Partilho aqui o regulamento para a escrita de um conto de Natal - enviado pela Editora Lugar da Palavra.
Boas escritas!
‘LUGARES E PALAVRAS DE NATAL – VOLUME XIII
Partilho aqui o regulamento para a escrita de um conto de Natal - enviado pela Editora Lugar da Palavra.
Boas escritas!
‘LUGARES E PALAVRAS DE NATAL – VOLUME XIII
Bom dia, desde já, e bom domingo.
Mas como será o dia, podemos perguntar, embora as respostas se embrulhem sempre no mistério que se vai desvendando, enquanto as horas passam. Às vezes, com doçura, outras com agrura. Mas a vida é mesmo assim e, mesmo assim, pode ser - e ótimo seria que fosse para todos - incomparavelmente bela.
Mas há tantas questões que surgem como, por exemplo:
Haverá mais acusações de mentiras a soprar-nos aos ouvidos e a entristecer os nossos olhos?
Continuarão a impor-se as imagens das guerras em que as pessoas que sobrevivem desesperam indefesas? Em que os lugares de legitimo e necessário abrigo são amontoados de destroços?
Veremos mais tempestades a impor-se na fúria de tanto desmazelo ambiental?
E não ficariam por aqui as questões. Mesmo por ser domingo.
Sejamos felizes no que pudermos. Pode ser que outros também o sejam e, embora em círculo pequeno, é sempre bom quando o dia fica melhor.
Mais uma vez, bom domingo!
Escrevi estes versos, no verão do ano passado, após um breve internamento de urgência num hospital de Londres.
Tinha lá ido visitar a família e festejar os meus anos.
Parabéns!
- Feliz aniversário,
Maria!
- Ah! Então, como
souberam?
- Vimos a data na ficha
E colegas nos disseram.
- Eu nunca nunca pensei
Vir hoje ao hospital;
Foi preciosa a vossa
ajuda
Neste meu súbito mal.
- Sob estas nuvens de Londres,
Nós queremos trabalhar,
Pra todos serem felizes,
Com saúde e bem-estar.
- Vim do meu país de sol,
Pequeno mas com beleza,
Pra visitar minha neta
Que, juntamente com meu
neto,
São minha grande riqueza.
- Noutros países nascemos,
Terras de eterno verão,
De cores várias e dimensão,
Mas grande pobreza lá
temos.
- Também portugueses
emigram
Para a vida melhorar;
Tantas vezes o esquecemos
Em vez de sempre o
lembrar.
- Muito difícil é viver
Com a pele de cor diferente;
Ter coragem de partir
Enobrece a forte gente.
- Obrigada pelo bolo
Com velinha e doçura;
Para vós, mil parabéns
Pelo saber e ternura!
O texto juntou-se a outros mais da coletânia Mimos de..., publicada pela Editora Lugar da Palavra. |
Há nomes na nossa vida que passam a ter um sentido próprio para quem os usa. Adotamo-los sem os questionar. É o caso da Portinha.
A Portinha era um terreno que as minhas tias tinham fora, mas perto da casa de lavoura onde sempre moraram enquanto viveram.
Logo que se entrava na Portinha, havia uma ramada e um enorme castanheiro. Por esta altura do ano, havia a vindima. A nós, os mais pequenos, cabia apanhar do chão os pequenos cachos (dizíamos gaipas) de uvas que iam ficando para trás e estavam ao nosso alcance ou caíam ao chão para serem aproveitados.
Queríamos era apanhar os cachos a sério, subindo ao escadote e usando tesoura de poda, mas era o tempo em que o querer de criança era como a parra da uva: pouco interessava para o efeito.
Ora, a limitar este espaço havia um muro que terminava com uma entrada para a horta, onde havia diferente hortaliças - nesta altura também havia nabos com rama alta e muito verde -, flores para o cemitério, onde estavam os antepassados -, e um grande espaço de erva onde a roupa era posta a corar. Se havia sol e estava calor, era regada devagar com um regador, para que ficasse mais limpa e branquinha. E havia muitas vezes umas toalhinhas pequenas de felpo que eram regadas para que as manchas saíssem. Só mais tarde lhes conheci a função e desvendou-se o mistério.
Lembro-me muitas vezes da Portinha que deixei de ver desde que as minhas tias faleceram e deixei de ir à velha casa.
