Era
uma vez dois vizinhos que viviam numa terra vulgar. Mas não viviam os
dois da mesma maneira! Um era o mais rico senhor daquela terra e muitas
noites levava sem poder dormir, preocupado com as suas riquezas, com a
sua casa cheia de preciosidades…
O
mais pobre era mesmo muito mais pobre: não tinha quase nada e vivia
numa casa velhinha, à porta da qual tinha montado uma espécie de
oficina de remendão. Ele remendava tudo: carteiras velhas, sapatos,
albardas, maletas, enfim, trabalho assim era coisa que nunca faltava! E
todo o dia cantava! Tivesse muito ou pouco trabalho, nunca deixava de
cantar!
Na
casa ao lado, o rico senhor não compreendia como é que com a sua vida
de sacrifício e canseira, e tanta miséria que bem se via, o seu vizinho
passava o dia em cantorias!!! Aquilo fazia-lhe imensa espécie...
Um dia mandou chamá-lo à sua presença e disse-lhe:
− Ó mestre, vossemecê quanto é que ganha num ano inteiro?
O remendão coçou a cabeça, o que era sinal de que não fazia a mínima ideia, e disse:
−
É impossível calcular isso... pois há tantos domingos e tantos
feriados que as contas ficam muito complicadas...
Mas o homem rico insistiu:
− Ó mestre, mas diga assim mais ou menos...
Respondeu o remendão:
− Mais ou menos, mais ou menos, ganho o que me dá para o comer do dia! Só sei que não morro de fome, lá isso não!
Então o homem rico disse-lhe:
− Pois tome nota: eu quero que vossemecê viva sem cuidados e com fartura, pois bem o merece, já por tanto ter trabalhado!
E dizendo isto, entregou-lhe uma bolsa bem recheada de moedas de ouro.
O
remendão foi às nuvens!!! Nem sabia como havia de agradecer! Julgou-se
o homem mais rico da terra e correu para o seu telheiro a enterrar a
bolsa de moedas. A partir daí, nunca mais cantou, pois o menor ruído o
punha em sobressalto, com medo dos ladrões... Deixou de ter o sono
ferrado e descansado que sempre tivera, e então cantar?! Isso foi coisa
que nunca mais fez, com medo de dar nas vistas a sua alegria!!!
Um
dia reparou que até o andar do seu gato o fazia tremer... Então foi
ter com o vizinho rico e levou-lhe a bolsa de moedas de ouro,
dizendo-lhe:
−
Muito lhe agradeço, meu senhor, a sua bondade, mas aqui tem o seu
dinheiro. Guarde-o, que eu por mim guardarei as minhas cantorias e o
meu rico soninho descansado!!!
E assim, o remendão
Preferiu o que mais queria.
Mais que a riqueza enterrada,
Vale a sua cantoria!
Maria Alberta Menéres
100 Histórias de todos os tempos
Porto, Ed. Asa, 2003
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