quarta-feira, 30 de julho de 2025

O inferno


Quando eu era miúda, a palavra inferno dava para muita coisa. Bastava fazer uma asneirita que se ouvia logo: olha que vais para o inferno! O inferno era muito mostrado como lugar para onde iam os maus (e tantas vezes as asneiritas eram tão pequeninas!). Assim, os bons iam para o céu e os que tinham pecadilhos não muito grandes iam para o purgatório, à espera de entrada no reino celestial. 

Com o tempo, felizmente, essa distinção e sobretudo o lugar de fogo e de eterno castigo foram desaparecendo da catequese, homilias, etc. porque a educação e interação pelo medo nunca trouxeram bem a ninguém. Mas, se desapareceu a ideia desse lugar tenebroso e sem redenção, vivemos na terra muitos infernos nos dias que correm. E de que maneira! Por estes dias, os incêndios são um inferno avassalador que destrói tudo por onde passa e a que bombeiros e populações dão luta, embora o fogo seja o elo mais forte, ajudado pelo vento e calor. As pessoas e as terras atingidas são muitas vezes as mais desprotegidas e esquecidas porque são poucos os votos que garantem. 

Outro inferno atual que muitas imagens, nomeadamente de fotojornalistas, mostram ao mundo são de pessoas que morrem à fome em Gaza. Vemos, através delas, vidas humanas reduzidas a quase esqueletos. O olhar de sofrimento comove e revolta. As imagens terríveis da fome extrema em Gaza - cruel genocídio - têm proliferado em muitos jornais e revistas, alertando, juntamente com muitas instituições, para o que lá se passa, perante muita e longa indiferença de governantes de muitos países. Que não conhecem nem querem conhecer de perto o inferno de tantas vidas indefesas, porque têm sempre os mais variados paraísos à sua disposição. Que os servem e dos quais não querem deixar de se servir.


sábado, 26 de julho de 2025

Sou católica, mas não gosto de ver aquilo

 

Embora entre mais em igrejas quando passo a qualquer hora e vejo com agrado as portas abertas do que em horas marcadas para cerimónias litúrgicas, considero-me católica. E, de vez em quando, gosto de ir à Fátima, julgo que mais para agradecer do que para pedir, embora também não escape ao 'se isto acontecer, faço isto ou aquilo!', como acontece em tantas promessas. Mas, como se costuma dizer, cada caso é um caso e cada um faz como melhor entende e como dita a dureza do momento.

Chegando lá, gosto de olhar a vastidão do recinto, a cruz estilizada que se eleva e onde vejo arte e elegância, a capelinha onde, a quase todas as horas, existem rituais, missas, cânticos, orações, música... irradiando, independentemente do grau da crença de cada um, calma e espiritualidade.

Ora, ontem, fui com um grupo de amigas ao santuário de Fátima, viagem que já se vai tornando um ritual em cada verão. Quando chegámos, a missa estava prestes a começar e seria acompanhada pela voz límpida de uma jovem cantora. Como já não tínhamos lugares sentadas, ficámos de pé, sentindo uma brisa refrescante no corpo e na alma. Pouco depois, tivemos de dar uns passos em frente porque, sem repararmos, estávamos a pisar o corredor onde as pessoas passam  de joelhos cumprindo as suas promessas.

Respeitando todos os sentimentos e os motivos que levam a tão difícil percurso feito de joelhos, custa(-me) ver aquele deslizar penoso ainda que protegido por joelheiras.

Alguém perguntou: Nossa Senhora ficará contente com este sofrimento?! Concordei com a pergunta que, por coincidência, também me estava a ocorrer.

Impossível ficar indiferente


Os jornais dos últimos dias têm publicado fotografias chocantes de crianças que estão a morrer à fome em Gaza. Impressiona o olhar desses meninos e meninas sem culpa de nada, que as mães abraçam em supremo sofrimento, e que os governantes esquecem porque nas suas cabeças apenas cabem o ódio, a ambição, a vingança, a manutenção de privilégios … tudo o que o ser humano tem de pior para se manter no poder e mandar em tudo quanto pode.

