Há dias, fui ao cinema Trindade, no Porto, ver
o filme Peregrinação, do realizador João Botelho.
Quando entrei, a sala estava
quase vazia. Minutos depois, começaram a chegar muitos idosos, ocupando quase
todos os lugares.
Ouvi depois que eram utentes de
um lar e que estar ali resultava de uma "Caixinha dos desejos", que, desta vez, se traduziram numa ida ao cinema. Achei uma bonita ideia.
Via-se que alguns daqueles idosos
não estavam habituados a ir ao cinema.
Ora, o filme dura 110m, sem
intervalo, e exibe muitas das dificuldades e relações violentas vividas pelos marinheiros portugueses, no séc. XVI, através dos olhares de
Fernão Mendes Pinto, que os transpôs para o seu livro Peregrinação.
Atrás de mim, ouvia-se uma voz que
repetia: "Nunca mais acaba", outra: "Preciso de ir à casa de
banho".
Talvez, quando
regressassem ao Lar, dissessem que não tinham gostado muito do filme.
Talvez os cuidadores presentes, numa atitude muito louvável,
ficassem satisfeitos com a oportunidade de proporcionar aos velhos um cinema sem
barreiras arquitetónicas, ver um filme português, aprender um pouco mais da
nossa História, conviver, conversar depois sobre diferentes assuntos, conhecer uma boa obra de arte, etc.
Talvez os dinamizadores do cinema
Trindade ficassem felizes ao verem que o grupo
estava feliz por vir ao cinema.
E talvez alguns idosos retivessem somente cenas
bonitas, paisagens bonitas, músicas bonitas, jovens bonitas, para atenuar as cenas
mais violentas ou aflitivas de confronto humano ou com forças da natureza.
Porque às vezes já basta a longa e pesada peregrinação de cada um!