quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Agosto, serás assim tão querido?


O  mês de agosto está quase no fim.

Enquanto rego o jardim e o quintal - com água do poço que, felizmente, continua a brotar, apesar do calor, - vêm-me algumas ideias para aqui partilhar ou então para arranjar algumas plantas e tornar o recanto mais bonito, etc. 

Porém, o meu computador - talvez de tão carregadinho e cansado - pifou ou amuou ou desmaiou, não sei,  porque não me obedece e não dá sinal de si. Como são férias para muita gente e está muito calor, ainda não fui à loja própria.

Podia usar o telemóvel para blogar, mas nunca o tinha feito. Procurei ajuda e estou a fazê-lo agora, ainda que com algumas dificuldades. Logo, o azar ficou mais pequenino.

Mas como dizem que um azar - seja ele grande ou pequeno - nunca vem só, esta semana fui ao supermercado e da lista constava couve-flor. Chegada ao local, peguei num exemplar que, tal como os outros exemplares, tinha bastantes folhas velhas à volta da dita flor. Que fiz eu? Toca a tirar algumas que desfeiavam  o exemplar. Mal eu sabia que, pelo meu ato  considerado nada exemplar, iria ouvir um raspanete da funcionária que ajeitava os legumes.

Uns dias depois, fui a uma missa pelo aniversário de nascimento da minha mãe. Na igreja, e na mesma fila, fiquei com alguns familiares. De vez em quando, trocávamos palavras de circunstância, embora em voz baixa.

No final da cerimónia, já fora da igreja, enquanto, juntos, conversávamos, veio uma pessoa chamar-nos a atenção porque tínhamos falado bastante durante a missa e, voltando-se para mim, disse que eu havia sido a pior. 

Como não contava com o raspanete ali e naquele momento, a minha reação ficou-se por uma cara de muito poucos amigos, disseram-me depois.

Confesso que não gostei nada desses momentos, embora reconheça que não se deve falar na missa, nem que seja baixinho, tal como a minha mãe  nos ensinou. Sobre pagar por folhas velhas não me lembro de ter recebido ensinamentos.

Mas, pronto, como já posso escrever sobre estas coisas, ainda que o computador continue avariado, vejo melhor que estes azares são mais que pequeníssimos em relação a outros que já aconteceram no país e no mundo este mês.

E desculpa, agosto, ainda que tragas coisas boas ou engraçadas ou que até dão pra rir; pelo que sinto, vejo, oiço e leio, há palavras que nunca te direi. Sabes quais? ‘Meu querido mês de agosto’!

terça-feira, 15 de agosto de 2023

Rituais também com melancia e talvez doces

 

Liguei a televisão e, no canal 1, estava a ser transmitida uma missa, porque hoje se celebra a festa católica da Senhora da Saúde. De repente, ocorreram-me alguns hábitos que, menina e moça, muitas vezes vi serem seguidos na família, mas que não cultivei pelos afazeres da vida e, se calhar, por algum desapego a rituais em dias marcados.

Por exemplo, neste dia feriado de 15 de Agosto, os meus pais iam quase sempre à missa aos Carvalhos, Vila Nova de Gaia, onde se festejava a Senhora da Saúde, na capela com o seu nome. O fervor religioso era da minha mãe, o lado de apreciar a festa mais pagã era do meu pai. 

Quando regressavam, traziam sempre uma grande melancia, muito vermelhinha e sumarenta, que saboreávamos deliciados, e talvez doces, mas deles já não me lembro bem. A minha mãe não os dispensaria, aconchegadinhos no habitual cartucho de papel. O plástico ainda não tinha invadido o mundo inteiro. Oxalá este ano  tenha diminuído por lá e em toda a parte. Também pela saúde de todos.

O dia, às vezes, estava muito quente, mas, quando a minha mãe chegava a casa, não falava do calor, mas sobretudo da beleza dos andores e da cerimónia, enquanto o meu pai procurava no jornal - julgo que naquela altura era O Primeiro de Janeiro - o horário de algum jogo de futebol ou da Volta a Portugal em bicicleta.