O mundo, felizmente, vai reagindo, alertando, mas quem mata, quem impede que os camiões com os alimentos avancem na faixa de Gaza continuam a fazê-lo… e os mais fracos não cessam de sofrer, desnutridos e indefesos, e a morrer num dos piores massacres a que o mundo tem assistido. Nós, os anónimos, sentimo-nos perplexos e impotentes, os governantes querem estar de bem com Deus e com o Diabo para não perderem o lugar e conquistar cada vez mais, se possivel… e assim o horror continua sem dar tréguas. 

Enquanto isso, muitas pessoas vão sendo mortas, também enquanto esperam por alimentos ou desesperam por água.

Depois de as armas terem sido acionadas e muita gente morta, os assassinos sentam-se à mesa farta sem terem qualquer indigestão.

Que os media não se calem - cresce esse receio! - nem deixem de mostrar estes horrores para que também não se normalizem, como está a acontecer a tantos outros.

Às vezes, a sociedade civil, mesmo sem armas, trava alguns avanços de monstros que destroem o mundo para salvarem a própria pele, por onde o sangue devia escorrer mais à vista por tanto mal que ja fizeram e continuam a fazer à Humanidade. E parece que nada lhes acontece. Raisparta!


terça-feira, 22 de julho de 2025

Chapéus… afinal, há poucos!

 

Há umas semanas, procurei um chapéu para levar a um casamento, fazendo a vontade à noiva. Depois de lhe dizer que não era o meu estilo, que não estava habituada, acabei por aceder e até achei piada à ideia.

Tinha era de me despachar. Já faltava pouco tempo para a cerimónia. Comecei por procurar na net. Sem sucesso imediato. Dava jeito comprar no Porto, aonde já não ia há bastante tempo, apesar da proximidade. Na net, encontrei duas lojas onde, à partida, poderia encontrar chapéus como eu queria: uma na rua Sá da Bandeira, outra na rua Nova de S. Crispim. Na primeira, muito perto da estação de S. Bento, nem entrei quando lá cheguei. De fora, vi logo que eram para homem. E que gostasse de chapéu à cowboy. Voltei a subir a rua, notando a proliferação de lojas para turista: muito souvenir, muita esplanada, muito pastel de nata de múltiplos sabores. O calor apertava e os turistas enchiam os passeios da rua. Mesmo assim, ainda entrei noutras lojas onde ouvia o mesmo: não temos chapéus e nem sei onde os possa encontrar!

Nessa tarde, já nem tive vontade de ir à tal outra chapelaria. Ficaria para o dia seguinte.

Cheguei a casa e telefonei para a loja. Atendeu-me uma senhora de voz antiga e meiga. Sim, havia um chapéu como eu pretendia. Posso reservar, se quiser. E o tamanho? Era melhor medir. Tem fita métrica de costureira em casa? Sim, tenho.  Como indicado, medi a cabeça, mas medi mal. Precisaria de um tamanho maior, mas só vi isso quando lá fui no dia seguinte.

Para experimentar o chapéu, era dado um lenço de papel ao cliente para limpar a testa e depois uma touca de plástico.

Tantos cuidados e tão poucos chapéus para mulher, pensei eu. Para homem, abundavam, de muitas formas e muitas cores! E bonitos, muito bonitos. Para todos os estilos. Do mais vaidoso, ao mais sóbrio.

E saí desconsolada, pondo-me uma questão que me fez esquecer o que eu procurava e não tinha: Será que volto às Galerias Lafayette em Paris? 

E lá veio a resposta-promessa: Se for, não saio de lá sem um chapéu!


segunda-feira, 21 de julho de 2025

Na manhã deste domingo


Na manhã deste domingo, fiz parte de um grupo  de pessoas de Gondomar que gostam de ler, escrever e que publicam, seja em poesia ou prosa. 

