quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

"Quando eu morrer" de António Feijó

I
"Quando eu morrer - e hei-de morrer primeiro
do que tu - não deixes fechar-me os olhos
meu Amor. Continua a espelhar-te nos meus olhos
e ver-te-ás de corpo inteiro

como quando sorrias no meu colo.
E, ao veres que tenho toda a tua imagem
dentro de mim, se, então, tiveres coragem,
fecha-me os olhos com um beijo.

Eu, Marco Pólo,

farei a nebulosa travessia
e o rastro da minha barca
segui-lo-ás em pensamento. Abarca

nele o mar inteiro, o porto, a ria...
E, se me vires chegar ao cais dos céus,
ver-me-ás, debruçado sobre as ondas, para dizer-te adeus.

II
Não um adeus distante
ou um adeus de quem não torna cá,
nem espera tornar. Um adeus de até já,
como a alguém que se espera a cada instante.

Que eu voltarei. Eu sei que hei-de voltar
de novo para ti, no mesmo barco
sem remos e sem velas, pelo charco
azul do céu, cansado de lá estar.

E viverei em ti como um eflúvio, uma recordação.
E não quero que chores para fora,
Amor, que tu bem sabes que quem chora

assim, mente. E, se quiseres partir e o coração
to peça, diz-mo. A travessia é longa... Não atino
talvez na rota. Que nos importa, aos dois, ir sem destino."

Álvaro Feijó, lido na evocação de Mário Soares, pela voz de Maria Barroso

Nota -  António Feijó nasceu em Ponte de Lima, em 1859
e faleceu no dia 20 de junho de 1917,
em Estocolmo, na Suécia.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Obrigada, Mário Soares!

Vieira da Silva
Ela é tão livre que um dia será presa.
- Presa por quê?
- Por excesso de liberdade.
- Mas essa liberdade é inocente?
- É. Até mesmo ingênua.
- Então por que a prisão?
- Porque a liberdade ofende.  
Clarice Lispector 

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Flores da época



domingo, 1 de janeiro de 2017

"O melhor do mundo..."

Era quase meia noite e a família estava reunida à volta da mesa. Já se ouviam foguetes a anunciar o Novo Ano. 
Fazia-se a contagem dos minutos por ordem decrescente. Cada um tinha as suas doze passas. As taças estavam à espera do champanhe, a garrafa, da hora certa para a espuma do momento.
5... 4... 3... 2... 1....
E, com um brinde, todos diziam: Bom Ano! Bom Ano!
E foi quando o menino, ao colo do pai, muito contente pela alegria partilhada, disse:
Bom Ano! Bom avô! Boa avó!

sábado, 31 de dezembro de 2016

Num Centro Comercial e Feliz Ano Novo! Ah! E também rabanadas!

Há dias, por casualidade, encontrei uma amiga num Centro Comercial. Falámos das nossas vidas, como é natural.
E referimos outras amigas que, apesar de não estarem sempre presentes, presentes estão na minha lembrança.
E, naquela manhã, ela disse-me uma coisa muito simples, mas que me soube muito bem ouvir: então, quando voltas ao blogue? Já não escreves desde o dia 11!
Pois bem, apesar de todos os afazeres, sobretudo natalícios, foi um bom e feliz motivo para me sentar hoje (depois de ter feito as rabanadas) à frente do computador e partilhar imagens de uma agradável visita que fiz, ontem, ao Museu Mineiro de S. Pedro da Cova, com outra amiga. 
Partilho também um conto de Natal. Talvez por ter uma filha emigrada, acho que, nas pequenas coisas que escrevo, este tema está em mim muito presente.
E não podia deixar de me lembrar de Georges Michael que, tal como outros músicos que nos deixaram este ano, partiu demasiado cedo.
Ele deu tanta doçura a tantos momentos das nossas vidas!

Um ótimo Ano Novo!


Um conto (ainda) de Natal!