Embora não seja de seguir muitos rituais, sobretudo com regularidade, acho que estes podem também dar saúde a quem os pratica. Então, por que não?

 

Muita saúde para todos!

 

domingo, 13 de agosto de 2023

Praça da Liberdade

 

Eram duas as tias. No verão, alugavam uma casa na Foz e iam uns dias para a praia. Diziam que o sol e o iodo lhes faziam bem e assim passavam melhor o inverno.

Como não usavam fato de banho, uma delas, a que tinha mais jeito para a costura, fazia, antes das férias, saias mais claras e frescas para si e para a irmã. As blusas eram as que usavam habitualmente, de popeline e de manga curta. As saias eram abaixo do joelho e com umas rachas de lado, que eram cosidas quando o outono começava a dar sinais.

Duas das sobrinhas foram um dia visitá-las. Vão ficar contentes, pensavam. E vão contar coisas engraçadas. É verão e a Foz não é a nossa aldeia. Para além disto, havia o mar que sempre as fascinava e que raramente viam tão perto. 

Saíram de manhã cedo de casa, foram de elétrico até ao Bolhão e apanharam outro elétrico até à Foz. Chegaram, contentes, quando o areal era ainda um pequenino e fresco deserto.

Como sabiam que as tias tinham o seu ritmo e não gostavam de surpresas nem correrias, as sobrinhas esperaram por elas no murinho próximo entre a rua e a praia. Nesses entretantos, viram muitas mulheres a tomar banho em combinação, sob o olhar cuidador do velho banheiro, agarradas a uma longa e grossa corda para aguentarem as ondas contra o corpo que não queriam destapar, mas cujos relevos a água acentuava.

Como as tias diziam que o ar do mar abre o apetite e para não dar despesa, as sobrinhas compraram pão fresco e bananas, que foram saboreando sentadas no murinho enquanto esperavam. O tempo não era de avisos prévios como é atualmente, porque nem toda a gente tinha telefone e do telemóvel nem sequer se falava.

Em breve, as tias apareceram, mas o encontro não foi efusivo como as sobrinhas esperavam, com alguma indiferença até. Como se não lhes agradasse a certa alteração dos seus rituais. Ainda assim, perguntaram se as sobrinhas queriam almoçar. Uma delas subiu de novo à casinha alugada para avisar a senhoria, que também fazia as refeições, para pôr mais dois pratos na mesa.

Sem mais delongas, desceram todas à praia e dirigiram-se à barraca de riscas azuis. As tias sentaram-se nas cadeirinhas pequenas também pintadas de azul e as sobrinhas na manta que ficava de noite num saco, com muitos outros sacos, à guarda do banheiro.

Entre palavras curtas, uma das tias tirou de uma cesta uma toalha de linho que andava a bordar, a outra começou a alinhavar umas peças de roupa e nem olharam quando se ouvia, bem próximo, o pregão: Olha a língua da sogra!

Depois do almoço, as tias foram descansar um pouco e as sobrinhas vieram cá para fora olhar mais longamente o mar. Falavam baixinho para não perturbar a sesta no quarto que era logo ali. 

Mais brando o calor, voltaram todas à praia até uma das tias dizer que estava cansada, dobrando o trabalho que tinha entre mãos. Levantaram-se, penduraram as cadeirinhas nos cabides das barracas, saíram da praia devagar sem grandes mimos nem conversas. E para mais as pernas e as costas já doíam e o jantar já devia estar quase pronto.

A frase mais comprida que as sobrinhas então ouviram foi: quando quiserem, apareçam.

Depois da despedida um tanto apressada, porque as tias sempre gostavam de comer cedo e à hora certa, as sobrinhas regressaram, não sem antes comprarem pão que comeram com as bananas sobrantes, já um pouco moles. 