Presentes estavam impulsionadores da iniciativa e autores de poesia e prosa que foram, nos últimos tempos, aderindo ao grupo por convite, por amizade, por vontade própria…

Partilharam-se livros já publicados, leram-se textos, conversou-se, reencontraram-se pessoas, conheceram-se outras, sentindo-se feliz comunhão pelo gosto de escrever. 

Foi boa a manhã de ontem em espaço público e aberto (Jovim). A chuva era anunciada, mas o sol abriu-se. O encontro trouxe alegria, amizade, boa comunicação, empatia…

Venham mais manhãs assim. Ou tardes ou noites. No mundo atual, as boas palavras são cada vez mais necessárias. Ditas ou escritas.


sexta-feira, 18 de julho de 2025

O que vou fazer para logo à noite?


Segundo o Expresso, na edição anunciada para esta semana, são os portugueses que mais gastam em comida.

Há muitos anos, uma pessoa alemã, ligada à nossa família, passou connosco uns dias e perguntou à minha mãe se não se cansava de passar tanto tempo na cozinha para fazer almoço e jantar. Já para não falar do lanche, porque com muita frequência, sobre a mesa havia ou aletria, ou leite creme, ou rabanadas para aproveitar pão seco, etc.

Nessa época,  passei um tempo na Alemanha e o jantar era sempre umas fatias de um pão escuro e maravilhoso a que juntávamos queijo ou salame. Tenho saudades desse pão que não voltei a encontrar em lugar algum.

Mas, voltando à notícia do jornal, fiquei surpreendida por sermos os mais gastadores na alimentação. Será pela quantidade ou pela qualidade dos alimentos? Estou com curiosidade de ler o texto na íntegra.

E, a propósito, nem sei o que vou fazer para o jantar!

quarta-feira, 16 de julho de 2025

MEO Deus, ou uma questão de vírgula!


Ontem, liguei para a MEO, a minha operadora de telemóvel, porque me apareceu uma mensagem com uma conta que não reconheci: 123 euros mais iva.

Interroguei-me: será 123  ou 1,23 euros? O que é certo é que aparecia 123 sem qualquer ponto ou vírgula.

O melhor seria telefonar para a MEO. Felizmente não me apareceu a senhora virtual a pedir o assunto do contacto exigindo apenas as palavras programadas e mais nenhuma.

Não, foi voz humana que me atendeu. Voz de homem mal disposto. Expus o assunto. Quis que eu lesse a mensagem recebida. Cumpri o pedido. Perguntou-me se eu tinha a certeza que a mensagem era da MEO e se o número 123 não era 1,23. Repetiu a pergunta com secura. 

A má disposição começou a contagiar-me. Repeti a questão: o custo mencionado na mensagem era de 1,23 ou 123 euros? O que estava escrito era 123 e a mensagem era da MEO, por isso, a operadora é que teria as respostas, e não eu. Se eu soubesse a resposta, não tinha contactado. O funcionário mal disposto continuava mal disposto. Pacatamente, pedi-lhe que tivesse mais paciência, porque a minha dúvida era legítima.

Depois de alguma desconversa, pediu-me para aguardar para ver então o que se passava. Finalmente, depois de algum tempo, comunicou-me que era 1,23 e não 123 euros. Que não tinha a vírgula, mas que eu deveria saber que era 1,23 euros.

Irritada, eu disse apenas obrigada e desliguei, lembrando-me do anúncio: Humaniza-te!


terça-feira, 15 de julho de 2025

No sofá com RGC e NM


Hoje de manhã, apressei-me nas tarefas domésticas para, de tarde, poder ler o livro que comecei há muito tempo e também jornais em atraso. Em papel, chega-me o Expresso, trazido pela minha filha que o compra todas as semanas e que, depois, mo passa para mim.

