Tenho cada vez mais paciência para algumas coisas, mas, para outras, tenho cada vez menos. O tempo em que ficava, paciente e silenciosamente, à espera que a minha mãe terminasse a sesta para me ajudar a fazer roupinha para as bonecas já desapareceu no emaranhado dos tempos.
Pois bem, não tenho paciência para quem fala, fala, fala e exibe muitas certezas, só elas espertas e certeiras, tipo descoberta da pólvora. Na certeza de que os outros pouco sabem e andam, coitadinhos, de olhos tapados.
Não tenho paciência para descrições minuciosas, como as da experiência da vida militar, quase sempre em discurso direto ou indireto, que se prolonga por muitos pormenores que se cruzam e dos quais vou desligando, embora permaneça no lugar. O olhar é que se vai perdendo. O que vale é que não o vejo!
Não tenho paciência para textos manuscritos com letra incompreensível. Há muitos muitos anos, no tempo da terrível guerra colonial, uma jovem deixou de ler as cartas do namorado, porque eram longas e quase ilegíveis. Passou a escrever-lhe, ignorando, portanto, o que ele lhe dizia em letra que nunca quis melhorar. Não faltou muito para o namoro acabar.
Não tenho paciência para quem gere o tempo apenas consoante a sua disponibilidade, sem pensar que os outros podem ter o seu tempo contado.
Não tenho paciência para quem faz longas descrições dos problemas do dia a dia e, quando termina e o interlocutor quer também intervir, logo olha para o relógio, diz que é tarde e vai-se embora. A menos que lhe ocorra outra coisa que passa a desenvolver, como se o tempo tivesse parado.
Não tenho paciência para quem encontra justificação para tudo o que diz e faz e se ofende à mínima palavra que logo julga ofensiva.
E tenho muito mais impaciências. Tantas vezes contidas, embora gostasse de, corajosamente, as revelar mais nalgumas circunstâncias. Trava-me, com certeza, esta ideia: quem nunca mói a paciência dos outros que atire a primeira pedra! Eu não sou de certeza.