Já na paragem, sorriram quando, ao longe, viram aparecer o elétrico onde à frente se lia: Praça da Liberdade.

 

sábado, 12 de agosto de 2023

A praia

 

A família chegou e montou a tenda de campismo, que sempre usava nos domingos de verão passados na mata junto à ria. 

Naquele tempo - em que o avô ia de fato, gravata e chapéu - não se ouvia falar de grandes incêndios.

Também não faziam fogueiras porque levavam comida para todo o dia. E nunca faltava a panela de pressão sempre cheia. Nem sei se o feijão era acompanhamento ou o prato principal.

Depois de almoço, dava quebreira que a sombra das árvores altas refrescava, mas não abrandava. E quase ninguém resistia a uma sesta. Aqui e ali um ressonar. Não ficava cadeira vazia, sobretudo as de encosto.

Uma adolescente - a mais jovem da família - ia pela primeira vez acompanhada pelo namorado.

Sentados lado a lado, olhavam à sua volta. Eram os únicos não tomados pelo sono. Podiam ir passear pela estrada fora, mas o calor era muito. Podiam atravessar a rua e estender-se na curta areia da ria, mas estaria muito quente e não poderiam tomar banho.

- E se fôssemos à praia? Há passagem aqui ao lado.

- É difícil. Há muitos arbustos que picam, outros arranham de tão secos.

- Vamos tentar. Somos magros e resistentes.

- A praia é grande, bonita e não há quase ninguém.

- Pode ser perigoso. Não é vigiada.

- Estaremos sós como numa ilha deserta. Valemo-nos um ao outro.

Olharam de novo a família. Toda a gente dormia. Apenas o pai se mexia por causa de uma mosca que lhe passeava no rosto.

Com ternura e força, deram a mão e entraram nos arbustos densos que os separavam da praia de areia larga, clara e limpa.

Aonde entraram maravilhados, sem pressas nem tormentos. E onde se deitaram ouvindo só o som do mar. E os sentidos que a livre maresia atiçava.

Quando regressaram ao 'acampamento' já todos estavam acordados e alguns jogavam à bola. A mãe, preocupada, olhava em todas as direções.

Duas cadeiras, bem juntas, estavam vazias. Sentaram-se e, passados apenas alguns instantes, adormeceram.

sexta-feira, 11 de agosto de 2023

Na esplanada

 

Éramos três. Amigas de longuíssima data. Sentadas numa esplanada em frente a uma estação de comboios, um lugar sempre mágico pelas partidas e chegadas. Pelos sonhos e realidades. Pelo ruído das malas que guardam ou guardaram momentos embelezados pelo prazer e esperança.

Com um café sobre a mesa, e, apesar de não haver cerejas, a conversa foi como elas. Maduras ou não. E longa.

E tomou o caminho dos amores da adolescência. A aproximação aconchegada no lugar na camioneta de e para o Porto. E o tocar tímido da mão rua fora. E o pedido de namoro. E o encontro sem dizer nada à mãe. E as palavras que aqueciam ou arrefeciam o momento. Tanta coisa.

Fomos ficando, recordando, rindo. O sol já esquentava, indiferente ao calor juvenil de histórias antigas.

Quando nos despedimos, desejámos boas férias, não sem antes combinarmos outro encontro noutra esplanada aberta ao sol de verão.

Não sei que temas virão à baila, mas assim tem mais piada, como tiveram hoje recordações juvenis que deram um calor risonho a uma manhã bonita de verão.

 

quinta-feira, 10 de agosto de 2023

Ó dona!

 

A minha irmã chamava-se Leonor e muitas vezes sou confundida com ela, o que será natural, porque tínhamos idades muito aproximadas e muitas semelhanças físicas. O mais estranho é que às vezes me chamam Leonor, mesmo pessoas que não a conheceram.

Há umas semanas, chamaram-me dona Manuela, depois compreendi porquê: há outra pessoa na família com esse nome. Para dona Olga, como também me chamaram há dias, é que não encontrei explicação. Achei graça e passei à frente. 