E o que não perco são as crónicas habituais do suplemento Ideias do semanário. A de Isabela Figueiredo é sempre uma maravilha pela maneira sedutora como escreve e pela bravura que revela também na seleção e desenvolvimento de temas atuais e importantes.

Ora, na mesma página, há outra crónica que não dispenso: a do jornalista e escritor Rodrigo Guedes de Carvalho. Vejo na sua escrita sensibilidade, ternura e vontade de transformar o mundo. Para melhor, é claro. Na crónica de 27 de junho, elege a coragem como ‘uma das mais belas palavras’ e dá o exemplo do cantor brasileiro Ney Matogrosso, que tem ‘a coragem de sermos quem somos, venha quem vier’. 

Em tarde quente e sossegada, há textos e músicas que nos refrescam e descansam. E se neles cabem ‘belas palavras’, ainda melhor.


Voltou o calor

 

Perto do Porto, onde vivo, nem sempre o calor aperta como noutras zonas do país. Talvez por sempre cá ter vivido, prefiro temperaturas mais amenas. Acho até que me daria bem em países mais a norte da Europa, ainda que o sol nem sempre brilhasse como acontece com tanta frequência no nosso país.

Quando está muito calor, penso nas pessoas que vivem em espaços pequenos e muito quentes, o que dificulta a vida e aumenta a solidão, sobretudo dos mais velhos.

E o que é certo é que, pelos dados que existem, não  vamos para melhor, pelo contrário. O aquecimento global vai-nos esturricando o corpo e a alma. E erros fatais continuam a destruir a natureza, apesar de todos os apelos.

 Porém, as crianças e jovens, nas escolas, fazem trabalhos, aparentemente simples, mas fundamentais para que o clima não se canse nem se zangue, como é o caso de plantação de árvores, separação de lixos, reciclagem, criação de pequenas hortas, etc.

Possam frutificar estas sementes que tantas pessoas vão lançando para que o calor excessivo não traga tantos males como incêndios e seca e tantos outros.

A propósito, vou beber um copo de água. 


segunda-feira, 14 de julho de 2025

Les Bonbons, de Jacques Brel (hoje no Expresso Curto)!



‘Les portugaises’ e o 14 de Julho



Em França, quando se fala de ostras, também são referidas ‘Les portugaises’, cujo nome tem a ver com a antiga importação desses bivalves por portugueses. Isto fiquei a saber num estágio para professores de francês em que participei há muitos anos, num mês de julho, em Bordéus. Com outras colegas, visitei vários viveiros de ostras da região, com vista a um trabalho que realizámos. Também pudemos saborear algumas, é claro. Ao todo, éramos um grupo de uma dezena de professoras portuguesas e os colegas dos outros países também diriam ‘Les portugaises’ referindo-se a nós e atendendo ao nosso país de origem, porque as palavras são ricas em diferentes sentidos.

Ora, durante esse estágio, pudemos também assistir à festa nacional francesa do 14 de Julho, em que se celebra a tomada da Bastilha, em 1789, fortaleza e prisão, símbolo do absolutismo monárquico, espaço que deu lugar à atual Praça da Bastilha.


Nessa data, fundamental para a França e importante para nós vivê-la como experiência, lá fomos todas alegremente para a rua participar da Festa Nacional Francesa e comemorar a Liberdade, Igualdade e Fraternidade, símbolos da Revolução Francesa. Impossível esquecer essa Festa.
Oxalá que o 14 de Julho seja sempre celebrado em feliz Liberdade.


Nota: Imagens da net

domingo, 13 de julho de 2025

Bom domingo de verão!













sábado, 12 de julho de 2025

O filme que já era e uma crónica que chegou

 

Para o meu leitor (ou leitora, não sei) que, com alguma razão, me apontou preguiça por não publicar há alguns dias!


Há muito que não ia ao cinema. Um grupo de amigas convidou-me e logo disse que sim. E acrescentei: desta vez não vou dar nega.

