terça-feira, 13 de setembro de 2011

Diário de Mariana

13 de setembro

Querido diário,

Escrevi-te há algumas horas, mas como ainda tenho um bocadinho de tempo livre fui andar de bicicleta. Quando cheguei a casa, tive vontade de te escrever outra vez. Antes de sair, ouvi não sei quantas vezes: Mariana, anda devagar. Mariana, não fales com pessoas que não conheces, mesmo que pareçam fixes, como tu dizes. Mariana, atenção às pedras e aos carros. Mariana, anda só onde houver gente. Mariana, não demores…

A gente quando chega à escola, tem de se lembrar de regras que nunca mais acabam. Eu acho que as mães também deviam saber algumas. Por exemplo, que não se pode repetir tantas vezes as mesmas coisas. Fogo.

Quando ando de bicicleta, lembro-me de muitas coisas. A minha mãe diz que isso lhe acontece quando anda a pé. Diz que se lembra de coisas giras mas que depois se esquece. Eu juntei dinheiro e comprei-lhe uma agenda moleskine para ela tomar notas. Agora anda sempre com ela na carteira. Qualquer dia, vou espreitar.

Se calhar por ter falado da minha mochila, enquanto andava de bicicleta, lembrei-me que nunca tive nenhum professor que usasse mochila ou rabo de cavalo. Mas eu já vi e achei fixe. Os meus profs usam sempre pasta e cabelo rentinho. Algumas pastas são horrorosas. Tenho até um setor que usa uma pasta preta , muito cheia e já velha. Quando a abre, até demora a encontrar os papéis. É fixe porque assim podemos falar um pouco mais.

Será que é este ano que vou ter um prof de mochila e de rabo de cavalo? Falta pouco pra eu ficar a saber.

Até amanhã, querido diário.

Mariana

Por que se diz, pejorativamente, "fazer flores"?




Instantâneos/ Os meninos de sua mãe




Para o L. e para o J.

O menino disse uma palavra e a mãe rejubilou.

O menino temperou a salada e a luz da cozinha clareou.

O menino adormeceu e a mãe enlevou-se no seu respirar.

O menino viu o mar e correu correu para apanhar as suas ondas.

O menino sorriu quando viu que ia passear e a mãe estava junto dele.

O menino abriu o frigorífico e as mãos saborearam o queijo que espreitava.

O menino fez um gesto e a mãe escutou-o.

O menino é um anjo que vai voando perto de sua mãe.

O menino aproxima-se como se fizesse festas a uma árvore macia.

O menino está feliz e é mais sonoro o riso da mãe.

O menino chega à escola e sossega com palavras sossegadas.

O menino abraça a mãe refugiando-se na sua voz.

O menino despeja a água e refresca-se nela.

O menino procura a doçura da geleia.

O menino brinca como se o tempo não existisse.

O menino olha as imagens que passam e a mãe fixa-as no olhar.

O menino ouve a história que a mãe escreveu e quer agarrar o papel.

O menino cresce e continua a ser menino.

Diário de Mariana

13 de setembro

Querido diário,

As minhas irmãs disseram-me que adoravam, por esta altura do ano, comprar os materiais para a escola. Os meus pais iam com elas e escolhiam tudo a condizer. As capas, as canetas, o estojo, o papel para encadernar… Fogo, eu acho é que nesse tempo ainda não havia crise. O dinheirão que seria. Parece que até foram ao Corte Inglês, em Vigo, porque ainda não havia cá. Para o dia ser em cheio, iam de manhã, faziam as compras e depois iam comer merluza ao almoço(não sei por que traduzem. Já sei que sabem mais do que eu. Também era o que faltava não saberem. Com a diferença de idades que há entre nós!). Em Tuy, compravam chocolates e rebuçados e ainda passavam por Valença, onde a minha mãe gostava de comprar toalhas e panos da loiça. Deviam vir carregados! A carteira é que devia pesar muito menos!

Eu, por mim, tenho as minhas coisas do ano passado e ainda servem muito bem. Os manuais são diferentes, mas aproveitei os livros de uma prima. Pra mais ela era muito boa aluna. Assim tenho tudo escrito e gasto menos tempo a fazer os trabalhos de casa. Não gosto nada de estar muito tempo sentada e não se pode fazer os trabalhos de casa em movimento. A minha mochila também é fixe. Fico chateada é quando me pegam nela e a atiram para o chão. Um dia, ficou toda suja, fiquei possessa e disse um palavrão. Nem reparei numa professora que ia a passar. Olhou pra mim e disse: parece impossível, as raparigas são piores do que os rapazes. Eu nem disse nada, porque um dia, por uma coisa parecida, chamaram-me Calimera e não gostei nada.

Até logo, amigo. Andas sempre na minha mochila e no meu coração

Mariana

PS – Chamam “Pombal” aos contentores onde vamos ter aulas. Depois conto-te.