Já dona Dores, como acontece com frequência, aproxima-se mais e leva-me até a sorrir e a brincar com o nome que os meus pais e talvez padrinhos preferiram pôr-me traduzido e que, quando eu era menina e moça, de cabelo forte e preto e brincos de argolas, levava a que me perguntassem se eu era espanhola.

Ora, a confusão de nomes não me faz confusão. Às vezes é até divertido e não me faz perder a identidade. Do que não gosto mesmo nada é quando me chamam ó dona, como é hábito de algumas pessoas. Uma vez, um ex-vizinho dirigiu-se-me ó dona, a propósito de um assunto qualquer que tinha a ver com o quintal. Eu respondi-lhe, pondo a palavra no masculino e ele levou a mal!!!

Pronto, nesta tarde em que o meu computador marca 26 graus, mas no Sul e noutros países marcaria bem mais, lembrei-me deste fait divers, mas as altas temperaturas não o são, marcando que, afinal, somos donas e donos de muito pouco. E isso é um assunto cada vez mais sério.

 

quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Jornada de juventude

 

Na minha infância, a minha mãe pertencia à Lac - Liga agrária católica - e muito cedo nos inscreveu, a mim e à minha irmã, na Pré-Jac e, depois, na Jac - juventude agrária católica (É curioso que ao meu irmão a minha mãe nunca filiou)! 

Tínhamos reuniões mensais no Salão Paroquial, ao domingo antes da missa e às vezes à tarde, dinamizadas pela presidente, que era eleita democraticamente por todas nós. A que mais me ficou na memória foi uma rapariga das poucas que seguiram os estudos e que era muito alegre e empenhada.

Teve a coragem de se opor às ideias de um padre, que considerava retrógrado. Parte do grupo seguiu-a, outra parte não e o 'cisma' motivou algumas desistências, como foi o meu caso. Não me recordo do que a levou a estar contra o padre, mas tenho pena de não ter tido a mesma coragem. A minha desistência, se calhar, foi o caminho mais fácil, mas foi o que aconteceu. É a vida. Faltavam ainda muitos anos para se ouvir o Papa repetir: 'Não tenhas medo! Não tenhas medo!'.

Recordo-me de outra presidente, uma rapariga muito convicta e muito doce e que hoje continua a ser uma mulher que muito admiro. Recordo-me de, numa atividade, ter sugerido que vendássemos os olhos por uns instantes para sentirmos o que é não ver. 

A vida foi-lhe muito dura, roubando-lhe os seres que ela, naturalmente, mais amava, mas continua com o seu sorriso bonito, generoso e brando. E a interessar-se pelos outros. Há tempos, ouvi-a dizer que, pelo menos ao fim de semana ia tomar café onde sabia que encontrava pessoas conhecidas. Um dia, ouviu que o café de casa era bem melhor e ela logo respondeu: é bom o café tomado, mas é melhor quando é falado.

No tempo em que eu pertencia à ação católica, fazíamos reflexões interessantes, como, por exemplo, sobre problemas do mundo, ainda que geograficamente distantes, já numa perspetiva global e solidária. Hoje, nem sei se existem a Jac, a Jec, a Joc, a Juc... Atualmente, tais divisões - de género, de ocupação, etc. - não fazem qualquer sentido. Felizmente.

De outras presidentes não me recordo. Não devem ter feito nada de relevante, no meu entender, ou então, eu não estava devidamente atenta.

Tudo isto me veio à cabeça quando, perto do mar, ia acompanhando, de vez em quando, aquele alegre mar de jovens na JMJ. 

Voltando à filiação na Jac, na minha juventude, não dou por perdido esse tempo e algumas coisas me ficaram. 

Ah, também havia festas anuais com teatro, danças, etc. Dessas não me ficaram as recordações que eu desejaria. Os irmãos - rapazes - tinham liberdade maior. Isso, é claro, também me ficou.