O filme escolhido foi uma comédia divertida francesa. Como pede o verão e o tempo (com coisas tão sinistras) que vivemos. E também havia, felizmente, coisas boas para festejar, para além da amizade.

O filme era às 13,30. Chegámos um pouco apressadas à bilheteira do Alameda. Pois, mas o filme já não estava em exibição! Não teve saída - disse o jovem funcionário do outro lado do balcão. Ai o preconceito dos filmes franceses - dissemos nós.

Olhámos o painel dos filmes - ou não nos interessavam ou o horário não nos convinha. E se fôssemos à Arcádia tomar alguma coisa e pôr a conversa em dia?! Foi o que fizemos e que bem que soube! 

E da conversa, que é como as cerejas, resultou também o envio, no dia seguinte, desta crónica de Elena Ferrante (obrigada, Idalina!) de que gostei muito e que agora também partilho. Oxalá gostem também.


«Medos                                                                                     27 de Janeiro de 2018

 

Não sou corajosa. Tenho medo sobretudo de qualquer coisa que rasteje, e acima de tudo de cobras. Tenho medo das aranhas, dos carunchos, das melgas e até das moscas. Tenho medo das alturas e, portanto, dos elevadores, dos teleféricos, dos aviões. Tenho medo da própria terra onde assentamos os pés quando imagino que poderia escancarar-se ou, devido a uma avaria imprevista no mecanismo universal, como na lengalenga que recitávamos em pequenas enquanto fazíamos uma roda (a roda a girar, o mundo a tombar, tomba tomba o chão, todos para o chão – como me aterrorizavam estas palavras). Tenho medo de todos os seres humanos quando se tornam violentos: tenho-lhes medo se berram, se insultam, se ostentam desprezo, cacetes, correntes, armas brancas ou de fogo, bombas atómicas. E contudo em rapariga, em todas as ocasiões em eu era preciso ser-se destemida, eu obrigava-me a ser destemida. Depressa me habituei a temer menos os perigos reais ou imaginários e mais, muito mais, o momento em que os outros ou as outras reagiam como eu, paralisada, não conseguia reagir. Assim, as minhas amigas gritavam por causa de uma aranha? Pois bem, eu vencia a minha repulsa e matava-a. O homem que eu amava propunha-me férias na montanha com os seus inevitáveis voos de teleférico? Eu ficava a escorrer suor, mas lá ia. Uma vez, com uma pá e uma vassoura, aos gritos, pus fora uma cobra que o gato me trouxera para debaixo da cama. E, se alguém ameaça as minhas filhas, a mim, qualquer ser humano, qualquer animal não agressivo, venço a vontade de fugir. A opinião corrente é que quem age como eu tenazmente me treinei a reagir tem verdadeira coragem, a coragem que consiste precisamente em vencer o medo. Mas não estou de acordo. Nós, as pessoas timoratas-combativas, pomos acima de todos os nossos medos o medo de perdermos a estima por nós próprias. Atribuímo-nos imodestamente um valor muito grande e, para não termos de nos confrontar com uma imagem degradada de nós próprias, somos capazes seja do que for. Em suma, repelimos os medos não por altruísmo, mas por egoísmo. E, por isso, devo reconhecê-lo, tenho medo de mim. Sei desde já há algum tempo que posso exceder-me e portanto estou a tentar atenuar as reacções agressivas a que me forcei desde pequena. Estou a aprender a aceitar o medo, e até mesmo a mostrá-lo com autoironia. Comecei a fazê-lo quando compreendi que as minhas filhas se assustavam se me viam defendê-las com exagerado ardor de perigos pequenos, grandes, imaginários. Talvez devamos ter acima de tudo medo da fúria das pessoas aterradas.»

                                               Ferrante, Elena, A Invenção Ocasional, 2019, Relógio D´Água, pp. 13-14.


sexta-feira, 4 de julho de 2025

E viviam aqui tão perto!