Caminhos para as estrelas

Podia dizer-se que Celeste, embora de forma simples, vivia bem e sentia-se bem. Havia bastantes anos que alugara aquela casa. Já nem sabia ao certo quantos. E punha-se a pensar. Foi a seguir à partida do marido. Portanto, havia dez anos. Quando passou a viver só, optou por se mudar para uma casa mais pequena e os filhos concordaram.
Por essa altura, decidiu fazer o que nunca tinha conseguido concretizar até então: escrever diferentes histórias. Embora não fosse esse o seu principal objetivo, a escrita também atenuaria o peso magoado de alguma solidão.
Sempre escrevera pequenos contos dispersos, nos quais não reconhecia muita qualidade. Sentia que lhe faltava tempo e concentração para, maduramente, reler, corrigir e aprofundar as narrativas. Queria passar a fazê-lo o mais brevemente possível, mas o momento demorava a chegar.
Os filhos conheciam-lhe esse gosto e motivavam-na para que continuasse a escrever, também de forma mais abundante e sustentada, uma vez que dispunha agora de mais tempo; tinha acabado de se aposentar. Celeste, olhando as grandes obras de autores que moravam, sábios, na sua estante, achara sempre uma ousadia querer partilhar e publicar os  seus textos que, por vezes, até desvalorizava.
Porém, o melhor - concluía de forma positiva - era continuar a escrever, cada vez mais e melhor, reflexões, histórias, textos cuja escrita lhe dava imenso prazer. Às vezes, achava que escrevia mais para si e de si, embora, com as suas palavras, pretendesse abraçar todas as pessoas, sem as quais a vida não faria sentido. Mesmo assim, escrevia pouco, embora lhe andassem a bailar algumas ideias na cabeça. Tinha-as até registado num bloquinho que guardava na carteira. Precisava de sossegar ou de um impulso para passar à prática.
 Os filhos, sempre presentes no seu pensamento, viviam em diferentes países - um no Canadá e outro na Islândia. Tinham organizado a sua vida bem longe de Portugal, porque lá haviam encontrado melhor trabalho e mais reconhecimento profissional. Os netos frequentavam as escolas nos países de acolhimento, que já conheciam melhor do que o dos pais e avós, ao qual associavam sobretudo as férias grandes ou o Natal.
Antes da mudança, Celeste teve a preocupação de a casa dispor de espaço suficiente para que, quando os filhos e netos viessem a Portugal, pudessem lá ficar confortavelmente. Aquando das suas poucas visitas, a casa era toda arranjada, para ficar ainda mais bonita. Pelas claraboias, parecia entrar mais intensamente a luz.
De facto, a casa tinha várias claraboias que permitiam a Celeste ver, em qualquer momento, a luz do dia, o luar ou a escuridão da noite. Se havia nuvens, distinguia a cor com que o céu se tingia ou carregava. Quando chovia, sentava-se muitas vezes a olhar os pingos de chuva a cair e a escorrer, ronceiros mas brilhantes, nos vidros transparentes e retangulares. Até as luzes incertas das noites de trovoada a fascinavam.
Com o tempo, foi-se ligando àquela casa como a uma pessoa amada ou a um cão estimado, cuja companhia não se dispensa. Quando lhe ocorriam estas associações, logo se lembrava do  Dunas - o velho labrador - que vivera com a família mais de dez anos, como se dela fizesse parte. Olhando as claraboias, estas e muitas outras recordações cintilavam como estrelas.
 A casa, para Celeste, era o seu teto, o seu abrigo, um caminho para atingir as estrelas, apesar de achar indispensável o convívio com a família e amigos.
 Havia noites em que, entre as estrelas, via a fugaz luz faiscante de um avião e era inevitável pensar em possíveis viagens para visitar os filhos e os netos: as suas estrelas. Seria difícil a deslocação, porque ficaria muito cara por ser enorme a distância.
