terça-feira, 9 de julho de 2024

Mas, sem jeito nem paciência, nada feito!


Rosarinha abriu o portão alto e entrou em casa. Estava triste. Queria ajudar o afilhado, mas estava a ver que não conseguia. O Nequita era bom rapaz, mas não estava fadado para ser padre, ia concluindo. Para tal, faltava-lhe espiritualidade e, sobretudo, convicção e empatia. Poderia ser até violência querer fazê-lo seguir um rumo para o qual não tinha nascido.

A ideia da cruz  ao peito, do missal e de se apresentar com indumentária à beato do início do século XX não resultava e tornava-o uma figura caricata. Era o que Rosarinha menos queria e culpava-se a si própria por ter corroborado nesta situação. Custava-lhe dizer que não a quem quer que fosse e muito menos ao padre.

Só a ela própria menos vezes dizia sim, incluindo sobre a sua saúde. Quando ia ao médico, de longe a longe, trazia sempre vários exames que não fazia. Ia adiando até que ficavam esquecidos no envelope que usava para o efeito. Até que um dia ficou doente, muito doente, doença que podia ter sido evitada se tivesse sido vista por um médico mais cedo. Nessa altura, sentiu que era até leviandade e desrespeito por si própria.

Sempre tinha ajudado mais do que tinha sido ajudada, dizia para si própria como revolta ou desabafo. E sofreu bastante com a incerteza do presente e do futuro. Apesar de ser tão religiosa, não concordava com promessas. Parecia-lhe um negócio de toma lá dá cá, ou melhor, dá cá e depois toma lá.

Porém, durante a doença, deu consigo a fazer uma promessa. Se recuperasse a saúde, tentaria viver uma vida ainda mais equilibrada com ela e com os outros. Tentaria ajudar quem precisasse, sem se pôr em segundo plano,  como sempre tinha acontecido.

Neste patamar, entrou o Nequita, em quem o padre depositava confiança, porque gostava de rezar e de ir à igreja, muito mais do que os jovens da sua idade. Como era afilhado da Rosarinha, e viviam muito próximos, o caminho até à vida religiosa seria mais fácil. Rosarinha confiou no projeto que englobava Nequita. Depositava nele a confiança que tantas vezes inculcava pela imaginação.

No entanto, via agora que era quase impossível transformar aquele jovem num ser religioso, amado, confiável e ouvido.

Já na cozinha, começou a fazer o jantar. Aproveitaria o diálogo à mesa para o orientar e aconselhar. De repente, a campainha começou a tocar em desespero.


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