Apesar de morar a curta distância dos dois irmãos que faleceram no terrível acidente de carro, não os conhecia pessoalmente. Pelo que se sabe, não procuravam a fama por dá cá aquela palha, mas, antes, a construíram com o seu trabalho diário e constante.
Os louvores têm sido imensos sobretudo a Diogo Jota, que começou no futebol de Gondomar, tal como o irmão, e, em menos de uma dezena de anos, chegou ao Liverpool. Também os meios de comunicação britânicos o elogiam pelo ser humano que sempre foi e pelo excelente desempenho no futebol.
É bom perceber que ainda se sabe reconhecer o talento, o trabalho e a honestidade de quem merece. Porém, os elogios chovem sobretudo depois da morte. Oxalá que estes dois jovens  tenham ouvido em vida uma grande parte desses elogios que hoje são partilhados.
Os dois jovens vão  fazer muita falta à família e ao mundo - porque bons exemplos, seja a que nível for, são cada vez mais necessários. 
A sua terrível morte mostra mais um caso de desconcerto do mundo.
 Amanhã,  sábado, a Gondomar vão chegar muitas figuras conhecidas pelo seu papel na política, no desporto, etc. Possam algumas dessas pessoas aprender com a vida exemplar destes dois rapazes que, sem vaidade nem estratagemas, se tornaram uma boa referência para todas as idades, nomeadamente para os jovens.

segunda-feira, 30 de junho de 2025

Coisas de verão

 

Levantei-me cedo para regar o jardim e a horta, mas deixei a horta para logo à tardinha (gosto muito desta palavra). Desliguei a torneira porque, apesar de pouco passar das oito da manhã, já corava de calor e as moscas andavam, doidas ou aflitas, não sei,  em meu redor, o que detesto. Mas gosto de ver as plantas refrescadas, já que nós andamos cheios de calor. E a zona onde vivo nem se pode queixar muito, em relação a regiões que se tornaram tórridas por estes dias - muito difíceis para muitas pessoas. Para juntar a outras dificuldades.

Andava a regar e vi que na caixa do correio havia várias cartas: impostos que vou ter de pagar. Como faço sempre, é claro. E sempre penso e desejo: que sejam por uma boa causa, mas ao pensamento vem-me sempre também: porque é que tanta gente que ganha rios de dinheiro paga pouco ou até nem paga nada? Que raio é este desconcerto do mundo que se alarga pelo mundo fora e também no nosso país?! 

Nasci em julho. Há dois anos, também  em julho, tive de ser operada de urgência em Londres, onde estava em visita à minha filha, e para festejarmos, juntas, o meu aniversário. No ano passado, no mesmo mês, fiquei bastante doente e fui operada em agosto. Diz-se que não há duas sem três!!! Como agora há tanta coisa às avessas, espero que não!

No meu quintal, tenho ameixas quase maduras e limões que, de tão robustos, até caem ao chão. Em breve vou ter aqui em casa a minha neta que vive em Londres. Ela adora ir ao quintal colher o que houver e pôr numa cestinha. Ao vê-la, apetece-me sempre tirar-lhe fotografia, mas, mesmo que não o faça, a imagem bela fica-me na memória. 


Bom dia de verão: se possível com mais frescura e alguma maresia (outra palavra de que gosto muito).


segunda-feira, 23 de junho de 2025

Já chegou o São João


Já chegou o S. João,

Sem vontade de sorrir;

Deve estar preocupado

Com tanta guerra pra vir!


S. João, alegre e santo,

De tanta coisa és um ás;

Dá juízo a quem mal governa

Já que o mundo é incapaz!


Meu querido S. João,

Escreve nos manjericos 

Que a paz vai ser possível,

Mas, para longe os mafarricos!


quinta-feira, 19 de junho de 2025

Será possível ainda falar de coisas simples e boas?