Feliz ou infelizmente, não sou muito saudosa, mas estou grata (palavra muito usada atualmente e oxalá não se gaste) por ter tido essas experiências até à minha adolescência.
Nem sei se a Portinha ainda existe, porque foi construído um viaduto nas imediações, espaços desportivos e uma estrada onde se pode caminhar.
São boas as portinhas que a vida nos vai abrindo, nem que sejam como pequenos cachos de uvas que vamos agarrando para que não desapareçam no chão.
Ontem à tarde, na Assembleia da República - conhecida pela Casa da Democracia - discutia-se o Orçamento de Estado e todos estavam zangados, chateados, mal humorados, afinados, furiosos, exaltados…
Nas intervenções dos governantes e deputados, era quem mais queria evidenciar o seu trabalho e maldizer, criticar, desprezar, anular as pretensões e palavras dos outros.
Uma guerrilha teimosa e feia, uma crispação nada exemplar. Cada um atirava palavras duras, culpabilizadoras, jogando ao ataque e à defesa ao mesmo tempo. Enquanto isso, os sobrolhos carregados faziam prever que quando não há entendimento, não há orçamento. Tudo irrevogável.
E tudo se encaminhava para um virar de costas nas negociações - um namoro conflituoso que terminava com ofensas na praça pública que assistia à prolongada e grande gritaria. Não, o casamento não era possível e no ar, e na AR, pressentia-se o fechar do pano de uma longa novela, enquanto se apregoava: ‘Está tudo terminado entre nós.’
Eis senão quando, passadas umas duas horas, o casamento entre o casal desavindo voltava a ser possível, o incêndio das palavras abrandava e o diálogo aproximava-se da porta para entrar.
Que bom - disseram uns, o país não aguenta com tantas eleições em tão pouco tempo.
É preciso esperar - diziam outros mais prudentes - porque os noivos ainda não contaram a história toda e podem afastar-se outra vez.
Enquanto isto, e também por causa disto, o país vai-se mantendo tristonho, zangado e crispado. Ah, e de sobrolho carregado.
Se eu fosse nova, emigrava. Só vinha cá de vez em quando. Para não desaprender de ser feliz.
Porquê?
Ele fala pausadamente, dividindo bem as sílabas das palavras, acompanhando o discurso que profere de gestos com as mãos, juntando o polegar ao indicador, mostrando que nada está a escapar à sua equipa de governo e que o caminho tem sido perfeito, como nunca foi. Está implícito, é claro, que os outros é que estragam tudo.
Ele aparece perante as câmaras para apaziguar, explicar, justificar, ‘amar a todos como a nós mesmos’, como numa aula imaginária e bondosa para crianças sentadinhas que se limitam a ouvir e a sorrir. Tudo muito zen, límpido e transparente. Ah, e ‘com sentido de estado’, que é expressão muito usada por quem está no poder e que assume múltiplos sentidos, consoante o momento.
Mas gabo a paciência do jovem ministro e a visível lealdade ao seu líder e a uma causa que, nas suas palavras lentas e quase soletradas, parece não ter mácula. Mas tem, como tudo na vida, corra ela mais depressa ou devagar.
De facto, (tentar) representar bem também estará no rol de quem é político. E se essa capacidade ajudar a pacificar e desenvolver o país, tanto melhor. Ainda que, confesso, às vezes o excesso até dê vontade de rir ou, pelo contrário, não tenha piada nenhuma, se o que se diz é bem diferente do que se faz.
Seja como for, mais vale ser zen do que incendiário como, infelizmente, também os há, dentro e fora do governo. Estes correm depressa para as câmaras de televisão para que, sempre a velocidade cruzeiro, nenhum descontentamento lhes escape e com ele só eles possam ganhar.
É caso para dizer:
Nem tanto ao mar nem tanto à terra, ou seja, nem tão devagar nem tão acelerado. E, sobretudo, que bom seria que os políticos fossem, de facto, mais francos, na prática e não só na teoria, porque são muito importantes na vida de um país.
Mas, às vezes, dá vontade de desligar do que dizem e fazem para ter(mos) momentos verdadeiramente mais zen, no recato (outra palavra atualmente muito usada) da nossa vida do dia a dia.