sábado, 13 de julho de 2024

E foi quando Nilda viu Zeferino, o primeiro grande amor da sua vida.

 

Há mais de quarenta anos que Nilda não via Zeferino. Para dizer a verdade, lembrava-se dele muitas vezes, mas era casada e afastava essas ideias da cabeça. Ele era divertido e tinha um sorriso bonito e prazenteiro. Nilda sentia o amor que também a fazia sorrir. 

Dele, os pais de Nilda tinham gostado. Para mais, tinha posses e alguns estudos. Começaram a namorar andava ele na tropa, e o tempo era de guerra colonial. Em breve, foi mobilizado para Angola. Despediram-se com tristeza e já saudade. 

Com o passar do tempo, veio o vazio que ela não tinha aprendido a preencher.  Se havia o longe da vista, logo pensava no longe do coração que poderia levar ao esquecimento ou desamor.

Se nunca sentira amor vindo da família mais próxima, como podia continuar a ser amada por alguém que conhecera  não havia um ano e tão longe dela estava?

Simpático como ele era, em Luanda arranjaria facilmente outra namorada. Valeria a pena esperar por ele para ter uma desilusão? Para ser olhada com indiferença?

Trocavam aerogramas e cartas. Nilda queria juras de amor e, em vez delas, Zeferino contava ataques sofridos ou perpetrados, por obrigação, pela sua Companhia. Nilda ia-se convencendo de que Zeferino já não gostava dela. 

E de novo a ideia recorrente de que, se nunca se sentira amada pelos mais próximos, também não o seria por ele que estava tão longe. A par, vinha a culpabilidade que também a fazia sofrer.

Um dia, mandou-lhe uma carta em que usou e abusou do verbo amar, para ter provas de que ele gostava dela.  Ele respondeu-lhe que não compreendia a carta que, como dizia o poeta, era  ridícula e durante algum tempo não deu notícias. 

Nilda, insegura como era quanto ao amor dos outros, considerou a ausência de correspondência como prova de que o namoro tinha acabado. Recebeu ainda alguns aerogramas que nem chegou a abrir, convencida de que eram de desamor e era de amor que precisava.

Umas semanas depois, Augusto telefonou-lhe a convidá-la para um baile de garagem e ela aceitou, dizendo para si que era livre e fiel.

Muito tempo depois, soube que Zeferino tinha tido um grave acidente num ataque que tinham travado nos dias em que as cartas do verbo amar circulavam. Ficou sem palavras.

Agora, passados mais de quarenta anos, estavam próximos, na mesma tarde de domingo e no mesmo recinto de dança.

Apesar da grande dimensão do espaço, os seus olhares encontraram-se, Nilda sorriu-lhe, mas ele não, mantendo-se sereno no lugar onde estava.

Nilda foi ganhando coragem e abeirou-se de Zeferino.

Sem comentários:

Enviar um comentário