 

Hoje levantei-me cedo. O tempo estava fresco e orvalhava, não bastante para regar as plantas. Liguei a água do poço e, daí a nada, estava a regar. Água abundante. Até quando será assim?

Enquanto regava, fui cortando as rosas velhas. Iam caindo junto da raiz - também um modo de fortalecer as vindouras.

Estendi roupa que sempre seco ao sol e ao vento. E reparei nas florzinhas pequeninas e azuis que renasceram. Uma amiga tinha-me dado o vaso há bastante tempo por causa dessas flores que, disse-lhe eu, me faziam lembrar Londres, onde as via em bonitos canteiros. Ela deve ter reparado que me ‘estava a fazer’ à planta e, como é simpática e generosa, deu-me o vaso.  Agora, de novo com as florzinhas bem mimosas, vou tirar uma foto e mandar-lhe. Deve ficar contente por ver que estimei o presente que me deu.

Enquanto escrevia este post,  fui participando num grupo de amigas do WhatsApp. E vários assuntos vieram à baila, como, por exemplo, o último livro de Mário Cláudio, em cujo título entra a palavra cruzeiro. E como as palavras são como as cerejas (tenho comido algumas bem boas!), veio à baila o gosto de fazer um cruzeiro. Eu, não, disse eu de imediato. Sobretudo em mares revoltos! Morreria de medo! O único que fiz foi há muitos anos - um pequeno cruzeiro no Báltico. Ficou-me na memória a serenidade daquele mar naquele fim de tarde. Ainda nem se falava dos horrores e medos por guerras que abalam regiões próximas e vão chegando, por diferentes formas, a todo o mundo.

Por tanta violência que parece aumentar em cada dia, interrogo-me se ainda tem cabimento falar das pequenas alegrias do dia a dia. A resposta é-me dada logo pelos meus botões: são cada vez mais necessárias para que o mundo não fique ainda mais triste!


domingo, 15 de junho de 2025

A roupa

 

Sobre o tema do título, posso dizer que cada vez gosto menos de comprar roupa. Falta-me paciência. Se é pela net, muitas vezes, o tamanho não coincide com o meu; se é na loja, fico cansada e cheia de calor nos provadores.

Por outro lado, abro o meu guarda-fatos e concluo que tenho a roupa de que preciso durante bastante tempo e para diferentes ocasiões. Para quê então acumular mais, gastar mais dinheiro, ocupar mais espaço em casa?

Seja como for, de tempos a tempos, as arrumações vão separando roupas que já não se quer. Fui juntando assim algumas num saco que hoje meti na mala do carro para depositar num contentor. Logo que via algum, parava o carro, tirava o saco e lá tentava rodar o dispositivo para o introduzir, mas nada, porque estava cheio. Ao quarto contentor por onde passei, nem parei o carro porque muitas peças de roupa saíam, avulsas, pelo contentor fora, sem qualquer cuidado ou arrumação.

Moral da história: o saco ficou na mala do carro, à espera de contentor com espaço para o receber e a roupa poder seguir um bom caminho.

Ah, ainda não disse, mas tentei dar essa roupa; agradeceram-me muito, mas a instituição já não tinha espaço para tanta roupa recebida.

Há uns anos, fiz voluntariado numa instituição de pessoas sem abrigo, que recebia todo o tipo de objetos para serem vendidos e, assim, ajudar pessoas em situação de muita necessidade básica. Pois bem, dado o seu volume, muita roupa era vendida ao desbarato e uma grande parte - a que tivesse alguma mazela - voltava para os sacos e ia para reciclar.

Por isso, o excesso de roupa é um problema cada vez maior e mais sério. Doada ou depositada nos contentores próprios, pode ser muito útil para muitas pessoas ou instituições, mas, pelas notícias conhecidas, muita roupa vai parar a países muito pobres, aumentando ainda mais o horror da poluição. 

