Levantou-se pela hora do costume. Sempre antes das nove. Mesmo vivendo sozinho, parecia ouvir a voz antiga da mãe: daqui a bocado é noite.
Como quase todos os dias, o que tinha para fazer não era muito demorado. Hoje, tinha de ir ao supermercado. A fruta tinha acabado, o pão e o queijo também.
Podia almoçar lá. Uma vez, tinha travado conhecimento com uma mulher bem bonita e sorridente que também estava sozinha a almoçar. Pediu-lhe o número de telefone, ela esquivou-se, mas o prazer do momento já ninguém lho tira.
Podia ser que hoje acontecesse uma situação semelhante e até tomar café juntos. Juntos, isto é, na mesma mesa, porque manteriam as distâncias e também as sociais.
Vestiu uma camisa preta e umas calças da mesma cor. Viu-se ao espelho. Como estava moreno, gostou da imagem que viu. Molhou o pente e penteou o cabelo para trás. Estava um pouco comprido, mas devia ficar-lhe bem, porque já lho haviam dito por duas vezes. Devia ser verdade porque acabaram sempre a frase por: 'A sério!'
Chegou ao supermercado e aproximou-se do balcão. Sentou-se no banco de pernas altas. Olhou à sua volta. As mulheres que via sozinhas pareciam apressadas ou estavam muito interessadas em escolher ou ver os preços dos produtos.
Acabou por almoçar no balcão solitário e triste. Talvez no exterior encontrasse alguém a tomar café e gostasse de conversar um bocado.
Saiu e dirigiu-se para um dos pontos onde serviam café.
As quatro mesas estavam cheias de gente animada.
Acabou por tomar o café ao balcão solitário. Agora menos triste, mas a alegria estava distante, apesar de a sentir bem perto.
Entrou de novo no supermercado, comprou a fruta, o pão e o queijo e voltou para casa para ver um filme.
No dia seguinte, iria a outro supermercado. Talvez uma roupa mais clara desse mais sorte.