Se continuasse a escrever, como pretendia, poderia imaginar que todos viviam mais próximos. Organizar as ideias e as palavras seria também um caminho para aceder a mais momentos felizes. Motivos para as suas histórias não faltavam. Tanta coisa acontecia em cada momento e a memória estava também tão preenchida. Era, de facto, urgente começar a escrever como pretendia. Tanto tinha desejado escrever mais e melhor e agora, que tinha mais tempo livre, ia adiando o seu projeto. Os filhos e os netos faziam-lhe falta, mesmo para escrever.
Num fim de tarde de início de dezembro, sentou-se no cantinho habitual do sofá e, olhando o céu escuro e invernoso, lembrou-se de que em breve o Natal chegaria. Sempre o tinha passado em família. Uma família grande e calorosa. Passavam tempos em que não se encontravam, mas todos sabiam que podiam contar uns com os outros. Pena sentia de não ter a companhia aconchegante dos filhos e dos netos que este ano haviam decidido não vir a Portugal, dizendo que, possivelmente, em breve se encontrariam.  Celeste interrogava-se: Em breve? Mas quando? Como? Onde?
No dia de Natal, apesar da diferença horária, falariam pelo Skype. Não era a mesma coisa, mas já era alguma coisa. Habituara-se, com o avançar dos anos, a não exigir mais do que a vida lhe ia dando. E já era tanto!
De facto, depois de algumas perdas muito importantes e da mudança para a casa das claraboias, tendo-se despojado de muita coisa que não considerava essencial, aprendera a relativizar os problemas e a gostar de ver bocadinhos de céu em vez de pretender abarcar o Céu por inteiro.
Os filhos e os netos iam dando notícias quase diariamente pelo Skype ou pelo WhatsApp; estavam bem, o que lhe dava consolo. A avaliar pelas imagens e palavras recebidas, todos pareciam saudáveis e felizes. Via que se olhavam amorosamente, que sorriam uns para os outros, que trocavam palavras de carinho e apreço. Que mais poderia desejar como presente de Natal?
Educara os filhos para serem cidadãos  honestos, responsáveis e respeitadores do outro - fosse ele pessoa ou elemento da Natureza. E tinham excedido em muito o que lhes ensinara. Não teria a sua presença neste Natal, mas estaria com a restante família à qual estava profundamente ligada. E pensava para si que os filhos e os netos nunca deixavam de estar com ela.
Na véspera de Natal à noite, depois de arrumadas as travessas do bacalhau com batatas e hortaliças - tudo viera para a mesa a fumegar ; os pratos de aletria, de rabanadas - adoçantes do ar e dos sentidos; os sacos abertos das prendas - que eram feitas cada vez mais por cada um a pensar em cada um, regressou a casa. O familiar convívio natalício e festivo enchia-lhe a alma, mas voltar a casa era sempre regressar ao seu pequeno paraíso, como a um prolongado, sereno e amado abraço.
Antes de se deitar, sentou-se no seu lugar preferido do sofá, olhando, mais uma vez, a claraboia do teto da sala. Viu, então, um avião que deixava um lastro reluzente. Parecia viajar entre as estrelas.
De repente, acendeu a luz, leu e releu as mensagens que, no momento, estava a receber pelo WhatsApp. Ajeitou os óculos e voltou atrás para confirmar o que lia. Queria ter a certeza dos presentes que estava a receber.
Cada um dos filhos oferecia-lhe uma viagem, para breve, ao país para onde tinham emigrado. Celeste poderia, assim, abraçar os filhos e os netos, passar com eles algum tempo e conhecer melhor a região.
Respirou fundo, olhou a claraboia e o céu, que sempre lhe aparecia aos bocadinhos, naquela noite desenhava-se como inteiro.
Entretanto, olhou para o computador dizendo, decidida e confiante,  para si: não me vou deitar sem começar a escrever uma das histórias que andam na minha cabeça há tanto tempo.
Seriam um presente para os netos.  Pô-las-ia em forma de livrinho, em papel claro e luzidio, e juntar-lhes-ia imagens que aumentassem o brilho das palavras. Poderiam lê-las em conjunto.
Olhando o céu através das claraboias e imaginando as próximas viagens para rever os filhos e os netos, logo lhe surgiu um título para a primeira história: "Janelas para as minhas estrelas".

