Ah-nuld,  o macaco
Durante
  os últimos dez anos tenho orientado passeios ecológicos e de vida 
selvagem na  Costa Rica. Embora tenha tido inúmeros encontros 
hilariantes com macacos,  preguiças, jaguares e outros animais exóticos 
da floresta tropical, há uma  viagem que se destaca entre todas —  quando o nosso grupo teve o privilégio de testemunhar um acontecimento  verdadeiramente extraordinário.
Nessa
  viagem em particular, o nosso grupo de entusiastas da vida selvagem 
incluía Jim  e o seu filho adolescente Andy. Pai e filho não eram o que 
podemos chamar de  clientes típicos. Jim era um antigo militar de modos 
austeros, nos seus  cinquenta e muitos anos, que não falava muito, mas 
que parecia entrar  frequentemente em confronto com o filho. Eu tinha 
pena de Andy, cujo entusiasmo  pela aventura chocava com a carapaça dura
 e modos controladores de Jim. Uma vez,  Jim chegou mesmo a ser rude com
 ele, puxando-o asperamente pelo braço quando  Andy se deixou ficar para
 trás tentando apanhar uma rã venenosa de cor vermelha  e azul. Ninguém 
proferiu palavra, mas quase todos os do grupo passaram a evitar  Jim 
depois desse episódio.
Tentei
  passar um tempo extra com Andy. Ele confessou-me que estava morto por 
ver um  jaguar. Então esgueirávamo-nos, tarde na noite, já depois de 
todos terem ido  para a cama, para ir procurar rãs e outros animais 
noturnos. Era o nosso pequeno  segredo.
Mais
  ou menos a meio da viagem, numa área remota do Parque Nacional do 
Corcovado, o  nosso grupo encontrou um bandode vinte macacos capuchinho 
de cara  branca e parámos para observar. Os capuchinhos de cara branca 
são frequentemente  usados em filmes, porque são extremamente espertos e
 têm um comportamento muito  semelhante ao dos humanos. Mas embora estes
 macacos sejam, por norma, bastante  amistosos e sociáveis, este bando 
incluía um macho alfa, que era invulgarmente  agressivo. Era muito 
territorial e até ao final da tarde já tínhamos presenciado  várias 
escaramuças violentas. Quando algum dos outros macacos se aproximava  
demasiado, ele corria em direção aos outros arreganhando os dentes, 
chegando  mesmo a embater contra eles. Pusemos-lhe a alcunha de Ah-nuld,
 em homenagem a  Arnold Schwarzenegger.
Mantendo
  uma distância respeitosa, seguimos o bando de macacos à medida que 
eles iam  pilhando através da floresta, parando ocasionalmente para se 
regalar com figos  maduros que pendiam de algumas árvores. Na retaguarda
 do bando encontrava-se um  macaquinho bastante jovem, que não teria 
mais de 1 metro de altura, cuja mãe  andava já a ensinar-lhe como trepar
 aos ramos e seguir os outros. De quando em  quando, a mãe conseguia 
levá-lo do tronco de uma árvore mais larga até um ramo  mais afastado. 
Isto era o mais difícil de fazer para o macaquinho. Parava,  
choramingava, recuava e avançava, analisando qualquer outra opção antes 
de  finalmente dar o salto para além do tronco. O nosso grupo batia 
palmas  entusiasticamente sempre que ele conseguia.
Depois
  de algum tempo, o macaquinho começou a ficar cansado e a deixar-se 
ficar para  trás. Quanto mais afastado ficava, mais alto ele 
choramingava e gemia, para  conseguir a atenção da mãe. Esta parava e 
esperava por ele, mas nunca voltou  para trás. Finalmente, o macaquinho 
bebé chegou a uma árvore grande, que era  demasiado larga para ele 
conseguir ultrapassar. O seu choro tornou-se cada vez  mais alto até 
que, por fim, a mãe recuou uns passos e permitiu que ele usasse as  suas
 costas como uma espécie de ponte. Uma vez a salvo o filhote, ela 
continuou  na retaguarda do bando, com o pequeno macaco cansado, ainda a
 choramingar,  agarrado fortemente às suas costas.
Mas  o choro continuou, cada vez mais alto e irritante, até que despertou a atenção  do macho alfa que liderava o bando —
  o terrífico Ah-nuld. Arreganhando os dentes e silvando furiosamente, o
 grande  macho dirigiu-se para a mãe e a cria, deitando fogo pelos 
olhos. Aquela assumiu  uma postura defensiva e emitiu um forte rosnado. 
Todos nós suspendemos a  respiração, sem saber o que Ah-nuld iria fazer,
 mas esperando o pior.  
Quando
  Ah-nuld se abeirou de mãe e do filhote, a sua face suavizou-se. Olhou 
 diretamente para o macaquinho bebé, como se o visse pela primeira vez. 
De  seguida, Ah-nuld acercou-se da cria aterrorizada, tomou 
delicadamente a  minúscula cara do bebé entre as mãos e depositou-lhe um
 beijo na testa. O bebé  parou de chorar imediatamente. Ah-nuld ficou 
ali, embalando suavemente a cabeça  do macaquinho, e afagando-lhe 
amorosamente o pelo com os  dentes.
Imagem retirada da net
O
  nosso grupo deixou escapar um suspiro coletivo de alívio. Estávamos 
tão rendidos  à ternura do momento que quase não nos apercebemos de Jim,
 o nosso Ah-nuld, a  soluçar discretamente. Ninguém disse uma palavra, 
talvez por delicadeza, embora  eu suspeite que, lá no fundo, todos nós 
ficámos felizes ao vê-lo amolecer um  pouco. Sussurrando com entusiasmo,
 fizemos o percurso de regresso à cabana.  Depois do jantar, sentei-me 
com Jim e alguns outros na varanda, a balançar nas  redes e a escutar os
 sons da floresta tropical, tão lindos e variados como se de  uma 
sinfonia se tratasse.
A
  paz foi quebrada quando Andy se dirigiu para o alpendre e Jim se 
esticou para  agarrá-lo, segurando bruscamente o braço do rapaz. Andy 
ficou tenso. O coração  caiu-me aos pés, pois estava à espera de outra 
luta entre os dois. Todos os  olhares se fixaram ansiosamente no pai e 
no filho. Então Jim puxou Andy até ele,  deu-lhe um abraço e disse 
“Estou tão feliz por estarmos a fazer esta viagem  juntos! Sempre quis 
que tivesses uma experiência deste tipo. Andy, eu sei que  muitas vezes 
nem te dás conta, mas eu amo-te.” Chocado, Andy olhou para o pai,  como 
se fosse a primeira vez que o tinha ouvido dizer “Eu amo-te”. Mais 
tarde,  viemos a saber que efetivamente assim era.
Josh  Cohen
Jack Canfield; Mark Victor Hansen; Steve Zikman
Chicken soup  for the nature lover’s soul
Florida,  HCI, 2004
(Tradução  e adaptação)

Gostei muito desta história.
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