Quando há moderação nas compras, sabe melhor comprar uma roupa nova, como o vestido para casamento que comprei e que já está na cruzeta - no cabide, como se diz mais para o sul do país.


quinta-feira, 12 de junho de 2025

‘Para pior já basta assim’


 Fui assinante do jornal Expresso durante um par de anos e continuo a ler este semanário. Habitualmente, a minha filha compra-o ao sábado e na semana seguinte vem até mim. E há, atualmente, o suplemento Ideias que não dispenso, sobretudo pelas crónicas.

Pois bem, cancelei a assinatura há coisa de um ano. Estava tão irritada que também queria deixar de receber o Expresso Curto, que recebo, sem pagar, todas as manhãs, e que acho muito bom.

Ora, o  que me levou ao cancelamento da assinatura do jornal foi o destaque - na minha opinião, é claro - que era dado a André Ventura. Ele era título gordo de primeira página, ele era fotos enormes, etc. Julgo não errar se disser que não havia edição do semanário em que o A.V. não fosse uma das principais figuras e notícias.  A favor ou contra, lá estava ele a marcar o seu território que lhe era dado nas páginas principais.

Acho que agora o jornal - que continua a ser de referência - já está mais moderado quanto a essa opção. E ainda bem, porque o tempo também traz ensinamentos. Espero que vários leitores tenham também reagido.

As televisões, porém, continuam a andar atrás do Sr Ventura. Logo que ele se aproxime de um microfone, lá estão as televisões. Um dos exemplos mais ridículos foi quando Ventura se sentiu mal na campanha eleitoral e as televisões, julgo que sem exceção, o seguiram incessantemente até às consultas no centro de saúde. Mesmo depois de se saber que a má disposição não era grave.

É que isto das audiências deve envolver muito dinheiro que as televisões não querem perder.

A comunicação social - fundamental para a informação e formação dos cidadãos - terá de refrear muitos ímpetos. E nós, leitores, ouvintes, telespectadores também, mostrando o nosso desagrado por certos exageros que só contribuem para a desinformação. E para a normalização de casos muito graves de violência, vindos de grupos extremistas.

Quanto à selva das redes sociais mais comuns, nem me pronuncio, porque não as uso. Para ‘pior já basta assim’.

terça-feira, 10 de junho de 2025

Hoje, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades

 

Neste dia, os elogios à seleção portuguesa  ainda se ouvem. E ainda bem, apesar das incontáveis fortunas que o futebol mobiliza.

A vitória veio também do trabalho persistente e do esforço para vencer e isso é bom, não só pela alegria coletiva (e tanto precisamos dela!), mas também porque dá exemplos às novas gerações. Muitas figuras públicas são conhecidas de todos não porque ajudam a Humanidade, mas pelo que fazem para manipular os outros e assim aumentarem o seu poder. Por isso, bons e estimulantes exemplos são bem-vindos.

Camões, que viveu no século XVI, não foi indiferente a temas que ainda persistem de forma notória: ambição, vaidade, falsidade…

Daqui a pouco, nos discursos públicos e políticos, surgirão, por certo, citações de versos do nosso Épico. Mais valia não os encaixarem tanto neste Dia e dar mais relevo à cultura no dia a dia.

Julgo que as cerimónias públicas deste 10 de Junho começam às 10,30. Gostava de ver e ouvir  sobretudo Lidia Jorge, personalidade que muito aprecio e de quem já li alguns livros.

Vejamos se as cerimónias públicas serão uma mais-valia para todos, dentro e fora do país. Nem que fosse um grão de areia.

E vejamos se os estrondos ou pesados silêncios diários, que lembram tanto desconcerto do mundo’ de que Camões também falou, se atenuam um pouco, mas deve ser difícil pelo que se vê e escuta.

Hoje, aqui pelo Norte, também se prevê muito estrondo de trovoada. Pudesse, no final de tantas tempestades, vir a bonança. De que o mundo tanto precisa.