O vento é o mensageiro que leva e traz nas
crinas os segredos
Os segredos são a arca onde o esquecimento
tem guardados seus tesouros
Os tesouros são azuis, tão azuis, tão azuis como os
olhos da ilusão
A ilusão é jamais perder de vista a luz dos
pombos a pique nos telhados
os telhados são bandeiras às vezes alegres
ou tristes sobre as praças
as praças se denudam como mulheres
esculpidas entre as dunas
as dunas reconhecem a voz do sal ao sol do
meio-dia
o meio dia dança ao som de silvos, de vozes e sirenes
as sirenes são sereias alucinadas e hirtas
sobre o caos
o caos, já vencido, se entregou quase à hora
do sol-pôr
o sol-pôr é uma montanha onde crescem
enigmas e fantasmas
os fantasmas se insinuam entre as pedras,
as árvores, as estrelas
as estrelas às vezes descem aos ombros
surrados do mendigo
o mendigo se dissipa entre os latidos
cerrados do degredo
o degredo é tão antigo como a distância obscura do destino
o destino é uma cobra enroscada e ferida na cabeça
a cabeça é um romeiro que não tem fé na mão de nenhum santo
o santo mora na ermida guardada de
ciprestes e silêncio

o silêncio deixa sempre saudade.


Nuno Higino