sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Uma história com um livro dentro



                                                Imagem da net


A tangerineira
    Era verão. Os dias amanheciam já quentes e as tardes tornavam-se abrasadoras. A Ana estava de férias e adorava passar as tardes a ler debaixo da sua árvore preferida: uma tangerineira enorme e de copa frondosa, que, no inverno, se enchia de frutos doces e sumarentos e, no verão, amaciava com a sua sombra as tarde escaldantes na aldeia. 
    Depois do almoço, depois da cozinha arrumada, enquanto a mãe dormia a sesta, a Ana sentava-se à sombra da tangerineira a ler. As leituras sucediam-se, e nas páginas do livro sentia-se a frescura das folhas verdes da tangerineira. E as personagens da história sentiam-se também protegidas pela sua sombra.
    Mas um dia a árvore secou. Era já muito antiga e muito velhinha. Foi preciso cortá-la, ficou só o tronco grosso e abandonado. A Ana teve de procurar outras sombras no quintal para poder continuar a ler naquelas tardes quentes de verão, mas não havia nenhuma que se assemelhasse aos braços protetores da sua tangerineira. A ameixoeira tinha folhas finas e pequenas; a figueira, largas e recortadas. O sol lançava com facilidade os seus raios sobre as páginas dos livros. As personagens queixavam-se, encolhiam-se, franziam o sobrolho àquela luz que as inundava. A Ana não tinha como as proteger.
  Os anos foram passando, a menina cresceu, morou noutras casas sem tangerineiras que abrigassem as personagens das histórias que continuou a ler. No lugar onde existia a sua árvore preferida, nem o tronco sobreviveu; foi arrancado pelos braços fortes do cunhado, que agora habita a casa. Nesse espaço florescem rosas de todas as cores, que cheiram a livros e têm a frescura das folhas verdes da tangerineira.    

Maria da Glória Poças  

4 comentários:

  1. Há professoras de Português que escrevem mesmo bem! Com singeleza e qualidade perlocutória.
    ;)

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  2. Quando a Glorinha me mandou esta sua história, respondi-lhe logo que estava muito bem escrita e que o final estava lindíssimo!
    Hoje, com mais tempo, gostaria de lhe dizer que um outro pensamento me ocorreu: "Quem me dera ter escrito este texto!"
    Penso que este é o maior elogio que se possa dar a quem escreve.
    E nem todos são disso merecedores...
    Parabéns, Glória! E obrigada por seres minha amiga!

    Quanto a vós, Mariana, Dolores e Vítor, que posso eu dizer?
    Apenas, que temos todos muito bom gosto (Que se dane a modéstia!...)! E muita sorte em estarmos tão bem acompanhados...
    ;-)

    beijinhos para todos (inclusive para a Ana, a feliz personagem do conto)

    IA (às vezes, prima Zá)

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  3. Ora assim é que é! Continuemos, então, a partilhar histórias.

    Beijinhos para todos
    M.

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