quarta-feira, 10 de julho de 2024

De repente, era a campainha a tocar em desespero!


 Era Nilda que tocava aflita. 

- Dona Rosarinha, dona Rosarinha, abra e ajude-me, por favor.

- O que se passa, Nilda, o que se passa?

- O meu Augusto está muito mal. Tem de vir a ambulância, mas o meu telefone está avariado

Passados uns minutos, chegava o 112 e a maca ia até ao tanque, onde o dr Esticadinho tinha caído quando foi pôr a camisa com a nódoa de molho. Nem chegou a mergulhar a camisa na água com detergente, deu-lhe uma coisa - como disse Nilda - e caiu redondo no chão - como acrescentou ao enfermeiro.

Chegou ao hospital, com a sua calça branca suja e amarrotada, sapato branco com um pouco de lama e a camisola interior com manchas de terra e ele já sem vida. O dr Esticadinho parecia mais encolhido e pequenino.

Na Casa do Sol, soube-se do falecimento no dia seguinte, fez-se silêncio e os sorrisos fecharam-se. Mas durante pouco tempo. Até a Tilde dizer:

- Meninas, enquanto há vida, há alegria. Vamos mas é celebrar o tempo em que este nosso amigo do peito esteve feliz entre nós.

Ao funeral, que a Rosarinha ajudou a pagar, vieram três pessoas desconhecidas. Houve quem falasse de três mulheres, outros de três senhoras, outros de três raparigas e também se ouviu que eram três meninas.

No velório, Nilda estava pálida, pensativa e fazia ainda mais festas aos filhos. O Nequita leu umas orações do missal, tropeçando nas palavras mais difíceis, mas, durante a leitura, houve silêncio e as vizinhas não fizeram tantas perguntas nem olhavam tanto para as coloridas forasteiras.

Quando todos regressavam a casa, o Nequita pôs-se ao lado de Nilda e explicou-lhe quem eram as três senhoras desconhecidas, sem Nilda lhe perguntar nada. Rosarinha deu-lhe uma pequena cotovelada, mas ele não percebeu e continuou. Ela sentiu então que a sua causa de ajudar Nequita a entrar na vida religiosa também tinha morrido. 

Tentaria motivá-lo a arranjar um trabalho o mais brevemente possível. Talvez o padre não concordasse, mas tinha de ser prática e decidida.

O tempo foi passando: dias, semanas, meses… e Nilda, um dia, disse a Rosarinha que se sentia muito só, aliás como sempre se tinha sentido, mesmo quando o seu Augusto era vivo.

E, com um sorriso meigo e sereno, disse que ia a um baile na tarde do domingo seguinte.


4 comentários:

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    1. Claro que sim e é bom quando tal acontece.
      Um beijinho

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  2. Dizem que a vida continua... e para alguns assim é. Para outros a vida são as recordações e a saudade.
    Abraço e saúde

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    1. Mas Nilda talvez precise de viver de forma diferente, enquanto é tempo.
      Um abraço

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