Maria Dolores Garrido
In Lugares e Palavras de Natal
Editora Lugar da Palavra

Museu Mineiro de S. Pedro da Cova: Vale a pena uma visita!




2016 - Um ano de muitas perdas. Felizmente ficaram obras!

domingo, 11 de dezembro de 2016

Por ser quase Natal

sábado, 3 de dezembro de 2016

Paris, je t'aime!


"Odeio!", "Teadoro"...

Ontem, fui a uma loja de roupa e ouvi uma das palavras que é muito recorrente, sobretudo entre os jovens, em relação a qualquer peça, ou cor, ou modelo de que não se gosta: "odeio".
Claro que não é para levar à letra, mas acho bizarro este verbo usado neste contexto..
Cliquei num dicionário eletrónico e encontrei sobre o verbo "odiar":
"transitivo direto e pronominal
sentir aversão por (algo, alguém, a si próprio ou um ao outro); detestar(-se), abominar(-se)."
Ora, não gostar de uma cor - como era o caso - não implicaria sentimento tão extremo.
Porém, eu era incapaz de comprar um casaco amarelo-canário, verde-alface, rosa-choque...
Poderia dizer que odeio e poupava palavras porque digo: sou incapaz de usar essas cores, não me vejo com essas cores...
Por outro lado, odeio cenários de guerra que destroem vidas e a vida de muitos seres humanos; odeio o desrespeito pelos mais frágeis, neles cabendo as crianças e os velhos; odeio a destruição voluntária de bens que pertencem à história da Humanidade; odeio os maus tratos domésticos, como se houvesse donos e vassalos; odeio a ambição desmedida dos que empurram, com um sorriso e pancadinhas nas costas, os que não são hábeis e corruptos...
E talvez as jovens que disseram odiar já não sei que cor odeiem também tudo isto. E oxalá que sim.
E, quem sabe, talvez gostem - ou melhor, amem, odorem, curtam, etc, alguns poetas.
Eu, por mim, gosto, amo, adoro, curto este poeta e este poema:

"Beijo pouco, falo menos ainda.

Mas invento palavras
Que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.
Inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo:
Teadoro, Teodora"

Manuel Bandeira


Quem pode dizer que o(s) odeia?


quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Apetece-me chorar, disse ela.

Ela sempre gostara de jardinar, de plantar, de semear, de colher, de guardar as sementes...
O jardim estava viçoso, a horta, sempre com hortaliças verdes da época. Para não falar das árvores de fruto que eram acarinhadas e seguidas como se de pessoas se tratasse.
Paralelamente à família, as flores, os frutos, as hortaliças assumiam estatuto de relevante prioridade. Para que nada lhes faltasse. Tal como os humanos, precisavam de viver para que se prolongassem outras vidas.
O que a natureza produzia sempre foi para ela um dos bens mais sagrados da vida. Como a água ou a chuva quando necessária.
O tempo foi passando; a vida, trazendo dores nas pernas e articulações e ela teve de ir escasseando esses trabalhos. Com dor.  Com muita dor. Com saudade, Com muita saudade.
Um dia, pegou na bengala e foi até ao terreno, onde havia plantado árvores, onde tinha lançado sementes no tempo certo, onde tinha enchido cestos no tempo das colheitas...
Ficou parada a olhar e disse:
-Apetece-me chorar, porque queria continuar a trabalhar e já não posso.
E, apesar do verão de S. Martinho, a natureza parecia compreender.


segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Natural outono



domingo, 13 de novembro de 2016

Nas Galerias Lumière, dia 24, às 21.30

Desnecessárias seriam as pipocas!!!

sábado, 12 de novembro de 2016

Leonard Cohen - Divinamente eterno

sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Há homens que (ainda) não deviam morrer!

LEONARD COHEN (1934-2016)

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Saber e fazer bem!


quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Um sim ou um não?

Trump ganhou as eleições de ontem  nos Estados Unidos. Contrariamente às previsões. Contrariamente às sondagens. Contrariamente a todos os apelos de figuras públicas. Contrariamente a meios de comunicação social que decidiram tomar posição contra o candidato.
Ganhou, apesar das mentiras, apesar do racismo, apesar da fuga aos impostos, apesar do desrespeito pelas mulheres, apesar da mente fechada ao novo mundo, apesar da ausência de ideias...
Mesmo assim, venceu as eleições até em estados onde seria improvável ganhar, como a Florida.
Milhões e milhões de eleitores deram-lhe um sim, pretendendo, por certo, vincar um não a tantas políticas e políticos que tanto mal fazem e que tantos bens recebem por esse mundo fora, incluindo Portugal, é claro.
Pior lição era impossível.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Camden Arts Centre no outono



Amanhecer